To review the association between intimate partner violence and breastfeeding practices in the literature.
Data sourcesThe search was carried out in five databases, including MEDLINE, LILACS, SCOPUS, PsycoINFO, and Science Direct. The search strategy was carried out in February 2017. The authors included original studies with observational design, which investigated forms of intimate partner violence (including emotional, physical, and/or sexual) and breastfeeding practices. The quality of the studies was assessed based on the bias susceptibility through criteria specifically developed for this review.
Summary of dataThe study included 12 original articles (10 cross‐sectional, one case‐control, and one cohort study) carried out in different countries. The forms of intimate partner violence observed were emotional, physical, and/or sexual. Breastfeeding was investigated by different tools and only assessed children between 2 days and 6 months of life. Of the 12 studies included in this review, eight found a lower breastfeeding intention, breastfeeding initiation, and exclusive breastfeeding during the first six months of the child's life, and a higher likelihood of early termination of exclusive breastfeeding among women living at home where violence was present. The quality varied between the studies and six were classified as having low bias susceptibility based on the assessed items.
ConclusionsIntimate partner violence is associated with inadequate breastfeeding practices of children aged 2 days to 6 months of life.
Revisar na literatura a associação da violência entre parceiros íntimos e as práticas de aleitamento materno.
Fontes dos dadosForam utilizadas para as buscas cinco bases de dados, incluindo o MEDLINE, LILACS, SCOPUS, PsycoINFO e Science Direct. A estratégia de busca foi realizada em fevereiro de 2017. Foram incluídos estudos originais com desenho observacional, os quais investigaram formas de violência entre parceiros íntimos: emocional, física e/ou sexual e as práticas de aleitamento materno. A qualidade dos estudos foi avaliada a partir da susceptibilidade a vieses por critérios especificamente desenvolvidos para esta revisão.
Síntese dos dadosForam incluídos 12 artigos originais (10 seccionais, 1 caso‐controle e 1 coorte) realizados em diferentes países. As formas de violência entre parceiros íntimos observadas foram emocional, física e/ou sexual. O aleitamento materno investigado nos estudos se fez por diferentes instrumentos e avaliaram apenas crianças entre dois dias e seis meses. Dos doze estudos incluídos nesta revisão, oito encontraram menor chance de intenção de amamentar, menor chance de iniciação ao aleitamento materno e de amamentação exclusiva durante os primeiros seis meses de vida da criança e maior probabilidade de interrupção precoce do aleitamento materno exclusivo entre as mulheres que viviam em domicílios onde a violência estava presente. A qualidade variou entre os estudos e seis foram classificados apresentando baixa suscetibilidade ao viés a partir dos itens julgados.
ConclusõesA violência entre parceiros íntimos está relacionada às práticas inadequadas de aleitamento materno de crianças entre dois dias e seis meses.
O leite materno é comprovadamente o alimento ideal para o crescimento e o desenvolvimento saudável das crianças.1,2 A Organização Mundial de Saúde (OMS), o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e o Ministério da Saúde recomendam o início precoce da amamentação dentro de uma hora após o nascimento, que as crianças recebam exclusivamente o leite materno durante os primeiros seis meses e que o aleitamento materno seja complementado por outros alimentos até os dois anos ou mais.2,3
O aleitamento materno adequado é tão decisivo que poderia evitar a morte de mais de 800.000 crianças menores de cinco anos por ano. No entanto, dados mostram que não mais do que 37% das crianças em todo o mundo são amamentadas exclusivamente durante os primeiros seis meses.4,5 Ainda, a longa duração da amamentação também contribui para a saúde e o bem‐estar das mães, reduz o risco de câncer de ovário e de mama e ajuda a evitar uma gravidez nesse período.5
A literatura destaca as consequências imediatas e as de longo prazo relacionadas à interrupção precoce do aleitamento materno exclusivo e à curta duração do aleitamento materno. Essas práticas inadequadas podem estar associadas ao sobrepeso e à obesidade na infância e também ao baixo peso em crianças menores de cinco anos, uma das principais causas de morte no mundo.2,6–8
As práticas de aleitamento materno (PAM), tais como a decisão de iniciar ou não a amamentação, ofertar o leite materno ou alimentar com fórmulas infantis, assim como o tempo de sua duração, podem ser influenciadas por muitos fatores, como o peso ao nascer; a idade materna; o nível de escolaridade; o status socioeconômico; a renda; o estresse e os sintomas depressivos maternos; o apoio social; a rede social; os estilos de alimentação dos pais e o próprio ambiente em que se vive.9–12
Estudos mostram ainda que, em ambientes domésticos violentos, a qualidade da maternagem e a habilidade de ambos os pais de lidar com as necessidades da criança são comprometidas.13–15 Consequentemente, a capacidade de cuidados com a alimentação da criança também é afetada.
A violência entre parceiros íntimos (VPI) é definida como o uso intencional de força física, abuso emocional e sexual ou uso de poder contra um parceiro íntimo e vem sendo apontada em recentes estudos como mais um fator associado às práticas inadequadas de aleitamento materno.16,l7
A literatura sobre o tema ainda é escassa e os resultados das investigações são contraditórios. Alguns estudos mostram que há associação entre VPI e aleitamento materno, já outros não encontram associações estatisticamente significativas.16–19 Problemas nas metodologias empregadas nos estudos podem ser uma explicação para esses resultados discrepantes. No entanto, para um melhor entendimento da relação entre VPI e amamentação e para a implantação de novas pesquisas, é preciso aprofundar o conhecimento desse fenômeno.19–22
Assim, o objetivo desta revisão sistemática foi avaliar evidências existentes sobre a associação da violência entre parceiros íntimos e as práticas do aleitamento materno durante o primeiro ano de vida da criança.
MétodoEste estudo foi baseado no Guidelines for Meta‐Analyses and Systematic Reviews of Observational Studies (Moose) e os procedimentos para revisões sistemáticas pelo Systematic Reviews by the Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta‐Analyses (Prisma).23,24 Esta revisão não está registrada em qualquer base de dados de revisão sistemática.
Critério de elegibilidadeOs trabalhos incluídos nesta revisão foram limitados a estudos observacionais originais que avaliaram a associação entre VPI e as PAM. Artigos que se concentraram em grupos populacionais especiais, como aqueles com HIV e transtornos alimentares, não foram incluídos nesta revisão. Foram excluídos trabalhos que não avaliassem, por medidas de associação, a associação da VPI e as PAM.
Definição e mensuração da exposição (VPI)Esta revisão considerou diferentes formas de VPI, inclusive a violência física; violência emocional; violência sexual ou qualquer combinação das três formas. Considerou a violência de um homem para uma mulher, bem como de uma mulher para um homem. Os períodos considerados para a mensuração da VPI foram: durante a gestação atual, durante gestações anteriores, no período pós‐parto, na relação atual, em relacionamentos anteriores, em qualquer momento da vida e/ou no ano anterior à entrevista.
Definição e mensuração do desfecho – Práticas de aleitamento materno (PAM)As práticas de aleitamento materno consideradas para esta revisão foram: intenção de amamentar, quando a mulher manifestou interesse em ofertar o leite materno ainda durante a gestação; início do aleitamento materno, ou seja, se a mãe ofereceu o leite materno no pós‐parto; aleitamento materno exclusivo, definido como somente a oferta de leite materno à criança; duração do aleitamento materno, expresso em dias ou meses em que o leite materno foi oferecido à criança; interrupção precoce do aleitamento materno exclusivo, quando, além do leite materno, outros líquidos e/ou alimentos são oferecidos a uma criança anteriormente aos seis meses; aleitamento materno predominante quando a criança recebe, além do leite materno, líquidos a base de água, tais como água, chás e sucos; e outras práticas relacionadas ao aleitamento materno investigadas pelos estudos.25
Estratégia de pesquisaForam usadas para as buscas cinco bases de dados, Medline, Lilacs, Scopus, PsycoINFO e Science Direct. A busca foi feita em fevereiro de 2017. Os MeSH Termos (domestic violence OR spouse abuse OR intimate partner violence) AND (breast feeding OR breastfeeding OR Milk, Human) foram combinados com filtros para estudos observacionais. Nenhuma restrição de idioma ou data para a inclusão foi aplicada.
Critérios de seleçãoApós a remoção de duplicatas, a seleção dos títulos e resumos foi feita por dois pesquisadores (MR e FM) de forma independente para avaliar registros completos, seguiu uma estratégia de pesquisa previamente estabelecida
Extração de dadosOs dados foram extraídos de forma independente por dois autores (MR e FM) com um formulário de coleta de dados de acordo com os critérios do Prisma.24 Os itens extraídos de cada artigo foram compilados em uma tabela no programa Excel (Microsoft®, WA, EUA) e incluíram país, ano de publicação, desenho do estudo, variáveis de exposição e de desfecho e instrumentos de coleta de dados.
Suscetibilidade a viesesA suscetibilidade a vieses foi avaliada com um formulário padrão para avaliação de estudos observacionais especificamente desenvolvido para esta revisão. Uma lista de itens individuais incluiu análise das PAM, análise da VPI e instrumentos para a mensuração da VPI e das PAM. Além desses, foram avaliados: controle por variáveis de confusão, critérios de elegibilidade para os participantes, critérios de inclusão e exclusão, tamanho da amostra, perdas e causalidade reversa para artigos seccionais. O formulário foi desenvolvido com base nos critérios do Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (Strobe)26 e na literatura, com o objetivo principal de avaliar a validade externa e interna dos diferentes tipos de estudos incluídos nesta revisão.
As respostas aos itens “sim” (+) ou “não” (‐) indicaram que as informações foram ou não consideradas, respectivamente; “parcialmente” (+/) foi considerado quando parte do critério foi cumprido e (?) foi usado quando a informação não era suficientemente clara.
ResultadosA pesquisa resultou em 239 artigos. Após a exclusão das duplicatas, foram selecionados 132 para a leitura dos títulos e resumos. Posteriormente, foram escolhidos 20 para leitura na totalidade. Foram identificados para inclusão na revisão 12 estudos.16–19,27–34 A figura 1 mostra o diagrama de fluxo do processo de seleção do estudo.
As características gerais dos artigos incluídos nesta revisão são apresentadas na tabela 1. Dos estudos incluídos na revisão final, dez foram de corte seccional,17–19,27–32,34 um de caso‐controle16 e apenas um estudo de coorte prospectiva.33 Os estudos foram publicados entre 2001 e 2017. A idade das crianças estudadas variou entre dois dias e seis meses. Quatro estudos foram feitos nos Estados Unidos, dois na Índia, dois no Brasil, um na China, um na Austrália, um em oito países da África (Quênia, Tanzânia, Gana, Libéria, Nigéria, Malawi, Zâmbia, Zimbabwe) e um em Bangladesh. O tamanho da amostra dos estudos variou de 212 a 118.579 participantes.
Características gerais dos estudos que avaliaram a relação da violência entre parceiros íntimos e as práticas de aleitamento materno
1° Autor Ano País do estudo | Amostra total (N) | Idade materna (anos) | Idade da criança | Desenho de estudo | VPI | PAM | ||||
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Exposição | Período avaliado | Instrumentos | Desfecho | Período avaliado | Instrumentos | |||||
Bullock16 2001 USA | 212 | 24,6±5,1 | NR | Caso‐controle | Experiência de violênciaa | NA | AAS Questões | Oferta de LM Duração da AM | 1° mês pós‐parto Número de meses em AM | Questionário com itens sobre AM |
Silverman17 2006 USA | 118.579 | < 20 20‐30 > 30 | < 4 semanas | Seccional | Física | 12 meses antes/durante e atual gestação | Questionário contendo 2 itens sobre VPI | Oferta de LM Ipame | Ofereceu ou não LM pós‐parto Até a 4ª semana pós‐parto | Questionário com itens sobre AM |
Lau18 2007 China | 1.200 | > 25 ≤ 25 | NR | Seccional | Experiência de violênciaa | Durante a gestação | AAS CTS‐2 | Oferta de LM | 2‐5 dias pós‐parto | Questionário com itens sobre métodos de alimentação |
Moraes19 2011 Brasil | 811 | 20‐35 | 5 meses | Seccional | Física grave | Durante a gestação | CTS‐2 | Ipame | Até 5° mês pós‐parto | Recordatório dos últimos 7 dias |
Shroff27 2011 Índia | 600 | 22,14±3,35 | 3,4±0,54 meses | Seccional | Experiência de violênciaa | Relação atual | 2 questões sobre experiência de VPI | Ipame | Até 4° mês pós‐parto | Questionário usado no Survey NFHS2 |
Sipsma28 2013 USA | 296 | 15‐21 | 6 meses | Seccional | Experiência de violênciaa | Relação atual | Questões sobre experiência de VPI | Intenção de amamentar Início da AM Duração do AM e AME | Durante a gestação Iniciou AM pós‐parto Número de semanas em AM e AME | Questionário sobre experiência e práticas de AM |
Sipsma29 2013 USA | 296 | 15‐21 | NR | Seccional | Experiência de violênciaa | Relação atual | Questões sobre experiência de VPI | Intenção de amamentar | Durante a gestação | Questões sobre a intenção de amamentar |
Zureick‐Brown30 2013 Índia | 3.552 | Média 24,4 | 3±1,7 meses | Seccional | Física/sexual | Durante a vida/Relação atual | CTS‐2 reduzida | Início precoce do AM Ipame | Uma hora pós‐parto Até 4° mês pós‐parto | Recordatório de 24 horas |
Mischb31 2014 África | Países africanos 4.822 | 15‐49 | < 6 meses | Seccional | Física, sexual, emocional | Durante a vida/Anos anteriores | CTS‐2 questões adaptadas | Início precoce do AM Ipame | Iniciou AM pós‐parto Até 6° mês pós‐parto | Questões sobre AM, outros líquidos e alimentos nas últimas 24 horas |
James32 2014 Austrália | 2.621 | 15‐35 ou+ | 3‐6 meses | Seccional | Experiência de violênciaa | NR | CAS | Oferta de LM Duração do AM | Ofertou LM no período Tempo total de AM | Questões sobre AM |
Hasselmann33 2016 Brasil | 564 | ≥ 20 e < 20 | 30‐60 dias | Coorte | Física e física grave | 2° mês de vida da criança | CTS‐1 | IPAME | 2 e 3 meses de vida | Recordatório de 24 horas |
Islam34 2017 Bangladesh | 426 | 15‐49 | ≤ 6 meses | Seccional | Física, sexual, emocional | Após o parto da relação atual | OMS | Duração do AME | Tempo total de AME | Recordatório de 24 horas da OMS |
AAS, Abuse Assessement Screen; AM, aleitamento materno; AME, aleitamento materno exclusivo; CAS, Composite Abuse Scale; CTS‐1, Conflict Tactics Scales; CTS‐2, The revised Conflict Tactics Scale – 2; Ipame, Interrupção precoce do aleitamento materno exclusivo; LM, leite materno; NA, não aplicado; NR, não reportado; OMS, Organização Mundial de Saúde; PAM, práticas de aleitamento materno; VPI, violência entre parceiros íntimos.
A VPI foi investigada de diferentes formas dentre os estudos. Seis estudos investigaram a violência física.17,19,30,31,33,34 Três, a violência sexual30,31,34 e dois avaliaram a violência emocional.31,34 Os sete restantes consideraram a experiência de violência, ou seja, ter sido vítima de agressão, seja ela física, sexual ou emocional.16,18,27–30,32 Somente um artigo abordou a mulher como perpetradora da violência.29
Entre os estudos incluídos na revisão, dois estudos analisaram a intenção de amamentar,28,29 dois examinaram o início da amamentação,18,31 três avaliaram a oferta do leite materno,16,17,32 oito analisaram o aleitamento materno exclusivo17,19,27,28,30,31,33,34 e dois examinaram a duração do aleitamento materno.16,28
Para avaliar as práticas de aleitamento materno, a maioria dos estudos (n=10) usou algum tipo de registro ou recordatório de consumo alimentar (tabela 1, coluna 11).
Associação entre VPI e PAMOs resultados globais desta revisão sistemática são apresentados na tabela 2. A VPI foi associada significativamente com: uma menor chance de intenção de amamentar em um estudo,29 a interrupção precoce do aleitamento materno exclusivo em seis estudos,19,28,30,31,33,34 menor chance de iniciar o aleitamento materno18,31 e com a curta duração do aleitamento materno.28 Resultados contraditórios foram observados em um estudo feito por Misch & Yount31 em diferentes países da África. A VPI física na Tanzânia e a VPI sexual na Zâmbia foram associadas com o início precoce do aleitamento materno (oferta do leite materno na primeira hora após o parto) (OR 0,47, p=0,042) e com maiores chances da prática do aleitamento materno exclusivo (OR 0,40, p=0,025), respectivamente (tabela 2, colunas 3 e 5).
Principais resultados de estudos que avaliaram a relação entre VPI e as práticas de aleitamento materno de crianças no primeiro ano de vida
Formas de VPI/ 1° Autor | PAM | ||||
---|---|---|---|---|---|
Intenção | Iniciaçãoa | Oferta do LMb | Ipame | Duração da amamentação | |
Violência físicag | |||||
Silverman17 | NA | NA | Não significantec | Não significantec | NA |
Misch31 | NA | Tanzânia,e RC: 0,47; p‐valor=0,042 Zimbabwe,e RC:2,5; p‐valor=0,002 Malawi,e RC: 0,11; p‐valor=0,013 Gana, Libéria, Zâmbia, Quênia, Nigéria,e Não significante | NA | Gana, Libéria, Zâmbia, Tanzânia, Quênia, Malawi, Nigériaf Não significante | NA |
Moraes19 | NA | NA | NA | RR: 1,30; IC 95% 1,01‐1,65 | NA |
Hasselmann33 | NA | NA | NA | RRh: 1,35; IC 95% 1,07‐1,71 | NA |
Islam34 | RC: 1,83; IC 95% 1,03‐1.60 | ||||
Violência física graveg | |||||
Hasselmann33 | NA | NA | NA | RPi: 1,32; IC 1,04‐1,67 RRj: 1,51 IC 1,16‐1,95 RRl: 2,10; IC 1,27‐3,48 | NA |
Violência sexualg | |||||
Misch31 | NA | Zâmbia,e RC: 2,38; p‐valor=0,017 Gana, Libéria, Tanzânia, Zimbabwe, Quênia, Malawi, Nigéria,f Não significante | NA | Gana,f RC: 5,88; p‐valor=0,033 Libéria,f RC: 11,11; p‐valor=0,026 Zâmbia,f RC: 0,40; p‐ valor=0,025 Tanzânia, Zimbabwe, Quênia, Malawi, Nigéria,f Não significante | NA |
Islam34 | RC: 1.68; IC 95% 1,20‐1.87 | ||||
Violência emocional/psicológicag | |||||
Misch31 | NA | Quênia,e RC: 1,85; p‐ valor=0,050 Gana, Libéria, Zâmbia, Tanzânia, Zimbawe, Malawi, Nigéria,e Não significante | NA | Gana, Libéria, Zâmbia, Tanzânia, Zimbawe, Quênia, Malawi, Nigéria,f Não significante | NA |
Islam34 | NA | 1.49; IC 95% 1.00‐1.74 |
Formas de VPI/ 1° Autor | PAM | ||||
---|---|---|---|---|---|
Intenção | Iniciaçãoa | Oferta do LMb | Ipame | Duração da amamentação | |
Violência física/sexualg | |||||
Zureick‐Brown30 | NA | NA | NA | RC: 0,74; IC 95% 0,58‐0,95 | |
Alguma experiência de violênciad,g | |||||
Bullock16 | NA | NA | Não significante | NA | Não significante |
Sipsma29 | RC: 0,37; IC 95% 0,16‐0,84 | NA | NA | NA | NA |
Sipsma28 | Não significante | NA | NA | RC: 3,29; IC 95% 1,81‐6,01 | RC: 1,77; IC 95% 1,21‐0,60 |
James32 | NA | NA | Não significante | NA | Não significante |
Lau18 | NA | RC: 1,84; IC 95% 1,16 ‐2,91 | NA | NA | NA |
Shroff27 | NA | NA | NA | Não significante | NA |
Zureick‐Brown30 | NA | NA | NA | RC: 0,78; IC 95% 0,62‐0,98 | NA |
IC 95%, intervalo de confiança 95%; Ipame, interrupção precoce do aleitamento materno exclusivo; LM, leite materno; NA, não aplicado; PAM, práticas de aleitamento materno; RC, razão de chances; RP, razão de prevalência; RR, risco relativo; VPI, violência entre parceiros íntimos.
Cinco estudos não observaram associação significativa entre VPI e PAM. A violência física não foi significativamente associada à oferta de leite materno, à iniciação do aleitamento materno e à interrupção precoce do aleitamento materno exclusivo;17,31 a violência emocional não foi associada ao início e à interrupção precoce da amamentação exclusiva 31 e a experiência de algum tipo de violência não foi associada à oferta de leite materno, à duração da amamentação e à interrupção precoce da amamentação exclusiva.16,27,32
Suscetibilidade a viesesA tabela 3 fornece uma descrição individual da suscetibilidade a vieses para cada estudo. Para a variável PAM, nove estudos descreveram como essa variável foi categorizada e analisada. Apenas seis estudos usaram o método recordatório de 24 horas para mencionar a oferta de leite materno, iniciação, interrupção precoce da amamentação exclusiva e/ou duração da amamentação.19,30,31,33,34
Avaliação da suscetibilidade a vieses
Desenhos de estudo Suscetibilidade a vieses | Caso‐controle | Coorte | Transversal | |||||||||
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Referência 1° autor | Bullock16 | Hasselmann33 | Silverman17 | Moraes19 | Zureick‐Brown30 | Lau18 | Shroff27 | Sipsma28 | Sipsma29 | Misch31 | James32 | Islam34 |
Variável PAM | + | + | +/‐ | + | + | + | + | + | + | + | +/‐ | + |
Variável VPI | + | + | ‐ | + | + | + | ‐ | + | + | + | ‐ | + |
Mensuração da PAM | +/‐ | + | ‐ | + | + | ‐ | + | ‐ | ‐ | + | ‐ | + |
Mensuração da VPI | +/‐ | + | ‐ | + | + | + | ‐ | ‐ | ‐ | +/‐ | + | + |
Controle de confusão | ‐ | + | + | + | ‐ | + | + | + | ‐ | + | + | + |
Validade externa | ‐ | ‐ | ‐ | +/‐ | + | + | ‐ | +/‐ | + | + | + | + |
Critérios de elegibilidade | + | ‐ | +/‐ | + | + | + | + | + | + | + | + | + |
Critérios de inclusão e exclusão | ? | + | ‐ | + | + | + | + | + | + | + | ‐ | ? |
Tamanho da amostra e perdas | ‐ | ‐ | ‐ | + | + | + | ‐ | ‐ | ‐ | + | ‐ | + |
Análises estatísticas | ‐ | + | + | + | + | + | + | + | +/‐ | + | + | + |
Relação causal | NA | NA | + | +/‐ | + | ‐ | ‐ | ‐ | ‐ | ‐ | ‐ | + |
PAM, práticas de aleitamento materno; VPI, violência entre parceiros íntimos; +, sim; ‐, não;+/‐, parcialmente; ?, não claro; NA, não aplicado.
Em relação à VPI, nove estudos mostraram claramente como a variável foi categorizada e as formas de violência abordadas separadamente.17,19,31–34 Para medir a VPI, seis estudos usaram instrumentos validados completos18,19,30,32–34 e dois usaram a CTS‐2 reduzida ou adaptada.30,31 Os outros demais estudos usaram medidas diferentes, por exemplo, fizeram perguntas relacionadas à variável violência17,27–29 (tabela 1, coluna 8).
Dos oito artigos que usaram um instrumento validado, seis encontraram uma associação significativa entre o VPI e as PAM.18,19,30,31,33,34
A qualidade variou entre os estudos e seis foram classificados como baixa suscetibilidade ao viés (cumpriram com 60% ou mais dos critérios estabelecidos) a partir dos itens julgados.18,19,30,31,33,34
DiscussãoEsta revisão apontou evidências de que a VPI está associada com PAM desfavoráveis, observada em oito dos 12 estudos incluídos. Resultados como a menor intenção de amamentar, baixa probabilidade de iniciação ao aleitamento materno e de amamentação exclusiva durante os primeiros seis meses de vida da criança e a maior chance de interrupção do aleitamento materno exclusivo estão presentes entre casais nos quais existe a violência física, sexual e/ou emocional. Os resultados do único estudo prospectivo mostram que os filhos de mulheres que sofreram violência física estavam em maior risco de interrupção precoce da amamentação exclusiva, tanto no segundo mês de vida como no mês seguinte, mesmo após o controle de possíveis fatores de confusão. No entanto, outros estudos não observaram associação significativa entre VPI e PAM. Além disso, no estudo de Misch & Yount (2014), a exposição materna à VPI relacionou‐se significativamente com o início da amamentação precoce e a amamentação exclusiva.
Conceitualmente, os possíveis caminhos dessas relações são complexos e ainda não estão totalmente estabelecidos. Com base na literatura, pode‐se especular sobre essas associações em ambas as direções. Por um lado, os caminhos de efetuação podem ser usados para explicar que a violência pode aumentar as chances de comportamentos de risco (abuso de álcool e drogas, por exemplo) e a probabilidade de um resultado adverso à saúde, inclusive práticas inadequadas de alimentação infantil.19,35 Ainda, a violência pode ter repercussões no estado emocional da mãe e, consequentemente, na sua disponibilidade para cuidar ou se relacionar com as crianças e interagir com elas – qualidade da maternidade.30,36 Além disso, Klingelhafer (2007)37 e Dignam (1995)38 sugerem que alguns parceiros acreditam que exista diferença na relação das suas esposas com eles e delas com a criança durante o período de amamentação. Os companheiros podem considerar os seios da mãe como pertencentes a eles e, portanto, não estão preparados para compartilhá‐los com o bebê.39 De acordo com Dignam (1995),38 a amamentação proporciona uma troca íntima entre mãe e filho, traz harmonia, proximidade emocional, pele sensível ao toque e reciprocidade. Essa relação acaba por excluir o parceiro que pode ver a criança como um concorrente da atenção da mulher, e assim, ele desencoraja a amamentação e assume uma atitude agressiva em relação à mãe e ao recém‐nascido. Por outro lado, Levandovsky et al. (2003)40 sugerem a possibilidade de uma “hipótese compensatória” sob a qual mulheres maltratadas tentam compensar a violência dando mais atenção e responsividade à criança. Na mesma direção, um estudo de Kelly (2009)41 com mães hispânicas residentes nos Estados Unidos mostrou que as mulheres maltratadas priorizam, protegem e cuidam de seus filhos em situações de violência.
Outros estudos mostram que o apoio dos parceiros durante a amamentação é um fator significativo no sucesso das mulheres com o aleitamento. No entanto, o apoio dos parceiros é menos provável de ocorrer em uma relação abusiva.42 As mulheres que durante os períodos pré‐natal e pós‐parto se sentem mais apoiadas pelos seus parceiros, têm mais confiança e autoestima e, portanto, são mais propensas a iniciar e manter a amamentação.28,29,31
Adiciona‐se a ausência de estudos que investigassem a violência perpetrada pelas mulheres. Exceto por um estudo, a violência entre parceiros íntimos foi investigada em algum momento da vida da mulher, no relacionamento anterior ou atual e/ou durante gestação e suas consequências nas PAM, observou‐se, por tanto, uma lacuna sobre o conhecimento desse aspecto no que diz respeito ao comportamento da mulher como perpetradora da violência e suas implicações.
Em geral, quanto à susceptibilidade a vieses, quatro estudos receberam uma avaliação negativa, o que pode afetar a validade dos resultados desses estudos. Esses possíveis vieses incluem o uso de ferramentas para identificar as práticas de aleitamento materno, as categorias de violência emocional com análise física e sexual em conjunto, o uso de instrumentos não validados para medir a exposição e o desfecho e o ajuste da análise sem considerar variáveis de confusão relacionadas à exposição e ao desfecho.
A maioria dos estudos incluídos na presente revisão mediu as PAM através de recordatórios de 24 horas (medição circunstancial). Nessa perspectiva, pode ser inapropriado avaliar, por exemplo, a duração do aleitamento materno exclusivo, uma vez que esse método se destina a fornecer um cenário de práticas atuais. Assim como, em estudo observado por Greiner (2014),43 o recordatório de 24 horas pode gerar erro na estimativa de aleitamento materno exclusivo. Crianças que recebem outros líquidos irregularmente podem não os ter consumido no dia anterior à pesquisa.
A mensuração da exposição variou entre os estudos, inclusive diferentes escalas para medir VPI, diferentes pontos de corte e diversos tipos de relações e períodos de exposição investigados. Outro aspecto que deve ser destacado está relacionado ao período em que a exposição foi investigada. Esta revisão incluiu estudos que estimaram a exposição ao longo da vida, durante a infância, durante a gravidez e no pós‐parto e nos últimos 12 meses. Pesquisas disponíveis mostram que a mensuração da VPI pode ser feita através de 20 escalas diferentes, que incluem itens que avaliam apenas um tipo de violência, como violência sexual ou abuso emocional, ou que pretendem avaliar mais de um tipo de violência.44,45 Questões relativas à validade e confiabilidade dessas escalas, os seus objetivos, as consequências potenciais ou os possíveis impactos sobre os resultados dos estudos que tratam associação da VPI com diferentes resultados no campo da nutrição materna e infantil merecem reflexão. Como observado por Misch & Yount (2014),31 os resultados podem ser válidos, ou podem ter algum grau de erro de classificação devido, por exemplo, à falta de memória, à má interpretação da questão, ou, especialmente, ao medo relacionado com as consequências da divulgação. Além disso, instrumentos com questões específicas sobre diferentes formas e intensidade de violência experimentada pelos casais são mais propensos a captar uma situação de violência do que aqueles que usam uma única questão. Nessa perspectiva, as associações entre vitimização da VPI materna com práticas de aleitamento materno, por exemplo, podem estar super ou subestimadas. Importante mencionar que a maioria dos estudos incluídos nesta revisão foi seccional, portanto há um possível viés de memória em relação a perguntas aos participantes sobre exposição e práticas no passado.46 Além disso, é difícil separar causas e efeitos, uma vez que a prevalência de desfecho e a exposição são avaliadas simultaneamente entre os indivíduos.46
Outra característica importante do presente estudo é que, embora nossos critérios de pesquisa incluíssem crianças no primeiro ano de vida, todos os estudos da revisão encontrados foram restritos a crianças de dois dias a seis meses. É provável que estudos focalizem práticas de alimentação infantil precoces, como o início da amamentação e o aleitamento materno exclusivo, dado o consenso internacional sobre sua importância e a recomendação para a garantia de crescimento e desenvolvimento adequado das crianças.2,7
Cabe mencionar que, apesar dos esforços para pesquisar e considerar todos os estudos, não foi possível rastrear estudos na literatura cinzenta, a fim de minimizar os efeitos potenciais do viés de publicação.
As estratégias para promover o aleitamento materno e as práticas de alimentação infantil, bem como a prevenção da violência entre parceiros íntimos, continuam a ser desafios a serem superados. A maioria das intervenções pode ser feita em unidades de saúde onde ocorrem os cuidados primários das mulheres, como clínicas pré‐natais, obstétricas e ginecológicas.47,48 Outras categorias de intervenções são aquelas aplicadas diretamente contra o perpetrador da violência. Esse tipo de intervenção é feito, em geral, como parte da penalidade para os autores de violência doméstica.49 Essas intervenções existentes podem ser oferecidas diretamente aos homens sobre as perspectivas de diferenças de gênero, abuso, controle e momentos de raiva, bem como o tratamento para abuso de drogas e álcool.50
As pesquisas futuras devem focar não somente em práticas adequadas de aleitamento materno, mas também na introdução adequada de alimentação complementar e alimentação infantil, dada sua importância para o desenvolvimento e crescimento na infância e na idade adulta. Ainda, para melhorar a compreensão atual da relação entre VPI e práticas de alimentação infantil, novas investigações requerem estudos prospectivos, feitos em contextos mais amplos, o uso de instrumentos validados e análise substancial e que abordem ambos os gêneros, dada a complexidade dessa relação.
A violência é um fenômeno complexo que envolve todos os membros da família e, portanto, os programas de intervenção precisam ser incentivados contra a violência doméstica, entre as vítimas e os perpetradores como uma excelente maneira de obter uma mudança de pensamento e comportamento social sobre a violência. O principal objetivo desses programas deve ser prevenir a violência de gênero, aumentar a confiança e proteger as mulheres contra seus relacionamentos abusivos e suas consequências. Além disso, os estudos que investigam o papel específico de cada tipo de violência na iniciação e na duração da amamentação ajudam na criação de estratégias mais específicas para serem usadas nos cuidados de saúde. Em um nível prático, a melhoria da autoestima e da confiança das mulheres durante os períodos pré‐natal e pós‐parto pode ter efeitos benéficos em vários níveis. Isso não seria apenas uma maneira de quebrar o ciclo de violência, mas também ajudar a melhorar as atitudes das mulheres em relação a si mesmas e seus bebês e, eventualmente, teria um efeito positivo sobre a amamentação. Assim, compreender o contexto e as motivações das mães que são vítimas de violência e amamentam seus filhos pode ser útil para aconselhamento e apoio a todas as mães vitimizadas, além de considerar esses fatores no planejamento de políticas e programas de alimentação e nutrição na infância.
Finalmente, é importante entender como os efeitos da VPI podem variar entre contextos culturais e quanto à disponibilidade e qualidade do cuidado pré‐natal, às crenças populares em relação ao aleitamento materno e aos esforços existentes de saúde pública para promover a amamentação. Essas diferenças contextuais também podem ajudar a explicar por que os resultados variam de país para país.
FinanciamentoFundação de Apoio à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro Carlos Chagas Filho (Faperj); Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior (Capes).
Conflitos de interesseOs autores declaram não haver conflitos de interesse.
Como citar este artigo: Mezzavilla RS, Ferreira MF, Curioni CC, Lindsay AC, Hasselmann MH. Intimate partner violence and breastfeeding practices: a systematic review of observational studies. J Pediatr (Rio J). 2018;94:226–37.