To identify the prevalence and factors associated with anemia in children attending Municipal Early Childhood Education Day Care Center (Centros Municipais de Educação Infantil [CMEI]) nurseries in Colombo‐PR.
MethodsAnalytical, cross‐sectional study with a representative sample of 334 children obtained by stratified cluster sampling, with random selection of 26 nurseries. Data collection was conducted through interviews with parents, assessment of iron intake by direct food weighing, and hemoglobin measurement using the finger‐stick test. Bivariate association tests were performed followed by multiple logistic regression adjustment.
ResultsThe prevalence of anemia was 34.7%. Factors associated with anemia were: maternal age younger than 28 years old (p = 0.03), male children (p = 0.02), children younger than 24 months (p = 0.01), and children who did not consume iron food sources (meat + beans + dark green leafy vegetables) (p = 0.02). There was no association between anemia and iron food intake in CMEI. However, iron intake was well below the recommended levels according to the National Education Development Fund resolution, higher prevalence of anemia was observed in children whose intake of iron, heme iron, and nonheme iron was below the median.
ConclusionsIn terms of public health, the prevalence of anemia is characterized as a moderate problem in the studied population and demonstrates the need for coordination of interdisciplinary actions for its reduction in CMEI nurseries.
Identificar a prevalência e os fatores associados à anemia em crianças que frequentam berçários de Centros Municipais de Educação Infantil (CMEI) de Colombo (PR).
MétodosEstudo analítico, de caráter transversal, com amostra representativa de 334 crianças obtida por amostragem estratificada por conglomerados, com seleção aleatória de 26 berçários. A coleta de dados foi feita por meio de entrevista com os pais, avaliação da ingestão de ferro por pesagem direta de alimentos e dosagem de hemoglobina por punção digital. Foram feitos testes de associação bivariados seguidos pelo ajuste de uma regressão logística múltipla.
ResultadosA prevalência de anemia foi de 34,7%. Os fatores associados à anemia foram: idade materna inferior a 28 anos (p = 0,03), crianças do sexo masculino (p = 0,02), com idade inferior a 24 meses (p = 0,01) e que não consumiam fontes alimentares de ferro (carne + feijão + verduras verde‐escuro) (p = 0,02). Não houve associação entre anemia e ingestão de ferro no CMEI. Porém, a ingestão de ferro foi bem abaixo da recomenda pela resolução do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. Foi possível observar maior prevalência de anemia nas crianças cuja ingestão de ferro, ferro heme e ferro não heme apresentava‐se abaixo da mediana.
ConclusãoEm termos de saúde pública, a prevalência de anemia encontrada se caracteriza como um problema moderado na população estudada e demonstra a necessidade de articulação de ações interdisciplinares para a sua diminuição nos CMEIs.
A anemia é um problema global de saúde pública com consequências importantes para a saúde humana e para o desenvolvimento social e econômico de cada nação.1 Resulta de causas isoladas ou múltiplas que atuam concomitantemente e influenciam a saúde da criança,2 o seu desenvolvimento cognitivo e físico e a imunidade e aumentam o risco de infecções e de mortalidade infantil.3
Uma análise global da prevalência de anemia no mundo evidenciou que as crianças em idade pré‐escolar são as mais afetadas, com prevalência de 47,4%.1
Sua complexidade e dificuldade de controle fazem com que vários estudos busquem identificar as razões para as altas prevalências e seus potenciais fatores associados.4–6 O reconhecimento desses fatores contribui para o direcionamento de ações para a prevenção e minimização do problema.
O período compreendido entre a concepção e os dois anos consiste numa fase crítica do desenvolvimento, torna a criança vulnerável à anemia. Nessa idade, elas ingressam nos berçários de Centros de Educação Infantil, os quais são responsáveis pelo cuidado de sua saúde e alimentação, em período integral.
O município de Colombo e a Região Metropolitana do Paraná não dispõem de estudos de prevalência de anemia em crianças que frequentam Centros Municipais de Educação Infantil (CMEI). Assim, tais estudos são justificados pela maior vulnerabilidade dessas crianças e pela identificação da oferta de quantidades de ferro nas refeições dessas instituições. Obter um perfil da situação da anemia pode contribuir para a adoção e o fortalecimento de ações que contribuam para a sua prevenção e redução nessa população.
O objetivo do estudo consiste em estimar a prevalência de anemia e identificar seus fatores associados em crianças que frequentam berçários de Centros Municipais de Educação Infantil (CMEI) do município de Colombo (PR).
Material e métodosO estudo é transversal e analítico, contempla 334 crianças de seis a 36 meses de berçários de CMEI do município de Colombo, Região Metropolitana do Paraná. Colombo conta com 38 CMEI, que atendem 6.852 crianças matriculadas regularmente em 2012, 816 nos berçários.
A amostra selecionada foi representativa das crianças de berçários dos CMEI e foi definida por amostragem estratificada por conglomerados em único estágio, com seleção aleatória de 26 dos 38 CMEI de Colombo. Esses foram separados por distrito sanitário do município de acordo com sua localização, foi respeitada a proporcionalidade dos alunos matriculados de cada distrito sanitário. Como referência para o cálculo da amostra, adotou‐se a prevalência de 29,7% de anemia de um estudo feito em berçários de CMEI de Cascavel (PR) com uma amostra representativa de crianças entre seis e 24 meses,7 por se tratar de crianças da mesma faixa etária e que frequentam CMEI. Adotou‐se nível de confiança de 95%, margem de erro de 0,04, estimativa da proporção tomada como referência de 0,3. Por se tratar de uma amostragem estratificada por conglomerados, foi incluído um fator de efeito do desenho amostral de 1,4 para resguardar a precisão desejada, o que resultou em amostra mínima de 320 crianças.
O questionário continha questões sobre as condições socioeconômicas, ambientais, biológicas, características maternas e do nascimento, práticas alimentares e suplementação com ferro. Os questionários foram previamente testados em estudo‐piloto em um CMEI que não fez parte da amostra. Foram feitas entrevistas com pais e responsáveis, de junho a dezembro de 2013.
Os níveis de hemoglobina foram obtidos com amostra de sangue por punctura digital, coletada em microcuveta e leitura feita em hemoglobinômetro portátil. A concentração de hemoglobina inferior a 11g/dL foi considerada anemia e classificada como leve (10‐10,9g/dL), moderada (7‐9,9 d/dL) ou grave (< 7,0 d/dL), segundo a Organização Mundial de Saúde.8
Fez‐se a avaliação antropométrica com aferição de peso e estatura. O peso foi aferido em balança pediátrica digital com divisão de 5g e capacidade de 15 Kg. As crianças foram pesadas despidas, com fralda descartável limpa, com a balança previamente tarada e instalada em superfície plana, lisa e firme. Aquelas que tinham peso maior do que 15 kg foram pesadas em balança digital portátil com capacidade para 150kg, divisão de 100g.9
O comprimento foi aferido com antropômetro portátil confeccionado em barra de madeira, amplitude de 100cm e subdivisões de 0,5cm. As crianças menores de dois anos foram medidas em posição de decúbito dorsal sobre o antropômetro. As crianças maiores de dois anos foram medidas em pé com antropômetro de madeira.
A classificação do estado nutricional foi feita no programa WHO Anthro versão 3.2.2 (WHO, GE, Suíça), para Peso/Idade (P/I), Estatura/Idade (E/I) e Índice de Massa Corporal/Idade (IMC/I).10
A ingestão de ferro foi obtida mediante pesagem direta individual dos alimentos fornecidos nos CMEI, feita em dois dias não consecutivos. A composição nutricional dos alimentos foi obtida pelo programa Avanutri® (Avanutri®, RJ, Brasil). A ingestão de ferro foi expressa em ingestão total de ferro da dieta, ingestão de ferro heme e ingestão de ferro não heme. Foram considerados ferro heme 40% do ferro contido nas carnes e como ferro não heme os 60% restantes, somados ao ferro total encontrado nos outros alimentos. As densidades de ferro total, ferro heme e ferro não heme foram obtidas pela divisão do total de cada um desses nutrientes pelo total de calorias ingeridas pela criança no dia, expressas em mg de ferro para cada 1.000kcal da dieta.11
As variáveis independentes foram distribuídas da seguinte forma: 1) fatores biológicos: sexo e idade da criança; 2) prática alimentar: duração do aleitamento materno, aleitamento materno exclusivo até os seis meses, consumo de suco de fruta, fruta, leite, feijão, carne, fígado, legumes, verduras verdes escuras, alimentos fonte de ferro (carne + feijão + verduras verdes escuras); ingestão no CMEI de ferro total, ferro heme e ferro não heme; densidade de ferro total, ferro heme e ferro não heme; 3) morbidades: febre e diarreia nos últimos 15 dias, história de anemia; 4) estado nutricional: baixo peso ao nascer, baixo peso, excesso de peso, baixa estatura, excesso de peso segundo IMC para idade; 5) assistência à saúde: pré‐natal, número de consultas de pré‐natal, suplementação de ferro na gestação; tipo de parto; prematuridade; 6) fatores maternos: idade, cor, número de filhos; 7) fatores socioeconômicos: escolaridade e trabalho materno, renda familiar per capita, beneficiários dos programas Bolsa Família e Leite das Crianças; casa própria, número de moradores no domicílio, número de quartos, água tratada, tratamento do esgoto e destino do lixo. As variáveis foram categorizadas conforme estudos que investigaram anemia em crianças.2,4,11,12 Ingestão de ferro foi categorizada em relação à média dos valores encontrados.
Os dados foram digitados em dupla entrada no formulário online Google Drive® e após conferência exportados para o programa SPSS® versão 19.0 (IBM Corp. Released 2010. IBM SPSS Statistics para Windows, NY: EUA).
Fez‐se análise descritiva das variáveis. A associação com anemia foi verificada com o teste qui‐quadrado e exato de Fisher. As variáveis que apresentaram p inferior a 0,20 foram selecionadas para compor o modelo de regressão logística múltipla. A análise multivariada foi feita por meio da construção do modelo conceitual baseado e adaptado de Osório et al.13 Foram definidos sete níveis hierárquicos, de acordo com a seguinte ordem: características maternas (idade); estado nutricional (baixa estatura); morbidades (presença de febre e/ou diarreia nos últimos 15 dias, história de anemia); aleitamento materno (duração do aleitamento materno); práticas alimentares no domicílio (consumo de verduras verde‐escuras, carnes, fígado e alimentos fonte de ferro (carne + feijão + verduras verde‐escuro); ingestão de ferro no CMEI (ferro não heme e ferro total); características biológicas da criança (sexo e idade). As variáveis foram introduzidas no modelo uma a uma e foram retiradas aquelas que não apresentavam significância estatística de p<0,05. Foram estimadas as razões de chances – RC (odds ratio) – brutas e ajustadas.
Este trabalho faz parte do Projeto de Pesquisa Segurança Alimentar e Nutricional no Ambiente Escolar, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos (CAAE 11312612.5.0000.0102).
ResultadosA prevalência de anemia estimada é de 34,7%. Das crianças anêmicas, 56,9% apresentam anemia leve, 42,2% moderada e 0,9% grave. O valor médio de hemoglobina é de 11,3g/dL (± 1,34).
A idade média das crianças é de 21,2 (± 5,7) meses, 50,3% do sexo masculino. A duração mediana de aleitamento materno é de 180 dias e de aleitamento materno exclusivo de 90 dias. Encontraram‐se 5% de baixa estatura, 0,6% de baixo peso, 3,4% de excesso de peso e 8,4% de excesso de peso segundo IMC. A renda familiar per capita é inferior a um salário mínimo em 76,7% das famílias
A ingestão mediana de ferro total no CMEI é de 3,01mg, com uma maior contribuição de ferro não heme. A densidade mediana de ferro é de 5,64mg/1000kcal. A prevalência de anemia é maior nas crianças que tiveram ingestão de ferro total, ferro heme, ferro não heme e densidade de ferro heme abaixo da mediana (tabela 1).
Ingestão de ferro total, ferro heme, ferro não heme e densidade de ferro total, ferro heme e ferro não heme da dieta consumida em crianças de Centros Municipais de Educação Infantil, Colombo, 2013
Variáveis | Média (Desvio Padrão) | Mediana | Mínimo – Máximo | % anemia (< mediana) | % anemia (≥ mediana) |
---|---|---|---|---|---|
Ferro total (mg) | 3,10 (1,46) | 3,01 | 0,12‐8,81 | 39,9 | 31,1 |
Ferro heme (mg) | 0,13 (0,12) | 0,09 | 0,00‐0,68 | 38,9 | 32,9 |
Ferro não heme (mg) | 2,97 (1,40) | 2,89 | 0,09‐8,71 | 39,8 | 31,1 |
Densidade de ferro total (mg/1.000kcal) | 5,64 (1,85) | 5,41 | 0,70‐15,89 | 35,7 | 35,7 |
Densidade de ferro heme (mg/1.000kcal) | 0,25 (0,20) | 0,18 | 0,00‐1,27 | 39,1 | 32,5 |
Densidade de ferro não heme (mg/1.000kcal) | 5,40 (1,78) | 5,17 | 0,61‐15,89 | 35,1 | 36,4 |
Na análise bivariada (tabela 2), anemia apresenta associação estatística com: sexo masculino (OR: 1,86; IC95%: 1,17‐2,94); idade menor do que 24 meses (OR: 1,88; IC95%: 1,15‐3,09); idade materna inferior a 28 anos (OR: 1,80; IC95%: 1,14‐2,84) e não consumo de alimentos fontes de ferro (OR: 1,67; IC95%: 0,98‐2,84). Outros fatores significativos nesta primeira etapa da análise foram: presença de febre nos últimos 15 dias (OR: 1,64; IC95%: 1,04‐2,58), histórico anterior de anemia (OR: 1,83; IC95%: 1,01‐3,33), consumo de carne (OR: 4,83; IC95%: 1,22‐19,12) e consumo de verduras verdes escuras (OR: 0,58; IC95%: 0,34‐1,01); 14 fatores apresentaram p < 0,20 na análise bivariada e foram considerados para inclusão no modelo de regressão logística múltipla (tabela 2).
Distribuição de anemia em crianças de Centros Municipais de Educação Infantil, Colombo, 2013
VARIÁVEIS | na | Prevalência de anemia n (%) | Qui‐quadrado | OR Bruto (IC 95%) | p |
---|---|---|---|---|---|
Sexo | |||||
Masculino | 168 | 70 (41,7%) | 7,17 | 1,86 (1,17‐2,94) | 0,00 |
Feminino | 166 | 46 (27,7%) | |||
Idade da criança | |||||
< 24 meses | 198 | 79 (39,9%) | 6,46 | 1,88 (1,15‐3,09) | 0,01 |
≥ 24 meses | 123 | 32 (26,0%) | |||
Idade materna | |||||
< 28 anos | 156 | 65 (41,7) | 6,42 | 1,80 (1,14‐2,84) | 0,01 |
≥ 28 anos | 176 | 50 (28,4) | |||
Baixa estatura para idade | |||||
Sim | 16 | 8 (50,0) | 1,77 | 1,96 (0,71‐5,37) | 0,18 |
Não | 305 | 103 (33,8) | |||
Febre nos últimos 15 dias | |||||
Sim | 157 | 64 (40,8%) | 4,60 | 1,64 (1,04‐2,58) | 0,03 |
Não | 176 | 52 (29,5%) | |||
História anterior de anemia | |||||
Sim | 229 | 25 (44,6%) | 4,01 | 1,83 (1,01‐ 3,33) | 0,04 |
Não | 56 | 70 (30,6%) | |||
Diarreia nos últimos 15 dias | |||||
Sim | 73 | 31 (42,5) | 2,46 | 1,52 (0,89‐2,60) | 0,11 |
Não | 261 | 85 (32,6) | |||
Duração do aleitamento materno (dias) | |||||
≤ 180 dias | 156 | 44 (28,2) | 4,06 | 0,70 (0,36‐1,36) | 0,13 |
> 180 a ≥ 360 dias | 62 | 26 (41,9) | 1,29 (0,60‐2,74) | ||
> 360 dias | 53 | 19 (35,8) | 1 | ||
Consumo de carne | |||||
Sim | 292 | 95 (32,4%) | 6,06 | 4,83 (1,22‐19,12) | 0,03 |
Não | 10 | 7 (70,0%) | |||
Consumo de verdura verde escura | |||||
Sim | 229 | 70 (30,7) | 3,74 | 0,58(0,34‐1,01) | 0,05 |
Não | 72 | 31 (43,1) | 1 | ||
Consumo de alimentos fontes de ferro (carne+feijão+verduras verde‐escuro) | |||||
Sim | 223 | 68 (30,5%) | 3,61 | 1 | 0,05 |
Não | 78 | 33 (42,3%) | 1,67 (0,98‐2,84) | ||
Consumo de fígado | |||||
Sim | 163 | 48 (29,6) | 2,57 | 1,48 (0,91‐2,39) | 0,10 |
Não | 138 | 53 (38,4) | 1 | ||
Ingestão de ferro total no CMEI | |||||
< 3,10mg | 163 | 65 (39,9) | 2,61 | 1,46 (0,92‐2,33) | 0,10 |
≥ 3,10mg | 151 | 47 (31,1) | |||
Ingestão de ferro não heme no CMEI | |||||
< 2,97mg | 166 | 66 (39,8) | 2,56 | 1,46 (0,91‐2,33) | 0,10 |
≥ 2,97mg | 148 | 46 (31,1) |
A ordem de entrada das variáveis no modelo de regressão logística múltipla está representada na figura 1.
A tabela 3 apresenta o resultado do ajuste do modelo de regressão logística múltipla. Após executado o algoritmo de seleção, permaneceram no modelo as seguintes variáveis: sexo da criança, estimou‐se uma chance de anemia 82% maior para crianças do sexo masculino (OR: 1,82; IC95%: 1,08‐3,06); idade da criança inferior 24 meses (OR: 2,12; IC95%: 1,19‐3,75); idade materna menor do que 28 anos (OR: 1,72; IC95%: 1,03‐2,87) e não consumo de alimentos fontes de ferro (OR: 1,91; IC95%: 1,06‐3,44).
Modelo de regressão logística para fatores associados à anemia em crianças Centros Municipais de Educação Infantil, Colombo, 2013
Variáveis | OR bruto (IC) | p | OR ajustado (IC) | p |
---|---|---|---|---|
Sexo da criança | ||||
Masculino | 1,86 (1,17‐2,94) | 0,00 | 1,82 (1,08‐3,06) | 0,02 |
Feminino | 1 | 1 | ||
Idade da criança | ||||
< 24 meses | 1,88 (1,15‐3,09) | 0,01 | 2,12 (1,19‐3,75) | 0,01 |
> 24 meses | 1 | 1 | ||
Idade materna | ||||
< 28 anos | 1,80 (1,14‐2,84) | 0,01 | 1,72 (1,03‐2,87) | 0,03 |
>28 anos | 1 | 1 | ||
Consome alimentos fonte de ferro (carne+feijão+verduras verde‐escuro) | ||||
Sim | 1 | 0,05 | 1 | 0,02 |
Não | 1,67 (0,98‐2,84) | 1,91 (1,06‐3,44) |
Identificou‐se prevalência de 34,7% de anemia e associação positiva com menor idade materna, sexo masculino, idade inferior a 24 meses e não consumo de alimentos fonte de ferro (feijão, carne e verduras verdes escuras) no domicílio.
Em saúde pública, a prevalência de anemia de 34,7% é considerada um problema moderado na população estudada.3 Essa prevalência é superior àquela encontrada em estudo feito em Cascavel (PR),7 que investigou crianças com idade inferior a 24 meses que frequentavam creches (29,7%). A Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde (PNDS) de 2006 avaliou pela primeira vez, em nível nacional, a prevalência de anemia em crianças e encontrou 20,9% em crianças menores de 59 meses e 35,8% nas crianças com idade inferior a 24 meses, próximo ao que foi encontrado neste estudo.14 Esse resultado é compatível com Leal et al.12 (32,8%) em crianças de 0 a 59 meses do Estado de Pernambuco e com Castro et al.15 (29,2%) em pré‐escolares, mas menor do que aquele identificado em Vitória (ES) (15,7%) em crianças de um a cinco anos.16 Outros dois estudos que investigaram anemia em creches encontraram prevalências superiores, 51,9% e 46,6%.2,17 Metanálise feita por Vieira & Ferreira encontrou prevalência média ponderada superior ao presente estudo, de 52% de anemia em creches, 60,2% em serviços de saúde e 66,5% em populações em iniquidades.18
Embora a maioria das crianças apresente anemia leve, anemia moderada esteve presente em 42,2% das crianças anêmicas. Tal frequência merece atenção, uma vez que a anemia interfere negativamente no desenvolvimento cognitivo, na capacidade física, na produção de hormônios tireoidianos, na regulação da temperatura corporal e no estado imune, aumenta os riscos de infecção e pode acarretar efeitos que perduram por toda a vida.14 Konstantyner et al.4 encontraram 9,9% de anemia moderada em crianças menores de 24 meses de todas as regiões do Brasil.
A associação entre anemia e idade inferior a 24 meses é verificada em estudos feitos em creches.15,19,20 Essa vulnerabilidade está relacionada com uma maior velocidade de crescimento, em que o peso triplica e a superfície corporal duplica. Tal fato gera necessidades nutricionais aumentadas, que coincidem com mudanças importantes na alimentação, introdução da alimentação complementar, desmame e exposição à alimentação da família.
O abandono precoce do aleitamento materno associado a uma alimentação complementar inadequada com baixo teor de ferro soma efeito multiplicador no aumento do risco de anemia. Esse risco é agravado pela maior exposição ao contágio de doenças infecciosas e parasitárias, devido ao maior contato com o ambiente externo.11,15,20 Apenas 13,2% das crianças foram amamentadas exclusivamente por seis meses, 33% tiveram introdução de carne aos seis meses e a ingestão de ferro, em especial de ferro heme, é bem inferior à ingestão das crianças maiores e corresponde a 35,2% do que é recomendado pelo Programa Nacional de Alimentação Escolar.
O crescimento cerebral é maior nos primeiros dois anos de vida, no qual as membranas do sistema nervoso central são mais permeáveis ao ferro, é o período mais crítico para seu uso. A deficiência de ferro tem como consequências o prejuízo do desenvolvimento físico e cognitivo, o que prejudica a capacidade de aprendizagem e diminui a força de trabalho. A promoção de uma nutrição melhor nos primeiros 1000 dias de vida tem sido uma das estratégias para melhorar o estado de saúde na fase adulta e o desenvolvimento humano e reforça a importância da prevenção de agravos nutricionais, como a anemia por deficiência de ferro, nos primeiros dois anos de vida.21
A maior prevalência de anemia no sexo masculino relaciona‐se com a maior velocidade de crescimento dos meninos, o que acarreta maior necessidade de ferro pelo organismo, não suprida pela dieta.15,22,23
Idade materna e não consumo de alimentos fonte de ferro permanecem no modelo final e dizem respeito às questões familiares relacionadas ao domicílio. Essa situação demonstra a homogeneidade em relação às demais variáveis investigadas e ressalta a importância do presente estudo em identificar os subgrupos mais vulneráveis ao desenvolvimento da anemia, dentro de uma população relativamente homogênea.
Mães com mais idade têm melhores condições de atender aos cuidados de saúde das crianças. O risco de anemia em filhos de mães com idade menor sugere que essas têm menos preparo para atender às necessidades nutricionais de seus filhos e de exercer a maternidade. Isso pode ser reflexo da falta de recursos financeiros, do desconhecimento em relação à anemia, do cuidado com a criança e da falta de orientação adequada.11,12,20,24
O não consumo de alimentos fontes de ferro permanece associado à anemia e reitera a importância da alimentação adequada no contexto familiar, que contenha feijão, verduras verdes escuras e, especialmente, carnes e vísceras, por serem fontes de ferro heme, de melhor biodisponibilidade. As crianças cujos pais relataram o consumo desses alimentos no domicílio apresentam‐se mais protegidas da anemia.
A ingestão de ferro feita no CMEI não tem associação com anemia. Porém, observa‐se maior prevalência de anemia nas crianças que tiveram ingestão de ferro total, ferro heme, ferro não heme e densidade de ferro heme abaixo da mediana. Essa associação possivelmente não ocorre porque no CMEI todas as crianças recebem basicamente a mesma alimentação. O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) recomenda que a alimentação escolar deva contemplar 7,7mg/dia de ferro para crianças de sete a 11 meses e 4,9mg/dia para a faixa de um a três anos.25 A ingestão mediana de ferro encontrada no CMEI (3,10mg) está bem abaixo dessa recomendação. Estudo feito com crianças de seis a 59 meses no Estado de Pernambuco encontrou tendência linear significativa com redução das prevalências de anemia conforme maior densidade de ferro total, ferro heme e ferro não heme na dieta das crianças.11 A baixa quantidade de ferro consumida nos CMEI, associada à baixa oferta de alimentos fontes de ferro, reflete a dificuldade da execução do que o PNAE recomenda, mostra que a alimentação escolar não tem sido suficiente para contribuir na prevenção de anemia nas crianças atendidas.
Nenhuma variável relacionada às condições socioeconômicas e ambientais apresenta associação com anemia, provavelmente devido à homogeneidade da amostra. Isso é evidenciado ao se analisar que quase 80% da população vive com menos de um salário mínimo per capita, 84,8% dos domicílios têm esgoto sanitário ligado à rede pública, 98,7% têm acesso à água tratada e 100% têm coleta pública de lixo. Outros estudos feitos em creches também não encontraram associação com renda da família.26–28
Buscou‐se dimensionar todas as condições que poderiam se relacionar com anemia descritas na literatura científica, porém a potencialidade deste estudo consiste na investigação das variáveis de ingestão de ferro, pouco investigada na maioria dos estudos, devido ao grau de dificuldade de se obterem tais dados.
Como limitações do estudo, pode‐se citar o fato de ser transversal, o que impossibilita a compreensão da relação de causa e efeito da anemia. Além disso, não foi quantificada a ingestão de ferro no domicílio. No entanto, o fato de as crianças permanecerem em período integral no CMEI e fazerem a maioria de suas refeições nesse estabelecimento pressupõe que a participação da alimentação na escola é predominante no dia alimentar delas. Foi feita entrevista com a mãe para investigar a prática alimentar da criança em relação à presença de alimentos fontes de ferro no consumo da criança no domicílio.
A anemia, resultado da insegurança alimentar presente na vida das crianças, reflete a violação do direito ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade e em quantidade suficientes. Os CMEI devem promover a segurança alimentar e nutricional, com estratégias que permeiem os cuidados de saúde e a alimentação adequada, pois a anemia afetou mais de 1/3 das crianças e essas apresentaram baixa contribuição alimentar de ferro.
Os CMEI são locais potenciais para intervenções, tendo em vista a permanência das crianças em período integral. Ações intersetoriais, atuação dos profissionais de saúde e educação em conjunto com as famílias podem ser as bases que sustentarão melhores condições de saúde das crianças. Incentivam‐se estratégias de planejamento e treinamento dos profissionais envolvidos para uma melhor oferta alimentar de ferro nos CMEI.
Os fatores associados à anemia são resultado também da influência de condições sociais, econômicas e comportamentais da população que incidem sobre a saúde e alimentação. Toda ação que beneficie a saúde das crianças depende também de reestruturação econômica, política e social do país, que pode propiciar avanços que afetam educação, emprego e renda e acesso à saúde. Necessita‐se de fortalecimento e investimento em estratégias e programas que promovam a segurança alimentar das famílias e previnam, indiretamente, a anemia.
FinanciamentoA pesquisa faz parte do projeto Procad/Casadinho UFPR‐UFPE, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico (CNPq), processo n° 552448/2011‐7. Bolsista Capes.
Conflitos de interesseOs autores declaram não haver conflitos de interesse.
Como citar este artigo: Zuffo CR, Osório MM, Taconeli CA, Schmidt ST, da Silva BH, Almeida CC. Prevalence and risk factors of anemia in children. J Pediatr (Rio J). 2016;92:353–60.
O artigo faz parte da dissertação de mestrado da primeira autora no Programa de Pós‐Graduação em Segurança Alimentar e Nutricional, Setor de Ciências da Saúde, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, PR, Brasil.