To evaluate the quality of the human milk expressed at home and at a human milk bank.
MethodsThis a retrospective, analytical, and observational study, performed by assessing titratable acidity records and the microbiological culture of 100 human milk samples expressed at home and at a human milk bank, in 2014. For the statistical analysis, generalized estimating equations (GEE) and the chi‐squared test were used.
ResultsWhen comparing the two sample groups, no significant difference was found, with 98% and 94% of the samples being approved among those collected at the milk bank and at home, respectively. No main interaction effect between local and titratable acidity records (p=0.285) was observed, and there was no statistically significant difference between the expected and observed values for the association between the collection place and the microbiological culture results (p=0.307).
ConclusionsThe quality of human milk expressed at home and at the milk bank are in agreement with the recommended standards, confirming that the expression of human milk at home is as safe as expression at the human milk bank, provided that the established hygiene, conservation, storage, and transport standards are followed.
Avaliar a qualidade do leite humano ordenhado em domicílio e no Banco de Leite Humano.
MétodosEstudo retrospectivo, feito por meio da avaliação dos registros da acidez titulável e dos resultados de cultura microbiológica de 100 amostras de leite humano ordenhado em domicílio e em um Banco de Leite Humano, no ano de 2014. Para análises estatísticas foram utilizadas as Equações de Estimação Generalizadas (Generalized Estimating Equations ‐ GEE) e o teste Qui‐quadrado.
ResultadosNa comparação dos dois grupos de amostras, não foi detectada diferença significativa, sendo que 98% e 94% das amostras foram aprovadas entre as coletadas no Banco de Leite e em domicílio, respectivamente. Não foi observado efeito principal de interação entre local e grau de acidez titulável (p=0,285) e não se constatou diferença estatisticamente significante entre os valores observados e esperados para associação entre local de coleta e o resultado da cultura microbiológica (p=0,307).
ConclusõesA qualidade do leite humano ordenhado em domicílio e no Banco de Leite Humano estão de acordo com o padrão preconizado, comprovando que a ordenha de leite humano em domicílio é tão segura quanto a ordenha no Banco de Leite Humano, desde que sejam seguidas as normas de higiene, conservação, armazenamento e transporte estabelecidas.
Situações como a prematuridade, a internação do recém‐nascido em unidade neonatal, doenças da mãe ou baixa produção láctea podem gerar dificuldades no estabelecimento e na manutenção do aleitamento materno (AM).1 Dessa forma, o uso de leite humano (LH) doado se torna uma eficiente opção para nutrição2 dos recém‐nascidos em condições especiais e uma forma de manutenção da produção de leite pelas nutrizes doadoras.3
Nesse sentido, os Bancos de Leite Humano (BLH) são serviços especializados, responsáveis por ações de promoção, proteção e apoio ao AM e pela execução de atividades de coleta do LH, processamento, controle de qualidade e distribuição.3
O processo de definição da qualidade do leite humano ordenhado (LHO) é resultado das condições higiênico‐sanitárias adequadas, desde a ordenha até a administração, e da avaliação conjunta de vários parâmetros, que incluem as características nutricionais, imunológicas, químicas e microbiológicas, proporciona, assim, a verificação da segurança do produto final.3,4
No Brasil, como também em outros países, a ordenha do LH é permitida no domicílio da doadora, desde que sejam cumpridas as normas de higiene, conservação, armazenamento e transporte estabelecidas.3,5–7 Dessa forma, assegura‐se maior cadastramento de nutrizes doadoras e, consequentemente, maior captação de LHO.
Diante da relevância da ordenha domiciliar como estratégia para captação de LHO e a escassez de estudos sobre a segurança dessa ordenha, considerou‐se importante avaliar a qualidade do LHO em domicílio e no BLH.
MétodosEstudo retrospectivo, feito por meio da análise dos registros de processamento das amostras de LHO em 2014 avaliadas pelo BLH do Hospital de Clínicas de Uberlândia da Universidade Federal de Uberlândia (HCU‐UFU), Minas Gerais, Brasil. Este estudo obteve a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da instituição onde foi feito, parecer n°: 1.289.959, de 21 de outubro de 2015.
Para definição do n amostral foi feito o cálculo com o programa G*Power8 (Statistical Power Analyses, G*Power 3.1, Alemanha), o tamanho amostral total mínimo foi definido em 84. Optou‐se por coletar os dados de 100 amostras de LHO, 50 em cada um dos grupos (grupo 1: ordenha no domicílio e grupo 2: ordenha no BLH).
Para seleção das amostras de LHO analisadas, usou‐se amostragem aleatória simples. Inicialmente foram identificados os registros das nutrizes cadastradas em 2014 e separadas por local de ordenha, e assim feitos dois sorteios. No primeiro foram sorteadas 50 nutrizes em cada grupo, cada nutriz tinha, em média, seis amostras de LHO; no segundo foram sorteadas uma das amostras de LHO de cada nutriz previamente sorteada.
Das amostras de LHO sorteadas foram coletados inicialmente os resultados da avaliação da acidez titulável que identifica o nível de acidez expressa em graus Dornic (°D) do LHO cru.1,3 O LH tem uma acidez original com valores entre 1 e 4°D, mas em condições que favorecem a proliferação de microrganismos da microbiota primária e secundária há produção de ácido láctico e, como consequência, a elevação da acidez do LHO.3 Acidez ≥ 8°D desqualifica o LHO para consumo.1,3,9 A medição de acidez Dornic é, portanto, uma maneira de classificar e selecionar o LH doado antes de sua pasteurização, de forma simples e econômica.4
As amostras de LHO que obtiveram valor de acidez titulável < 8°D foram pasteurizadas e submetidas ao controle de qualidade microbiológico, a partir do procedimento clássico para detecção de presença (positivo) ou ausência (negativo) de coliformes totais.3 O uso desse procedimento é recomendado por ser de cultivo simples, economicamente viável e seguro, minimiza a possibilidade de resultados falso‐negativos.10 Assim, foram coletados os resultados da cultura microbiológica das amostras de LHO que obtiveram valores de acidez titulável < 8°D. As amostras que apresentaram resultados de acidez titulável ≥ 8°D foram substituídas pela amostra seguinte da mesma nutriz com acidez titulável < 8°D ou feito novo sorteio a fim de selecionar nova amostra.
Todas as nutrizes selecionadas como doadoras foram orientadas, de forma verbal e escrita, sobre as condutas para ordenha e estocagem do LHO, conforme as recomendações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária e da Rede Brasileira de BLH (Rede BLH‐BR).1,3
O BLH HC‐UFU conta com equipe capacitada para visita domiciliar, quando são reforçadas as orientações e é feita a verificação das condições higiênico‐sanitárias do ambiente. As orientações são: escolha de um local reservado, tranquilo, limpo e sem animais por perto; prender os cabelos e colocar touca; retirar anéis, relógio e pulseira; colocar máscara ou fralda de tecido sobre o nariz e a boca; manter as unhas sempre curtas e limpas; higienizar as mãos e antebraços até o cotovelo com água corrente e sabão; limpar as mamas somente com água filtrada antes de iniciar a ordenha; desprezar os primeiros jatos de leite (0,5 a 1,0mL); usar frasco de vidro com tampa de plástico esterilizado (fornecido pelo BLH) ou fervido por 15 minutos (contados a partir do início da fervura); armazenar os frascos em local (armário ou recipiente) limpo e fechado; não tocar no interior do frasco ou tampa; ordenhar o leite diretamente no frasco, colocá‐lo debaixo da aréola; ao término da ordenha, fechar o frasco e congelar imediatamente em posição vertical; na próxima ordenha em caso de complementação do volume já coletado anteriormente usar outro frasco ou um copo de vidro fervido por 15 minutos para coletar o leite e colocá‐lo sobre aquele que já está congelado; não preencher todo o frasco, deixar o volume de leite cerca de 2 a 3cm abaixo da borda; identificar o frasco (nome da nutriz completo e data e hora da ordenha); manter os frascos com leite no freezer ou congelador até no máximo 10 dias; armazenar o leite separado de outros alimentos, quando não houver disponibilidade de armazenagem exclusiva o leite deve ser acondicionado dentro de outro recipiente impermeável (saco ou recipiente plástico); em caso de ordenha com bombinha de sucção, essa deverá ser higienizada após a ordenha com muita água corrente e sabão líquido e antes de cada ordenha colocar a bombinha em solução de hipoclorito (uma colher de sopa) com água filtrada (um litro) durante 60 minutos (essa solução deverá ser trocada a cada oito horas) e em seguida enxaguar em água corrente; o leite congelado deverá ser transportado para o BLH dentro de caixa térmica com gelo.1,3
O LHO em domicílio e ŕecolhido pela equipe do BLH HC‐UFU e transportado em carro próprio e com funcionários treinados para o transporte seguro e adequado.1
Para análises estatísticas foram usadas Equações de Estimação Generalizadas (Generalized Estimating Equations ‐ GEE) com matriz de correlações de trabalho não estruturada para comparar as médias marginais estimadas (MME) de dois valores de acidez titulável (medidas repetidas) do LHO provenientes de dois locais (fatores fixos: domicílio e BLH); os fatores randômicos considerados foram a doadora e a própria amostra doada; visto que a distribuição da variável resposta é diferente da distribuição normal, optou‐se pelo uso do modelo com resposta de escala gama com ligação de log.11 Para comparação das frequências observadas dos resultados de cultura microbiológica em ambos os grupos, usou‐se o teste qui‐quadrado de independência com a correção V de Cramer.12 Para todas as análises, adotou‐se o nível de significância de 5%.
ResultadosAcidez titulávelA média dos resultados de avaliação da acidez titulável das amostras de LHO no domicílio variou entre 3°D e 9,5°D e entre 3°D e 10,5°D nas amostras ordenhadas no BLH, apenas 2% (n = 1) em cada grupo apresentaram grau de titulação ≥8 D, consideradas impróprias para consumo1,3,9 (fig. 1).
Não se observou efeito principal do local de coleta, no domicílio MME = 4,64; IC 95% = ± 0,29 e no BLH MME = 4,39; IC 95% = ± 0,33 (χ2 de Wald = 1,14; gl = 1; p = 0,285).
Cultura microbiológicaDas amostras de LH ordenhadas nos domicílios analisadas foram identificadas 6% (n = 3) com cultura microbiológica positiva para coliformes totais; e das ordenhadas no BLH analisadas foram identificadas 2% (n = 1) com cultura positiva.
Identificou‐se que não há diferença entre os valores observados e esperados para associação entre o local de coleta e o resultado da cultura microbiológica (χ2 = 1,04; gl = 1; p = 0,307; φc = 0,102).
DiscussãoEvidenciaram‐se em ambos os locais de coleta valores de acidez titulável < 8°D em 98% das amostras de LHO analisadas. Este valor é próximo ao encontrado em outros estudos, com variação de 88 a 99,2%4,9,13 sem a distinção entre os locais de ordenha; 96%10,14 em amostras de LHO exclusivamente em domicílio; e 78%15 em amostras ordenhadas somente no BLH. A variação encontrada entre os resultados sugere a importância do controle higiênico‐sanitário em todos os passos do processamento, independentemente do local da coleta.3 Todo o processo de coleta domiciliar sob responsabilidade do BLH deste estudo foi avaliado em trabalho anterior, que confirmou o controle de qualidade do processo.1
A cultura microbiológica foi positiva em 6% das amostras de LHO no domicílio e em 2% das amostras ordenhadas no BLH. Em outros estudos, a avaliação da cultura microbiológica apontou para resultados positivos em 5%16 e 5,6%17 das amostras de LHO em BLH; 7%18 positivas em amostras de LHO em domicílio, sem adoção de critérios rígidos de higiene na ordenha e armazenamento; e 2%1 positivas quando foram adotados os critérios higiênico‐sanitários estabelecidos na ordenha domiciliar. Levando‐se em conta que a presença do grupo coliformes indica inobservância dos procedimentos higiênicos‐sanitários recomendados, o LH pode ser um veículo para microrganismos patógenos e dessa forma a pasteurização e o controle microbiológico são importantes para garantir segurança no uso do LHO.3
Não foram identificadas diferenças estatisticamente significantes nas avaliações de acidez titulável e cultura microbiológica do LHO entre os dois locais de coleta, não houve, portanto, interferência do local da coleta na qualidade do LHO, o que pode ser resultado da observância das recomendações higiênico‐sanitárias estabelecidas para BLH.3 Logo, ressalta‐se a importância da ordenha em conformidade com essas recomendações como um indicador do controle de qualidade do leite.
A ordenha no domicílio da doadora é permitida e incentivada3,5–7 e é uma forma segura e eficaz para a obtenção de LH em maior volume, para manter os estoques de LH nos BLH suficientes para atenderem às demandas.1 Entretanto, é necessário que haja orientação adequada às doadoras quanto à ordenha e ao armazenamento do leite e que seja garantido o transporte seguro.1,3,5 Este estudo apontou a qualidade e segurança da ordenha domiciliar quando comparada com ordenha no BLH, de acordo com os critérios de avaliação da qualidade e segurança do LHO por meio da avaliação da acidez titulável e cultura microbiológica.
O estudo sugere que a ordenha domiciliar é segura para obtenção de LH, desde que haja observância das normas higiênico‐sanitárias estabelecidas. Ressalta‐se que o estudo foi feito em um BLH credenciado a R`ede BLH‐BR (Rede Brasileira de Bancos de Leite Humano), que incentiva a ordenha domiciliar, garante a orientação das doadoras, faz avaliação sistemática e visita domiciliar e que conta com carro próprio e funcionários treinados para o transporte seguro do LHO.
Conflitos de interesseOs autores declaram não haver conflitos de interesse.
À nutricionista Marília e à equipe do Banco de Leite Humano do Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia pelo apoio a este estudo.
Como citar este artigo: Borges MS, Oliveira AM, Hattori WT, Abdallah VO. Quality of human milk expressed in a human milk bank and at home. J Pediatr (Rio J). 2018;84:399–403.
Trabalho vinculado à Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Faculdade de Medicina, Programa de Pós‐Graduação em Ciências da Saúde, Uberlândia, MG, Brasil.