To analyze the prevalence and impact of asthma in schoolchildren from the city of Caxias do Sul, RS, Brazil.
MethodsCross‐sectional observational and case‐control study with children and adolescents between 7 and 15 years old, from public schools in Caxias do Sul/RS. The study is composed of two phases: Phase I analyzed the prevalence of asthma in the delimited population investigating 1915 schoolchildren; Phase II quality of life questionnaires, asthma control and classification (for the asthmatic group), physical activity, school performance, pulmonary function tests and anthropometric measures were applied to 266 asthmatics and 288 controls.
ResultsThe estimated prevalence of asthma was 16.1%. In the comparison between asthmatics and nonasthmatics premature birth (p <0.001) and diagnosis of another chronic disease at birth (p <0.001) were found. Regarding pulmonary function, significant differences were found in the values between groups in FEV1, FEV1/FVC and forced expiratory flow in the 25 and 75% moments (FEF25‐75%), being that asthmatics presented lower values. Among asthmatics, 133 (50.8%) did not have the disease controlled. In the anthropometric variables, significant differences were observed, with higher values in controls, in the waist‐to‐height ratio (p=0.009) and in the perception of health (p <0.001). Quality of life is lower in asthmatics in the physical well‐being domain (p=0.001) and in the total score (p=0.016). The total school performance score did not present a statistically significant difference between the study groups.
ConclusionThe prevalence of asthma is similar to that of other industrialized urban centers and may negatively affect some areas of the development of schoolchildren.
Analisar a prevalência e o impacto da asma em escolares do município de Caxias do Sul‐RS.
MétodosEstudo analítico observacional transversal e caso‐controle, com crianças e adolescentes entre sete e 15 anos, de escolas da rede pública de Caxias do Sul‐RS. O estudo é composto por duas fases: Fase I analisou a prevalência da asma na população delimitada e investigou 1.915 escolares; Fase II foram aplicados a 266 asmáticos e 288 controles, questionários de qualidade de vida, classificação e controle da asma (para o grupo asmático), atividade física, desempenho escolar, espirometria e antropometria.
ResultadosA prevalência de asma estimada foi de 16,1%. Na comparação entre asmáticos e não asmáticos foram encontradas diferenças na prematuridade (p<0,001) e ter diagnóstico de outra doença crônica ao nascer (p<0,001). Na espirometria foram encontradas diferenças significativas entre os grupos nos valores de VEF1, VEF1/CVF e fluxo expiratório forçado nos momentos 25 e 75% (FEF25‐75%); os asmáticos apresentaram valores inferiores. Entre os asmáticos, 133 (50,8%) não tem a doença controlada. Nas variáveis antropométricas foram observadas diferenças significativas, com valores superiores entre os controles, na classificação razão cintura/estatura (p=0,009) e na percepção da própria saúde (p<0,001). A qualidade de vida é menor nos asmáticos no domínio bem estar físico (p=0,001) e no escore total (p=0,016). O escore total do desempenho escolar não apresentou diferença estatisticamente significativa entre os grupos de estudo.
ConclusãoA prevalência de asma se assemelha à de outros centros urbanos industrializados e pode impactar negativamente alguns domínios do desenvolvimento dos escolares.
A asma é um sério problema de saúde global que afeta todos os grupos etários. Sua prevalência tem aumentado em muitos países, especialmente entre as crianças,1 é considerada a principal doença respiratória crônica da infância, resulta em importante comprometimento da qualidade de vida tanto dos pacientes quanto dos seus parentes, com elevados custos diretos e indiretos para a sociedade. Em um estudo brasileiro foram encontradas prevalências de asma em crianças e adolescentes iguais a 24,3% e 19%, respectivamente.2 No mesmo estudo as taxas de prevalência de asma e doenças alérgicas mais elevadas foram observadas nos centros das regiões norte e nordeste, exceção feita à de asma, que também foi observada na região sul.
A asma é caracterizada pelo histórico de sintomas respiratórios, como sibilos, falta de ar, aperto no peito e tosse, que variam com o tempo e a intensidade, juntamente com a limitação variável do fluxo aéreo expiratório. Crianças com sintomas respiratórios de asma apresentam função pulmonar prejudicada, por consequência podem ser mais suscetíveis a fatores ambientais e apresentar um risco aumentado de função pulmonar declinante na vida adulta.3 De acordo com a Global Initiative for Asthma (GINA), a asma deve ser classificada em bem controlada, parcialmente controlada e não controlada, com base na avaliação de sintomas. Dessa forma, o paciente com asma controlada deve estar livre de sintomas diurnos, despertares noturnos, necessidade de medicação de resgate e limitação de atividades diárias e a prática de atividades física.1 As doenças crônicas costumam interferir na qualidade de vida das pessoas de forma substancial. No entanto, as características individuais e os estilos de vida diferentes fazem com que o impacto proporcionado pelas doenças seja diverso e muitas vezes não se correlacione com a gravidade ou prognóstico da doença propriamente dita.4
Estudos comparativos de níveis de atividade física entre jovens asmáticos e não asmáticos não apresentam resultados similares. No entanto, os níveis mais elevados de atividade estão associados a um maior relato de asma ou sintomas relacionados.5 A prática da atividade física por indivíduos asmáticos, quando feita com intensidade e duração adequadas, melhora a capacidade física e diminui a dispneia. Além disso, pode resultar na melhoria da administração e do uso de medicação, na diminuição da gravidade do broncoespasmo induzido pelo exercício, com consequente melhoria da qualidade de vida.6
Outro fator relacionado à asma é o rendimento escolar, muitas crianças com asma faltam às aulas por causa das crises, o que prejudica seu desempenho escolar.6 Ainda no contexto escolar, as atividades que envolvem interação social com colegas, como brincadeiras que exijam esforço físico, também tendem a ser evitadas por crianças com asma e, a depender do modo como os professores abordam as limitações do asmático, ele pode vir a sentir‐se socialmente excluído.7 Nesse enquadramento, o presente estudo investigou a prevalência e o impacto da asma escolares do município de Caxias do Sul‐RS.
MétodosEstudo composto dor duas fases, a primeira observacional descritiva (transversal) e a segunda observacional analítica (caso‐controle).
Deste estudo participaram crianças e adolescentes regularmente matriculados no Ensino Fundamental da rede municipal de ensino de Caxias do Sul/RS. Como critérios de inclusão foram definidos escolares entre 7‐16 anos, de ambos os sexos, com o diagnóstico de asma (casos) e sem diagnóstico de asma e previamente hígidas (controles). Foram excluídos escolares com limitações cognitivas, motoras ou com outras doenças crônicas que pudessem comprometer a avaliação da asma ou da qualidade de vida.
Na Fase I do estudo, na qual o objetivo foi investigar a prevalência da asma e caracterizar economicamente a amostra, os pais ou responsáveis legais responderam o questionário escrito padrão (QE), que corresponde à primeira parte do questionário escrito do International Study of Asthma and Allergies in Childhood (ISAAC)8 e o questionário de classificação econômica que usa o Critério de Classificação Econômica do Brasil (CCEB).9
Na Fase II, na qual o objetivo foi investigar o impacto da asma, os instrumentos usados foram: para avaliar a qualidade de vida relacionada à saúde foi aplicado o questionário KINDL (Kinder Lebensqualität Fragebogen) QV‐Genérico.10 O questionário é composto de 24 perguntas que abrangem seis dimensões da qualidade de vida: bem‐estar físico, bem‐estar emocional, autoestima, família, amigos e rotina escolar. Complementando a mensuração dos dados relativos à qualidade de vida, as crianças/adolescentes com diagnóstico de asma responderam um questionário específico sobre qualidade de vida relacionada à asma. O KINDL QV‐Específico, validado no Brasil,11 é composto por 15 perguntas dirigidas a qualidade de vida dos pacientes em relação à doença referentes à semana antecedente à entrevista. Para investigar o controle da asma foram aplicados os questionários de controle da asma Asthma Control Test (ACT).12
Na avaliação da função pulmonar, os procedimentos técnicos e os critérios de aceitabilidade e reprodutibilidade para a feitura dos exames de função pulmonar seguiram as diretrizes da American Thoracic Societ– European Respiratory SocietyATS/ERS.13 O espirômetro usado foi o modelo KoKo® e software próprio. As avaliações foram feitas em campo, por dois pesquisadores treinados e capacitados para fazer as mensurações. Para fins de referência dos valores em litros para percentual do predito, foram usados os valores referenciais do Consenso Brasileiro sobre Espirometria.14
As crianças responderam o Physical Activity Questionnaire for Children (PAQ‐C) e os adolescentes o Physical Activity Questionnaire for Adolescents (PAQ‐A), que identificam o nível de atividade física. O instrumento investiga atividades físicas moderadas e intensas nos sete dias anteriores ao preenchimento. Esse questionário é composto de nove questões sobre a prática de esportes e jogos, atividades físicas na escola e lazer. Cada questão tem valor de 1 (não praticou atividade) a 5 (praticou todos os dias da semana) e o escore final é a média das questões.15
Para as medidas antropométricas os procedimentos foram: a massa corporal foi obtida com uma balança digital (G‐Tech, Glass 1 FW, Rio de Janeiro, Brasil), com precisão de 100 gramas; a estatura, com um estadiômetro portátil (AlturaExata, TBW, São Paulo, Brasil), com precisão de 1mm; para a circunferência da cintura, foi usada uma fita métrica, a mensuração foi feita no ponto‐médio entre a costela inferior e a crista ilíaca. A partir dessas aferições, o índice de massa corporal (IMC) foi calculado pela divisão da massa corporal (kg) pela estatura2(m) e a classificação pelo percentil para idade, segundo a distribuição de referência do Centers of Disease Control and Prevention (CDC).16 A relação cintura/estatura foi obtida com a divisão da circunferência da cintura (cm) pela medida da estatura (cm). Foi usado como ponto de corte um valor de razão cintura/estatura ≤ 0,50 para baixo risco coronariano e ≥ 0,51 para alto risco.17
Na avaliação do desempenho escolar foi usado o Teste de Desempenho Escolar – TDE,18 um instrumento que busca oferecer de forma objetiva uma avaliação das capacidades fundamentais para o desempenho escolar, mais especificamente da escrita, aritmética e leitura. Indica, de uma maneira abrangente, quais as áreas da aprendizagem escolar que estão preservadas ou prejudicadas no examinando.
Na análise descritiva, os dados categóricos foram apresentados por frequências absolutas e relativas. Já as variáveis contínuas, por média e desvio‐padrão. Para fins de teste de normalidade, foi aplicado o teste de Shapiro‐Wilk. Na análise inferencial, as variáveis contínuas foram analisadas pelo teste de Mann‐Whitney e as variáveis categóricas pelo teste de qui‐quadrado. Todas as análises foram feitas com o programa IMB‐SPSS (International Business Machines – Statistical Product and Service Solutions), versão 20. As diferenças foram consideradas significativas para um p ≤ 0,05.
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Caxias do Sul (CEP‐UCS), sob parecer consubstanciado n° 1.453.525. Os responsáveis assinaram o Termo de Consentimento Livre Esclarecido e as crianças e adolescentes o termo de Assentimento Livre Esclarecido.
ResultadosNa Fase I do estudo participaram 1.915 escolares e na Fase II, 554 (266 asmáticos e 288 controles). A taxa de adesão foi de 83% (1.915/2.307), com prevalência de asma estimada em 16,1% (309/1.915), segundo critérios estabelecidos pelo protocolo ISAAC, no qual 920 (48%) escolares apresentaram chiado no peito e 700 (36,6%) tiveram confirmação de diagnóstico médico de asma alguma vez na vida e nos últimos 12 meses 372 (19,4%) apresentaram chiado no peito. Além disso, 444 (23,2%) escolares relataram ter usado medicação para a doença ao menos uma vez nos últimos 12 meses.
Dos 1.915 escolares avaliados nessa fase, 953 (49,8%) são do sexo masculino, com média de 10,77±2,55 anos. Para fins de classificação econômica e escolaridade dos responsáveis, 1.833 (95,7%) pertencem às classes B e C e 852 (44,5%) têm ensino médio completo.
Na comparação entre os grupos (asmáticos e controles) os resultados foram significativamente maiores dos asmáticos nas variáveis idade (p=0,041), prematuridade ao nascimento (p<0,001) e ter diagnóstico de outra doença crônica ao nascer (p<0,001), conforme apresentado na tabela 1.
Avaliação da classificação entre os grupos de asmáticos (n=309) e controles (n=1.606) na Fase I do estudo
Asmáticos n (%) | Controles n (%) | p | |
---|---|---|---|
Classificação dos escolares | |||
Sexo, masculino (%) | 145 (46,9) | 808 (50,3) | 0,29 |
Idade, em anos (M±DP) | 10,5±2,5 | 10,8±2,6 | 0,04 |
Prematuridade ao nascimento | 50 (16,2) | 134 (8,3) | <0,001 |
Outra doença crônica (rinite, atopia, TDAH) | 66 (21,4) | 109 (6,8) | <0,001 |
Classificação dos responsáveis | |||
Escolaridade responsável | |||
Ensino básico | 28 (9,0) | 204 (12,8) | 0,38 |
Ensino fundamental | 113 (36,6) | 533 (33,2) | |
Ensino médio | 138 (44,7) | 714 (44,5) | |
Ensino superior | 30 (9,7) | 155 (9,7) | |
Classificação econômica | |||
Classe A | 2 (0,6) | 18 (1,1) | 0,93 |
Classe B | 147 (47,6) | 773 (48,1) | |
Classe C | 149 (48,2) | 764 (47,6) | |
Classe D | 10 (3,2) | 48 (3,0) | |
Classe E | 1 (0,3) | 3 (0,2) |
M±DP, média e desvio‐padrão; testes aplicados: qui‐quadrado e Mann‐Whitney.
Na Fase II do estudo, do total de sujeitos elegíveis, 554 (28,9%) escolares fizeram parte da amostra, 266 (48%) asmáticos, 283 (51,1%) do sexo masculino e com média de 10,8±2,4 anos (10,7±2,3 asmáticos e 10,9±2,4 controles, p=0,264). Entre os 262 asmáticos que responderam o questionário sobre o controle da doença, 129 (49,2%) afirmaram tê‐la controlada e 133 (50,8%) como não controlada.
Em relação à função pulmonar (tabela 2), foram encontradas diferenças significativas entre os grupos nos valores de VEF1, VEF1/CVF e fluxo expiratório forçado nos momentos 25 e 75% (FEF25‐75%). Demonstrou‐se que os asmáticos apresentam função pulmonar menor quando comparados com os controles. Além disso, os asmáticos apresentam percentuais de resposta ao broncodilatador acima dos controles.
Comparação entre os volumes e capacidades pulmonares entre os estudantes asmáticos (n=266) e controles (n=288)
Asmáticos | Controles | p | |
---|---|---|---|
M±DP | M±DP | ||
Pré‐BD (% predito) | |||
VEF1 | 107,2±18,8 | 113,9±17,4 | <0,001 |
CVF | 107,8±17,1 | 110,5±17,1 | 0,09 |
VEF1/CVF | 99,1±18,4 | 102,3±8,3 | <0,001 |
FEF25‐75% | 103,2±28,1 | 119,7±26,7 | <0,001 |
Pós‐BD (% predito) | |||
VEF1 | 111,8±15,9 | 117,3±18,3 | <0,001 |
CVF | 109,6±15,4 | 112,3±17,0 | 0,06 |
VEF1/CVF | 101,1±7,5 | 103,5±7,5 | <0,001 |
FEF25‐75% | 114,6±27,4 | 127,5±28,7 | <0,001 |
Diferença entre Pré e Pós‐BD | |||
VEF1 | 4,5±13,3 | 3,4±8,8 | 0,013 |
CVF | 1,8±9,5 | 1,8±6,3 | 0,27 |
VEF1/CVF | 2,0±16,2 | 1,3±7,7 | 0,002 |
FEF25‐75% | 11,3±17,1 | 7,9±17,9 | 0,024 |
BD, broncodilatador; CVF, capacidade vital forçada; FEF25‐75%, fluxo expiratório forçado nos momentos 25 e 75%; M±DP, média e desvio‐padrão; usado o teste de Mann‐Whitney; VEF1, volume expiratório forçado no primeiro segundo.
Na análise dos dados referentes ao perfil antropométrico (tabela 3), dos 266 asmáticos, 25,9% e dos 288 controles, 23,6% apresentaram sobrepeso/obesidade, teve‐se como base o índice de massa corporal (IMC). Na razão cintura/estatura, 31,6% e 21,2%, respectivamente, apresentaram alto risco coronariano. Diferenças significativas relacionadas à doença somente foram encontradas na variável razão cintura/estatura (p=0,009). Para a atividade física, a média semanal de tempo de tela dos 266 asmáticos foi de 32,2 horas diante de televisão, videogame e/ou computador. Já entre os 288 controles, o total semanal foi de 29,4 horas. Com isso, 79,7% e 74,3% dos avaliados, respectivamente, apresentaram risco de sedentarismo. Esse dado foi confirmado, em partes, pois mais da metade dos asmáticos 146 (54,9%) e 49% (141) dos não asmáticos foram classificados como sedentários com base na quantidade de minutos de atividade física semanal. Mesmo assim, a grande maioria percebe a sua saúde como boa ou muito boa (63,5% dos asmáticos e 65,6% dos controles), com diferenças estatísticas entre os grupos quanto sua percepção de saúde (p<0,001).
Avaliação antropométrica e níveis de atividade física dos asmáticos (n=266) e controles (n=288)
Asmáticos | Controles | p‐valor | |
---|---|---|---|
N (%) | N (%) | ||
Massa corporal, kg (M±DP) | 43,3±14,9 | 42,5±14,8 | 0,43 |
Estatura, cm (M±DP) | 145,0±14,7 | 145,6±14,0 | 0,57 |
Cintura, cm (M±DP) | 70,0±12,2 | 68,6±12,2 | 0,19 |
Índice de massa corporal (M±DP) | 20,1±4,5 | 19,5±4,0 | 0,11 |
Razão cintura/estatura (M±DP) | 0,48±0,08 | 0,47±0,07 | 0,11 |
Classificação IMC | |||
Eutrófico | 194 (72,9) | 211 (73,3) | 0,49 |
Sobrepeso | 48 (18) | 55 (19,1) | |
Obeso | 21 (7,9) | 13 (4,5) | |
Classificação razão cintura/estatura | |||
Baixo risco coronariano | 179 (67,3) | 218 (75,7) | 0,009 |
Alto risco coronariano | 84 (31,6) | 61 (21,2) | |
Total minutos de atividades (M±DP) | 212,6±274,5 | 236,0±309,6 | 0,10 |
Classificação do nível de atividade física | |||
Fisicamente ativo | 73 (27,4) | 82 (28,5) | 0,29 |
Parcialmente ativo | 47 (17,7) | 65 (22,6) | |
Sedentarismo | 146 (54,9) | 141 (49) | |
Tempo total frente a telas (M±DP) | 4,6±3,2 | 4,2±3,2 | 0,129 |
Classificação total frente a telas | |||
<2h/dia – Sem risco de sedentarismo | 54 (20,3) | 74 (25,7) | 0,158 |
>2h/dia – Risco de sedentarismo | 212 (79,7) | 214 (74,3) | |
Percepção da saúde | |||
Ruim | 7 (2,6) | 3 (1,0) | |
Regular | 68 (25,6) | 45 (15,6) | |
Boa | 128 (48,1) | 134 (46,5) | <0,001 |
Muito boa | 41 (15,4) | 55 (19,1) | |
Excelente | 18 (6,8) | 38 (13,2) |
M±DP, média e desvio‐padrão; testes aplicados, qui‐quadrado e Mann‐Whitney.
Na figura 1 são apresentadas as médias do escore nos domínios avaliados de qualidade de vida relacionada à saúde (QVRS) entre os grupos estudados. O grupo de asmáticos apresentou diferença estatisticamente significativa nos domínios bem‐estar físico (p=0,001) e no escore total de qualidade de vida (p=0,016) quando comparado com o grupo controle.
Quanto à qualidade de vida relacionada à doença, o escore total do módulo asma foi de 78,5±15,5 pontos, demonstrou‐se que a asma não interfere na qualidade de vida das crianças asmáticas, pois apresenta valores clinicamente dentro dos padrões aceitáveis (> 70% do escore total).
Na avaliação do desempenho escolar não foram encontradas diferenças significativas entre os grupos (p=0,64). Porém os asmáticos obtiveram pontuação inferior em todos os testes. Os asmáticos obtiveram média de 107,2±27,0 pontos no escore total (valor máximo possível 143 pontos) e os controles, 109,5±23,0 pontos. Especificamente nos subtestes, os valores encontrados foram: na escrita 25,6±8,6 e 26,4±7,6 (valor máximo possível de 35 pontos); na aritmética, 18,0±8,0 e 18,4±7,5 (valor máximo possível 38 pontos); e na leitura, 63,5±14,0 e 64,2±11,3 (valor máximo possível 70 pontos), para asmáticos e controles, respectivamente.
DiscussãoEste estudo se propôs a avaliar a prevalência de asma em crianças/adolescentes de um centro urbano industrializado da Serra Gaúcha. Como resultado principal pudemos constatar que 16,1% dos escolares avaliados foram identificados como asmáticos; entre esses mais da metade tem a doença não controlada. Em relação ao impacto da asma no desenvolvimento dos escolares, foram constatados impactos significativos na função pulmonar, na razão cintura/estatura, na qualidade de vida e na percepção da própria saúde.
Em relação à prevalência, no presente estudo a asma se apresenta levemente inferior (16,1%) a outros estudos feitos com escolares de todo o Brasil19 e com escolares de Porto Alegre/RS.20 Em um estudo transversal feito em 2012 com amostra que envolveu as cinco regiões, 26 capitais de estado e o Distrito Federal (n=109.104), a prevalência de sintomas da asma foi de 23,2%.19 Em outro estudo com escolares da capital do Rio Grande do Sul (n=2.500) a prevalência foi de 28,2%.20 Importante ressaltar que em todos os estudos apresentados foram usados os mesmos critérios de diagnóstico da doença. Fatores ambientais são a chave para explicar as variações e mudanças na prevalência de asma.21 Em relação ao controle da doença, a prevalência de 50,9% de asmáticos com asma não controlada deste estudo se assemelha à encontrada em Porto Alegre/RS.20
O desenvolvimento da função pulmonar em crianças com asma persistente é menos favorável do que o observado na população não asmática. Porém, estudos indicam que a asma mais grave pode estar associada a um declínio superior na função pulmonar, enquanto que a asma mais leve pode estar associada a taxas quase normais de declínio da função pulmonar.22 Outro fator relacionado à prevalência da asma e função pulmonar reduzida é a prematuridade ao nascer. Neste estudo a prevalência de prematuridade foi praticamente o dobro entre os asmáticos comparados com os não asmáticos. Uma metanálise com 24.938 crianças demostrou que crianças nascidas com idade gestacional inferior apresentaram valores reduzidos de VEF1, VEF1/CVF e fluxo expiratório forçado no momento 75% (FEF75%).23
Em relação ao nível de atividade física, a prevalência de sedentarismo e quantidade de horas diante de telas é elevada nos dois grupos investigados. Comportamento semelhante foi encontrado em estudo que comparou o nível de atividade física de 155 crianças asmáticas e 158 controles em Portugal.24 O estudo concluiu que apesar de os pais de crianças asmáticas afirmarem que a doença dos seus filhos seja uma barreira à atividade física, não parece haver diferenças entre o nível de atividade física das crianças asmáticas controladas e dos seus pares. Além disso, o total de horas diante de telas dos escolares asmáticos se comparou ao tempo dos escolares sem a doença. Em estudo feito no município de João Pessoa/PA, uma prevalência de tempo excessivo de tela de 79,5% foi encontrada entre 2.874 adolescentes. Contudo, o estudo não encontrou associação entre o tempo excessivo de tela e o nível de atividade física e o estado nutricional.25
A prevalência de sobrepeso e obesidade na infância aumentou substancialmente em todo o mundo em menos de uma geração. No Brasil esse valor subiu de 15% em 2002 para 25% em 2010.26 Neste estudo foram observados percentuais semelhantes de sobrepeso/obesidade entre asmáticos e controles (25,9 e 23,6%, respectivamente). Em escolares de Porto Alegre também não foram encontradas diferenças significativas entres os grupos de estudo, porém os percentuais foram superiores aos deste estudo (34,8 e 32,7%, respectivamente).20 Por outro lado, foram observadas diferenças significativas entre os grupos de estudo na gordura abdominal, avaliada pela razão cintura/estatura (p=0,009). Estudo feito com escolares de seis a 12 anos na Bahia sugere que um aumento nos depósitos de gordura, seja na região abdominal ou em outra parte do corpo, aumenta o risco de chiado no peito.27
A asma demonstrou afetar a qualidade de vida relacionada à saúde dos asmáticos, especificamente no domínio bem‐estar físico e também no escore total. Esses achados são semelhantes aos encontrados em uma amostra de 480 escolares de uma cidade no interior do Rio Grande do Sul, na qual o grupo com asma demonstrou pior escore nos domínios bem‐estar físico (p ˂ 0,001) e no escore total de qualidade de vida (p=0,025) quando comparado com o grupo controle.28 Em uma amostra na capital do Rio Grande do Sul os 290 asmáticos apresentaram pontuação inferior aos 315 controles no domínio bem‐estar físico (p ˂ 0,001) além de diferenças significativas no bem‐estar emocional e autoestima.20
O desempenho escolar dos asmáticos foi inferior ao desempenho dos escolares do grupo controle, porém as diferenças não foram significativas. Um estudo com crianças e adolescentes de Maceió/AL comparou o desempenho escolar de 188 asmáticos e 213 controles e concluiu que a asma não interferiu no desempenho escolar, avaliado por média de todas as notas do primeiro semestre escolar.29 Outro estudo que corrobora o presente resultado indicou não haver diferenças significativas no desempenho entre asmáticos e não asmáticos em 3.812 escolares americanos entre oito e 17 anos. Porém, escolares com asma persistente apresentaram valores inferiores de rendimento em comparação com os asmáticos com asma leve. O mesmo estudo encontrou correlação inversa significativa entre absenteísmo e desempenho escolar (p ˂ 0,001). Isso levou os autores a concluir que a gravidade da asma, um dos principais determinantes do absenteísmo, pode ser um fator importante para diminuir o desempenho escolar.30
Mesmo que os resultados não comprovem o impacto negativo da asma em todas as variáveis estudadas, é importante aprofundar os estudos que envolvem o tema a fim de identificar outras relações entre elas. Por fim, características do nível de atividade física, horas diante de tela, perfil antropométrico e desempenho escolar precisam ser observados pelos profissionais da escola, saúde e parentes, deve‐se desenvolver um trabalho coletivo, que favoreça uma melhor qualidade de vida dos escolares não asmáticos, mas principalmente dos que têm asma.
Algumas limitações do estudo estão relacionadas ao fato de a investigação do impacto da asma ter sido limitada a levantar informações junto às crianças e aos adolescentes. Com isso, não foram identificadas informações mais precisas com relação ao controle da doença, consultas médicas, internações, absenteísmo escolar, tratamento e qualidade de vida, que os pais ou responsáveis poderiam fornecer.
FinanciamentoCoordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
Conflitos de interesseOs autores declaram não haver conflitos de interesse.
Como citar este artigo: Zacaron D, Roncada C, Molin RS, Jones MH, Pitrez PC. Prevalence and impact of asthma in schoolchildren in the city of Caxias do Sul-RS. J Pediatr (Rio J). 2020;96:479–86.