To assess the level of agreement in health‐related quality of life between children with Post‐infectious Bronchiolitis Obliterans and their parent (so‐called proxy).
MethodsParticipants aged between 8and 17 years who had been previously diagnosed with Post‐infectious Bronchiolitis Obliterans were regularly followed up at a pediatric pulmonology outpatient clinic. Parents or legal guardians (caregivers) of these patients were also recruited for the study. A validated and age‐appropriate version of the Pediatric Quality of Life Inventory 4.0 was used for the assessment of health‐related quality of life. Caregivers completed the corresponding proxy versions of the questionnaire. The correlation between self and proxy reports of health‐related quality of life was determined by intra‐class correlation coefficient and dependent t‐tests.
ResultsThe majority of participants were males (79.4%), and the average age was 11.8 years. Intra‐class correlations between each of the Pediatric Quality of Life Inventory 4.0 domains and the total score were all lower than 0.6, with a range between 0.267 (poor) and 0.530 (fair). When the means of each domain and the total score of the questionnaires were compared, caregivers were observed to have a significantly lower health‐related quality of life score than children, with the exception of the social domain in which the difference was not significant. However, the differences in score exceeded the critical threshold difference of four points in all other domains.
ConclusionProxies of children and adolescents with Post‐infectious Bronchiolitis Obliterans appear to consistently perceive their children as having lower health‐related quality of life than how the patients perceive themselves.
Avaliar o nível de concordância a respeito da qualidade de vida relacionada à saúde entre crianças com bronquiolite obliterante pós‐infecciosa e seus pais (responsáveis).
MétodosOs participantes entre 8‐17 anos, anteriormente diagnosticados com bronquiolite obliterante pós-infecciosa, foram acompanhados regularmente no ambulatório de pneumologia pediátrica. Os pais ou responsáveis legais (cuidadores) desses pacientes também foram convidados a participar do estudo. Uma versão validada e adequada para a idade do Inventário Pediátrico de Qualidade de Vida, versão 4.0, foi utilizada para a avaliação da qualidade de vida relacionada à saúde. Os cuidadores concluíram as versões do questionário correspondentes aos responsáveis. A correlação entre os autorrelatos e os relatos dos responsáveis da qualidade de vida relacionada à saúde foi determinada pelo coeficiente de correlação intraclasse e pelos testes t dependentes.
ResultadosA maior parte dos participantes era do sexo masculino (79,4%) e a idade média foi 11,8 anos. As correlações intraclasse entre cada um dos domínios do Inventário Pediátrico de Qualidade de Vida e o escore total foram todas inferiores a 0,6, com intervalo entre 0,267 (baixo) e 0,530 (justo). Quando as médias de cada domínio e o escore total dos questionários foram comparados, observamos que os cuidadores apresentaram qualidade de vida relacionada à saúde significativamente menor em comparação com as crianças, com exceção do domínio social, no qual a diferença não foi significativa. Contudo, as diferenças no escore ultrapassaram o limite de diferença essencial de 4 pontos em todos os outros domínios.
ConclusãoOs responsáveis pelas crianças e adolescentes com bronquiolite obliterante pós-infecciosa parecem perceber de forma consistente que suas crianças possuem qualidade de vida relacionada à saúde menor que os próprios pacientes.
A bronquiolite obliterante pós‐infecciosa (BOPI) é uma doença respiratória grave e incomum caracterizada por obstrução crônica das pequenas vias aéreas.1–9 Como resultado, há expectativa de impactos negativos sobre as funções da vida diária e a qualidade de vida como um todo.
Em uma tentativa de entender o tamanho desse impacto, relatamos recentemente que as crianças e adolescentes com BOPI apresentaram menores escores de qualidade de vida relacionada à saúde (QVRS) do que os indivíduos saudáveis nos domínios físico e escolar.10 Uma parte importante do manejo das doenças pediátrica crônicas é controlar os sintomas e proporcionar desenvolvimento psicossocial adequado aos pacientes.11 A avaliação do último, ao medir o resultado objetivo, é mais complicada do que o primeiro. Portanto, o uso de medidas subjetivas, como os resultados relatados pelos pacientes (RRP), deve ser incentivado na prática clínica como importantes ferramentas complementares no cuidado de pacientes adultos e pediátricos com doença crônica.
Quando um paciente não consegue responder as perguntas ou expressar sua própria opinião devido a limitações cognitivas, uma pessoa da família, ciente do problema de saúde do paciente, pode ser uma fonte de informações adequada. Essa pessoa é conhecida como um responsável e geralmente é o cônjuge ou um membro próximo da família que conhece bem o paciente. As avaliações dos responsáveis geralmente são usadas na pesquisa ou no cuidado clínico dos indivíduos muito jovens, muito velhos e/ou gravemente doentes.12 Contudo, o uso da avaliação dos responsáveis também é comum em crianças com doenças crônicas, levanta algumas dúvidas e debates sobre como os pais e seus filhos devem concordar com a avaliação da QVRS das crianças.
Em um cenário ideal, as crianças e os responsáveis participam juntos do processo de tomada de decisão com relação ao manejo da doença. Como as diferenças na percepção da QVRS dos pacientes podem influenciar na intervenção, seria essencial que os médicos entendessem a base e a importância dessas diferenças ao orientar as famílias. As diferenças na QVRS entre os grupos podem ser atribuídas às intervenções quando elas de fato decorrerem das diferenças relatadas.13
Apesar da gravidade da BOPI e de seus efeitos sobre a qualidade de vida do paciente, ainda não há estudos publicados que avaliem a concordância na avaliação da qualidade de vida relacionada à saúde (QVRS) entre as crianças e seus responsáveis.14 Assim, o objetivo deste estudo foi avaliar a concordância entre os autorrelatos e os relatos dos responsáveis sobre a QVRS das crianças com BOPI.
MétodosIncluímos as crianças e adolescentes com BOPI, entre 8‐17 anos e acompanhadas em um ambulatório de pneumologia pediátrica no Sul do Brasil e seus pais ou responsáveis legais (responsáveis). Os critérios para o diagnóstico da BOPI foram descritos anteriormente.15 Eles essencialmente tiveram como base a associação dos seguintes critérios clínicos, radiológicos e funcionais: 1) histórico de infecção pulmonar aguda em uma criança anteriormente saudável; 2) problemas respiratórios crônicos por mais de quatro semanas do evento inicial; 3) tomografia computadorizada de alta resolução com achados comuns de BOPI, como padrão em mosaico, bronquiectasia e atelectasia; 4) testes da função pulmonar que indiquem limitação significativa do fluxo aéreo; e 5) exclusão de outras doenças pulmonares crônicas, como asma grave, fibrose cística, discinesia ciliar primária e deficiências imunológicas.
Função pulmonarPara categorizar o dano funcional, a função pulmonar foi avaliada por espirometria, de acordo com os critérios da Sociedade Torácica Americana para aceitabilidade e reprodutibilidade.2 A espirometria foi feita com o equipamento Master‐Screen (Jaeger, Alemanha) e os resultados da espirometria foram expressos como percentuais de valores preditivos dos valores de referência de Knudson.16
A QVRS foi avaliada com a escala do núcleo genérico, versão 4.0, do Inventário Pediátrico de Qualidade de Vida (o PedsQL), que foi validada no Brasil em estudos anteriores.17,18 O instrumento incluiu 23 itens que abrangem os domínios: físico (oito itens), emocional (cinco itens), social (cinco itens) e escolar (cinco itens). Usamos as versões para os pacientes e responsáveis para as crianças e seus pais, respectivamente, com as opções adequadas para a idade para crianças entre 8‐12 e 13‐18 anos. Os itens em cada uma das versões foram basicamente semelhantes e diferenciaram somente em termos do idioma ajustado para a idade e do uso pelos próprios pacientes ou por seus responsáveis. A escala e seus domínios se referem à percepção dos eventos e aos sentimentos no mês anterior. Os entrevistados da pesquisa responderam com o uso da escala Likert de cinco pontos, que varia de 0 (nunca um problema) a 4 (quase sempre um problema). Para eliminar a discrepância devido a possíveis dificuldades de leitura, o PedsQL foi aplicado por entrevista.18 Seguindo as instruções da escala, os itens foram classificados inversamente e transpostos linearmente em uma escala de 0‐100 (0 = 100, 1 = 75, 2 = 50, 3 = 25, 4 = 0). Assim, os escores maiores indicaram melhor QVRS. Dois entrevistadores previamente treinados aplicaram todos os questionários. As crianças e seus responsáveis foram entrevistados separadamente.
Tamanho da amostraCom uma observação para a criança e o responsável e assumindo a probabilidade de um erro tipo 1 de 5%, a probabilidade de um erro tipo 2 (1‐beta) de 10%, um coeficiente de correlação intraclasse de 0,7, intervalo de confiança de 95% e limite inferior exigido de no mínimo 0,3, o tamanho exigido da amostra é 29 participantes em cada grupo (criança e responsável).
Análise estatísticaA distribuição variável foi avaliada com o teste de Kolmogorov‐Smirnov. Os valores das médias e os desvios‐padrão representaram as variáveis contínuas, ao passo que as frequências absolutas e relativas representaram as medidas categóricas. A concordância entre os autorrelatos e os relatos dos responsáveis foi determinada pelo coeficiente de correlação intraclasse (CCI) e pelos testes t dependentes. O nível de significância foi estabelecido em 5% (p < 0,05). Para a avaliação do limite de diferença essencial, as médias dos grupos foram comparadas com o teste t. O limite de diferença essencial foi considerado em 4 pontos.18
As análises dos dados foram feitas com a versão 17.0 do software SPSS (SPSS Inc., Chicago, EUA). O uso do instrumento de pesquisa PedsQL foi anteriormente autorizado pelo autor do questionário.19 O projeto foi aprovado pelo Comitê Institucional de Ética em Pesquisa e os participantes forneceram o consentimento por escrito antes da participação.
ResultadosA idade média dos pacientes foi 11,8 ± 2,6 anos e a maior parte dos participantes era do sexo masculino (79,4%). A função pulmonar mostrou padrões de doença respiratória obstrutiva moderada a grave, típica em crianças com BOPI (tabela 1).
Caracterização das crianças e adolescentes diagnosticados com BOPI
Variáveis | Participantes (n = 34) |
---|---|
Dados demográficos | |
Masculino, n (%) | 27 (79,4) |
Idade (anos), média (DP) | 11,8 (2,6) |
Função pulmonar | |
Capacidade vital forçada (percentual preditivo), média (DP) | 69,4 (15,3) |
Volume expiratório forçado em 1 segundo (percentual preditivo), média (DP) | 53,3 (19,5) |
25–75% do fluxo expiratório forçado (percentual preditivo), média (DP) | 26,6 (16,9) |
Tiffeneau (Índice), média (DP) | 0,6 (0,1) |
DP, desvio padrão.
Quando os resultados das crianças com relação ao PedsQL foram comparados com os de seus responsáveis, as crianças apresentaram escores significativamente melhores em relação a seus pais, em termos do escore total e individualmente na maior parte dos domínios da escala. Em outras palavras, os pais consideraram que seus filhos apresentam menor QVRS do que o avaliado pelos próprios pacientes. A única exceção foi o domínio social da escala, no qual as diferenças entre os pacientes e os responsáveis não foram significativas (tabela 2). Contudo, todas as diferenças foram clinicamente relevantes (> 4 pontos).
Diferenças nos domínios e no escore total autorrelatado pelas crianças e pelos pais
Domínios | Pais | Crianças | Diferença (%) | valor de p |
---|---|---|---|---|
Saúde, média (DP) | 72,4 (15,7) | 81,0 (12,3) | –8,4 (18,8) | 0,017a |
Emocional, média (DP) | 61,2 (22,1) | 78,7 (17,7) | –17,2 (22,1) | < 0,01a |
Social, média (DP) | 80,5 (19,5) | 87,5 (14,7) | –6,6 (22,6) | 0,111 |
Escolar, média (DP) | 62,3 (20,3) | 79,0 (14,6) | –16,4 (19,6) | < 0,01a |
Psicossocial, média (DP) | 70,8 (17,2) | 83,1 (14,1) | –11,8 (18,5) | < 0,01a |
Total, média (DP) | 69,4 (15,4) | 81,8 (11,8) | –12,9 (15,7) | < 0,01a |
DP, desvio‐padrão.
As correlações intraclasse entre cada um dos domínios do PedsQL e o escore total foram todas inferiores a 0,6, com intervalo entre 0,267 e 0,530.
DiscussãoEste estudo mostrou que os pacientes com BOPI relataram ter melhor qualidade de vida do que a percebida por seus responsáveis. Como em outros casos, principalmente em doenças crônicas, os pais tendem a assumir que seus filhos têm uma qualidade de vida pior do que a avaliada pelos próprios pacientes.13,20,21
Uma explicação possível para a falta de concordância, de um ponto de vista mais conservador, é que a estrutura interna cognitiva da criança é diferente da do adulto.22 Portanto, as crianças podem ter um entendimento diferente da doença, de suas causas, do histórico natural esperado e da eficácia esperada do tratamento. Outra possível explicação é a resistência à adaptação das crianças com BOPI; elas convivem com a doença desde muito cedo e podem ter aprendido a se adaptar e fazer suas atividades diárias, apesar de suas limitações. Essa situação inevitável provavelmente fez com que as crianças aceitassem a doença como uma parte natural de sua vida e influenciou sua percepção (uma muito mais otimista) do que é considerado “normal” em comparação com seus pais. Isso está em linha com a hipótese de incompatibilidade, que diz que os indivíduos que passam por situações aversivas no início da vida acionam processos adaptativos. Isso faz com que um indivíduo se adapte melhor a desafios aversivos mais tarde na vida.23 Outro fator crucial que vale mencionar é que ser cuidador (ou responsável) por uma criança com uma doença crônica e grave como a BOPI geralmente leva a níveis mais altos de ansiedade e sentimentos de desesperança, que, por sua vez, afetam a própria qualidade de vida dos pais.24–26 Foi documentada uma relação causal entre o viés de interpretação e a ansiedade27 e ela pode predispor os pais a distorcer negativamente suas percepções de seus filhos.
Uma limitação de nosso estudo pode ser que não avaliamos a QVRS dos próprios pais nem o impacto emocional da doença crônica de seus filhos sobre eles. O alto impacto emocional e/ou a baixa QVRS podem influenciar negativamente suas respostas de como eles perceberam a QVRS de seus filhos.
Em conclusão, nosso estudo constatou que a avaliação da QVRS em crianças com BOPI difere entre as crianças com BOPI e seus responsáveis. A discordância, mais do que uma contradição, reflete duas visões diferentes que devem ser consideradas ao cuidar desses pacientes.
FinanciamentoConselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) pelo auxílio nas bolsas de estudos dos pós‐graduandos. Os autores Rita Mattiello e Ricardo Stein são bolsistas do CNPq.
Conflitos de interesseOs autores declaram não haver conflitos de interesses.
Aos pais e pacientes pela participação neste estudo.
Como citar este artigo: Sarria EE, Mundstock E, Mocelin HT, Fischer GB, Torres RR, Garbin JG, et al. Health‐related quality of life in post‐infectious bronchiolitis obliterans: agreement between children and their proxy. J Pediatr (Rio J). 2019;95:614–8.