To verify if the connection between electrodes for heart and transcutaneous oxygen monitoring interfere with the measurement of electrical bioimpedance in preterm newborns.
MethodsThis was a prospective, blinded, controlled, cross‐sectional, crossover study that assessed and compared paired measures of resistance (R) and reactance (Xc) by BIA, obtained with and without monitoring wires attached to the preterm newborn. The measurements were performed in immediate sequence, after randomization to the presence or absence of electrodes. The sample size calculated was 114 measurements or tests with monitoring wires and 114 without monitoring wires, was calculated for a difference between the averages of 0.1 ohms, with an alpha error of 10% and beta error of 20%, with significance<0.05.
ResultsNo differences were observed between the R (677.37±196.07 vs. 677.46±194.86) and Xc (31.15±9.36 vs. 31.01±9.56) values obtained with and without monitoring wires, respectively, with good correlation between them (R: 0.997 and Xc: 0.968).
ConclusionThe presence of heart and/or transcutaneous oxygen monitoring wires connected to the preterm newborn did not affect the values of R or Xc measured by BIA, allowing them to be carried out in this population without risks.
Verificar se a conexão de eletrodos e os fios de monitoração cardíaca e transcutânea de oxigênio interferem na aferição da bioimpedância elétrica em recém‐nascidos pré‐termo (RNPT).
MetodologiaEstudo prospectivo, cego, randomizado, transversal, crossover, em que foram mensuradas e comparadas medidas pareadas de resistência (R) e reatância (Xc) por meio da BIA, obtidas com e sem os fios de monitoração acoplados aos RNPT. As medidas foram feitas em sequência imediata, após aleatorização para a presença ou ausência dos eletrodos. O tamanho amostral calculado foi de 114 aferições ou exames com fios de monitoração e 114 sem fios de monitoração, foi calculado para uma diferença entre as médias de 0,1 ohms, com erro alfa de 10% e erro beta de 20%, com significância<0,05.
ResultadosNão foram observadas diferenças entre os valores de resistência (677,37±196,07 vs. 677,46±194,86) e reatância (31,15±9,36 vs. 31,01±9,56) obtidos com e sem fios de monitoração respectivamente, com boa correlação entre ambos (resistência: 0,997 e reatância: 0,968).
ConclusãoA presença de fios de monitoração cardíaca e/ou transcutânea de oxigênio não interferiu nos valores da resistência ou da reatância aferidos pela BIA em RNPT. Recomenda‐se, então, a feitura desse exame, sem riscos, para essa população.
Entre os métodos usados para a avaliação da composição corporal, a bioimpedância elétrica (BIA) tem sido amplamente usada, sobretudo por ser não invasiva, indolor, prática, segura, de baixo custo, facilmente feita à beira do leito e que estima, além dos componentes corporais, a distribuição dos fluidos nos espaços intra e extracelulares, bem como a qualidade, o tamanho e a integridade das membranas celulares.1,2 Pode ser repetida quantas vezes forem necessárias. Possibilita, assim, um acompanhamento evolutivo dos pacientes com idades, pesos corporais e estados de saúde diversos.
É, portanto, uma ferramenta promissora a ser incorporada na pesquisa clínica e na rotina de avaliação de pacientes de diferentes especialidades médicas, entre elas, a neonatologia.3
Atualmente, além dos poucos dados disponíveis sobre a BIA em recém‐nascidos (RN), principalmente os pré‐termos (RNPT), não há consenso sobre a padronização metodológica desse exame para essa população.4 Por exemplo, há a sugestão de que estar acoplado a algum fio de monitoração impossibilita a feitura da BIA. No entanto, a monitoração contínua de vários parâmetros fisiológicos é necessária para manter a segurança dos RN em cuidados intensivos.
O objetivo deste trabalho é verificar se, de fato, a presença de eletrodos e fios de monitoração cardíaca e transcutânea de oxigênio conectados aos RNPT interfere nos valores da resistência (R) e da reatância (Xc) aferidos pelo método da BIA.
MétodosEstudo prospectivo, cego, randomizado, tipo crossover, em que foram comparadas medidas feitas pela BIA para avaliação de R e Xc, em RNPT, com e sem fios de monitoração cardíaca e transcutânea de oxigênio.
O exame foi padronizado da seguinte forma: o eletrodo interno (detector – cor vermelha) do braço foi colocado na superfície dorsal do punho direito entre os ossos ulnar e rádio e o eletrodo externo (emissor – cor preta), no terceiro metacarpo; o eletrodo interno da perna foi colocado na superfície anterior do tornozelo direito, entre as porções proeminentes dos ossos, e o externo, na superfície do terceiro metatarso.5
Durante a feitura dos exames, tanto o examinador quanto o responsável pelo RNPT foram impedidos de o tocar. Esse foi colocado em posição dorsal, com os membros mantidos afastados, sem encostar em superfícies metálicas, a fim de evitar diminuição/dispersão aleatória da corrente elétrica. A duração do exame foi de aproximadamente 5 minutos.
A coleta foi feita 1 hora e 30 minutos após o término da dieta, para evitar que a manipulação do RNPT pudesse provocar episódios eméticos ou interferência na digestão. Durante todo o período de feitura do exame, os RNPT foram observados cuidadosamente pelo pesquisador.
As mensurações de R e Xc foram feitas com o equipamento monofrequencial (BIA 101 Quantum II, RJL Systems, EUA) que aplica uma corrente alternada sinusoidal de 50kHz e 800μA.1
As medidas foram feitas em sequência imediata, após sorteio para aleatorização da presença ou ausência dos eletrodos (sorteio simples tipo “sim” ou “não”). Durante a leitura do banco de dados, a presença ou ausência de fios de monitoração conectados ao RN não era conhecida pelos pesquisadores e/ou pelo estatístico, ou seja, a análise dos dados foi “cega”.
Foram incluídos no estudo todos os RNPT com idade gestacional (IG) entre 24 e 36 semanas e 6 dias, que estivessem hemodinamicamente estáveis e que pudessem permanecer por, pelo menos, 10 minutos sem a monitoração cardíaca e transcutânea de oxigênio. Não foram avaliados RN em ventilação mecânica, pois entendemos que seria muito arriscado mantê‐los sem monitoração, mesmo que por poucos minutos.
Foram excluídos do trabalho todos os RNPT com malformação congênita, instáveis hemodinamicamente e em uso de drogas vasoativas, além daqueles cuja família recusou a participação.
O tamanho amostral, de 114 aferições ou exames com fios de monitoração e 114 sem fios de monitoração, foi calculado para uma diferença entre as médias de 0,1 ohms, com erro alfa de 10% e erro beta de 20%.
As variáveis foram apresentadas pelas medidas de tendência central e analisadas pelo teste t pareado. Foi adotado um nível de significância igual a ou menor do que 5% e os dados foram analisados com o programa estatístico SPSS (SPSS Inc. Released 2007. SPSS para Windows, versão 16.0, EUA).
O trabalho foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa (CEP), inscrito sob o número 193/2010, CAAE n° 0153.0.258.000‐10.
ResultadosForam feitas 114 medidas em RNPT acoplados e 114 medidas em RNPT não acoplados aos fios de monitoração cardíaca e transcutânea de oxigênio. Foram avaliados 90 RN, 70 RN 1 vez, 16 RN 2 vezes e 4 RN 3 vezes, com intervalo mínimo de 1 semana entre as aferições.
O peso ao nascer (PN) dos participantes variou de 630g a 1,980g. Desses, 7% dos RN avaliados apresentavam PN entre 500g e 750g; 10% entre 751g e 1.000g; 51% entre 1.001g e 1.500g e 33% entre 1.501g e 2.000g. Em média, os exames foram feitos em RNPT com idade cronológica de 15 dias (variação de 9 a 33 dias).
Não foram observadas diferenças entre os valores de R e Xc obtidos com e sem fios de monitoração, com boa correlação entre as aferições (fig. 1).
As médias e os desvios padrões da resistência aferida com e sem a presença dos eletrodos de monitoração cardíaca e de saturação de oxigênio foram, respectivamente, 677, 37±196,07 e 677,46±194,86 ohms (p=0,952); as médias da reatância foram, respectivamente, 31,15±9,56 e 31,01±9,56 ohms (p=0,532). As correlações entre as medidas pareadas da resistência e da reatância foram, respectivamente, 0,997 e 0,968 (p<0,001).
DiscussãoOs resultados encontrados neste estudo deixam claro que a presença dos eletrodos de monitoração cardíaca e de saturação transcutânea de oxigênio conectados aos RNPT não interfere nas aferições de resistência e reatância feitas pelo equipamento monofrequencial.
Em estudos conduzidos na população adulta, Foster & Lukaski afirmam que, apesar de os campos elétricos que são induzidos pela BIA no corpo serem muito inferiores aos limites de suscetibilidade dos aparelhos como marca‐passos e desfibriladores implantados, na ausência de uma análise de segurança detalhada é prudente evitar fazer medidas de impedância corporal em indivíduos com tais dispositivos.6 Acredita‐se que poderia haver dispersão da corrente elétrica induzida pela BIA por meio, principalmente, dos eletrodos de monitoração cardíaca, pois são próprios para perceber as variações elétricas produzidas pelas despolarizações do músculo cardíaco.
Kyle et al., por sua vez, sustentam que, apesar de não ser verificada interferência da bioimpedância em marca‐passos e desfibriladores, recomenda‐se a monitoração cardíaca nesses casos e, na impossibilidade da monitoração, a bioimpedância é contraindicada.7
Estudos conduzidos por Lingwood et al., em população adulta e neonatal, atestam que aparelhos monofrequenciais estão sujeitos a grande interferência e possibilidade de erros quando usados em RN e adultos acoplados à monitoração necessária aos ambientes de cuidados intensivos.8–10 Esses estudos, além de contar com um n‐amostral pequeno, foram conduzidos com metodologia distinta do estudo atual.
Acreditamos que não houve dissipação da corrente elétrica por meio dos eletrodos colados/aplicados à pele do RN, ou, se houve, foi muito pequena, a ponto de não gerar diferenças estatisticamente significativas.
No atual estudo, cujo objetivo é avaliar interferências na técnica de aferição de BIA em uma população específica, o uso de análise de comparação de média pareada, isto é, uma mesma medida aferida duas vezes em um mesmo sujeito, anula totalmente a possibilidade de interferência do sujeito da pesquisa nos resultados. Ou seja, não importa qual sexo, idade gestacional, peso ou qualquer outra característica do RN avaliado, pois o próprio RN já é o seu controle. Além disso, o cálculo do n‐amostral aumenta muito o poder do teste estatístico empregado.
Os RN em geral e, mais precisamente, os RNPT estão sujeitos, logo após o nascimento, a uma perda de água corporal muito severa. Quando saudáveis, seus órgãos podem lidar bem com essas perdas e gerar equilíbrio homeostático rapidamente. No entanto, em RN criticamente doentes ou muito prematuros, esse equilíbrio homeostático pode ficar muito prejudicado.
Os RNPT também são mais suscetíveis a desenvolver algumas patologias que se correlacionam ou com a administração excessiva de fluidos, como broncodisplasia pulmonar e persistência do canal arterial, ou com a hipovolemia, como hipotensão arterial e acidose metabólica. Por isso, um controle rigoroso do equilíbrio hidroeletrolítico é fundamental no manuseio clínico de RNPT.11
A possibilidade de avaliar RN gravemente enfermos em unidades de terapia intensiva neonatais sem expô‐los ao risco de ficarem sem monitoração, mesmo que por poucos minutos, abre espaço para se associar aos cuidados neonatais uma ferramenta de fácil uso, não invasiva e com possibilidades muito interessantes de pesquisa.
A determinação da água corporal total e suas variações, a inferência dos volumes dos demais compartimentos corporais, entre outros, aumentam todo um arsenal de dados rapidamente disponíveis à beira do leito para ajudar nas decisões clínicas dos neonatologistas.12 Além disso, essas informações são cruciais em uma população que, até o momento, tem muitas lacunas no entendimento de sua homeostase hídrica.
Atualmente, usam‐se as medidas de resistência e reatância obtidas pela BIA para análise do vetor de bioimpedância elétrica (BIVA). Nessa análise, não é necessária a aplicação de fórmulas ou modelos matemáticos e acredita‐se que só é influenciada por erro de medição e pela variedade biológica dos sujeitos avaliados. Plota‐se um vetor a partir das aferições de R e Xc e compara‐se esse vetor com uma referência populacional conhecida. A determinação da posição e do ângulo vetorial, chamado ângulo de fase, pode condicionar, entre outros, o grau de normalidade da distribuição hídrica do indivíduo, a gravidade clínica e até predizer a mortalidade relacionada.2,12–14
Muitas incertezas ainda perduram no que tange à metodologia ideal para analisar a resistência e a reatância na população pediátrica e neonatal. Até mesmo o uso da BIA para cálculo da água corporal total e demais compartimentos corporais sofre críticas, pois não existem na literatura equações validadas em crianças menores de 6 anos.1,7 No entanto, ainda não encontramos um método mais fácil de ser aplicado à beira do leito do que a BIA.
A definição de um padrão único para a feitura das medidas de BIA em RNPT é importante para permitir validade, comparação e interpretação dos resultados obtidos.
Em conclusão, o uso da BIA de frequência simples para aferir a resistência e a reatância em RNPT não sofreu interferência da conexão de eletrodos para a monitoração cardíaca e da saturação transcutânea de oxigênio na população estudada.
Conflitos de interesseOs autores declaram não haver conflitos de interesse.
Como citar este artigo: Comym VC, Macedu YS, Neves EK, Bueno AC, Fernandez HC, Moreira ME, et al. Interference of heart and transcutaneous oxygen monitoring in the measurement of bioelectrical impedance analysis in preterm newborns. J Pediatr (Rio J). 2016;92:528–31.
Pesquisa vinculada à Universidade Federal Fluminense, Niterói, RJ, Brasil.