To verify the psychometric properties of the Cerebral Palsy: Quality of Life Questionnaire Children – child report (CPQol‐Child) questionnaire, after it was translated and culturally adapted into Brazilian Portuguese.
MethodsAfter the translation and cultural adaptation of the tool into Brazilian Portuguese, the questionnaire was answered by 65 children with cerebral palsy, aged 9 to 12 years. The intraclass correlation coefficient and Cronbach's alpha were used to assess the reliability and internal consistency of the tool and its validity was analyzed through the association between CPQol‐Child: self‐report tooland Kidscreen‐10 using Pearson's correlation coefficient.
ResultsInternal consistency ranged from 0.6579 to 0.8861, the intraobserver reliability from 0.405 to 0.894, and the interobserver from 0.537 to 0.937. There was a weak correlation between the participation domain and physical health of CPQol‐Child: self‐report tooland Kidscreen‐10.
ConclusionThe analysis suggests that the tool has psychometric acceptability for the Brazilian population.
Verificar as propriedades psicométricas da versão traduzida e adaptada culturalmente para o português do Brasil do instrumento Cerebral Palsy Quality of Life Questionnaire for Children – Child report.
MétodosApós a tradução e a adaptação cultural do instrumento para o português, o questionário foi respondido por 65 crianças com paralisia cerebral, entre nove e 12 anos. Os coeficientes de correlação intraclasse e alfa de Cronbach foram usados para avaliar a confiabilidade e consistência interna do instrumento e a validade do instrumento foi analisada pela relação entre CPQol‐Child: self‐report toole a Kidscreen‐10 por meio do coeficiente de correlação de Pearson.
ResultadosA consistência interna variou de 0,6579 a 0,8861, a confiabilidade intraobservador de 0,405 a 0,894 e a interobservador de 0,537 a 0,937. Verificou‐se uma fraca correlação entre o domínio participação e saúde física da CPQol‐Child e Kidscreen‐10.
ConclusãoA análise feita sugere que o instrumento usado tem aceitabilidade psicométrica para a população brasileira.
Paralisia cerebral (PC) é considerada um grupo de desordens do movimento e da postura que causa limitações nas atividades, devido a alterações não progressivas que ocorrem no cérebro fetal ou infantil, geralmente acompanhada de alterações sensoriais, cognitivas, de comunicação, percepção, de comportamento e/ou crises convulsivas.1 Ela é considerada a causa mais comum de deficiência motora na infância,2 com incidência em países desenvolvidos de 2‐2,5/1.000 crianças nascidas vivas.3 No Brasil não existem dados precisos, porém alguns autores estimam sete para cada 1.000 nascidos vivos.4
A necessidade de conhecer os efeitos da patologia sobre as condições de saúde e bem‐estar tem resultado em inúmeros esforços para desenvolver instrumentos que avaliem a qualidade de vida (QV) dessas crianças,5 principalmente instrumentos em que o respondente é a própria criança, uma vez que parece haver uma discrepância entre o autorrelato de crianças e adolescentes e de seus cuidadores, principalmente nos aspectos emocionais.6–8 Há evidências de que as crianças podem fazer o autorrelato de QV de forma confiável se o seu desenvolvimento emocional, sua capacidade cognitiva e o seu nível de leitura forem considerados,9 porém deve haver a preocupação com a confiabilidade das informações de crianças muito novas, que apresentam déficit cognitivo ou com severo comprometimento de comunicação.
Atualmente, há disponíveis instrumentos genéricos, traduzidos e validados para o português, que avaliam QV de crianças, porém não abordam características especificas da paralisia cerebral. Na PC deve‐se usar instrumento específico que aborde os sentimentos sobre equipamentos de tecnologia assistiva, os sentimentos sobre as intervenções médicas, terapêuticas e cirúrgicas, a satisfação com o acesso aos serviços e a aceitação na comunidade. Essas questões ultrapassam o escopo de um instrumento genérico, que geralmente omite informações da vida diária dessas crianças e não abordam o ponto de vista da criança com PC, que gera dúvida se corresponde à opinião delas.10–12 Estudo feito em 200711 identificou apenas dois instrumentos específicos para avaliar qualidade de vida de crianças com PC, o Disabkids‐Cerebral Palsy e o Cerebral Palsy Quality of Life Questionnaire Children (CPQol‐Child).12
O CPQol‐Child foi considerado um instrumento com forte propriedades psicométricas para avaliar QV dessas crianças em idade escolar10 e tem sido amplamente usado.
Os autores do CPQol‐Child desenvolveram um instrumento com base na Classificação da Funcionalidade e Incapacidade (CIF), com o auxílio de uma equipe de especialistas internacionais, e preocuparam‐se em verificar a opinião da criança e dos cuidadores. O questionário tem duas versões, o CPQol‐Child Primary Caregiver Questionnaire (4‐12 anos) e o CPQol‐Child Child Report Questionnaire (9‐12 anos). A versão CPQol‐Child: Child Report Questionnaire (9‐12 years) é respondida por crianças com paralisia cerebral entre nove e 12 anos e contém 53 questões distribuídas pelos domínios: bem‐estar social e aceitação, funcionalidade, participação e saúde física, bem‐estar emocional e autoestima, acesso a serviços e dor e impacto da deficiência.12,13 A versão para cuidadores já foi traduzida para diferentes línguas.14–17 A Organização Mundial da Saúde recomenda a tradução e adaptação cultural de instrumentos já existentes, pois facilita a comparação de estudos feitos em diferentes países e a comunicação entre os pesquisadores.18
Nessa perspectiva, este estudo tem como objetivo verificar as propriedades psicométricas da versão traduzida e adaptada culturalmente para o português do Brasil do instrumento CPQol‐Child Child Report Questionnaire‐ 9‐12 years.
Material e métodosFoi solicitada aos e autorizada pelos autores a tradução, adaptação cultural e validação para a língua portuguesa do instrumento CPQol‐Child. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Filosofia e Ciências, com parecer N° 278/2009.
ParticipantesPara o cálculo do tamanho amostral mínimo, para a validade considerou‐se um coeficiente de correlação igual ou superior a 0,40; para a reprodutibilidade considerou‐se um coeficiente de correlação intraclasse (ICC) igual ou superior a 0,40, um erro tipo I de 5% e um erro tipo II de 20% e acréscimo de 30% para possíveis recusas ou perdas, que resultou em uma amostra com tamanho mínimo de n = 62.19
A amostra inicial constava de 200 pacientes com paralisia cerebral, das diferentes regiões do país. Após a verificação dos critérios de inclusão e exclusão, foram selecionadas 65 crianças. Os fatores de inclusão foram ter entre 9 e 12 anos e diagnóstico de PC; os de exclusão foram apresentar déficit intelectual e não ter um sistema de comunicação eficiente.
No estudo foi usada uma amostra de conveniência devido às dificuldades de acesso aos participantes com as características necessárias. Segundo Mattar,20 uma amostra não probabilística é uma opção viável quando a população não está disponível para ser sorteada e quando existem limitações de tempo, recursos financeiros e materiais. Os responsáveis pelos participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e foi lido o Termo de Assentimento para as crianças que concordaram em participar. O Termo de Assentimento foi lido, explicado e solicitada à criança a participação voluntária. A concordância foi obtida de forma verbal ou não verbal, devido à dificuldade motora apresentada por grande parte dos participantes que impossibilitava a assinatura do documento.
ProcedimentosO processo de tradução e adaptação seguiu recomendações internacionais21‐23 e foram cumpridas as seguintes etapas: tradução para o português; tradução conciliada; retrotradução; tradução final; pré‐teste; adaptação cultural.
Primeiramente dois tradutores independentemente traduziram o CPQol‐Child do inglês para o português. Ambos tinham fluência no inglês e no português e como língua nativa o português. As seguintes orientações foram dadas aos tradutores: usar linguagem natural e aceitável para um público amplo; fazer uma tradução clara, simples e compreensível; evitar frases longas; focar a equivalência conceitual, em vez de tradução literal; considerar a idade dos respondentes e a forma como irão compreender os itens; não usar gíria ou termos de difícil compreensão; evitar duplo negativo.21
Posteriormente as duas traduções foram comparadas e resultaram em uma tradução conciliada que consistiu em uma versão consensual com a adequação e reconciliação dos itens. Nessa etapa solicitou‐se a colaboração de uma equipe de pesquisadores experientes em pesquisa com crianças com PC. Eles tinham que analisar item por item, escolher a melhor tradução e sugerir outra tradução se necessário. Eles foram orientados a focar nas diferenças culturais e linguísticas que poderiam causar dificuldades quando a versão em inglês fosse transformada para o português.
A seguir solicitou‐se a um tradutor nativo em inglês e fluente em português que fizesse a retrotradução, isto é, retornou para a lingual inglesa a tradução conciliada, que foi encaminhada aos autores do questionário original para que identificassem e corrigissem as discrepâncias existentes em relação à equivalência semântica, idiomática e conceitual.
Na quarta etapa, foi feita a revisão e a comparação da versão retrotraduzida corrigida pelos autores do questionário com a versão original inglesa que gerou a tradução final que foi usada no pré‐teste.
No pré‐teste a versão final foi usada com seis crianças com PC para verificar se todos os itens eram compreensíveis e satisfatórios. Para testar a equivalência cultural, as questões que não apresentaram boa compreensão foram novamente discutidas e reformuladas pelos pesquisadores e usadas com outro grupo de seis crianças até que todos os itens fossem compreendidos por 90% dos entrevistados.24
Após finalização dessa etapa, fizeram‐se contato e convite aos pesquisadores de universidades brasileiras que trabalhavam com crianças com PC para auxiliar no estudo. Após o aceite foram feitas reuniões para treinamento dos aspectos teóricos e metodológicos de aplicação do questionário. No treinamento os entrevistadores foram treinados para fazer a leitura de cada questão para a criança e solicitar sua resposta, que era anotada no questionário. Eles não deviam fazer intervenção ou comentário sobre a questão ou resposta. Em cada região do país as entrevistas foram feitas por uma dupla de pesquisadores. Como não houve intervenção, explicação ou comentários durante as entrevistas, a diferença de avaliadores não interferiu nas respostas obtidas.
Para a coleta de dados foi feito um mapeamento do número de crianças com diagnóstico de paralisia cerebral e a faixa etária dessas crianças. Foram identificadas 200 crianças que atendiam os critérios estabelecidos, porém 65 famílias concordaram com que suas crianças participassem do estudo. Durante a coleta, cada criança foi entrevistada três vezes por dois entrevistadores: E1 e E2. O entrevistador E1 fez a primeira entrevista, em que era respondida a versão em português do instrumento CPQol‐Child: autorrelato (fig. 1)[somente online]e foi preenchido um questionário com informações sobre: gênero, idade, grau de instrução e nível de classificação da criança no Sistema de Classificação da Função Motora Grossa (GMFCS). Após um intervalo de 30 a 60 minutos, o entrevistador E2 fazia uma segunda entrevista, na qual a criança respondia novamente a versão em português do CPQol‐Child. Após 14 dias era feita a terceira entrevista pelo entrevistador E1, na qual os participantes respondiam as versões em português do CPQOL‐Child e do Kidscreen‐10.
Foi usada a versão traduzida e validada para o português do Brasil do questionário Kidscreen‐10 para verificar a validade de construto. Optou‐se por esse instrumento, pois tem‐se mostrado eficaz para a avaliação genérica de qualidade de vida de crianças saudáveis, bem como daquelas que apresentam condições crônicas. Esse instrumento tem padrão de qualidade internacional e foi usado pelas autoras do CPQol‐Child para validação do instrumento original em língua inglesa e tem sido usado nas traduções para as diferentes línguas e culturas.
O GMFCS é um sistema de classificação do nível da função motora de crianças com PC que tem sido usado internacionalmente e permite a estratificação em cinco níveis de habilidades. O nível I representa a melhor habilidade motora grossa e o nível V a pior função com base na faixa etária da criança avaliada.25
Foi feita a digitação dos dados brutos no programa SPSS (IBM Corp. Released 2013. IBM SPSS Statistics for Windows, versão 22.0. NY, EUA) para verificar o escore de pontuação para cada questionário e o domínio para posterior análise estatística.
Análise estatísticaFizeram‐se estatística descritiva para caracterizar a população do estudo e testes para verificar a confiabilidade inter e intraobservadores e a consistência interna do instrumento.
A confiabilidade interobservador foi avaliada com base em medições feitas em um mesmo momento por entrevistadores diferentes e a intraboservadores por meio de teste e reteste que consistiu em preencher o questionário duas vezes, com um tempo suficiente entre eles para excluir o efeito de memória, mas não muito tempo para evitar a mudança de qualidade de vida.11 Verificou‐se a consistência interna do instrumento, que consiste em verificar se as medidas repetidas dentro de uma mesma escala são convergentes, o que significa que eles estão voltados para a mesma direção, se os itens em cada dimensão formam um todo coerente e se a correlação aproximada interna entre os itens é relativamente forte.11
Os coeficientes de correlação intraclasse (ICC) e alfa de Cronbach foram usados para avaliação da confiabilidade e consistência interna do instrumento.2,13 O coeficiente de correlação intraclasse foi considerado excelente quando ICC ≥ 0,75; satisfatório quando 0,4 ≤ ICC < 0,75 e pobre ICC < 0,419 e foram considerados significativos valores de p < 0,05. Para o valor de alfa de Cronbach, para comparar grupos de indivíduos, recomendam‐se medidas com confiabilidade acima de 0,5.26
A validade de construto foi analisada por meio do coeficiente de correlação de Pearson.
ResultadosNa tabela 1 verificam‐se os dados referentes às características demográficas das crianças com paralisia cerebral. Houve uma predominância do gênero masculino e com nível I no GMFCS, apesar de terem sido entrevistadas crianças de todos os estratos.
Características demográficas das crianças
Variável | N (%) |
---|---|
Idade (anos) média ± desvio padrão | 10,5 ± 1,25 |
Gênero | |
Masculino | 41 (63) |
Feminino | 24 (37) |
Nível GMFCS | |
I | 27 (41) |
II | 18 (27) |
III | 7 (11) |
IV | 5 (7) |
V | 9 (14) |
Região do Brasil | |
Sudeste | 46 (70) |
Sul | 04 (06) |
Centro‐Oeste | 05 (08) |
Nordeste | 07 (11) |
Norte | 03 (05) |
A confiabilidade do questionário CPQol‐Child foi adequada, com coeficiente alfa de Cronbach maior do que 0,5 para todos os domínios, para os dois avaliadores. Apenas o domínio “Acesso a serviços” teve valores inferiores a 0,7 (tabela 2).
Consistência interna da versão em português do CP QOL‐Child: autorrelato
Subescala CP QOL child | Cronbach's Alpha E 1 | Cronbach's Alpha E 2 |
---|---|---|
Bem‐estar social e aceitação (12 itens) | 0,8050 | 0,8490 |
Funcionalidade (12 itens) | 0,8861 | 0,8618 |
Participação e saúde física (11 itens) | 0,7975 | 0,7873 |
Bem‐estar emocional e autoestima (6 itens) | 0,8445 | 0,8445 |
Acesso a serviços (3 itens) | 0,6579 | 0,6579 |
Dor e impacto da deficiência (8 items) | 0,7758 | 0,7416 |
Na tabela 3 são apresentados os resultados da confiabilidade intra e interobservador para cada domínio do CPQol‐Child. A confiabilidade intraobservador foi significativa para todos os domínios, foi considerada excelente para funcionalidade (ICC ≥ 0,75) e satisfatória para bem‐estar social e a aceitação, participação de saúde física, o bem‐estar emocional e a autoestima, acesso a serviços e dor e impacto da deficiência (0,4 ≤ ICC < 0,75). A confiabilidade interobservador foi significativa para todos os domínios, foi considerada excelente para bem‐estar emocional e autoestima e acesso a serviços (ICC ≥ 0,75) e considerado satisfatório para bem‐estar social e aceitação, funcionalidade, participação e saúde física e dor e impacto da deficiência (0,4 ≤ ICC < 0,75).
Confiabilidade intra e interobservador de cada domínio da versão em português do CP QOL‐Child: autorrelato avaliada pelo coeficiente de correlação intraclasse
Coeficiente de correlação intraclasse (ICC) | ||
---|---|---|
Domínio | Intraobservador (teste‐reteste) | Interobservador |
Bem‐estar social e aceitação | 0,732 | 0,625 |
Funcionalidade | 0,894 | 0,725 |
Participação e saúde física | 0,640 | 0,537 |
Bem‐estar emocional e autoestima | 0,600 | 0,848 |
Acesso a serviços | 0,562 | 0,937 |
Dor e impacto da deficiência | 0,405 | 0,675 |
Na tabela 4 verifica‐se uma fraca correlação entre o domínio participação e saúde física da CPQol‐Child e do Kidscreen‐10.
Correlação entre os domínios CP QOL‐Child: autorrelato e Kidscreen‐10
CP QOL‐Child | ||||||
---|---|---|---|---|---|---|
SWA | FU | PPH | EWB | AS | PI | |
KIDSCR | 0,216 | 0,164 | 0,277 | 0,190 | –0,056 | 0,057 |
0,128 | 0,250 | 0,049 | 0,182 | 0,694 | 0,690 |
SWA, bem‐estar social e aceitação; FU, funcionalidade; PPH, participação e saúde física; EWB, bem‐estar emocional e autoestima; AS, acesso a serviços; PI, dor e impacto da deficiência.
O estudo possibilitou oferecer a versão em língua portuguesa do questionário CPQol‐Child, um instrumento específico que avalia QV de crianças com PC que possibilitará mensurar e comparar a QV de crianças brasileiras a partir do autorrelato e poderá contribuir para estabelecer parâmetros de políticas públicas na saúde e educação, como também verificar a eficácia de ações terapêuticas e preventivas desenvolvidas e uszadas com essa população.
A metodologia usada seguiu recomendações de especialistas22‐23 e garantiu uma versão do instrumento adequada aos aspectos culturais da população brasileira e equivalente à versão original em língua inglesa.
Quanto às características dos participantes do estudo, teve‐se a preocupação de garantir a representatividade da população brasileira e dos diferentes tipos de PC, apesar de uma predominância de participantes da Região Sudeste. Observa‐se que o estudo englobou participantes das diferentes regiões do país para garantir que a caracterísitca multicutural do Brasil não resultasse em dificuldades de compreensão de algumas perguntas e na emissão das respostas.17
Os resultados do estudo indicaram que a versão em língua portuguesa do CPQol‐Child: autorrelato apresentou confiabilidade e validade para avaliação da qualidade de vida de crianças brasileiras com paralisia cerebral na faixa entre nove e 12 anos.
Vários autores têm enfatizado a importância da validação de questionário para crianças por meio de autorrelato, uma vez que crianças e adolescentes têm diferentes graus de percepção de si mesmos e do mundo e, portanto, uma visão diferente sobre sua qualidade de vida. A percepção dos adultos, mesmo os que convivem de forma direta com as crianças, apresenta, em geral, baixo índice de correlação com a autoavaliação da criança.6,7,27 Deve‐se ressaltar que fatores como idade; severidade do comprometimento motor e funcionalidade interferem na qualidade de vida de pessoas com paralisia cerebral e com o aumento da idade o nível de participação dessas crianças nas atividades diminui, ao mesmo tempo em que sua capacidade de reflexão aumenta, o que interfere na sua percepção em relação a sua qualidade de vida.28
Os dados indicaram um elevado grau de consistência interna e resultados semelhantes aos encontrados na versão original do CPQol‐Child: autorrelato.13
O menor valor obtido no ICC no teste‐reteste (0,405) foi para o domínio “Dor e impacto da deficiência”. No entanto, o ICC interobservador para esse domínio teve valor maior (0,675), o que pode indicar o fato de o questionamento ser direcionado a um estado subjetivo que pode ter se alterado no período de 14 dias, tempo necessário entre a primeira e segunda avaliação. O domínio “Bem‐estar emocional e autoestima”, que apresentou valor 0,600 na avaliação intraobservador, também se refere à avaliação subjetiva que pode apresentar alterações em período pequeno. No entanto, o valor obtido para o domínio “Acesso a services” na avaliação intraobservador pode indicar haver uma dificuldade de compreensão desse domínio pelos participantes do estudo.
Em relação à validade de construto, a fraca correlação encontrada para o domínio participação e saúde física difere dos resultados do estudo de Davis et al.,5 que verificaram uma correlação moderada. No entanto, conforme os autores afirmaram, existem diferenças conceituais entre os dois instrumentos que comumente são usados para avaliar qualidade de vida de crianças com paralisia cerebral que podem ter interferido nos resultados. O CPQol‐Child é um instrumento específico para avaliar QV de crianças com PC e tem como objetivo compreender como o a criança se sente sobre aspectos da sua vida em relação a diferentes domínios, enquanto o Kidscreen‐10 é um instrumento genérico sobre QV em saúde de crianças de fácil aplicação, porém tem apenas um escore resumido. A avaliação de QV relacionada à saúde por meio de um único valor pode perder informações relativas a alguns aspectos físicos e psicossociais.29
O estudo apresentou limitações, principalmente em relação à falta de dados complementares sobre as características socioeconômicas, a distribuição heterogênea da amostra entre as regiões e a predominância de crianças com nível I e II da GMFCS. Houve uma perda amostral maior em algumas regiões do país, por não atenderem aos critérios de inclusão e exclusão no estudo. A predominância de crianças desses níveis ocorreu porque as crianças com PC mais grave muitas vezes apresentam comorbidades associadas, como déficit intelectual e severos problemas de comunicação, que inviabilizaram a participação no estudo. Porém, acredita‐se que o questionário possa ser usado com segurança e confiabilidade em qualquer região do país desde que os respondentes atendam aos critérios estabelecidos no manual de uso.
A versão brasileira do CPQol‐Child apresentou propriedades psicométricas adequadas, é um instrumento confiável, compreensível e de fácil aplicação para avaliar a qualidade de vida de crianças brasileiras com paralisia cerebral por meio de autorrelato.
O acesso ao questionário pode ser feito por meio de registro no site http://www.cpqol.org.au/questionnaires_manuals.html.
FinanciamentoConselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Conflitos de interesseOs autores declaram não haver conflitos de interesse.
A Elizabeth Waters e sua equipe pela autorização para tradução do instrumento. Ao CNPq pelo apoio financeiro.
Como citar este artigo: Braccialli LM, Almeida VS, Sankako AN, Silva MZ, Braccialli AC, Carvalho SM, et al. Translation and validation of the Brazilian version of the Cerebral Palsy Quality of Life Questionnaire for Children – child report. J Pediatr (Rio J). 2016;92:143–8.