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Vol. 91. Núm. 5.
Páginas 428-434 (Setembro - Outubro 2015)
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Vol. 91. Núm. 5.
Páginas 428-434 (Setembro - Outubro 2015)
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Comparison of two maintenance electrolyte solutions in children in the postoperative appendectomy period: a randomized, controlled trial
Comparação de duas soluções para manutenção hidroeletrolítica no pós‐operatório de apendicectomia em crianças: um estudo controlado e randomizado
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Maria Clara da Silva Valadãoa,b,
Autor para correspondência
mclaravaladao@yahoo.com.br

Autor para correspondência.
, Jefferson Pedro Pivac,d, João Carlos Batista Santanaa,e,f, Pedro Celiny Ramos Garciag,h
a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Porto Alegre, RS, Brasil
b Hospital Universitário de Santa Maria (HUSM), Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Santa Maria, RS, Brasil
c Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, RS, Brasil
d Serviço de Emergência e Medicina Intensiva Pediátricas, Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, RS, Brasil
e Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, RS, Brasil
f Hospital São Lucas, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Porto Alegre, RS, Brasil
g Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, SP, Brasil
h Serviço de Pediatria, Hospital São Lucas, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Porto Alegre, RS, Brasil
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Figuras (1)
Tabelas (3)
Tabela 1. Características dos dois grupos de pacientes submetidos a apendicectomia de acordo com a solução administrada
Tabela 2. Eletrólitos e osmolaridade iniciais, 24 horas PO e 48 horas PO
Tabela 3. Volumes infundidos, balanço hídrico e diurese nos dois grupos
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Abstract
Objective

To compare two electrolyte maintenance solutions in the postoperative period in children undergoing appendectomy, in relation to the occurrence of hyponatremia and water retention.

Methods

A randomized clinical study involving 50 pediatric patients undergoing appendectomy, who were randomized to receive 2,000mL/m2/day of isotonic (Na 150 mEq/L or 0.9% NaCl) or hypotonic (Na 30 mEq/L NaCl or 0.18%) solution. Electrolytes, glucose, urea, and creatinine were measured at baseline, 24h, and 48h after surgery. Volume infused, diuresis, weight, and water balance were analyzed.

Results

Twenty‐four patients had initial hyponatremia; in this group, 13 received hypotonic solution. Seventeen patients remained hyponatremic 48h after surgery, of whom ten had received hypotonic solution. In both groups, sodium levels increased at 24h (137.4±2.2 and 137.0±2.7mmol/L), with no significant difference between them (p=0.593). Sodium levels 48h after surgery were 136.6±2.7 and 136.2±2.3mmol/L in isotonic and hypotonic groups, respectively, with no significant difference. The infused volume and urine output did not differ between groups during the study. The water balance was higher in the period before surgery in patients who received hypotonic solution (p=0.021).

Conclusions

In the post‐appendectomy period, the use of hypotonic solution (30 mEq/L, 0.18%) did not increase the risk of hyponatremia when compared to isotonic saline. The use of isotonic solution (150 mEq/L, 0.9%) did not favor hypernatremia in these patients. Children who received hypotonic solution showed higher cumulative fluid balance in the preoperative period.

Keywords:
Hyponatremia
Hypernatremia
Fluid therapy
Isotonic solutions
Hypotonic solutions
Postoperative period
Resumo
Objetivo

Comparar duas soluções de manutenção hidroeletrolítica no período pós‐operatório (PO) de crianças submetidas à apendicectomia quanto à ocorrência de hiponatremia e retenção hídrica.

Métodos

Estudo clínico randomizado que envolveu 50 pacientes pediátricos submetidos à apendicectomia, randomizados para receber 2.000ml/m2/dia de solução isotônica (Na 150 mEq/L ou NaCl 0,9%) ou hipotônica (Na 30mEq/L ou NaCl 0,18%). Eletrólitos, glicose, ureia e creatinina foram mensurados no início do estudo, 24 e 48 horas após a cirurgia. Foram analisados volume infundido, diurese, peso e balanço hídrico.

Resultados

Apresentaram hiponatremia inicial 24 pacientes. Desses, 13 receberam solução hipotônica. Dezessete pacientes permaneceram hiponatrêmicas 48 horas após a cirurgia, 10 haviam recebido solução hipotônica. Nos dois grupos os níveis de sódio aumentaram na 24ª hora PO (137,4±2,2 e 137,0±2,7) e não houve diferença entre eles (p=0,593). Níveis de sódio 48h após a cirurgia foram 136,6±2,7 e 136,2±2,3 no grupo isotônico e hipotônico respectivamente sem diferença significativa. Os volumes infundidos e a diurese não diferiram entre os grupos durante o estudo. O balanço hídrico foi maior no período anterior à cirurgia no grupo de pacientes que receberam solução hipotônica (p=0,021).

Conclusões

No período pós‐apendicectomia, o uso da solução hipotônica não aumentou o risco de hiponatremia quando comparado com uma solução salina isotônica. O uso da solução isotônica não favoreceu a hipernatremia nesses pacientes. Crianças que receberam solução hipotônica apresentaram maior balanço hídrico cumulativo no período pré‐operatório.

Palavras‐chave:
Hiponatremia
Hipernatremia
Hidratação
Soluções isotônicas
Soluções hipotônicas
Pós‐operatório
Texto Completo
Introdução

Hiponatremia é um distúrbio eletrolítico frequentemente observado em pacientes hospitalizados definido como concentração sérica de sódio abaixo de 136 mmol/L.1‐5 Sua etiologia tem sido relacionada à retenção hídrica. Se o volume de água infundido excede a capacidade renal de excreção, a diluição dos solutos extracelulares reduz a osmolaridade.1 A presença de hipotonicidade promove edema cerebral pelo desequilíbrio entre a osmolaridade intra e extracelular no tecido neuronal. Na ocorrência de diminuição aguda do sódio sérico (Na+<130 mmol/), a água extracelular penetra o interior das células nervosas com o objetivo de igualar as tonicidades intra e extracelulares.2,6

A solução de manutenção proposta por Holliday & Segar em 1957, ainda amplamente usada, foi baseada no metabolismo de crianças saudáveis e calculada com base no peso corporal (< 10kg, 11‐20 Kg, >20 Kg, 3 mEq/L de Na+ e 2 mEq/L de K +), o que resulta em uma solução hipotônica e oferta hídrica excessiva para crianças agudamente doentes e pode propiciar o aparecimento de hiponatremia.7,8 A presença de estresse (dor, febre, cirurgia), náuseas, vômitos, anestesia, manipulação intestinal e hipovolemia é um estímulo não osmótico que aumenta a secreção e a atividade do hormônio antidiurético (arginina vasopressina).1 A elevada ação do ADH limita a excreção de água livre e a doença aguda leva à produção de água endógena, aumenta o volume extracelular e resulta em ou agrava a ocorrência de hiponatremia.9 Uma recente revisão que envolveu mais de 500 crianças em seis estudos prospectivos revelou que o uso de soluções isotônicas previne hiponatremia no PO e que o uso de fluidos hipotônicos resulta em diminuição de sódio.10

Crianças submetidas a procedimentos cirúrgicos, tanto pelo estímulo ao ADH quanto pela maior possibilidade de produção de água endógena, apresentam maiores riscos de hiponatremia e suas consequências neurológicas.4,11,12 Todas essas circunstâncias elevam as chances do aparecimento de hiponatremia e complicações neurológicas em pacientes previamente hígidos.

O uso de soluções isotônicas durante e após a cirurgia tem sido sugerido como forma de evitar a hiponatremia no período PO.13,14 Alguns autores defendem que a incidência de hiponatremia possa estar ligada ao volume de solução administrada, e não ao seu conteúdo sódico.15 Por outro lado, um estudo prospectivo e randomizado comparou fluido endovenoso isotônico versus hipotônico e volume de manutenção 50% ou 100% e concluiu que o risco de hiponatremia era menor com o uso de salina isotônica, e não pela restrição hídrica.13

Na última década, a prevenção da hiponatremia adquirida no hospital tem sido exaustivamente debatida. Alguns autores recomendam fortemente o uso de solução isotônica e outros o uso de fluidos isotônicos associados à restrição hídrica.6,16 Outros ainda se opõem ao uso de fluido isotônico. Alegam que a hiponatremia resulta principalmente da hemodiluição e, portanto, a restrição de fluidos poderia prevenir a hiponatremia.17 O principal objetivo deste estudo foi comparar o uso de soluções hipotônicas e isotônicas na manutenção hídrica (2.000ml/m2) nos períodos pré e pós‐operatório de crianças e adolescentes submetidos à apendicectomia.

Métodos

Entre março de 2012 e janeiro de 2013 fizemos um estudo prospectivo, duplo cego e randomizado aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (CEP 11/05688) e pelo Departamento de Ensino e Pesquisa do Hospital Universitário de Santa Maria, onde foi feita a coleta dos dados. Para a inclusão no estudo foi assinado Termo de Consentimento Livre e esclarecido pelo responsável e, quando possível, o Termo de Assentimento pela criança.

Foram incluídas crianças de um a 14 anos com diagnóstico de apendicite aguda e elegíveis para tratamento cirúrgico. O tipo de apendicite foi classificado como não complicado naqueles casos em que o apêndice apresentava‐se íntegro ou complicado nos casos de perfuração do órgão e/ou peritonite. Os pacientes foram pesados na admissão e 48 horas após o procedimento cirúrgico. Os pacientes que apresentaram na chegada distúrbio hemodinâmico grave, choque e/ou uso de drogas vasoativas foram excluídos.

Os participantes eram sorteados para usar solução isotônica ou hipotônica no momento da internação no Pronto‐Socorro Pediátrico. Com vistas a manter uma alocação equilibrada em ambos os grupos em todos os momentos do estudo, foi feita a randomização em blocos de 10 pacientes, cinco para cada uma das soluções. O pesquisador e os médicos assistentes desconheciam o conteúdo da solução e a enfermeira da Unidade de Pronto‐Socorro preparava as soluções com rótulo A ou B acrescida da infusão em ml/hora. A solução isotônica continha cloreto de sódio 150 mEq/L, cloreto de potássio 30 mEq/L e glicose 5%, enquanto a hipotônica, cloreto de sódio 30 mEq/L com mesmo conteúdo de glicose e potássio. O volume total infundido estimado para ambas as soluções foi de 2.000ml/m2/24h (fig. 1).

Figura 1.

Fluxograma do estudo.

(0,32MB).

No momento da randomização foi feita a coleta dos exames. Todos os pacientes receberam reposição inicial de perdas com solução fisiológica 0,9% com volume de 20ml/kg antes das soluções específicas. A infusão durante o transoperatório foi feita com solução salina a 0,9%. O volume foi estabelecido pelo anestesiologista e computado no volume total do estudo.

A solução foi administrada desde a internação até 48 horas do período pós‐operatório, com exceção do período transoperatório. Amostras para exames laboratoriais (Na+, K+, Ca++, cloro, glicose, ureia, creatinina e bicarbonato) foram colhidas no início da infusão, 24 e 48 horas após a cirurgia e analisadas pelo método do íon seletivo. Diurese e balanço hídrico foram feitos em três intervalos: admissão até a cirurgia, da cirurgia até 24h e 24 a 48 horas após a apendicectomia. As demais medidas do cuidado ao paciente foram feitas pela equipe médica assistente.

O desfecho primário foi o nível sérico de sódio durante a intervenção e no fim das 48 horas de protocolo. Hipernatremia foi definida como um Na sérico superior a 145 mEq/L e hiponatremia como Na sérico inferior a 136 mEq/L. Foi considerada hiponatremia moderada quando o Na sérico situava‐se entre 130 e 135 mEq/L e grave quando inferior a 130 mEq/L. Foram considerados desfechos secundários: a presença de hipervolemia (estimada por meio do balanço hídrico cumulativo positivo e/ou ganho ponderal) e presença de outros distúrbios eletrolíticos.

As variáveis quantitativas de distribuição normal foram descritas por média e desvio padrão e comparadas pelo teste t de Student, enquanto que aquelas variáveis sem distribuição normal foram comparadas pelo teste U de Mann‐Whitney. As variáveis categóricas foram apresentadas como frequências relativas e absolutas e a verificação de associação foi feita pelo teste qui‐quadrado. Os valores foram considerados estatisticamente significativos se o valor de p fosse < 0,05. As análises foram feitas com o auxílio do Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) (SPSS Inc. 2008. SPSS Statistics para Windows, versão 17.0. Chicago, EUA).

Resultados

Durante o período do estudo foram admitidas 57 crianças entre um e 14 anos submetidas a apendicectomia. Esses indivíduos foram randomizados para receber solução endovenosa de manutenção isotônica ou hipotônica. No grupo isotônico houve uma exclusão por tumor de ovário e três perdas por quebra de protocolo. Restaram 23 pacientes nesse grupo. No grupo hipotônico houve uma exclusão por sepse e duas perdas, que resultaram em 27 sujeitos. Não foram aferidos sódio inicial em um paciente e em quatro na hora 24.

As características antropométricas foram semelhantes nos dois grupos (tabela 1). Para cada indivíduo incluído a dosagem de sódio foi feita na admissão, após 24 e após 48 horas. Não houve diferenças significativas entre os três períodos de mensuração. Na admissão, 24 (49%) pacientes apresentavam hiponatremia moderada (Na+ > 130 e < 135 mEq/L) e 25 (51%) estavam com sódio normal (Na > 136 mEq/L).

Após 24 horas da cirurgia, 12 pacientes apresentavam hiponatremia,e sete desses haviam recebido solução hipotônica. Enquanto que na 48ª hora de pós‐operatório, 17 crianças apresentavam hiponatremia e 10 delas haviam recebido solução hipotônica. As características antropométricas e bioquímicas são apresentadas nas tabelas 1 e 2, respectivamente.

Tabela 1.

Características dos dois grupos de pacientes submetidos a apendicectomia de acordo com a solução administrada

  Isotônica (n = 23)  Hipotônica (n = 27) 
Idade, média, DP, anos  8,8 + 3,6  10,3 + 2,9  0,106a 
Peso, média, DP, kg  35,1 + 14,0  37,1 + 12,2  0,596a 
Sexo masculino n (%)  13 (43,3%)  17 (56,7%)  0,643b 
IMC, média, DP  18,5 + 3,4  20,7 + 4,7  0,205c 
Apendicite complicada n, %  14 (45,1%)  17 (54,9%)  0,879b 
Apendicite não complicada n, %  9 (47,4%)  10 (52,6%)  0,880b 
Jejum pré‐operatório, IQ, horas  5 (3‐9)  6 (4‐12)  0,190a 
Jejum pós‐operatório, IQ, horas  33 (25‐48)  38 (28‐48)  0,748a 
Tempo de internação, IQ, dias  6 (4‐8)  6 (5‐7)  0,745a 

DP, desvio padrão; IQ, intervalo interquartil; IMC, índice de massa corporal.

Valores de p baseados no teste.

a

teste U Mann‐Whitney.

b

qui‐quadrado.

c

t de Student.

Tabela 2.

Eletrólitos e osmolaridade iniciais, 24 horas PO e 48 horas PO

  Isotônica (n = 23)  Hipotônica (n = 27)  pa 
Na inicial (mEq/L) 49/50, média, DP  135,7 + 3,3  135,8 + 2,9  0,882 
Na 24h (mEq/L) 46/50, média, DP  137,4 + 2,2  137,0 + 2,7  0,548 
Na 48h (mEq/L) 50/50, média, DP  136,6 + 2,7  136,2 + 2,3  0,593 
K inicial (mEq/L) 49/50 média, DP  3.9 ± 0.4  3,9 + 0,4  0,846 
K 24h (mEq/L) 46/40 média, DP K  4.0 ± 0.4  4,2 + 0,3  0,093 
48h (mEq/L) 50/50 média, DP  4.3 ± 0.4  4,2 + 0,3  0,405 
Cloro inicial (mEq/L) 45/50, média, DP  100,3 + 2,3  99,0 + 3,5  0,162 
Cl 24h (mEq/L) 46/50, média, DP  103,2 + 2,5  101,4 + 2,7  0,797 
Cl 48h (mEq/L) 48/50, média, DP  101,0 + 3,0  99,7 + 2,2  0,085 
Creatinina inicial (mg/dL) 49/50, média, DP  0,6 + 0,1  0,6 + 0,1  0,157 
Creatinina 24h (mg/dL) 46/50, média, DP  0,5 + 0,1  0,5 + 0,1  0,797 
Creatinina) 48h (mg/dL) 50/50, média, DP  0,5 + 0,2  0,6 + 0,2  0,146 
Osmolaridade 24h (mOsm/L) 42/50, média, DP  281,7 + 4,5  280,2 + 5,4  0,356 
Osmolaridade 48h (mOsm/L) 50/50, média, DP  279,5 + 5,9  279,3+ 4,2  0,853 

DP, desvio padrão; mEq/L, miliequivalentes por litro; mg/dL, miligramas por decilitro; mOsm/L, miliosmois por litro.

a

Valores de p baseados no teste t de Student.

O grupo de pacientes que recebeu solução isotônica apresentou um aumento médio de sódio de 1,7 mEq/L no período entre a admissão e dosagem de 24 horas, enquanto que o grupo que recebeu solução hipotônica teve um aumento de 1,2 mEq/L. Entre 24 e 48 horas houve uma queda de 0,8 mEq/L em ambos os grupos. Entre o Na+ inicial e Na+ final (48h) houve um aumento de 0,9 mEq/L no grupo “Isotônica” e 0,4 mEq/L no grupo “hipotônica”. Essas diferenças não foram significativas (tabela 3).

Tabela 3.

Volumes infundidos, balanço hídrico e diurese nos dois grupos

Variáveis  Isotônica  Hipotônica 
Peso, média + DP, kg  35,1 + 14,0  37,1 + 12,2  0,596a 
Peso 48h  35,62 + 14,6  37,56 +12,5  0,615a 
Expansão pré‐operatória, mediana IQ, ml/m2  347,8 (285,7;500)  363,6 (286,6;571,4)  0,740b 
Volume pré‐operatório, mediana IQ, ml/m2  246,7 (86,3;653,3)  353 (166,5;695,0)  0,280b 
Volume transoperatório, mediana IQ, ml/m2  555,5 (384,6;750)  649,4 (357,1;833,3)  0,413a 
Volume 24h PO, média + DP, ml/m2  1956,3 + 369,7  2029,4 + 252,0  0,290a 
Volume 48h PO, média + DP,ml/m2  2010,6 + 262,1  2020 + 190,0  0,880a 
Balanço hídrico pré‐operatório, mediana IQ, ml/kg  12,00 (4;19,9)  19,4 (12,6;24,9)  0,021b 
Balanço hídrico 24h PO, mediana IQ, ml/kg,  22,6 (8,7;33,6)  24,8 (4,4;27,5)  0,647 b 
Balanço hídrico 48h PO, mediana IQ, ml/kg  9,8 (‐12,9;+17,9)  6,82 (‐11,0;+19,4)  0,808b 
Diurese pré‐operatória, média + DP, ml/kg/h  1,92 + 2,91  0,85 + 1,41  0,097a 
Diurese 24h PO, média + DP, ml/kg/h  1,99 + 1,01  1,98 + 0,8  0,957a 
Diurese 48h PO, média + DP, IQ, ml/kg/h  2,7 + 1,3  2,6 + 1,2  0,780a 

Valores de p baseados no a teste t de Student, b Mann‐Whitney.

No grupo de oito pacientes com sódio inicial normal (> 136) e sódio final baixo (< 135), três receberam solução isotônica e cinco solução hipotônica com variação inicial 136 a 140mEq/L e final (48h) de 132 a 135mE/L.

No grupo que internou com sódio baixo (130 a 135 mEq/L), nove crianças permaneceram hiponatrêmicas (132 a 135 mEq/L) no fim, quatro haviam recebido solução isotônica e cinco, solução hipotônica.

Nos 15 pacientes que apresentaram hiponatremia inicial (Na+ 130‐135 mEq/L) e Na+ normal na hora 48 (136‐140 mEq/L), sete receberam solução isotônica e oito solução hipotônica.

Dos 17 pacientes que permaneceram normonatrêmicos, oito receberam solução isotônica e nove, solução hipotônica.

Na evolução do sódio de 24 para 48 horas, oito crianças que apresentaram sódio normal (136 a 142 mEq/L) na hora 24 apresentaram hiponatremia na hora 48 (132 a 135 mEq/L); metade delas recebeu solução isotônica e metade, solução hipotônica.

Permaneceram hiponatrêmicos oito pacientes (24h: 131‐135 mEq/L e 48h: 132‐135 mEq/L), quatro usaram solução isotônica e quatro solução hipotônica. As outras 30 crianças apresentaram sódio normal nas 48 horas após a cirurgia. Em quatro pacientes não foi feita a dosagem de sódio nas 24 horas do estudo.

Quatro crianças necessitaram de expansão volumétrica no pós‐operatório: três do grupo isotônico e uma do grupo hipotônico; nenhuma criança necessitou de correção eletrolítica.

Nos dois grupos (isotônico e hipotônico) houve aumento de peso durante as primeiras 48h, mas sem diferença significativa entre eles. Por outro lado, o balanço hídrico no período pré‐operatório foi significativamente maior no grupo que recebeu solução hipotônica (mediana 19,4 IQ 12,6‐24,9) do que no grupo que recebeu solução isotônica (mediana 12,0, IQ 4‐19,9) (p:0,021). Nesse intervalo, que foi semelhante nos dois grupos, o grupo isotônico apresentou uma tendência a maior diurese (p: 0,097).

A expansão volumétrica após a cirurgia foi necessária em quatro pacientes, três usaram solução isotônica e um hipotônica. No segundo dia do protocolo apenas um paciente pertencente ao grupo isotônico necessitou de expansão volumétrica rápida, que foi feita com solução fisiológica (NaCl a 0,9%).

Discussão

Neste estudo duplo cego e randomizado que envolveu crianças submetidas a apendicectomia, observou‐se que: (a) a administração de solução hídrica de manutenção hipotônica não aumentou o chance de hiponatremia quando comparada com solução isotônica; (b) a infusão de solução isotônica não preveniu o aparecimento de hiponatremia no período pós‐operatório e também não aumentou a ocorrência de hipernatremia nesse período; (c) boa parte do grupo que apresentava hiponatremia na admissão (24 pacientes) teve seu sódio normalizado (n =15) sem relação com o tipo de solução recebida; (d) a retenção hídrica no período pré‐operatório foi maior naqueles pacientes que receberam solução hipotônica.

Nossos achados não confirmam os resultados da publicação de Choong, na qual a maioria dos pacientes era cirúrgico e apresentou hiponatremia significativamente maior no grupo que recebeu solução hipotônica.8 Deve‐se ressaltar que no presente estudo os pacientes usaram o mesmo volume no período pós‐operatório (2000ml/m2/dia), com exceção de quatro crianças que necessitaram expansão volumétrica: três do grupo isotônico e uma do grupo hipotônico. O número pequeno de pacientes e a não padronização de infusão hídrica no período pré‐hospitalar podem ter impedido o aparecimento de hiponatremia final relacionada a infusão de solução hipotônica.

A hiponatremia foi observada mesmo no grupo que recebeu solução isotônica como ração diária, fato que pode ser explicado pela possível elevação de ADH em todos os pacientes submetidos à cirurgia, como anteriormente sugerido no estudo de Choong, por meio de dosagem sérica desse hormônio e dos eletrólitos urinários.8 Vários estudos randomizados, controlados, cegos ou não, apresentam evidências da proteção da solução isotônica quanto à hiponatremia no período próximo à cirurgia (antes e após o procedimento). A maioria deles apresenta grupos heterogêneos de pacientes, incluindo situações clínicas de gravidade variável e/ou cirurgias de maior ou menor porte, o que dificulta comparações com o presente estudo.3‐5,13,17 Após a publicação de Hoorn em 2004, diversos autores questionaram a validade das evidências que demonstravam a superioridade da solução isotônica em prevenir hiponatremia. Em metanálise recente, feita a partir de 10 ensaios randomizados e controlados, o uso de salina isotônica se mostrou mais seguro do que a hipotônica quanto aos níveis de sódio.16

O presente estudo demonstrou que os pacientes com sódio baixo haviam recebido um volume maior de solução e que a hiponatremia poderia ser derivada desse fator.3,15 Também foi evidenciado um maior balanço hídrico prévio à cirurgia no grupo que recebeu solução hipotônica e ao mesmo tempo uma maior diurese no grupo isotônico. A hiponatremia pode ser explicada pelo aumento do conteúdo extracelular e pela consequente diluição dos solutos.

O volume infundido também exerce importante papel na ocorrência de hiponatremia e muitos estudos, apesar de focar no conteúdo sódico, também oferecem aos pacientes um volume acima do que é recomendado habitualmente.17,18 O estudo transversal de Armon et al. avaliou crianças hospitalizadas que recebiam solução endovenosa de manutenção e registraram que na grande maioria eram administradas soluções hipotônicas (77/99); 38% recebiam manutenção maior do que 105% do volume recomendado; 21 de 86 pacientes apresentavam hiponatremia (< 135 mmol/L).19 A solução proposta por Holliday & Segar para fluidoterapia de manutenção em crianças hospitalizadas resulta em uma solução hipotônica e merece ser reconsiderada.20

Nosso estudo foi desenhado para analisar a importância da prevenção da hiponatremia com o uso da solução de manutenção isotônica em um grupo de pacientes com características semelhantes e submetidos a procedimento cirúrgico do mesmo porte. No entanto, esse grupo de pacientes demonstrou diferença apenas na retenção hídrica (BH maior no grupo hipotônico e diurese maior no grupo isotônico), o que demonstra possível interferência da ação do ADH ou a menor capacidade expansora das soluções hipotônicas nesses pacientes, que necessitam de uma maior oferta para obter o mesmo efeito de uma infusão isotônica.

A principal limitação do presente estudo refere‐se ao tamanho amostral, com poder insuficiente para testar se a ocorrência de hiponatremia estava relacionada ao tipo de solução infundida. Além disso, uma grande parte dos pacientes apresentava apendicite complicada (30/50) com evolução arrastada e tempo de jejum prolongado, o que não pôde ser controlado. O ADH e os eletrólitos urinários não foram mensurados, o que impossibilitou inferências sobre a presença de urina hipertônica e a retenção de líquidos atribuída ao hormônio.

Mesmo considerando as limitações metodológicas, com base em nossos resultados pode‐se sugerir que a manutenção hídrica com solução hipotônica ou isotônica por período curto (inferior a 48 horas) em pacientes submetidos a apendicectomia não aumenta a incidência de hiponatremia. Entretanto, o uso de soluções hipotônicas está associado com maior retenção hídrica do que o observado com soluções isotônicas. Nesse aspecto deve‐se ressaltar que o balanço hídrico cumulativo positivo em pacientes criticamente doentes tem sido associado com maior mortalidade.21 Estudos que incluam um maior número de pacientes são necessários para avaliar tanto hiponatremia relacionada a infusão de solução hipotônica quanto a evolução desfavorável de pacientes que recebam uma maior oferta hídrica.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

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Como citar este artigo: Valadão MC, Piva JP, Santana JC, Garcia PC. Comparison of two maintenance electrolyte solutions in children in the postoperative appendectomy period: a randomized, controlled trial. J Pediatr (Rio J). 2015;91:428–34.

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