To analyze the association between physical activity, participation in Physical Education classes, and indicators of social isolation among adolescents.
MethodsThis was an epidemiological study based on secondary analysis of data from a representative sample of students (14‐19 years) from public high schools (n=4,207). Data were collected through the questionnaire Global School‐based Student Health Survey. The independent variables were the level of physical activity and enrollment in Physical Education classes, while the dependent variables were two indicators of social isolation (feeling of loneliness and having few friends). Descriptive and inferential procedures were used in the statistical analysis.
ResultsMost of the adolescents were classified as insufficiently active (65.1%) and reported not attending Physical Education classes (64.9%). Approximately two in each ten participants reported feeling of loneliness (15.8%) and, in addition, about one in each five adolescents reported have only one friend (19.5%). In the bivariate analysis, a significantly lower proportion of individuals reporting social isolation was observed among adolescents who referred higher enrollment in physical education classes. After adjustment for confounding variables, binary logistic regression showed that attending physical education classes was identified as a protective factor in relation to the indicator of social isolation ‘having few friends,’ but only for girls.
ConclusionsIt was concluded that participation in Physical Education classes is associated with reduced social isolation among female adolescents.
Analisar a associação entre a prática de atividades físicas, a participação nas aulas de Educação Física e indicadores de isolamento social em adolescentes.
MétodosTrata‐se de um estudo epidemiológico transversal, baseado na análise secundária de dados, a partir de uma amostra representativa de estudantes (14‐19 anos) do ensino médio da rede pública estadual (n=4.207). Os dados foram coletados por meio do questionário Global School‐based Student Health Survey. As variáveis independentes foram o nível de atividade física e a participação nas aulas de Educação Física, enquanto as variáveis dependentes foram dois indicadores de isolamento social (sentimento de solidão e ter poucos amigos). Na análise estatística, recorreu‐se a procedimentos descritivos e inferenciais.
ResultadosA maioria dos sujeitos foi classificada como insuficientemente ativa (65,1%) e relatou não participar das aulas de Educação Física (64,9%). Aproximadamente dois em cada dez participantes (15,8%) referiram sentimento de solidão e cerca de um em cada cinco (19,5%) reportaram ter até um amigo. Na análise bivariada, verificou‐se uma proporção significativamente inferior de isolamento social entre os adolescentes que participavam das aulas de Educação Física. Na regressão logística binária, após ajustamento de variáveis, verificou‐se que a participação nas aulas de Educação Física foi identificada como fator de proteção em relação ao indicador de isolamento social “ter poucos amigos”, mas somente entre as moças.
ConclusõesA participação nas aulas de Educação Física está associada à menor isolamento social em adolescentes do sexo feminino.
O isolamento social é o estado no qual a pessoa tem pouco contato com outras pessoas, tem uma quantidade mínima de contatos sociais e há dificuldade na manutenção e qualidade dos relacionamentos.1 O isolamento social é apontado particularmente como um problema de pessoas idosas,2–5 contudo também é possível identificar que pode afetar negativamente o estilo de vida dos adolescentes.6
Um estudo longitudinal feito em 2006 com crianças da Nova Zelândia (n=1.037), acompanhadas desde o nascimento até a idade adulta, apontou que a exposição ao isolamento social em indivíduos jovens pode ser um preditor de doenças crônicas degenerativas na idade adulta.7 Além disso, há evidências na literatura de que adolescentes socialmente isolados podem adotar condutas de risco à saúde, como a exposição excessiva a comportamentos sedentários e a redução do nível de prática de atividade física.8,9 O estudo conduzido com adolescentes por Gonçalves et al.10 indicou que a prática de atividades físicas era maior à medida que aumentava a frequência de encontros com amigos após o horário escolar.
A atividade física pode afetar diretamente o desenvolvimento social,11 entretanto o isolamento social é apontado como uma das principais barreiras para prática de atividade física entre os adolescentes.12 Em adição, estudos disponíveis indicam convergentemente que os adolescentes que são fisicamente ativos tendem a ter amigos igualmente ativos.13‐15
Na literatura internacional, poucos estudos focalizaram na análise da associação entre atividades físicas e participação nas aulas de Educação Física com indicadores de isolamento social16,17 e aqueles disponíveis foram feitos com adultos; na literatura nacional, as informações disponíveis são ainda mais escassas.12 Apesar da lacuna de conhecimento existente é plausivel admitir que as atividades físicas e as aulas de Educação Física possam constituir uma oportunidade para maior interação social e redução do isolamento social, mas essa hipótese precisa ser mais bem investigada. Diante do exposto, o objetivo do estudo foi analisar a associação entre a prática de atividades físicas e a participação nas aulas de Educação Física com indicadores de isolamento social em adolescentes.
MétodosDelineamentoTrata‐se de um estudo epidemiológico transversal, baseado na análise secundária de dados de um levantamento de abrangência estadual e base escolar, intitulado “Estilos de vida e comportamentos de risco à saúde em estudantes do ensino médio no Estado de Pernambuco”.
População alvo e amostraConsiderando‐se todas as dependências administrativas (federal, estadual, municipal e privada), os estudantes matriculados na rede pública estadual representavam à época aproximadamente 80% do total do estado.
Para o cálculo do tamanho amostral foram adotados os seguintes parâmetros: população estimada em 353 mil estudantes; intervalo de confiança de 95%; poder estatístico de 80%; erro máximo tolerável de três pontos percentuais; e, por não se conhecer com precisão a extensão dos problemas em foco na população sob investigação, a prevalência estimada foi arbitrada em 50%. O dimensionamento amostral conduzido permite que os testes estatísticos aplicados para medida de associação possam detectar como estatisticamente significativos valores de OR de 1,75 ou superiores, considerando‐se um nível de confiança de 95%. As análises foram limitadas a estudantes adolescentes do ensino médio da rede pública estadual de Pernambuco (n=4.207, 14‐19 anos).
Procurou‐se garantir que a amostra selecionada representasse a população alvo considerando a sua distribuição conforme região geográfica, período de matrícula (diurno e noturno) e porte das escolas (pequenas, com menos de 200 alunos; médias, com 200 a 499 alunos; e grandes, com 500 estudantes ou mais). Alunos matriculados no período da manhã e da tarde foram agrupados numa única categoria (estudantes do período diurno). A distribuição regional foi observada pelo número de escolas existentes em cada uma das 17 Gerências Regionais de Ensino da Secretaria de Educação do Estado de Pernambuco.
Para seleção da amostra, recorreu‐se a um procedimento de amostragem por conglomerados em dois estágios. A “escola” e a “turma” representaram, respectivamente, as unidades amostrais no primeiro e no segundo estágio. Todas as escolas da rede pública estadual que ofereciam ensino médio regular foram consideradas elegíveis para inclusão no estudo. No primeiro estágio, adotou‐se como critério de estratificação a densidade de escolas em cada microrregião do estado segundo o porte, assim foram sorteadas, proporcionalmente, mais escolas nas microrregiões onde a densidade era também maior. No segundo estágio, considerou‐se a densidade de turmas nas escolas sorteadas por turno de assistência às aulas como critério para sorteio daquelas nas quais os questionários seriam aplicados. Todos os estudantes das turmas sorteadas foram convidados a participar do estudo, independentemente da idade. Após a aplicação, os questionários respondidos por estudantes com idade superior a 19 anos e aqueles com idade inferior a 14 foram excluídos.
O período de feitura do estudo foi entre abril a outubro de 2006. A coleta dos dados foi feita por equipe previamente treinada, composta por seis estudantes de pós‐graduação, de acordo com um protocolo padronizado de coleta de dados. A aplicação dos questionários foi efetuada em sala de aula e os sujeitos foram continuamente assistidos por dois aplicadores que esclareciam as dúvidas e auxiliavam no preenchimento das informações.
Instrumento e medidasO questionário usado foi uma versão traduzida e adaptada do Global School‐based Student Health Survey, proposto pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em colaboração com outras entidades. O instrumento foi previamente testado em duas escolas da rede municipal de ensino na cidade do Recife, com uma amostra de 122 adolescentes. Indicadores de reprodutibilidade (consistência de medidas teste‐reteste) foram de moderados a altos na maioria dos itens do instrumento. Os coeficientes de concordância (índice kappa) variaram de 0,52 a 1,00.18
Variáveis do estudoDados sobre indicadores de isolamento social foram obtidos por meio de duas perguntas do módulo “sentimentos e relacionamentos” do instrumento usado: “Durante os últimos 12 meses, quantas vezes você se sentiu sozinho?” (opções de respostas=nunca, raramente, algumas, a maioria das vezes e sempre) e “Quantos amigos próximos (pessoas com quem você pode contar se precisar) você tem?” (opções de respostas=zero, um, dois, três ou mais amigos). Da primeira questão derivou‐se o primeiro indicador de isolamento social denominado de “sentimento de solidão” e foram considerados expostos a esse aqueles participantes que relataram “a maioria das vezes ou sempre” sentir‐se frequentemente sozinhos. E o segundo indicador foi “ter poucos amigos” e foram considerados ter poucos amigos os participantes que relataram ter nenhum até um amigo (0‐1).
O nível de atividade física foi determinado pelo número de dias por semana em que os estudantes relataram praticar atividades físicas de intensidade moderada a vigorosa por, no mínimo, 60 minutos. Os estudantes que relataram participação em, pelo menos, cinco dias de uma semana típica foram classificados como fisicamente ativos, enquanto os demais foram denominados insuficientemente ativos.19
Para a participação nas aulas de Educação Física (EF), os sujeitos foram classificados em dois grupos (participantes/não participantes). Os “participantes” foram aqueles que relataram participar, pelo menos, de uma aula de Educação Física por semana.20
Consideraram‐se como potenciais fatores intervenientes (confusão e modificadores de efeito) as seguintes variáveis: sexo (rapazes e moças), faixa etária (14 a 16 anos, 17 a 19 anos), local de residência (urbana, rural), cor da pele (branca, não branca), escolaridade materna (≤ 8 anos, 9 a 11 anos e 12 anos ou mais de estudo), turno escolar (diurno, noturno) e excesso de peso (sim, não).
Tabulação e análise dos dadosO procedimento de tabulação foi efetuado em um arquivo de dados do programa EpiData (Data Management and Basic Statistical Analysis System, versão 3.1, Odense, Dinamarca) com o uso de procedimentos eletrônicos de controle de amplitude e consistência na entrada de dados. Recorreu‐se à dupla digitação a fim de conferir a consistência na entrada dos dados. Todos os erros de digitação identificados foram corrigidos.
Para feitura das análises, usou‐se o pacote estatístico SPSS para Windows (SPSS Inc., 2007, SPSS para Windows, versão 16.0, Chicago, EUA) e empregaram‐se procedimentos de estatística descritiva e inferencial. Na análise bivariada, recorreu‐se à aplicação dos testes qui‐quadrado e qui‐quadrado para tendência (no caso das variáveis em escala ordinal). Esse procedimento foi usado para comparar a prevalência dos indicadores de isolamento social em função das categorias das variáveis independentes.
Na etapa de análise multivariada, recorreu‐se à regressão logística binária e consideraram‐se como desfechos: (1) sentimento de solidão (a maioria das vezes ou sempre); (2) ter poucos amigos (0‐1 amigo). Efetuou‐se ajustamento para as variáveis cor da pele, faixa etária, escolaridade materna, local de residência, turno escolar e excesso de peso e para os demais fatores incluídos no estudo como variáveis independentes, estratificado por sexo. Um modelo hierárquico de associação entre as variáveis foi empregado para estabelecer a ordem de entrada das variáveis (fig. 1). No modelo final de regressão, foram considerados significativamente associados os fatores para os quais o valor de p<0,05.
Aspectos éticosO protocolo do estudo foi aprovado, em 2005, pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos do Hospital Agamenon Magalhães (Recife, PE, Brasil). Todas as diretrizes estabelecidas na resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde foram observadas no desenvolvimento deste estudo. Foi obtido termo negativo de consentimento (parental passive consent form) dos pais ou responsáveis pelos estudantes menores de 18 anos e diretamente no caso dos estudantes com 18 anos ou mais e foi‐lhes assegurado o sigilo sobre as informações individuais.
ResultadosForam visitadas 76 escolas (11% do total de escolas públicas estaduais) em 44 municípios do estado de Pernambuco (23% dos municípios). Dos alunos que estavam matriculados e presentes nas turmas sorteadas na ocasião da visita para coleta de dados (6.114), 83 se recusaram a participar (1,9% de recusas) e 1.824 foram excluídos por estar fora da faixa etária.
A amostra final (n = 4.207), portanto, representa 99,8% do inicialmente previsto (n=4.217) e apresentava as seguintes características demográficas: 59,8% do sexo feminino, 58% entre 17 e 19 anos (média de 16,8 anos; s=1,4), 74,8% de cor de pele não branca e 78,9% residentes em áreas urbanas. A tabela 1 apresenta outras características demográficas e socioeconômicas da amostra segmentada pelo sexo.
Descrição das características demográficas, socioeconômicas, nível de atividade física e participação nas aulas de Educação Física dos adolescentes, estratificado pelo sexo
Variável | Rapazes | Moças | P | ||
---|---|---|---|---|---|
% | n | % | n | ||
Faixa etária (anos) | |||||
14 a 16 | 35,4 | 598 | 46,4 | 1.165 | < 0,001a |
17 a 19 | 64,6 | 1.089 | 53,6 | 1.346 | |
Local de residência | |||||
Urbana | 78,1 | 1.311 | 79,5 | 1.983 | 0,289a |
Rural | 21,9 | 367 | 20,5 | 510 | |
Cor da pele | |||||
Branco (a) | 24,8 | 417 | 25,5 | 639 | 0,649a |
Não branco (a) | 75,2 | 1.262 | 74,5 | 1.866 | |
Escolaridade materna (anos de estudo) | |||||
≤ 8 | 69,4 | 1.086 | 74,5 | 1.771 | |
9‐11 | 22,5 | 352 | 20,2 | 480 | < 0,001b |
≥ 12 | 8,1 | 127 | 5,3 | 126 | |
Turno escolar | |||||
Diurno (manhã/tarde) | 53,9 | 908 | 60,0 | 1.506 | < 0,001a |
Noturno | 46,1 | 778 | 40,0 | 1.002 | |
Excesso de peso | |||||
Sim | 8,9 | 147 | 10,4 | 253 | 0,148a |
Não | 91,1 | 1.497 | 89,6 | 2.188 | |
Nível de atividade física | |||||
Ativo | 42,3 | 713 | 29,8 | 745 | |
Insuficientemente ativo | 57,7 | 971 | 70,2 | 1.754 | < 0,001a |
Participação nas aulas de Educação Física | |||||
Sim | 39,5 | 664 | 32,2 | 805 | < 0,001a |
Não | 60,5 | 1.018 | 67,8 | 1.695 |
Dos participantes do estudo, em relação à adoção de prática de atividades físicas, 65,1% (IC95%: 63,7‐66,58) foram classificados como insuficientemente ativos e 64,9% (IC95%: 63,42‐66,31) relataram não participar das aulas de Educação Física.
Em relação aos indicadores de isolamento social, do total de participantes, 15,8% (IC95%: 14,7‐16,9) referiram sentimento de solidão e 19,5% (IC95%: 18,3‐20,7) relataram ter poucos amigos. A proporção de adolescentes separada por sexo que relataram sentimento de solidão foi significativamente maior (p=0,001) entre as moças (18,7%; IC95%: 17,2‐20,3) em comparação com os rapazes (11,4%; IC95%: 9,95‐13,0). De modo similar, a distribuição dos sujeitos que referiram ter poucos amigos foi estatisticamente superior (p=0,045) entre as moças (20,5%; IC95%: 18,9‐22,1) em comparação com os rapazes (17,9%; IC95%: 16,1‐19,8).
Na análise bivariada, verificou‐se que o sentimento de solidão está associado à participação nas aulas de Educação Física (p=0,012), mas parece ser um fator independente do nível de atividade física (p=0,913) entre as moças. Identificou‐se, ainda, que o indicador “ter poucos amigos” também está associado à participação nas aulas de Educação Física para ambos os sexos (p=0,001). A maior proporção de adolescentes que referem “ter poucos amigos” foi verificada entre aqueles que não participavam das aulas de Educação Física, conforme ilustrado na tabela 2.
Análise bivariada dos indicadores de isolamento social associado ao nível de atividade física e à participação nas aulas de Educação Física em adolescentes
Grupo | Variáveis independentes | Categorias | % | N | P |
---|---|---|---|---|---|
Rapazes | Desfecho: sentimento de solidão (a maioria das vezes ou sempre) | ||||
Nível de atividade física | Insuficientemente ativo Ativo | 11,9 10,8 | 115 77 | 0,567 | |
Participação nas aulas de Educação Física | Não Sim | 12,0 10,4 | 122 69 | 0,348 | |
Desfecho: ter poucos amigos (0‐1 amigos) | |||||
Nível de atividade física | Insuficientemente ativo Ativo | 19,1 16,4 | 185 117 | 0,187 | |
Participação nas aulas de Educação Física | Não Sim | 20,3 14,0 | 207 93 | 0,001a | |
Moças | Desfecho: sentimento de solidão (a maioria das vezes ou sempre) | ||||
Nível de atividade física | Insuficientemente ativo Ativo | 18,7 18,4 | 328 137 | 0,913 | |
Participação nas aulas de Educação Física | Não Sim | 20,1 15,8 | 340 127 | 0,012a | |
Desfecho: ter poucos amigos (0‐1 amigos) | |||||
Nível de atividade física | Insuficientemente ativo Ativo | 21,0 19,1 | 368 142 | 0,306 | |
Participação nas aulas de Educação Física | Não Sim | 22,0 17,2 | 373 138 | 0,006a |
Na regressão logística binária, a análise bruta das variáveis apontou que o sentimento de solidão estava associado à participação nas aulas de Educação Física (p=0,010) entre as moças. Observou‐se ainda na análise bruta que o indicador ter poucos amigos estava associado à participação nas aulas de Educação Física (p<0,05). Após ajustamento para variáveis de confusão e potenciais modificadores de efeito (variáveis intervenientes), verificou‐se que o desfecho ter poucos amigos permaneceu associado à participação nas aulas de Educação Física (p=0,025), mas somente entre as moças. A participação nas aulas de Educação Física foi identificada como fator associado à chance 24% inferior de ter poucos amigos (tabela 3).
Análise de regressão logística para identificação de fatores associados aos indicadores de isolamento social com o nível de atividade física e a participação nas aulas de Educação Física em adolescentes
Grupo | Variáveis independentes | Categorias | OR bruto | p | OR ajustadoa | P |
---|---|---|---|---|---|---|
Rapazes | Desfecho: sentimento de solidão (a maioria das vezes ou sempre) | |||||
(n=1.687) | Nível de atividade físicab | Insuficientemente ativo Ativo | 1 1,11 (0,81‐1,50) | 0,515 | 1 0,87 (0,63‐1,21) | 0,411 |
Participação nas aulas de Educação Físicac | Não Sim | 1 0,85 (0,62‐1,16) | 0,310 | 1 0,80 (0,57‐1,13) | 0,212 | |
Desfecho: ter poucos amigos (0‐1 amigos) | ||||||
Nível de atividade físicab | Insuficientemente ativo Ativo | 1 0,84 (0,65‐1,08) | 0,167 | 1 0,85 (0,64‐1,11) | 0,237 | |
Participação nas aulas de Educação Físicac | Não Sim | 1 0,64 (0,49‐0,83) | 0,001 | 1 0,75 (0,56‐1,01) | 0,055 | |
Moças | Desfecho: sentimento de solidão (a maioria das vezes ou sempre) | |||||
(n=2.511) | Nível de atividade físicab | Insuficientemente ativo Ativo | 1 1,02 (0,82‐1,27) | 0,868 | 1 0,99 (0,78‐1,25) | 0,918 |
Participação nas aulas de Educação Físicac | Não Sim | 1 0,75 (0,60‐0,93) | 0,010 | 1 0,80 (0,62‐1,02) | 0,077 | |
Desfecho: ter poucos amigos (0‐1 amigos) | ||||||
Nível de atividade físicab | Insuficientemente ativo Ativo | 1 0,89 (0,71‐1,10) | 0,281 | 1 0,91 (0,72‐1,14) | 0,414 | |
Participação nas aulas de Educação Físicac | Não Sim | 1 0,73 (0,59‐0,91) | 0,005 | 1 0,76 (0,60‐0,97) | 0,025d |
O principal achado deste estudo foi a identificação de que a participação nas aulas de Educação Física está associada à menor isolamento social em adolescentes do sexo feminino. As moças que participavam de uma ou mais aulas de Educação Física quando comparadas com aquelas que não participavam apresentaram menor chance de ter poucos amigos.
Os achados relatados no presente estudo devem ser interpretados à luz de algumas limitações metodológicas. As variáveis que expressam isolamento social foram obtidas a partir de medidas autorreferidas, que, portanto, estão sujeitas a viés de resposta. Essa limitação foi atenuada pelo uso de um instrumento previamente testado (piloto) que apresentou bons indicadores de consistência teste‐reteste.
Outra limitação é o hiato temporal entre a coleta de dados e a redação (oito anos). O lapso exige que as prevalências sejam interpretadas com cautela. Todavia, destaca‐se que o objetivo primário não era descrever a prevalência dos fatores de interesse, e sim analisar a associação entre eles. Nesse sentido, acredita‐se que eventuais flutuações nas medidas de prevalência que podem ter ocorrido nesse período em nada comprometem a qualidade dos dados no sentido de apoiar as análises de associação proposta.
Destaca‐se ainda que a maioria dos estudos congêneres foi feita com pessoas idosas.1‐5 A ênfase em fazer estudos com idosos decorre da hipótese de que o envelhecimento é um processo que leva à redução de laços sociais.21 Neste sentido, poucos estudos foram feitos a fim de investigar o isolamento social em adolescentes,6–8,12,22 já que se trata de um fenômeno mais contemporâneo e que somente agora começa a despertar o interesse da comunidade acadêmica devido aos seus potenciais efeitos na saúde dos jovens.
Apesar das limitações apresentadas, é importante destacar alguns pontos positivos em relação aos dados. Destacam‐se a abrangência estadual e a inclusão de adolescentes residentes tanto em áreas urbanas quanto rurais. Outro ponto que merece destaque é a inclusão na amostra de estudantes matriculados nos períodos diurno e noturno.
A escola é apontada como local ideal para incentivo e intervenção para a prática de atividades físicas e as aulas de Educação Física parecem ter papel fundamental nesse cenário. Apesar de despender grande parte do tempo diário na escola,23,24 os estudos indicam que boa parte dos adolescentes não participa das aulas de Educação Física.20,25,26 Uma das possíveis explicações pode ser a insatisfação em relação às atividades oferecidas nas aulas e/ou o desinteresse dos estudantes em relação aos conteúdos que são lecionados pelos professores.23
Em relação à associação entre a participação nas aulas de Educação Física e os indicadores de isolamento social, há poucos estudos congêneres cujos resultados possam ser comparados aos que estão relatados no presente estudo. Qual seria o mecanismo que explicaria menor chance de referir poucos amigos entre os adolescentes que referem participar das aulas de Educação Física? Embora não se descarte a possibilidade de viés de causalidade reversa, uma das explicações para tal achado pode residir no fato de que as aulas constituem oportunidade para interação social e formação de vínculos de amizade. Outra potencial explicação foi apresentada no estudo de Marzineck,27 feito com adolescentes de 3a série dos ensinos fundamental e médio, no qual se observou que a principal motivação para a participação nas aulas de Educação Física foi o momento de “estar com amigos”.
Santos et al.12 observaram que entre os participantes selecionados das aulas de Educação Física o isolamento social foi um dos principais fatores relatados para o não envolvimento em prática de atividades físicas. Em estudo longitudinal conduzido em Michigan (Estados Unidos), com 900 jovens do ensino médio, observou‐se que aqueles que estavam envolvidos com práticas esportivas – um conteúdo típico e bastante frequente das aulas de Educação Física – apresentaram menores níveis de isolamento social,28 o que converge para os achados relatados no presente estudo.
Destaca‐se ainda, na presente investigação, que a prática de atividade física não foi identificada como um fator associado aos indicadores de isolamento social, um achado que diverge dos resultados relatados em alguns estudos. Por exemplo, Sallis, Prochaska e Taylor29 apontaram a existência de forte associação entre a prática de atividade física e o apoio social de amigos. Evidência ratificada no estudo longitudinal feito com adolescentes em Pelotas (RS), no qual se observou a existência de uma relação inversa entre a prevalência de inatividade física e o número de dias por semana em que os adolescentes se encontram com amigos.10
Em adolescentes, o isolamento social está associado ao uso excessivo de internet,8 à insatisfação corporal devido ao sobrepeso ou à obesidade22 e às poucas oportunidades de interação social.6 Não é, portanto, implausível admitir que a maior participação nas aulas de Educação Física e em práticas de atividades físicas possa reduzir o isolamento social. No entanto, os achados relatados neste estudo apoiam somente parcialmente essa hipótese.
É necessário que a prática de atividade física dentro do ambiente escolar seja considerada um mecanismo importante para essa população específica e parte indissociável do processo global de educação, uma vez que a participação efetiva dos adolescentes nas aulas de Educação Física possibilitaria diminuir a exposição à comportamentos de risco à saúde30 e atenuar o isolamento social nessa fase da vida.
Concluiu‐se que a participação nas aulas de Educação Física, no presente estudo, foi identificada como fator de proteção para isolamento social (ter poucos amigos) entre as moças. Independentemente do gênero, o nível de significância e a amplitude dos intervalos de confiança das medidas de associação sugerem que a participação nas aulas de Educação Física parece ser um fator associado aos indicadores de isolamento social em adolescentes. Considerando a possibilidade de viés inerente aos estudos transversais, não se pode inferir uma relação de causa e efeito, razão pela qual acredita‐se que estudos prospectivos deverão procurar confirmar se a participação nas aulas de Educação Física tem efeito na redução do isolamento social.
FinanciamentoO presente estudo contou com o apoio a projetos de pesquisa (processo 486023/2006‐0) do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), com bolsas de estudos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e da Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia de Pernambuco (Facepe) (processo 108694/2009‐7).
Conflitos de interesseOs autores declaram não haver conflitos de interesse.
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), da Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco (Facepe), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Secretaria de Educação e Esportes do estado de Pernambuco.
Como citar este artigo: Santos SJ, Hardman CM, Barros SS, Da Franca C, Barros MV. Association between physical activity, participation in Physical Education classes, and social isolation in adolescents. J Pediatr (Rio J). 2015;91:543–50.
Estudo vinculado às atividades do Grupo de Pesquisa em Estilo de Vida e Saúde, Universidade de Pernambuco (UPE), Recife, PE, Brasil.