The main purpose of the current study was to perform the cross cultural adaptation and validation of the Activities Scale for Kids (ASK) both in its capability and performance versions to the European Portuguese language so it can be used in Portugal by healthcare professionals in children from 5 to 15 years of age with functional disabilities related to specific health conditions.
MethodsThe cross‐cultural adaptation of ASK followed the classic sequential methodology for linguistic equivalence. To test its validity, internal consistency, and reproducibility, the Portuguese version of ASK was administered together with the KINDL Questionnaire (KINDL) to 88 children (10±3 years of age) with functional limitations. The test–retest study was conducted two weeks apart.
ResultsAfter obtaining the semantic and content validity, the Portuguese version of ASK demonstrated good levels of reproducibility (performance: intraclass correlation coefficient [ICC]=0.99; capability: ICC=0.98) and internal consistency (performance: α=0.98; capability: α=0.97). The correlations between ASK and KINDL were positive and moderate.
ConclusionsThe Portuguese version of ASK showed acceptable levels of validity, internal consistency, and reproducibility; the authors recommend its use in clinical settings.
Fazer a adaptação transcultural para o português europeu e a validação das versões de capacidade e desempenho da Escala de Atividades para Crianças (Activity Scale for Kids [ASK]), de forma que possa ser usada em Portugal por profissionais da saúde com crianças de 5 a 15 anos com deficiências funcionais relacionadas a doenças específicas.
MétodosA adaptação transcultural da ASK seguiu a metodologia sequencial clássica para obter equivalência linguística. Para testar sua validade, coerência interna e reprodutibilidade, a versão em português da ASK foi administrada juntamente com o questionário KINDL em 88 crianças (10±3 anos) com limitações funcionais. O estudo de teste‐reteste foi feito com um intervalo de duas semanas.
ResultadosApós obter a validade semântica e de conteúdo, a versão em português da ASK demonstrou bons níveis de reprodutibilidade (desempenho: coeficiente de correlação intraclasse (CCI)=0,99; capacidade: CCI=0,98) e coerência interna (desempenho: α=0,98; capacidade: α=0,97). As correlações entre a ASK e o KINDL foram positivas e moderadas.
ConclusõesA versão em português da ASK apresentou níveis aceitáveis de validade, coerência interna e reprodutibilidade e recomendamos seu uso em ambientes clínicos.
A Organização Mundial de Saúde estimou que 15% da população mundial vivem com deficiências.1 Assim, medir a deficiência é essencial para desenvolver programas e políticas que promovam a integração e a participação dessas pessoas.1 Da mesma forma, para avaliar a eficácia de intervenções na assistência médica, é necessário quantificar o impacto das limitações funcionais sobre a atividade e a participação dos indivíduos.2
Apesar dos esforços e dos estudos publicados, não havia instrumento de mensuração que abrangesse todos os componentes da funcionalidade.3,4 Recentemente, várias medidas de resultado foram desenvolvidas especificamente para crianças com deficiências;5 contudo, poucas são adotadas na cultura portuguesa.
A Escala de Atividades para Crianças (Activity Scale for Kids [ASK]) é uma medida específica para a população pediátrica destinada a avaliar o grau de deficiência em crianças de 5‐15 anos com limitações funcionais em uma ampla gama de condições de saúde. Ademais, essa medida mostrou ter boas propriedades psicométricas e utilidade clínica significativa.2,5 Sua utilidade clínica é importante, é uma medida válida com valores de correlação entre 0,82 (Activity Scale for Kids – Desempenho [ASKp]) e 0,85 (Activity Scale for Kids−Capacidade [ASKc]) com o Questionário de Avaliação de Saúde em Crianças (CHAQ). Ele apresenta bons valores de reprodutibilidade em duas semanas (CCI=0,97 para ASKp e CCI=0,98 para ASKc) e valor de alfa de Cronbach de 0,99. Também se mostrou capaz de diferenciar níveis de deficiência.6 Ele foi amplamente mencionado na literatura.7–19
Uma das poucas medidas de resultado de crianças adotado pela cultura portuguesa é o questionário KINDL. É um instrumento genérico concebido para medir a qualidade de vida de crianças e adolescentes doentes ou saudáveis de 4 a 17 anos. Ele está disponível para ser usado por três faixas etárias (4 a 6, 7 a 13 e 14 a 17) e tem cinco versões, depende da idade do entrevistado e da fonte de informações (versão das crianças ou dos pais).20
A versão em português do KINDL tem demonstrado ser semanticamente equivalente à medida original; ela oferece bons níveis de confiabilidade e níveis aceitáveis de validade.20
O objetivo geral deste estudo foi adaptar culturalmente os módulos de capacidade (ASKc) e desempenho (ASKp) da ASK para o português europeu e avaliar sua validade e confiabilidade.
MétodosO presente estudo foi feito em duas fasesA primeira seguiu a abordagem sequencial, normalmente usada nesses tipos de estudos para obter uma versão linguisticamente equivalente.9,21,22 Isso inclui a autorização fornecida pelo autor do instrumento original2 e sua adaptação para o idioma e a cultura do português europeu.
Uma permissão formal para a adaptação transcultural para o português foi obtida de Nancy Young, desenvolvedora da ASK. Esse processo foi feito de acordo com a diretriz de etapas usada em medições do tipo autorrelatório.6
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Tradução. A versão original da ASK foi traduzida para o português por dois tradutores portugueses independentes fluentes em inglês.
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Versão de consenso. Um grupo composto por três especialistas do Centro de Estudos e Investigação em Saúde da Universidade de Coimbra desenvolveu uma versão de consenso entre ambas as traduções (primeira versão preliminar). O processo de síntese foi documentado em um relatório escrito.
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Retradução. Um tradutor, nativo em inglês e fluente em português, retraduziu a versão de consenso para o inglês. Essa retradução e todas as traduções anteriores da ASK foram levadas em consideração para chegar a um consenso e se obteve a segunda versão preliminar. Esse processo foi documentado em um relatório escrito.
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Validade do conteúdo. Um comitê de análise especializado, composto por dois fisioterapeutas pediatras e um médico especializado em medicina física e de reabilitação pediátrica, chegou a um consenso sobre a tradução da ASK. A reunião desse comitê de especialistas resultou em uma versão pré‐final. A etapa final da adaptação transcultural da ASK foi o pré‐teste cognitivo do questionário. Crianças e pais foram entrevistados para verificar se os itens eram compreensíveis. Para obter uma representação geral da população, o grupo inicial era composto por 15 crianças com diferentes características e um grupo de pais composto por quatro pais de crianças com menos de 10 anos; duas dessas crianças eram saudáveis. Após o preenchimento do questionário, solicitou‐se que cada participante indicasse quaisquer dificuldades de compreensão ou ambiguidades na tradução.
Essa etapa concluiu a criação da versão em português tanto da ASKp quanto da ASKc.
A segunda fase examinou os testes de validade e confiabilidade da versão em português. Especificamente, avaliamos a validade do constructo, a coerência interna e a reprodutibilidade.
ParticipantesFoi usada uma amostra de conveniência coletada em 11 instituições de saúde (hospitais e associações de pacientes), incluindo 88 crianças entre 5 e 15 anos e com vários tipos de distúrbios funcionais (neuromuscular, ortopédico/traumatológico e/ou reumatológico, cardiorrespiratório ou outros). Crianças com déficits cognitivos e crianças com alterações sensoriais que os impediriam de responder ou compreender a medida foram excluídas da análise.2
As instituições de saúde obtiveram aprovação de seus respectivos conselhos de revisão institucionais e o consentimento foi obtido de diferentes participantes. Antes de cada entrevista presencial, houve um esclarecimento do estudo, incluindo seus objetivos, sua confidencialidade e suas condições de participação.
Coleta de dadosOs protocolos foram enviados por correio para as instituições que concordaram em participar, juntamente com cartas‐resposta. Um fisioterapeuta de cada instituição ficou responsável por escolher os elementos de amostra e administrar os protocolos durante os períodos definidos.
Crianças de até 10 anos (inclusive) responderam ao questionário na presença de adultos (fisioterapeuta, pais ou cuidadores). Contudo, a resposta sempre veio da criança. Crianças com mais de 10 anos leram e responderam por si mesmas, exceto no caso de terem deficiências visuais ou motoras que as impediriam de responder.
O protocolo de coleta de dados continha ambos os módulos ASK, a versão em português do KINDL e um formulário para coletar algumas perguntas sobre características do paciente, incluindo duas perguntas clínicas (necessidades relacionadas a condições de mobilidade e de saúde). A ASK foi aplicada duas vezes para os mesmos participantes com um intervalo de 1‐2 semanas para avaliar a reprodutibilidade.
InstrumentosForam administradas as versões em português tanto da ASK quanto do KINDL.
A ASK é uma medida pediátrica específica composta de dois módulos: ASKc (capacidade), que reflete o que a criança consegue fazer em seu ambiente diário, e ASKp (desempenho), que reflete o que a criança de fato faz em seu ambiente diário.
Ambos os módulos são organizados em sete domínios (higiene pessoal, vestuário, outras habilidades, locomoção, brincadeiras, habilidades de ficar de pé e transferências) com 30 itens idênticos cada um, porém com diferentes opções de resposta.5 Esse instrumento é autoadministrado por crianças de 10 anos ou mais. As crianças com menos de 10 anos devem ser auxiliadas por seus cuidadores, porém as respostas devem ser dadas exclusivamente pelas crianças. A ASK não pode ser aplicada a crianças que não conseguem entender o que está sendo perguntado.
Em ambos os módulos, as pontuações resumidas foram calculadas pela média das respostas (0 a 4 pontos) e o resultado foi registrado como pontuação percentual (faixa 0‐100), em que 100% indica função física total.6
O KINDL mede seis dimensões de qualidade de vida (bem‐estar físico e emocional, autoestima, família, amigos e escola). Com relação à faixa etária, foram usadas três versões do questionário: Kiddy para crianças (4 a 6 anos) (entrevista); Kid para crianças (7 a 13); e Kiddo para adolescentes (14 a 17).20
As pontuações das dimensões individuais podem ser calculadas pela soma das respostas dadas às perguntas transformadas em uma escala positiva de 0 a 100, de acordo com o manual KINDL.23 A pontuação total pode ser obtida pela soma das pontuações das dimensões, em que valores maiores indicaram melhor qualidade de vida. A pontuação invertida foi aplicada a alguns itens de forma que as pontuações mais altas representam melhor qualidade de vida.20
Análise estatísticaResumimos as características dos participantes do estudo com estatísticas descritivas de tendência central, dispersão, frequências e percentuais de acordo com o tipo de variável.
A validade do constructo foi avaliada com a análise dos coeficientes de correlação de Pearson (r) obtidos entre as dimensões do KINDL e da ASK. Os valores de correlação foram interpretados com base nos critérios de Cohen: correlação muito baixa (<=0,19); baixa (entre 0,20 e 0,39); moderada (entre 0,40 e 0,69); alta (entre 0,70 e 0,89) e muito alta (para valores ≥ 0,90).24 O teste t de Student também foi usado para comparar as médias das dimensões da ASK entre grupos formados pelas duas perguntas clínicas.
Trabalhamos com a hipótese de que as melhores pontuações em qualidade de vida devem corresponder a melhor função física. Da mesma forma, indivíduos com doenças neuromusculares e/ou que precisam de apoio para se movimentar devem ter pontuações piores na ASK.
Para calcular a reprodutibilidade, usamos o coeficiente de correlação intraclasse (CCI) para verificar a compatibilidade, fórmula 2.1. Valores superiores ou iguais a 0,70 foram considerados aceitáveis.25 A coerência interna da ASK foi testada com o alfa de Cronbach. Os valores superiores ou iguais a 0,70 foram considerados aceitáveis.25
Usamos a SPSS para Windows (Inc. Released 2009, PASW Statistics for Windows, Versão 18.0, IL, EUA) para a análise estatística. Os valores de p < 0,05 foram considerados estatisticamente significativos.
ResultadosAdaptação transculturalA ASK foi adaptada transculturalmente com sucesso para o português europeu. O grupo era composto por 15 crianças, 8 do sexo feminino e 9 com paralisia cerebral espástica unilateral ou bilateral. A ASK levou cerca de 34±9 minutos para ser preenchida pelas crianças.
Contudo, durante esse processo, surgiram pequenas dificuldades com relação ao significado dos termos “blusa”, “camisa” e “apoio”. Nesses casos, vários sinônimos foram usados, para incluir todas as opções, em ambas as versões em português da ASK. O item 29da ASKc gerou algumas discordâncias no processo de tradução com relação à estrutura da sentença. Como as recomendações dos tradutores não foram totalmente aceitas, decidiu‐se combinar as propostas para obter uma nova solução, mais simples e clara. Por fim, todos os membros do comitê de especialistas concordaram com a versão pré‐final.
Nenhuma alteração resultou do comitê de especialistas, grupo de crianças ou grupo de pais (tabela 1). A extensão do protocolo pode ter sido, em alguns casos, considerada inconveniente, porém ele foi, em geral, considerado fácil de entender e responder.
Exemplo de uma subamostra da ASK original e de itens adaptados da ASK
Módulo | Item | Original | Versão em português |
---|---|---|---|
ASK Desempenho | 2 | I used the toilet at home by myself … (includes getting on and off the toilet) | Em casa, fui à sanita sozinho/a… (inclui sentar e levantar da sanita) |
3 | I washed my whole body by myself … | Lavei‐me todo/a sozinho/a… | |
4 | I put my shirt on by myself … | Vesti a camisola, blusa ou t‐shirt sozinho/a… | |
ASK Capacidade | 2 | I think I could have used the toilet at home by myself … (includes getting on and off the toilet) | Penso que teria conseguido, em casa, ir à sanita sozinho/a… (inclui sentar e levantar da sanita) |
3 | I think I could have washed my whole body by myself… | Penso que teria conseguido lavar‐me todo/a sozinho/a… | |
4 | I think I could have put my shirt on by myself… | Penso que teria conseguido vestir a camisola, blusa ou t‐shirt sozinho/a… |
ASK, Activity Scale for Kids.
No estudo de validade, usamos uma amostra de 88 crianças de 10,2±3,2 anos. A tabela 2 apresenta as principais características da amostra.
Estudo de Validação da Amostra (n=88)
Características | Frequências | Percentual | |
---|---|---|---|
Sexo | Masculino | 48 | 54,5% |
Feminino | 40 | 45,5% | |
Nível de escolaridade | Pré‐escolar | 13 | 14,8% |
Primeiro ciclo | 30 | 34,1% | |
2° ou 3° ciclos (ensino médio) | 45 | 51,1% | |
Preenchimento do formulário | Feito por si mesmo | 39 | 44,3% |
Por entrevista | 49 | 55,7% | |
Doença | Neuromuscular | 76 | 87,4% |
musculoesquelética | 11 | 12,6% |
Para abordar a validade do constructo, avaliamos as pontuações da ASK com relação a dois resultados clínicos: necessidade de apoio de movimentação e condições de saúde, bem como as correlações entre as diferentes dimensões da ASK e do KINDL.
O estudo da relação entre as respostas da ASK e a existência de apoio (tabela 3) mostrou que indivíduos com pontuações da ASK mais elevadas (ASKp e ASKc) estavam menos propensos a exigir qualquer tipo de apoio para se movimentar.
ASK em comparação com a existência de apoio e doença (n=88)
Apoio/Doença | n | Média | DP | p | ||
---|---|---|---|---|---|---|
ASKp | Ambiente interno | Sem apoio especial | 48 | 78,60 | 14,35 | 0,000 |
Qualquer tipo de apoio | 40 | 44,32 | 30,47 | |||
Ambiente externo | Sem apoio especial | 47 | 79,97 | 13,49 | 0,000 | |
Qualquer tipo de apoio | 41 | 43,59 | 29,23 | |||
Doença | Musculoesquelética | 11 | 81,97 | 12,74 | 0,000 | |
Neuromuscular | 76 | 59,91 | 29,31 | |||
ASKc | Ambiente interno | Sem apoio especial | 49 | 83,64 | 14,65 | 0,000 |
Qualquer tipo de apoio | 39 | 52,84 | 29,68 | |||
Ambiente externo | Sem apoio especial | 47 | 85,15 | 12,28 | 0,000 | |
Qualquer tipo de apoio | 41 | 52,62 | 29,28 | |||
Doença | Musculoesquelética | 11 | 87,64 | 10,51 | 0,000 | |
Neuromuscular | 76 | 67,13 | 27,97 |
ASKc, Activity Scale for Kids−Capacidade.
A tabela 3 também apresenta a relação entre as pontuações da ASK e a condição de saúde dos indivíduos. Era evidente que aqueles que apresentavam pontuações da ASK mais elevadas estavam também mais propensos a ter doenças musculoesqueléticas.
Ao comparar a ASK e o KINDL, foram encontradas correlações positivas entre a ASKp e a ASKc e todas as dimensões do KINDL, com exceção de bem‐estar físico. A maior parte dessas correlações era baixa e/ou moderada (tabela 4).
ASK em comparação com o KINDL (n=57)
Kindla | BEF | BEE | AE | F | A | E | TT | |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
ASKp | r | 0,023 | 0,559 | 0,538 | 0,386 | 0,624 | 0,343 | 0,631 |
p | 0,867 | 0,000 | 0,000 | 0,003 | 0,000 | 0,009 | 0,000 | |
ASKc | r | 0,093 | 0,464 | 0,396 | 0,386 | 0,440 | 0,292 | 0,523 |
p | 0,493 | 0,000 | 0,002 | 0,003 | 0,001 | 0,027 | 0,000 |
ASKp, Activity Scale for Kids – Desempenho; ASKc, Activity Scale for Kids – Capacidade.
No que diz respeito à coerência interna da versão em português da ASK, foram encontrados valores aceitáveis tanto para a ASKp quanto para a ASKc.
Os valores de reprodutibilidade da ASKp e da ASKc também eram aceitáveis (tabela 5), após os questionários serem preenchidos duas vezes, separados por um intervalo de uma ou duas semanas.
DiscussãoConsiderando os resultados dos grupos de consenso, de análise clínica e de crianças e pais, podemos dizer que a equivalência semântica e de conteúdo entre a versão traduzida da ASK e a versão original foi atingida.
Em geral, essa medida foi considerada clara, compreensível e adequada para uma população pediátrica. O único fator negativo foi o fato de ser uma medida relativamente extensa, principalmente quando as duas versões são aplicadas, conforme mostrado pelo tempo médio de preenchimento das duas versões (33,4min). Concluímos que a versão em português da ASK apresenta um nível aceitável de validade do conteúdo.
A respeito da existência de apoio recebido pelas crianças para se movimentarem, observamos que, tanto na ASKp quanto na ASKc, a maioria dos indivíduos (entre 53% e 56%) relatou não usar apoio para se movimentar em ambientes internos e externos. Esses achados parecem mostrar uma correlação entre o que as crianças realmente fazem em sua rotina e o que pensam que conseguem fazer.
Para avaliar a validade da ASK, pressupusemos que ela poderia permitir a diferenciação entre diferentes níveis de capacidade (ASKc) e desempenho (ASKp) entre grupos que, hipoteticamente, teriam essas diferenças. Essas hipóteses foram confirmadas entre indivíduos que usam ou não algum tipo de apoio de movimentação em ambas as versões da ASK. Portanto, os indivíduos que usam apoio para se movimentar devem apresentar menor grau de funcionalidade e, portanto, menores pontuações na ASK (tabela 3).
Adicionalmente, esperava‐se encontrar diferenças estatisticamente significativas entre crianças com doenças musculoesqueléticas e crianças com doenças neuromusculares, na suposição de que as doenças neuromusculares resultassem em estágios mais incapacitantes.5 Os resultados obtidos em ambas as versões da ASK não rejeitaram essa hipótese.
No estudo de validade, as relações entre a ASK e o KINDL também foram analisadas. A suposição foi a existência de valores de correlação positivos entre os constructos comparados, que reforçam que condições de saúde mais favoráveis devem corresponder a melhores níveis de capacidade e desempenho.
A escolha do KINDL ocorreu em virtude da falta de uma medida padrão adequada para o idioma e a cultura portugueses. Adicionalmente, está disponível uma versão em português do KINDL que abrange as idades exigidas. Além disso, uma estratégia semelhante foi usada no estudo da versão original.2
Ao analisar os valores das correlações entre o KINDL Total e ambas as pontuações de ASKp e ASKc, pudemos verificar a existência de correlações positivas e moderadas (tabela 5). Confirmou‐se, assim, a hipótese de que crianças com maior grau de funcionalidade também apresentam melhor nível de qualidade de vida. Também encontramos uma correlação das duas versões da ASK com todas as dimensões do KINDL, exceto a de bem‐estar físico. Para tentar explicar esse achado, comparamos as perguntas da dimensão de bem‐estar físico do KINDL e os itens da ASK e observamos que as quatro perguntas da dimensão de bem‐estar físico do KINDL dizem respeito a sentir dor, dores no corpo, cansaço ou força e os itens da ASK estão relacionados às atividades diárias. Entretanto, a dimensão física do KINDL pode combinar conceitos de formas diferentes dos da ASK. Por outro lado, o fato de a amostra ser composta por cerca de 18% de indivíduos com paralisia cerebral poderá representar um viés nos resultados. Como sabemos, as crianças tendem a supervalorizar seu estado de saúde, em especial aquelas com paralisia cerebral, que têm uma expectativa diferente com relação às suas capacidades físicas em comparação com indivíduos que têm uma deficiência adquirida.
Apesar de não incluir perguntas relacionadas a dimensões de bem‐estar emocional e autoestima, os valores de correlação obtidos tanto para ASKp quanto para ASKc, embora de fracos a moderados, foram aceitáveis (tabela 4). Esses valores podem ser justificados pela diferença de constructos e pelo fato de a amostra ser composta por crianças que percebiam suas incapacidades como fracas a moderadas, o que leva à hipótese de bons níveis de autoestima e bem‐estar emocional. Bjorson13 corrobora essa suposição, comprova que a feitura de atividades influencia positivamente a saúde física, o comportamento e o estado emocional em crianças com paralisia cerebral.
Na dimensão familiar, houve uma fraca correlação na ASKp e na ASKc (r=0,386). Esse tipo de correlação já era esperado, pois a ASK não considera questões diretamente relacionadas à família. No caso da dimensão de amigos, os valores de correlação foram moderados (r entre 0,624 e 0,440) na ASKc e ASKp. Esse resultado era esperado, já que a ASK tem perguntas diretamente focadas nos amigos da criança. Por último, na dimensão escolar, foi encontrada apenas uma fraca correlação com a ASKp (r=0,343), que também era esperado, já que também não há pergunta relacionada ao desempenho escolar na ASK.
A respeito da coerência interna e da reprodutibilidade da ASK, os resultados apresentaram valores aceitáveis. Os valores do CCI obtidos tanto na ASKc (CCI=0,978) quanto na ASKp (CCI=0,986) foram compatíveis, representaram alta reprodutibilidade de acordo com os critérios listados anteriormente.25 Quando comparados com os níveis de reprodutibilidade da versão original, verificamos que os resultados do teste‐reteste são compatíveis, pois o valor do CCI no estudo original foi de 0,97 em ambas as versões.2,6 Pode‐se considerar que a versão em português da ASK apresenta bons níveis de reprodutibilidade.
A respeito da coerência interna, os resultados de cada versão da ASK (α=0,980 para a ASKp e α=0,972 para a ASKc) foram semelhantes aos originais, considerados altos.25 Esses números sugerem que todos os itens da escala medem os mesmos constructos.
As principais limitações deste estudo estavam relacionadas à extensão do protocolo usado, incluindo ambas as versões da ASK, o questionário KINDL e as perguntas sociodemográficas. Além disso, o tamanho da amostra não nos permitiu fazer uma análise de fatores para testar a validade do constructo.
Considerando os resultados, concluímos que as versões em português da ASK apresentam equivalências semânticas e de conteúdo com a versão original, bem como valores aceitáveis de validade e confiabilidade. Por fim, propomos fazer estudos adicionais para aprofundar nossos achados e explorar ainda mais as características psicométricas da medida, incluindo a avaliação de sua responsividade.
Consideramos que ambos podem ser usados na prática clínica e em pesquisa.
Conflitos de interesseOs autores declaram não haver conflitos de interesse.
À equipe das instituições de saúde. Além disso, as crianças e os pais que participaram deste estudo merecem nosso profundo reconhecimento.
Como citar este artigo: Paixão D, Cavalheiro LM, Gonçalves RS, Ferreira PL. Portuguese cultural adaptation and validation of the Activities Scale for Kids (ASK). J Pediatr (Rio J). 2016;92:367–73.
Estudo feito no Instituto Politécnico de Coimbra, Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Coimbra, Coimbra, Portugal.