Compartilhar
Informação da revista
Vol. 91. Núm. 3.
Páginas 263-269 (Maio - Junho 2015)
Compartilhar
Compartilhar
Baixar PDF
Mais opções do artigo
Visitas
2819
Vol. 91. Núm. 3.
Páginas 263-269 (Maio - Junho 2015)
Artigo original
Open Access
Quality of life, school backpack weight, and nonspecific low back pain in children and adolescents
Qualidade de vida, peso das mochilas escolares e lombalgia não específica em crianças e adolescentes
Visitas
2819
Rosangela B. Macedoa, Manuel J. Coelho-e-Silvaa, Nuno F. Sousab, João Valente-dos-Santosa,c, Aristides M. Machado-Rodriguesa, Sean P. Cummingd, Alessandra V. Limae, Rui S. Gonçalvesf, Raul A. Martinsa,
Autor para correspondência
raulmartins@fcdef.uc.pt

Autor para correspondência.
a Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal
b Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, SP, Brasil
c Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, Lisboa, Portugal
d University of Bath, Bath, Inglaterra
e Universidade Federal do Acre (UFAC), Rio Branco, AC, Brasil
f Instituto Politécnico de Coimbra, Coimbra, Portugal
Este item recebeu

Under a Creative Commons license
Informação do artigo
Resume
Texto Completo
Bibliografia
Baixar PDF
Estatísticas
Tabelas (2)
Tabela 1. Características dos participantes e diferenças entre os sexos calculadas com uma análise multivariada e ajustadas para o Questionário Roland-Morris de Incapacidade (RMDQ)
Tabela 2. Análise multivariada entre os grupos, ajustada para o sexo, idade e estatura
Mostrar maisMostrar menos
Abstract
Objectives

To describe the degree of disability, anthropometric variables, quality of life (QoL), and school backpack weight in boys and girls aged 11-17 years. The differences in QoL between those who did or did not report low back pain (LBP) were also analyzed.

Methods

Eighty-six girls (13.9±1.9 years of age) and 63 boys (13.7±1.7 years of age) participated. LBP was assessed by questionnaire, and disability using the Roland-Morris Disability Questionnaire. QoL was assessed by the Pediatric Quality of Life Inventory (PedsQL). Multivariate analyses of variance and covariance were used to assess differences between groups.

Results

Girls reported higher disability than boys (p=0.01), and lower QoL in the domains of physical (p<0.001) and emotional functioning (p<0.01), psychosocial health (p=0.02) and physical health summary score (p<0.001), and on the total PedsQL score (p<0.01). School backpack weight was similar in both genders (p=0.61) and in participants with and without LBP (p=0.15). After adjustments, participants with LBP reported lower physical functioning (p<0.01), influencing lower physical health summary score (p<0.01).

Conclusions

Girls had higher disability and lower QoL than boys in the domains of physical and emotional functioning, psychosocial health, and physical health summary scores, and on the total PedsQL score; however, similar school backpack weight was reported. Participants with LBP revealed lower physical functioning and physical health summary score, yet had similar school backpack weight to those without LBP.

Keywords:
Quality of life
Nonspecific low back pain
Children and adolescents
School backpack
Resumo
Objetivos

Descrever o grau de incapacidade, as variáveis antropométricas, a qualidade de vida (QV) e o peso das mochilas escolares em meninos e meninas com 11-17 anos. Também são analisadas as diferenças na QV entre os que relataram ou não lombalgia (LBP).

Métodos

86 meninas (13,9±1,9 anos) e 63 meninos (13,7±1,7 anos) participaram. A LBP foi avaliada por um questionário e a incapacidade pelo Questionário Roland-Morris. A QV foi avaliada pelo Questionário Pediátrico sobre Qualidade de Vida (PedsQL). As análises de variância e de covariância multivariadas foram usadas para avaliar as diferenças entre os grupos.

Resultados

As meninas relataram maior incapacidade do que os meninos (p=0,01) e menor QV nos domínios de funcionamento físico (p<0,001) e emocional (p<0,01), no escore sumário de saúde psicossocial (p=0,02) e saúde física (p<0,001) e no escore total no PedsQL (p<0,01). O peso das mochilas escolares era semelhante para ambos os sexos (p=0,61) e para os participantes com e sem LBP (p=0,15). Após ajustes, os participantes com LBP relataram menor funcionamento físico (p<0,01), o que influenciou um menor escore sumário de saúde física (p<0,01).

Conclusões

As meninas tiveram maior incapacidade e menor QV do que os meninos nos domínios de funcionamento físico e emocional, nos escores sumários de saúde psicossocial e física e no escore total no PedsQL; contudo, foi relatado um peso semelhante das mochilas escolares. Os participantes com LBP revelaram menor funcionamento físico e escore sumário de saúde física, mesmo carregando mochilas escolares de mesmo peso do que aqueles sem LBP.

Palavras-chave:
Qualidade de vida
Lombalgia não específica
Crianças e adolescentes
Mochila escolar
Texto Completo
Introdução

A qualidade de vida (QV) considera interpretações subjetivas e o processo no qual cada um compara sua vida atual a alguns critérios identificados.1 Os estudos que investigam diferenças de QV entre os sexos geraram alguns resultados ambíguos, com alguns que relatam QV2 mais baixa em mulheres, ao passo que outros não observaram diferença entre homens e mulheres.3 Dessa forma, o efeito do sexo sobre a QV ainda não está claro. Esse conceito subjetivo poderia também ser influenciado por diversas condições de saúde, incluindo a lombalgia (LBP) não específica.3 Entre adultos, a LBP é um sintoma comum, com 70-80% da população que apresentam no mínimo um episódio na vida e em 80-85% dos casos considerada LBP não específica.4 Em crianças e adolescentes, a prevalência de LBP é bem semelhante à observada em adultos.5 Assim, a prevalência de LBP em crianças e adolescentes continua elevada, entre 30 e 70%, a depender da definição de dor, da idade da população e do tipo de modelo de pesquisa do estudo.6

Profissionais da saúde e pais destacaram o uso regular de mochilas, com a finalidade de levar material escolar, como fator de risco potencial de LBP em crianças e adolescentes.7 Apesar da ausência de valores de referência para o peso das mochilas escolares, o aumento da carga é visto como um importante fator que favorece a dor nas costas8 e a maioria dos pesquisadores e médicos concorda com um limite de peso da mochila, que não deve exceder 10% da massa corporal do aluno e deve estar igualmente distribuído em ambos os ombros.8 Mais de 10-40% dos adolescentes relataram que suas atividades diárias são de certa forma limitadas pela LBP.9,10 Pesquisas adicionais revelaram que a LBP na infância está associada à LBP crônica na vida adulta.8 Contudo, poucos estudos usaram especificamente instrumentos validados e padronizados para examinar a LBP e seu possível efeito sobre a QV.11 Da mesma forma, a situação geral da saúde de adolescentes que normalmente relatam LBP é desconhecida e parece difícil definir os limites de uma única experiência ou da dor como um problema de saúde.7 O uso de instrumentos padronizados de QV poderá divulgar a situação da saúde em diferentes populações gerais, indivíduos com dor e subgrupos de crianças e adolescentes que relatam LBP.

No contexto das tendências anteriores, este estudo visou a descrever o grau de incapacidade, as variáveis antropométricas, a QV e o peso das mochilas escolares em meninos e meninas de 11-17 anos. Além disso, esta investigação também estuda as diferenças de QV entre crianças e adolescentes que relataram LBP ou não.

MétodosModelo do estudo e participantes

O estudo teve um modelo transversal. A amostra foi recrutada de 12 classes em duas escolas de Rio Branco (AC); 324 alunos eram inicialmente elegíveis para participar deste estudo. Entretanto, apenas 149 (86 meninas e 63 meninos entre 11-17 anos) continuaram e concordaram em participar da investigação, após considerar o critério de inclusão com uma resposta positiva à seguinte pergunta: “No ano passado, você teve algum episódio de desconforto na coluna lombar que se estendeu para as pernas? Os critérios de exclusão incluíam escoliose idiopática, espondilite e hérnia de disco intervertebral.

Todos os participantes concordaram em participar deste estudo e seus pais/responsáveis forneceram o consentimento informado por escrito de acordo com a Declaração de Helsinque. Todos os métodos e procedimentos desta investigação foram aprovados por um Conselho Científico Institucional da Universidade de Coimbra, Portugal. Os dados clínicos foram registrados com questionários estruturados, aplicados por assistentes de pesquisa treinados.

Após o período de recrutamento, os participantes foram convidados para uma reunião preliminar em que foram informados sobre a natureza, os benefícios e os riscos do estudo. Na segunda parte dessa reunião, os participantes preencheram o Questionário Roland-Morris de Incapacidade (RMDQ) e o Questionário Pediátrico sobre Qualidade de Vida (PedsQL). Uma segunda reunião foi agendada para a avaliação das variáveis antropométricas. O peso da mochila escolar de cada participante foi medido em três dias separados em uma semana e, então, a média do valor nos três dias foi calculada.

Lombalgia (LBP)

A presença da LBP no mês anterior foi avaliada com a seguinte pergunta direta no momento da avaliação: “No mês passado, você sentiu uma dor lombar que durou um dia ou mais? Em caso de uma resposta afirmativa, era proposto que os participantes sinalizassem o local da dor em uma figura.11 Também foi pedido que os participantes preenchessem uma versão do RMDQ adaptada e validada especificamente para a população brasileira por Sardá Júnior et al.12 O RMDQ é um instrumento simples formado por 24 perguntas com respostas dicotômicas (sim/não) e que mede o grau de incapacidade apresentado pelo participante. A pontuação final no RMDQ representa a soma de respostas positivas, com 0 que corresponde a uma pessoa sem queixa e 24 a uma pessoa com limitações bastante graves.

Teste de Schober

Também foi solicitado que os participantes fizessem o teste de Schober, usado para mensurar a mobilidade da coluna lombar, que foi descrito pela primeira vez por Schober.13 O teste é feito de pé e com a flexão máxima do torso para frente, com os joelhos estendidos. Com o participante em posição ortostática, linhas horizontais paralelas são desenhadas 10 cm acima e 5 cm abaixo da junção lombossacral. O teste foi considerado normal quando houve variação de cinco ou mais centímetros entre as medidas na posição ortostática e com o torso flexionado.

Qualidade de vida relacionada à saúde (QVRS)

A QVRS foi avaliada por uma versão do PedsQL14 adaptada e validada para a população brasileira por Klatchoian et al.15 Esse questionário pode ser usado para avaliar a QVRS em crianças e adolescentes saudáveis e naqueles com doenças agudas e crônicas e consiste em 23 itens que abrangem quatro escalas multidimensionais: i) funcionamento físico (oito itens); ii) funcionamento emocional (cinco itens); iii) funcionamento social (cinco itens); iv) funcionamento escolar (cinco itens). As quatro escalas multidimensionais estão agrupadas em três escores sumários: i) escore sumário de saúde psicossocial (15 itens); ii) escore sumário de saúde física (oito itens); iii) escore total de PedsQL (23 itens). Os itens são classificados de maneira inversa e linearmente transformados em uma escala de 0-100 (0=100; 1=75; 2=50; 3=25; 4=0), portanto escores mais altos indicam melhor QVRS.

Medidas antropométricas e peso da mochila escolar

A estatura foi mensurada com arredondamento de 0,1 cm, com o uso de um estadiômetro padrão, com os participantes de pé e sem sapatos. O peso corporal foi aferido com a criança descalça e com roupas leves em uma balança digital de precisão calibrada (Filizola PL 200, Filizola®, São Paulo, Brasil) com precisão para os 100 gramas mais próximos. O índice de massa corporal (IMC) foi determinado com o cálculo da proporção entre a massa corporal em quilogramas e a estatura em metros quadrados. As medições antropométricas foram feitas em salas separadas para garantir a privacidade dos participantes. O peso da mochila foi medido em três ocasiões separadas durante a semana com a mesma balança digital (Filizola PL 200, Filizola®, São Paulo, Brasil).

Análise estatística

As médias e os desvios padrão (M±DP) foram calculados para as variáveis idade, peso corporal, estatura, IMC, peso das mochilas escolares, RMDQ, teste de Schober e escalas e sumários de QVRS. A normalidade da distribuição foi verificada para todas as variáveis contínuas por meio do teste de Kolmogorov-Smirnov, ao passo que a homogeneidade da variância foi verificada por meio do teste de Levene. As comparações entre grupos com e sem LBP foram feitas por meio de uma análise de variância multivariada (Manova) e de covariância multivariada (Mancova), com controle de sexo, idade e estatura. Foram feitas comparações entre os sexos com a Manova e, para as escalas de QVRS, também a Mancova, ajustadas para os graus de incapacidade. Todas as análises foram feitas com a versão 19 do Pacote Estatístico para as Ciências Sociais do Windows (SPSS, Inc. Chicago, IL, EUA). O nível de confiança de 0,05 foi usado como estatisticamente significativo para todas as análises. O Eta quadrado parcial foi usado para avaliar a magnitude das diferenças entre os grupos; valores F de 0,10, 0,25 e 0,40 foram interpretados como efeitos pequenos, médios e grandes, respectivamente. Convertidos em eta quadrado parcial, valores de 0,01, 0,06 e 0,14 foram considerados efeitos pequenos, moderados e grandes, respectivamente.

Resultados

As características dos participantes são descritas na tabela 1. Tanto os meninos como as meninas entre 11 e 17 anos registraram valores médios semelhantes para a idade (p=0,214). Os valores médios para a massa corporal (p=0,910) e o IMC (p=0,211) também foram semelhantes em meninos e meninas, apesar de os meninos serem mais altos do que as meninas (1,59±0,10cm em comparação com 1,56±0,07cm). Em comparação com os meninos, as meninas registraram níveis mais elevados de incapacidade quando avaliadas pelo RMDQ (p=0,007). As meninas também registraram níveis mais baixos de QVRS em relação aos meninos, medidos pelo PedsQL, e também em termos dos domínios de “funcionamento físico” (p=0,003), “funcionamento emocional” (p=0,003), “escore sumário de saúde física” (p=0,003) e “escore total do PedsQL” (p=0,016). Esses escores menores de QVRS registrados pelas meninas foram considerados independentes do grau de incapacidade.

Tabela 1.

Características dos participantes e diferenças entre os sexos calculadas com uma análise multivariada e ajustadas para o Questionário Roland-Morris de Incapacidade (RMDQ)

  Total (N=149)  Meninas (n=86)Meninos (n=63)Efeito no grupo Valores de p  Ajustado para o RMDQ Valores de p 
    Mín-Máx  M (DP)  Mín-Máx  M (DP)     
Idade (anos)  13,8 (1,9)  11-17  13,9 (1,9)  11-17  13,5 (1,8)  0,214 
Peso corporal (kg)  52,8 (12,6)  34,0-102,9  52,7 (12,0)  28,8-92,6  52,9 (13,6)  0,910 
Estatura (cm)  1,57 (0,09)  1,38-1,76  1,56 (0,07)  1,35-1,81  1,59 (0,10)  0,040a 
Índice de massa corporal (kg/m2)  21,2 (3,8)  15,5-36,5  21,5 (3,7)  13,5-32,1  20,7 (4,0)  0,211 
Peso da mochila escolar (kg)  4,04 (1,24)  2,10-7,00  4,08 (1,15)  1,70-7,50  3,97 (1,35)  0,613   
Roland-Morris (0-24)  5,2 (3,6)  0,0-18,0  6,0 (3,6)  0,0-14,0  4,2 (3,4)  0,007b   
Teste de Schober (cm)  15,6 (1,0)  12,5-18,0  15,7 (1,1)  13,5-17,5  15,4 (1,0)  0,101   
PedsQL (0-100)
Funcionamento físico  72 (16)  13-94  68 (17)  31-97  79 (13)  < 0,001c  0,003b 
Funcionamento emocional  63 (17)  20-90  59 (15)  15-100  69 (18)  0,001b  0,003b 
Funcionamento social  81 (17)  25-100  79 (17)  45-100  83 (15)  0,094  0,454 
Funcionamento escolar  74 (16)  25-100  74 (15)  10-100  74 (16)  0,804  0,705 
Escore sumário de saúde psicossocial  73 (13)  43-95  70 (12)  30-98  76 (13)  0,021a  0,118 
Escore sumário de saúde física  72 (16)  13-94  68 (17)  31-97  79 (13)  < 0,001c  0,003b 
Pontuação total no PedsQL  72 (13)  33-93  69 (12)  42-97  77 (12)  0,001b  0,016a 

PedsQL, Questionário Pediátrico sobre Qualidade de Vida.

Diferenças significativas entre meninas/meninos.

a

p<0,05.

b

p<0,01.

c

p<0,001.

A tabela 2 destaca as comparações entre os participantes com LBP no mês anterior (n=90; 55 meninas e 35 meninos) e sem LBP no mês anterior (n=59; 31 meninas e 28 meninos). O valor médio de QVRS foi maior naqueles sem LBP (p<0,001), especificamente nos domínios de “funcionamento físico” e “escore sumário de saúde física” (p<0,01). O “escore total do PedsQL” também mostra a mesma tendência de diferenças, porém com um valor marginal (p=0,056). Nos participantes com LBP, o escore médio menor de QVRS é semelhante após o controle de possíveis efeitos de confusão relacionados ao sexo, à idade e à estatura. Não foi observada diferença entre os participantes com e sem LBP, principalmente em termos do peso das mochilas escolares, no teste de Schober e nas escalas do PedsQL de “funcionamento emocional”, “funcionamento social”, “funcionamento escolar” e “escore sumário de saúde psicossocial”.

Tabela 2.

Análise multivariada entre os grupos, ajustada para o sexo, idade e estatura

Variáveis  Total  Com LBP  Sem LBP  Efeito no grupo  Ajustado para o sexo  Ajustado para o sexo e idade  Ajustado para o sexo, idade e estatura 
  (n=149)  (n=90)  (n=59)  Valores de p  Valores de p  Valores de p  Valores de p 
Peso da mochila escolar (kg)  4,04 (1,24)  3,92 (1,14)  4,21 (1,36)  0,154  0,141  0,118  0,124 
Roland-Morris (0-24)  5,21 (3,62)  6,26 (3,79)  3,61 (2,65)  < 0,001a  < 0,001a  < 0,001a  < 0,001a 
Teste de Schober (cm)  15,6 (1,0)  15,6 (1,0)  15,4 (1,0)  0,168  0,211  0,204  0,196 
PedsQL (0-100)
Funcionamento físico  72 (16)  69 (17)  78 (14)  < 0,01b  < 0,01b  < 0,01b  < 0,01b 
Funcionamento emocional  63 (17)  62 (18)  64 (16)  0,609  0,820  0,845  0,851 
Funcionamento social  81 (17)  80 (18)  82 (15)  0,450  0,538  0,558  0,571 
Funcionamento escolar  74 (16)  74 (14)  74 (18)  0,876  0,892  0,912  0,921 
Escore sumário de saúde psicossocial  73 (13)  72 (13)  73 (13)  0,530  0,667  0,693  0,705 
Escore sumário de saúde física  72 (16)  69 (17)  78 (14)  < 0,01b  < 0,01b  < 0,01b  < 0,01b 
Pontuação total no PedsQL  72 (13)  71 (13)  75 (12)  0,056  0,092  0,089  0,094 

PedsQL, Questionário Pediátrico sobre Qualidade de Vida.

Diferenças significativas nos efeitos entre os indivíduos.

a

p < 0,001.

b

p<0,01.

Discussão

Este estudo visou a descrever e comparar variáveis antropométricas, QV e peso das mochilas escolares em meninos e meninas com 11-17 anos com ou sem LBP não específica no mês anterior. Os meninos eram mais altos do que as meninas (tabela 1), ao passo que o peso corporal e o IMC eram semelhantes nos dois sexos. É importante observar que as diferenças na estatura entre os sexos aumentam a partir dos 10 anos,16 processo relacionado ao início da adolescência, e são explicadas pelas influências hormonais que afetam as meninas antes dos meninos.17 O surto de crescimento puberal que ocorre nos meninos mais tarde e com maior intensidade do que nas meninas contribui para a maior estatura e o maior peso corporal observados nos meninos após a puberdade.18

O teste de Schober tem sido amplamente usado por diversos autores19 para avaliar a extensão da flexão lombar. De forma compatível com a pesquisa anterior,19 os participantes com LBP deste estudo obtiveram valores semelhantes no teste de Schober, em comparação com participantes sem LBP, independentemente do sexo, da idade e da estatura (tabela 2). Contudo, alguns estudos constataram que uma maior mobilidade está associada a menor LBP.20 A maioria dos estudantes conseguiu mais de 15 cm no teste de Schober, o que é um desempenho significativo. A falta de diferenças entre os grupos nesse teste pode estar associada aos procedimentos metodológicos (p. ex., essas avaliações foram feitas durante aulas de educação física). Consequentemente, os estudantes podem já ter feito alguma atividade física no momento da avaliação e, assim, aumentado sua temperatura muscular,19 o que leva ao aumento de flexibilidade. De fato, a flexibilidade variou durante o dia e, provavelmente, as diferenças no momento da avaliação podem ter influenciado os resultados da comparação entre os estudantes com e sem LBP deste estudo, o que corrobora os resultados de estudos anteriores.21

As mochilas escolares eram usadas regularmente pela maioria dos estudantes que participaram deste estudo (99%); esses resultados são compatíveis com os níveis de uso observados por outros autores.19 Outros autores22 sugerem que o aumento no peso da mochila escolar está associado a uma maior prevalência de LBP e, portanto, causa má postura, contratura muscular e inflamação temporária ou crônica. Os achados de nosso estudo revelaram que 128 estudantes (86%) tiveram pelo menos um episódio de LBP em suas vidas atribuível ao transporte diário das mochilas, o que é compatível com os valores relatados em outros estudos.9 No momento da avaliação, 60% de nossos participantes (n=90) relataram LBP no mês anterior, porém todos os participantes tiveram pelo menos um episódio de desconforto na região lombar no ano anterior. Contudo, não foi constatada diferença entre os grupos com e sem LBP. Apesar de esses resultados estarem em linha com alguns estudos anteriores,9,23 outros estudos associaram a LBP ao peso das mochilas escolares,24 principalmente quando o peso distribuído em apenas um dos ombros foi levado em consideração, o que está associado a uma maior incidência de dor dorsal e lombar.25 De fato, a ausência de diferenças entre os participantes com e sem LBP neste estudo pode ser explicada, pelo menos em parte, porque apenas 18% dos estudantes carregam as mochilas escolares em apenas um ombro, ao passo que 78% carregam-na nos dois ombros; os outros 4% dos estudantes usam mochilas com rodinhas e outros tipos de bolsas escolares.

Outra fonte de variação é o tempo gasto entre a residência e a escola e o tipo de transporte. Priste et al.26 observaram que a LBP surge quando o tempo entre a residência e a escola é de mais de 30 minutos. A maioria dos participantes deste estudo (89%) normalmente vai de carro para a escola. Os outros 11% dos estudantes que normalmente vão para a escola a pé levam pouco tempo para chegar lá, o que limita o tempo em que carregam o peso nas costas (34% caminham por menos de 15 minutos; 35% caminham entre 15-30 minutos; 31% caminham por mais de 30 minutos). Isso certamente contribuiu para explicar a falta de associação entre a LBP e o peso das mochilas escolares.

Embora este estudo não sustente a hipótese de o peso das mochilas ser um fator de risco para LBP de curto prazo, seus efeitos de longo prazo não podem ser excluídos. Na verdade, as consequências de longo prazo de carregar mochilas pesadas incluem o desconforto e dores nas costas nos estudantes.27 Portanto, Bauer & Freivalds28 declaram que o peso da mochila não deve exceder 10% do peso corporal e que isso pode contribuir positivamente para evitar problemas de saúde. Neste estudo, o valor médio do peso das mochilas era de 4,04±1,24kg e o do peso corporal era de 52,8±12,6kg, o que se enquadra nos limites e, provavelmente, também contribui para a ausência de diferenças significativas entre os participantes com e sem LBP.

Neste estudo, as meninas relataram valores médios mais baixos de QVRS do que os meninos em “funcionamento físico”, “funcionamento emocional”, “escore sumário de saúde psicossocial”, “escore sumário de saúde física” e “escore total de PedsQL”. Após o controle do grau de incapacidade, essas diferenças foram mantidas, com exceção do “escore sumário de saúde psicossocial” (tabela 1). A QVRS menor apresentada pelas meninas pode ser parcialmente explicada por meio das diferentes atividades recreacionais; os meninos têm mais tempo de lazer do que meninas, ao passo que as adolescentes provavelmente estão mais focadas em ajudar suas mães nas tarefas domésticas. Outra possível explicação está relacionada ao início da puberdade e às suas associações a mudanças físicas; na verdade, as meninas enfrentam grandes desafios porque, por exemplo, o início da menstruação causa queixas frequentes, como observado anteriormente por Kolip.29 Adicionalmente, diferenças individuais de maturação biológica contribuíram para as quedas de QVRS relacionadas à idade em adolescentes do sexo feminino no Reino Unido.30 As alterações hormonais que ocorrem em adolescentes do sexo feminino poderão contribuir futuramente para as alterações no bem-estar psicológico.2

Uma pessoa com sintomas de LBP normalmente é parcial e temporariamente limitada com relação às atividades diárias, o que exerce um impacto negativo sobre a QV e legitima em si a importância de quantificar a incapacidade funcional posterior.10 Contudo, isso não é um consenso com outros autores.11 O RMDQ foi usado neste estudo para avaliar o grau de incapacidade funcional, o que revela, conforme esperado, maior incapacidade naqueles que mencionaram a LBP, independentemente do sexo, da idade e da estatura (tabela 2). Vale notar que participantes com LBP apresentaram QVRS mais baixa, porém apenas nas dimensões de “funcionamento físico” e “escore sumário de saúde física”; essas diferenças foram mantidas após o controle dos efeitos do sexo, idade e estatura. Esses achados destacam o impacto negativo da LBP sobre o domínio físico da QVRS na juventude.

Neste estudo, os participantes com e sem LBP costumavam carregar um peso semelhante nas mochilas escolares; o que parece sugerir que o peso das mochilas, se dentro dos valores recomendados, não é um fator de risco para causar a LBP. Além disso, achados sugerem que as meninas apresentam níveis mais elevados de incapacidade do que os meninos e menor QVRS, principalmente nos domínios de funcionamento físico e emocional, o que afeta o escore total de QVRS. Por fim, este estudo sugere que os participantes com LBP relatam menor QVRS percebida, especificamente no domínio de funcionamento físico. Conjuntamente, esses achados são importantes, principalmente para incentivar os pais e professores a se conscientizarem sobre os fatores de risco associados à LBP. Ademais, a LBP tende a apresentar baixa intensidade e frequência e os adultos devem estar cientes de que as crianças não devem ser expostas a cargas excessivas decorrentes de materiais escolares para contribuir para uma melhor QV da juventude.

Concluindo, as meninas registraram níveis mais elevados de incapacidade e menor QV nos domínios de funcionamento físico e emocional, escore sumário de saúde psicossocial, escore sumário de saúde física e escore total do PedsQL em comparação com os meninos. O peso das mochilas escolares era semelhante para ambos os sexos, estava dentro dos valores recomendados e não tem relação com a LBP. Após o controle de possíveis variáveis de confusão, os participantes com LBP apresentam menor QVRS, especificamente nos domínios de funcionamento físico e menor escore sumário de saúde física.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

Agradecimentos

Ao Mapi Research Trust, na pessoa de James W. Varni, PhD, professor do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina e do Departamento de Arquitetura Paisagística e Planejamento Urbano da Faculdade de Arquitetura da Texas A&M University, 3137 Tamu College Station, Texas, 77843-3137, EUA, pela construção de um instrumento padronizado para medir a QVRS e pela permissão para seu uso neste estudo.

Referências
[1]
M.R. Trine.
Physical activity and quality of life.
Lifestyle medicine, pp. 989-997
[2]
P.B. O'Sullivan, D.J. Beales, A.J. Smith, L.M. Straker.
Low back pain in 17 year olds has substantial impact and represents an important public health disorder: a cross-sectional study.
BMC Public Health, 12 (2012), pp. 100
[3]
J.I. Gold, N.E. Mahrer, J. Yee, T.M. Palermo.
Pain, fatigue, and health-related quality of life in children and adolescents with chronic pain.
Clin J Pain, 25 (2009), pp. 407-412
[4]
A.K. Burton, F. Balagué, G. Cardon, H.R. Eriksen, Y. Henrotin, A. Lahad, et al.
Chapter 2. European guidelines for prevention in low back pain: november 2004.
Eur Spine J., 15 (2006), pp. S136-S168
[5]
P. Kjaer, N. Wedderkopp, L. Korsholm, Y.C. De Leboeuf.
Prevalence and tracking of back pain from childhood to adolescence.
BMC Musculoskelet Disord., 12 (2011), pp. 98
[6]
L.J. Jeffries, S.F. Milanese, K.A. Grimmer-Somers.
Epidemiology of adolescent spinal pain: a systematic overview of the research literature.
Spine (PhilaPA 1976), 32 (2007), pp. 2630-2637
[7]
F. Balagué, J. Dudler, M. Nordin.
Low-back pain in children.
Lancet., 361 (2003), pp. 1403-1404
[8]
J1. Cottalorda, S. Bourelle, V. Gautheron, R. Kohler.
Backpack and spinal disease: myth or reality?.
Rev Chir Orthop Reparatrice Appar Mot., 90 (2004), pp. 207-214
[9]
K.D. Watson, A.C. Papageorgiou, G.T. Jones, S. Taylor, D.P. Symmons, A.J. Silman, et al.
Low back pain in schoolchildren: the role of mechanical and psychosocial factors.
Arch Dis Child., 88 (2003), pp. 12-17
[10]
A. Roth-Isigkeit, U. Thyen, H. Stöven, J. Schwarzenberger, P. Schmucker.
Pain among children and adolescents: restrictions in daily living and triggering factors.
Pediatrics., 115 (2005), pp. 152-162
[11]
F. Pellisé, F. Balagué, L. Rajmil, C. Cedraschi, M. Aguirre, C.G. Fontecha, et al.
Prevalence of low back pain and its effect on health-related quality of life in adolescents.
Arch Pediatr Adolesc Med., 163 (2009), pp. 65-71
[12]
J.J. Sardá Júnior, M.K. Nicholas, C.A. Pimenta, A. Asghari, A.L. Thieme.
Validação do questionário de incapacidade Roland Morris para dor em geral.
Rev Dor., 11 (2010), pp. 28-36
[13]
P. Schober Von.
Lendenwirbelsäule und Kreuzschmerzen (The lumbar vertebral column and backache).
Munch Med Wochenschr., 84 (1937), pp. 336-338
[14]
J.W. Varni, M. Seid, P.S. Kurtin.
PedsQL 4.0: reliability and validity of the Pediatric Quality of Life Inventory version 4.0 generic core scales in healthy and patient populations.
Med Care., 39 (2001), pp. 800-812
[15]
D.A. Klatchoian, C.A. Len, M.T. Terreri, M. Silva, C. Itamoto, R.M. Ciconelli, et al.
Quality of life of children and adolescents from São Paulo: reliability and validity of the Brazilian version of the Pediatric Quality of Life Inventory version 4.0 Generic Core Scales.
J Pediatr (RioJ)., 84 (2008), pp. 308-315
[16]
D.A. Silva, A. Pelegrini, E.L. Petroski, A.C. Gaya.
Comparison between the growth of Brazilian children and adolescents and the reference growth charts: data from a Brazilian Project.
J Pediatr (RioJ)., 86 (2010), pp. 115-120
[17]
J.C. Wells.
Sexual dimorphism of body composition.
Best Pract Res Clin Endocrinol Metab., 21 (2007), pp. 415-430
[18]
R.M. Malina, C. Bouchard, G. Beunen.
Human growth. Selected aspects of current research on well-nourished children.
Ann Rev Anthropol., 17 (1988), pp. 187-219
[19]
D.E. Feldman, I. Shrier, M. Rossignol, L. Abenhaim.
Risk factors for the development of low back pain in adolescence.
Am J Epidemiol., 154 (2001), pp. 30-36
[20]
M.A. Jones, G. Stratton, T. Reilly, V.B. Unnithan.
Biological risk indicators for recurrent non-specific low back pain in adolescents.
Br J Sports Med., 39 (2005), pp. 137-140
[21]
M.A. Adams.
Biomechanics of back pain.
Acupunct Med., 22 (2004), pp. 178-188
[22]
Z. Heuscher, D.P. Gilkey, J.L. Peel, C.A. Kennedy.
The association of self-reported backpack use and backpack weight with low back pain among college students.
J Manipulative Physiol Ther., 33 (2010), pp. 432-437
[23]
A. Kaspiris, T.B. Grivas, C. Zafiropoulou, E. Vasiliadis, O. Tsadira.
Nonspecific low back pain during childhood: a retrospective epidemiological study of risk factors.
J Clin Rheumatol., 16 (2010), pp. 55-60
[24]
B. Ozgül, N.E. Akalan, S. Kuchimov, F. Uygur, Y. Temelli, M.G. Polat.
Effects of unilateral backpack carriage on biomechanics of gait in adolescents: a kinematic analysis.
Acta Orthop Traumatol Turc., 46 (2012), pp. 269-274
[25]
P. Korovessis, G. Koureas, S. Zacharatos, Z. Papazisis.
Backpacks, back pain, sagittal spinal curves and trunk alignment in adolescents: a logistic and multinomial logistic analysis.
Spine (PhilaPA 1976), 30 (2005), pp. 247-255
[26]
A. Prista, F. Balagué, M. Nordin, M.L. Skovron.
Low back pain in Mozambican adolescents.
Eur Spine J., 13 (2004), pp. 341-345
[27]
B1. Akdag, U. Cavlak, A. Cimbiz, H. Camdeviren.
Determination of pain intensity risk factors among school children with nonspecific low back pain.
Med Sci Monit., 17 (2011), pp. PH12-PH15
[28]
D.H. Bauer, A. Freivalds.
Backpack load limit recommendation for middle school students based on physiological and psychophysical measurements.
Work, 32 (2009), pp. 339-350
[29]
P. Kolip.
Gender differences in health status during adolescence: a remarkable shift.
Int J Adolesc Med Health., 9 (2011), pp. 9-18
[30]
S.P. Cumming, F.B. Gillison, L.B. Sherar.
Biological maturation as a confounding factor in the relation between chronological age and health-related quality of life in adolescent females.
Qual Life Res., 20 (2011), pp. 237-242

Como citar este artigo: Macedo RB, Coelho-e-Silva MJ, Sousa NF, Valente-dos-Santos J, Machado-Rodrigues AM, Cumming SP, et al. Quality of life, school backpack weight, and nonspecific low back pain in children and adolescents. J Pediatr (Rio J). 2015;91:263–9.

Copyright © 2015. Sociedade Brasileira de Pediatria
Idiomas
Jornal de Pediatria
Opções de artigo
Ferramentas
en pt
Taxa de publicaçao Publication fee
Os artigos submetidos a partir de 1º de setembro de 2018, que forem aceitos para publicação no Jornal de Pediatria, estarão sujeitos a uma taxa para que tenham sua publicação garantida. O artigo aceito somente será publicado após a comprovação do pagamento da taxa de publicação. Ao submeterem o manuscrito a este jornal, os autores concordam com esses termos. A submissão dos manuscritos continua gratuita. Para mais informações, contate assessoria@jped.com.br. Articles submitted as of September 1, 2018, which are accepted for publication in the Jornal de Pediatria, will be subject to a fee to have their publication guaranteed. The accepted article will only be published after proof of the publication fee payment. By submitting the manuscript to this journal, the authors agree to these terms. Manuscript submission remains free of charge. For more information, contact assessoria@jped.com.br.
Cookies policy Política de cookies
To improve our services and products, we use "cookies" (own or third parties authorized) to show advertising related to client preferences through the analyses of navigation customer behavior. Continuing navigation will be considered as acceptance of this use. You can change the settings or obtain more information by clicking here. Utilizamos cookies próprios e de terceiros para melhorar nossos serviços e mostrar publicidade relacionada às suas preferências, analisando seus hábitos de navegação. Se continuar a navegar, consideramos que aceita o seu uso. Você pode alterar a configuração ou obter mais informações aqui.