this systematic review aims to explore and describe the studies that have as a primary outcome the identification of mothers’ perception of the nutritional status of their children.
Sourcesthe PubMed, Embase, LILACS, and SciELO databases were researched, regardless of language or publication date. The terms used for the search, with its variants, were: Nutritional Status, Perception, Mother, Maternal, Parents, Parental.
Summary of the findingsafter screening of 167 articles, 41 were selected for full text reading, of which 17 were included in the review and involved the evaluation of the perception of mothers on the nutritional status of 57,700 children and adolescents. The methodological quality of the studies ranged from low to excellent. The proportion of mothers who inadequately perceived the nutritional status of their children was high, and was the most common underestimation for children with overweight or obesity.
Conclusiondespite the increasing prevalence of obesity in pediatric age, mothers have difficulty in properly perceiving the nutritional status of their children, which may compromise referral to treatment programs.
esta revisão sistemática tem por objetivo explorar e descrever os estudos que apresentam como desfecho primário a identificação da percepção das mães quanto ao estado nutricional de seus filhos.
Fonte dos dadosforam utilizadas as bases de dados PubMed, Embase, LILACS e SciELO, sem distinção de idioma ou data de publicação. Os termos utilizados para a busca, com suas variações, foram: Nutritional Status, Perception, Mother, Maternal, Parents, Parental.
Síntese dos dadosapós triagem dos 167 artigos encontrados, restaram 41 artigos para leitura do texto completo, sendo incluídos 17 artigos, que envolveram a avaliação da percepção de mães sobre o estado nutricional de 57.700 crianças e adolescentes. A qualidade metodológica dos artigos variou de baixa a excelente. A proporção de mães que percebiam inadequadamente o estado nutricional dos filhos foi elevada, sendo mais comum a subestimativa para crianças com sobrepeso ou obesidade.
Conclusãoapesar do aumento da prevalência de obesidade em faixas pediátricas, as mães têm dificuldade de perceber adequadamente o estado nutricional de seus filhos, o que pode comprometer o encaminhamento para programas de tratamento.
A obesidade é uma das doenças crônicas não transmissíveis mais comuns na infância, com tendência de se prolongar até a vida adulta,1,2 tornando precoce o surgimento de outras doenças crônicas a ela associadas, tais como hipertensão arterial, dislipidemia, diabetes tipo 2, entre outros fatores de risco cardiometabólico.3–5
Um estudo realizado em Porto Alegre demonstrou que adolescentes obesos da rede municipal de ensino apresentavam prevalência de síndrome metabólica de 51,2% e de resistência à insulina de 80,1%; números muito próximos dos resultados de outros estudos realizados no Brasil e em outros países.6
A prevalência de excesso de peso tem aumentado em todas as faixas etárias no Brasil, a exemplo do que acontece ao redor do mundo. Dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares7 demonstram que a proporção de crianças obesas quadruplicou nos últimos 20 anos, e a de adolescentes triplicou no mesmo período. Tais achados não diferem muito das tendências observadas em países desenvolvidos.8,9
Considerando que os programas de tratamento da obesidade na infância e adolescência não apresentam resultados significativos,2,10,11 o ponto chave para o combate a esta doença deve ser a prevenção, baseada em um estilo de vida ativo e em práticas alimentares saudáveis.12
Vários estudos têm demonstrado que a obesidade é uma doença multifatorial, que apresenta grande relação com a dinâmica familiar, assim, o sucesso de programas de prevenção e tratamento depende do envolvimento da família como um todo.13–15 Para tanto, o primeiro passo é o reconhecimento dos pais quanto ao estado nutricional dos filhos, identificando o excesso de peso como risco para a saúde.16,17
Não são muitos os estudos que verificaram a percepção das mães quanto ao estado nutricional dos filhos, sendo que grande parte deles tem demonstrado que há uma tendência de as mães subestimarem o estado nutricional, não reconhecendo seus filhos obesos como tal. Este fato merece muita atenção, pois se os pais, e particularmente a mãe, não enxergam seus filhos obesos nesta condição, não se preocuparão em encaminhá‐los para tratamento, nem tampouco os estimularão a modificarem o estilo de vida.18
Neste sentido, o objetivo da presente revisão sistemática é explorar e descrever os estudos que apresentam como desfecho primário a identificação da percepção das mães quanto ao estado nutricional de seus filhos.
MétodosPara obter a literatura a respeito da percepção das mães quanto ao estado nutricional dos filhos foram utilizadas as bases de dados PubMed, Embase, Lilacs e Scielo, sem distinção de idioma ou data de publicação. Os termos utilizados para a busca, com suas variações, foram: Nutritional Status, Perception, Mother, Maternal, Parents, Parental, conforme descrito na figura 1. Os termos foram adaptados para as ferramentas de busca de cada base de dados utilizada.
Foram critérios de inclusão para esta revisão: que os artigos tivessem investigado a percepção das mães sobre o estado nutricional de seus filhos; que a faixa etária dos filhos estivesse entre dois e 19 anos; e que o desfecho fosse a verificação da diferença entre o estado nutricional (classificado pelo índice de massa corporal – IMC) e o estado nutricional percebido pela mãe.
A estimativa do estado nutricional pelo IMC pode utilizar variados pontos de corte, obtidos em diferentes estudos, sendo mais referidas na literatura as propostas da International Obesity Task Force – IOTF,19 dos Centers for Disease Control and Prevention – CDC,20,21 e da World Health Organization – WHO.22
As curvas percentílicas utilizadas pela IOTF, para crianças e adolescentes de dois a 17 anos de idade, definem sobrepeso a partir do percentil 85 e obesidade a partir do percentil 95, identificando estes pontos como similares aos pontos de corte utilizados para adultos, sendo 25kg/m2 para sobrepeso e 30kg/m2 para obesidade. Os pontos de corte utilizados pela WHO, para crianças e adolescentes de dois a 19 anos de idade, definem sobrepeso a partir do percentil 85 e obesidade a partir do percentil 97. Os CDC classificam crianças e adolescentes, de dois a 19 anos de idade, como sobrepeso a partir do percentil 85 e obesidade a partir do percentil 95.
Em alguns estudos, podemos encontrar a utilização de pontos de corte específicos para a população, divergentes daqueles mencionados como mais utilizados.23,24
Nos estudos que traziam a percepção de ambos os pais, foram extraídos somente os resultados relativos à percepção da mãe.
Adotou‐se como critério de exclusão a presença, nas amostras dos estudos, de doenças que afetam o estado nutricional, como transtornos alimentares e síndromes genéticas, além de estudos que visassem a percepção do estado nutricional em filhos com diferentes tipos de câncer.
A busca foi realizada por dois revisores separadamente, selecionando os artigos primeiramente pela leitura dos títulos, seguida da leitura dos resumos, para então proceder‐se a leitura completa do artigo. Além dos artigos selecionados das bases de dados, foi realizada a revisão das referências bibliográficas de cada artigo selecionado, no intuito de encontrar aqueles que não estivessem presentes nas principais bases de dados. A elegibilidade dos artigos foi avaliada independentemente pelos dois revisores, e as discrepâncias foram resolvidas em conjunto por todos os autores.
Tendo em vista que não existe ferramenta de avaliação da qualidade de artigos de estudos descritivos e de secção transversal, para atender ao propósito do presente estudo, foi utilizada uma ferramenta adaptada por Rietmeijer‐Mentink et al.,25 baseada no critério da Cochrane para avaliação de estudos diagnósticos (tabela 1). Assim, a qualidade metodológica dos artigos que apresentavam a descrição verbal da percepção materna sobre o estado nutricional dos filhos foi baseada em seis itens e categorizada em baixa qualidade (0‐2 itens positivos), moderada qualidade (3‐4 itens positivos), boa qualidade (5 itens positivos) e excelente qualidade (6 itens positivos). A qualidade dos artigos que utilizaram escalas de imagem corporal foi baseada em sete itens e apresenta como diferenças: boa qualidade (5‐6 itens positivos) e excelente qualidade (7 itens positivos).
Resultados da avaliação da qualidade dos artigos incluídos na revisão
Viés de seleção | Cegamento | Métodos e coleta de dados | Não respondentes | Qualidade | ||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Autor | Seleção não baseada noestadonutricional | Descrição das características, amostra representativa | A mãe não ficou sabendo do estado nutricional antes de perguntada | Tipos de equipamento mencionados, mesmos equipamentos para todos os sujeitos | Em caso de escala de imagem, a mesma era validada | Mencionado o critério diagnóstico para o estado nutricional | Não respondentes foram mencionados | Classificação da qualidade dos estudos |
Aparício et al.18 | + | + | + | ‐ | + | + | ? | Boa |
Baughcum et al.23 | + | ? | ? | + | n.a. | + | + | Moderada |
Binkin et al.30 | + | + | + | + | n.a. | + | + | Excelente |
Boa‐Sorte et al.16 | + | + | + | + | n.a. | + | + | Excelente |
Boutelle et al.42 | + | + | ? | ‐ | n.a. | + | + | Moderada |
Bracho & Ramos43 | + | + | ? | ? | n.a. | + | + | Moderada |
Carnell et al.33 | + | ? | ? | ‐ | n.a. | + | + | Moderada |
Genovesi et al.52 | + | + | + | ‐ | n.a. | + | + | Boa |
Guevara‐Cruz et al.31 | + | + | + | + | n.a. | + | ? | Boa |
Hackie & Bowles45 | ‐ | ‐ | + | ‐ | n.a. | ‐ | ‐ | Baixa |
Hirschler et al.46 | + | + | ? | ‐ | n.a. | + | + | Moderada |
de Hoog et al.44 | ‐ | + | + | + | n.a. | + | + | Boa |
Lazzeri et al.47 | + | + | ? | ‐ | + | + | + | Boa |
Manios et al.48 | + | + | ? | + | n.a. | + | + | Boa |
Maynard et al.49 | + | + | ? | + | n.a. | + | + | Boa |
Molina et al.50 | + | + | ? | ‐ | n.a. | + | + | Moderada |
Rosas et al.32 | + | + | + | ‐ | + | + | + | Boa |
n.a., não se aplica.
A busca nas bases de dados eletrônicas resultou em 151 artigos, dos quais foram descartadas 28 repetições. A triagem por títulos e abstracts dos 123 artigos restantes resultou em 31 artigos para leitura do texto completo. Além disso, pela leitura das referências bibliográficas destes artigos, foram incluídos, para leitura dos abstracts mais 16 artigos, dos quais dez foram selecionados para leitura do texto completo. Após aplicação dos critérios de exclusão, permaneceram nesta revisão sistemática 17 artigos (fig. 2).
A avaliação da qualidade metodológica dos artigos demonstrou que apenas um apresentou baixa qualidade, e dois, excelente qualidade, tendo sido classificados em moderada qualidade seis deles, e oito em boa qualidade (tabela 1).
A descrição dos artigos, incluindo o país de origem, objetivo, características da amostra, critério diagnóstico utilizado para o estado nutricional e principais resultados são apresentados na tabela 2.
Características dos estudos incluídos na revisão
Autor | País | Objetivo | Número de participantes adequados para este estudo | Masculino (%) | Faixa etária ou idade média | Critério diagnóstico do estado nutricional | Principais achados |
---|---|---|---|---|---|---|---|
Aparício et al.18 | Portugal | Identificar a percepção materna da imagem corporal de pré‐escolares | 1.424 | 52,4 | 3‐6 anos | CDC | 67,2% das mães perceberam bem o EN dos filhos, mas apenas 0,6% delas via seus filhos como obesos, quando 17,4% apresentavam esta condição |
Baughcum et al.23 | Estados Unidos | Verificar fatores associados com a má percepção do excesso de peso de filhos pré‐escolares | 622 | n.a. | 2‐5 anos | IMC > P90 – excesso de peso | 79% das mães não percebiam seus filhos que tinham excesso de peso como tal. Associação com baixo nível educacional |
Binkin et al.30 | Itália | Investigar o quanto a prevalência de obesidade influencia na percepção da mãe quanto ao EN dos filhos | 37.161 | 51,0 | 8‐9 anos | IOTF | As mães perceberam corretamente o EN em 84% dos eutróficos, 52% dos sobrepesados e 14% dos obesos. Associação com regiões de alta prevalência de obesidade |
Boa‐Sorte et al.16 | Brasil | Descrever a percepção materna e autopercepção do EN de escolares e identificar fatores associados ao erro | 827 | 46 | 6‐19 anos | CDC | A concordância global foi de 75,3%, mas 45,4% das mães subestimaram o EN dos filhos com excesso de peso |
Boutelle et al.42 | Estados Unidos | Avaliar a acurácia da percepção materna sobre o EN de filhos adolescentes | 675 | 53 | 14,6+1,7 anos | CDC | Percepção correta em 60% das mães; 70,5% de subestimativa para os adolescentes com sobrepeso e 86,2% para os obesos |
Bracho & Ramos43 | Chile | Avaliar a percepção materna sobre o EN dos filhos | 270 | 51 | 2‐6 anos | WHO | Percepção correta em 54,1% das mães; 71,25% de subestimativa para as crianças com sobrepeso e 86,49% para os obesos |
Carnell et al.33 | Reino Unido | Avaliar a acurácia da percepção dos pais sobre o EN dos filhos | 533 | n.a. | 3‐5 anos | IOTF | Das 145 crianças classificadas com excesso de peso, apenas 6% foram percebidas assim |
Genovesi et al.52 | Itália | Verificar se a percepção materna do EN e do consumo alimentar dos filhos tem relação com o nível de educação da mãe | 569 | 47,1 | 4‐10 anos | IOTF | 28,3% das mães subestimaram o EN, sendo 15,2% das mães de baixa escolaridade e 34,9% das de alta escolaridade |
Guevara‐Cruz et al.31 | México | Avaliar a percepção materna do EN dos filhos (crianças) | 273 | 56,8 | 8,52+4,12 anos | CDC | 78% das mães classificaram corretamente seus filhos; 37,8% das mães de crianças com excesso de peso os classificaram como eutróficos |
Hackie & Bowles45 | Estados Unidos | Avaliar a percepção materna do EN de pré‐escolares obesos | 38 | 53 | 2‐5 anos | CDC | 61% das mães não perceberam seus filhos obesos como tal |
Hirschler et al.46 | Argentina | Determinar a associação entre excesso de peso e idade, sexo e percepção materna | 321 | 49,8 | 2‐6 anos | CDC | 80% das mães de crianças com excesso de peso não percebiam seus filhos desta forma |
de Hoog et al.44 | Holanda | Determinar a variação étnica na subestimativa materna do EN de crianças | 2.769 | 49,5 | 5‐7 anos | IOTF | 79,1 das mães de crianças com excesso de peso subestimaram o EN, com diferenças entre os grupos étnicos estudados |
Lazzeri et al.47 | Itália | Avaliar a acurácia da percepção materna do EN de escolares | 2.835 | 51 | 8‐9 anos | IOTF | 35% das mães subestimaram a silhueta dos filhos com sobrepeso e 53% dos obesos. Para o EN a subestimativa foi de 59% e 87%, respectivamente |
Manios et al.48 | Grécia | Quantificar erros de classificação do EN de pré‐escolares por suas mães e determinar os fatores associados ao erro | 2.287 | 54 | 2‐5 anos | CDC | 88,3% das mães subestimaram o EN dos filhos com sobrepeso e 54,5% dos obesos. Os resultados foram piores para o sexo masculino, participantes em programas de exercícios e baixa escolaridade materna |
Maynard et al.49 | Estados Unidos | Quantificar erros de classificação do EN de crianças por suas mães e determinar os fatores associados ao erro | 5.500 | 50 | 2‐11 anos | CDC | As mães subestimaram a obesidade em 35% dos meninos e 29,2% das meninas, para o sobrepeso os resultados de subestimativa foram, respectivamente, 84,7% e 70,4% |
Molina et al.50 | Brasil | Verificar a correspondência entre o estado nutricional de crianças e a percepção materna | 1.282 | 42 | 7‐10 anos | IOTF | 89,5% das mães subestimaram o EN dos filhos obesos e 65,9% dos filhos com sobrepeso. Sexo e etnia mostraram associação com a má percepção |
Rosas et al.32 | México e Estados Unidos | Comparar a percepção de mães sobre o EN de crianças mexicanas e de comunidade de imigrantes na Califórnia | 314 | México=45Califórnia=47,5 | 5 anos | CDC | Apenas 10% das mães da Califórnia classificaram corretamente seus filhos que tinham excesso de peso e 82% das mexicanas acertaram o EN |
EN, estado nutricional; n.a., não se aplica; CDC, Centers for Disease Control and Prevention; IOTF, the International Obesity Task Force; WHO, World Health Organization.
Os estudos foram publicados entre 2000 e 2013. A idade dos filhos variou entre dois e 19 anos, predominando os estudos com crianças de dois a seis anos de idade. No total, fizeram parte desta revisão 57.700 pares mãe‐filho, sendo que 18.656 filhos apresentavam excesso de peso (32,3%). Já a obesidade foi detectada em 6.666 filhos (11,6%). Na percepção das mães, apenas 5.501 filhos estariam com excesso de peso (9,53%).
Em dez dos 17 artigos incluídos na revisão, os dados extraídos permitiram a realização dos cálculos de sensibilidade e especificidade da percepção das mães quanto ao estado nutricional dos filhos (tabela 3). A sensibilidade variou de 6,2% a 54,6%, indicando baixa capacidade das mães de perceberem o excesso de peso dos filhos. Já a especificidade foi superior a 90,0% para nove dos dez estudos, indicando boa capacidade das mães de perceberem o estado nutricional de seus filhos quando estes eram eutróficos.
Valores de sensibilidade e especificidade da percepção materna, calculados com base nos dados fornecidos pelos estudos
Estudo | Critério | VP | FP | FN | VN | Sensibilidade (IC95%) | Especificidade (IC95%) | VPP | VPN |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Baughcum et al.23 | IMC>P90 | 21 | 3 | 78 | 202 | 21,2% (17,0%‐25,4%) | 98,5% (97,3%‐99,8%) | 87,5% | 72,1% |
Boa‐Sorte et al.16 | CDC | 83 | 41 | 69 | 634 | 54,6% (49,5%‐59,7%) | 93,9% (91,5%‐96,4%) | 66,9% | 90,2% |
Boutelle et al.42 | CDC | 61 | 30 | 209 | 442 | 22,6% (18,3%‐26,9%) | 93,6% (91,1%‐96,2%) | 67,0% | 67,9% |
Bracho & Ramos43 | WHO | 28 | 4 | 89 | 149 | 23,9% (19,5%‐28,3%) | 97,4% (95,7%‐99,0%) | 87,5% | 62,6% |
Carnell et al.33 | IOTF | 9 | 3 | 136 | 416 | 6,2% (3,7%‐8,7%) | 99,3% (98,4%‐100,0%) | 75,0% | 75,4% |
Guevara‐Cruz et al.31 | CDC | 19 | 6 | 53 | 195 | 26,4% (21,9%‐30,9%) | 97,3% (95,3%‐98,8%) | 76,0% | 78,6% |
Hirschler et al.46 | CDC | 97 | 9 | 106 | 409 | 47,8% (42,6%‐52,9%) | 97,8% (96,4%‐99,3%) | 91,5% | 79,4% |
Manios et al.48 | CDC | 165 | 22 | 472 | 1.100 | 25,9% (21,4%‐30,4%) | 98,0% (96,6%‐99,5%) | 88,2% | 70,0% |
Maynard et al.49 | CDC | 527 | 75 | 725 | 4.173 | 42,1% (37,0%‐47,2%) | 98,2% (96,9%‐99,6%) | 87,5% | 85,2% |
Molina et al.50 | IOTF | 125 | 286 | 245 | 616 | 33,8% (28,9%‐38,6%) | 68,3% (63,5%‐73,1%) | 30,4% | 71,5% |
VP, verdadeiro positivo; FP, falso positivo; FN, falso negativo; VN, verdadeiro negativo; IC95%, intervalo de confiança de 95%; VPP, valor preditivo positivo; VPN, valor preditivo negativo; CDC, Centers for Disease Control and Prevention; IOTF, the International Obesity Task Force; WHO, World Health Organization.
A presente revisão sistemática teve como objetivo explorar e descrever os estudos que apresentam como desfecho primário a identificação da percepção das mães quanto ao estado nutricional de seus filhos. No total, fizeram parte desta revisão 57.700 pares mãe‐filho, sendo que o excesso de peso estava presente em 18.656 filhos (32,3%). Já a obesidade foi detectada em 6.666 filhos (11,6%). Mas, na percepção das mães, apenas 5.501 filhos estariam com excesso de peso (9,53%).
Outros estudos de revisão investigaram a percepção da mãe, ou dos pais, sobre o estado nutricional de seus filhos,26–29 mas com abordagens diferentes da do presente estudo, dificultado a realização de um paralelo dos resultados obtidos com os do presente estudo.
Rietmeijer‐Mentink et al.25 realizaram um abrangente estudo de revisão sistemática com meta‐análise, o qual serviu de base para a presente revisão, principalmente no que diz respeito à forma de avaliar a qualidade dos estudos. O referido estudo somou a avaliação de 35.103 crianças e adolescentes, das quais 11.530 apresentavam excesso de peso (32,9%). Proporção muito semelhante à encontrada em nossa revisão, entretanto, naquele estudo 7.191 mães (62,4%) viam seus filhos com excesso de peso como eutróficos, diferentemente da proporção encontrada no presente estudo (90,47%). Tal diferença pode ser explicada pela inclusão de estudos recentes, que demonstraram altos índices de subestimativa do estado nutricional.18,30–32
Como a maioria dos estudos que buscam identificar a percepção dos pais sobre o estado nutricional de seus filhos se restringe à percepção da mãe, o presente estudo objetivou apenas a percepção da mãe, mas foi incluído um estudo que abordava a percepção de ambos os pais, no qual foi possível separar os resultados referentes à mãe.33 Por este motivo, vários estudos não puderam ser incluídos, pois os resultados de ambos os pais eram apresentados sem distinção.34–41
Na maioria dos estudos incluídos, a percepção das mães apresentou elevada concordância com o real estado nutricional dos filhos quando estes eram eutróficos, entretanto, tendiam a subestimar significativamente o estado nutricional dos filhos com excesso de peso.18,23,30,33,42–50 Nos estudos em que os resultados foram apresentados separadamente para sobrepeso e obesidade, observa‐se que maior proporção de percepção subestimada do estado nutricional ocorre quando os filhos são obesos.30,42,43,47,50 Apenas dois estudos apresentaram maior subestimativa para os filhos com sobrepeso: o de Manios et al.,48 com pré‐escolares gregos de dois a cinco anos de idade; e o realizado nos Estados Unidos por Maynard et al.,49 para a faixa etária dos dois aos 11 anos de idade. Porém, a leitura destes trabalhos não permitiu uma explicação para tal divergência.
Pareceria mais coerente que as mães tivessem melhor percepção do estado nutricional dos filhos com excesso de peso, particularmente os obesos, pois em valores extremos os sinais clínicos são mais perceptíveis visualmente,51 entretanto, não é o que acontece, sugerindo que muitos outros fatores podem estar envolvidos na capacidade da mãe em perceber o estado nutricional dos filhos.
Buscar os possíveis fatores que levam as mães a perceberem incorretamente o estado nutricional de seus filhos tem sido a tônica da maioria dos estudos. Além do próprio excesso de peso, os fatores que apresentam maior associação com a inadequada percepção são a baixa escolaridade da mãe,18,23,30,44,48,52 o sexo masculino,30,42,48–50 idade dos filhos,16,43,49 excesso de peso da mãe23,42,43 e etnia/cor da pele,44,50 Outros fatores apareceram sem repetição, como o número de filhos43 e o engajamento dos mesmos em programas de exercícios físicos.48 No primeiro caso, maior número de filhos indicou maior chance de subestimativa do estado nutricional. Já no segundo caso, a participação dos filhos em programas de exercícios físicos aumentou a chance de a mãe subestimar o estado nutricional dos filhos.
A região ou o meio em que se vive também parece influenciar a forma como a mãe enxerga seus filhos. No estudo de Binkin et al., 30 que verificou a percepção das mães em regiões da Itália com baixa, moderada e elevada prevalência de obesidade, houve associação com a região, sendo que maiores índices de subestimativa do estado nutricional foram observados na região de maior prevalência de obesidade. No mesmo sentido, o estudo de Rosas et al., 32 que comparou a percepção de mães de crianças no México com a de mães de uma comunidade de imigrantes mexicanos na Califórnia, demonstrou que apenas 10% das mães da Califórnia classificaram corretamente seus filhos que tinham excesso de peso, enquanto 82% das que viviam no México acertaram o estado nutricional dos filhos.
Considerando o aumento da prevalência de obesidade em todo o mundo e em todas as faixas etárias, é possível que a mãe encare o excesso de peso das crianças e adolescentes como uma condição normal, sobretudo quando toda a família é obesa, ou quando o excesso de peso é algo recorrente na comunidade em que vive.
Não há unanimidade entre os estudos quanto ao instrumento utilizado para avaliar a percepção das mães, sendo que, entre os artigos incluídos, três utilizaram escalas de silhuetas, nas quais as mães escolhiam a imagem que julgavam representar bem o corpo dos filhos.18,32,47 Os demais estudos utilizaram questionários em que as mães assinalavam a alternativa que melhor representasse o estado nutricional de seus filhos, mas a forma de representar o estado nutricional também variou entre estes estudos. Pela simples observação dos resultados obtidos com os diferentes instrumentos, não foi possível identificar diferenças na capacidade de percepção das mães utilizando escalas de imagem ou questionários. No entanto, o estudo de Lazzeri et al.47 utilizou os dois instrumentos para avaliar a percepção das mães, verificando que, pela escala de silhuetas, 35% delas subestimaram o estado nutricional dos filhos com sobrepeso e 53% dos filhos obesos; já com o uso de questionário, estes valores de subestimativa subiram para 59% e 87% para sobrepeso e obesidade, respectivamente.
Outro ponto de divergência entre os estudos, que poderia influenciar o índice de acerto das mães, diz respeito ao critério diagnóstico utilizado para o estado nutricional, já que os resultados obtidos por diferentes critérios podem ser diferentes para uma mesma criança ou adolescente, conforme estudos realizados em diferentes países.53–57
Os critérios mais utilizados para a avaliação do estado nutricional pelo índice de massa corporal – IMC, por idade e sexo, são: IOTF – International Obesity Task Force,19 CDC – Centers for Disease Control and Prevention20,21 e WHO – World Health Organization.22 Em nossa revisão, apenas um artigo utilizou critério diferente destes, definindo excesso de peso para as crianças acima do percentil 90 do IMC.23 Também, somente um artigo utilizou o critério da Organização Mundial da Saúde.43 O critério da IOTF apareceu em seis artigos,30,33,44,47,50,52 e o dos CDC em nove.16,18,31,32,42,45,46,48,49
A observação dos resultados obtidos nos artigos analisados nesta revisão não permite identificar qualquer tendência de percepção das mães como melhor ou pior, em função do critério diagnóstico utilizado. Não encontramos em nossa busca estudos que tenham comparado a percepção das mães quanto ao estado nutricional de seus filhos determinado por diferentes critérios diagnósticos, mas a meta‐análise realizada por Rietmeijer‐Mentink et al.25 demonstrou que o agrupamento dos dados dos diferentes estudos incluídos não encontrou diferenças estatisticamente significantes entre os escores de sensibilidade para os diferentes pontos de corte utilizados pelos três critérios.
Neste sentido, no presente estudo, foram calculadas a sensibilidade e a especificidade da percepção materna quanto ao estado nutricional dos filhos para todos os estudos em que os dados disponíveis possibilitavam esta análise, totalizando dez artigos (tabela 3). Independentemente do critério diagnóstico utilizado, de um modo geral, os estudos demonstraram baixa sensibilidade e alta especificidade, ou seja, baixa capacidade de as mães perceberem o excesso de peso dos filhos e boa capacidade de identificarem como eutróficos aqueles que se encontravam nesta condição.
Foi possível verificar que a maioria dos estudos incluídos focou seus resultados e discussão na subestimativa do estado nutricional, pois parece ser este o maior problema na percepção materna. Além disso, na maioria dos estudos, é baixa a proporção de mães que superestimam o estado nutricional de seus filhos eutróficos ou com sobrepeso. Entretanto, naqueles estudos em que havia crianças com baixo peso, grande parte das mães percebia como eutróficos os seus filhos nesta condição.
No estudo de Binkin et al.30 para as 37.590 crianças avaliadas, apenas 3,2% das mães superestimaram o estado nutricional; entretanto, para as 344 crianças que tinham baixo peso, 43,2% de suas mães as viam como eutróficas. No Brasil, o estudo realizado por Molina et al.50 demonstrou que 2,7% das mães superestimaram o estado nutricional dos filhos, mas quando os dados se referiam apenas àqueles com baixo peso, a proporção de subestimativa foi de 26%.
Nesse contexto, parece que a tendência de as mães superestimarem o estado nutricional de seus filhos com baixo peso também merece atenção e deveria ser melhor investigada em estudos sobre esta temática.
Considerando a qualidade dos estudos revisados e os resultados obtidos, a presente revisão sistemática pode contribuir para o entendimento dos aspectos relacionados à percepção das mães quanto ao estado nutricional de seus filhos, bem como servir de base para a realização de outros estudos nesta área.
ConclusãoA maioria dos estudos demonstrou que as mães percebem mal o estado nutricional de seus filhos, tendendo a subestimar principalmente nos casos de sobrepeso e obesidade. Tal fato merece atenção, uma vez que, caso o excesso de peso não seja percebido, dificilmente a criança ou adolescente será encaminhada para um programa de tratamento, o que pode contribuir para a crescente prevalência de excesso de peso em populações pediátricas.
Conflitos de interesseOs autores declaram não haver conflitos de interesse.
Como citar este artigo: Francescatto C, Santos NS, Coutinho VF, Costa RF. Mothers’ perceptions about the nutritional status of their overweight children: a systematic review. J Pediatr (Rio J). 2014;90:332–43.
A instituição oficial de execução foi a Universidade Gama Filho (UGF), Rio de Janeiro, RJ, Brasil.