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Vol. 90. Núm. 5.
Páginas 464-471 (setembro - outubro 2014)
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Vol. 90. Núm. 5.
Páginas 464-471 (setembro - outubro 2014)
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Factors associated with low consumption of fruits and vegetables by preschoolers of low socio‐economic level
Fatores associados ao baixo consumo de frutas e verduras entre pré‐escolares de baixo nível socioeconômico
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Julia L. Valmórbidaa,
Autor para correspondência
juliavalmorbida@yahoo.com.br

Autor para correspondência.
, Márcia R. Vitolob
a Núcleo de Pesquisa em Nutrição, Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), Porto Alegre, RS, Brasil
b Departamento de Nutrição, Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), Porto Alegre, RS, Brasil
Conteúdo relacionado
J Pediatr (Rio J). 2014;90:437-910.1016/j.jpedp.2014.06.002
Benjamin W. Chaffee
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Estatísticas
Figuras (1)
Tabelas (3)
Tabela 1. Descrição da amostra
Tabela 2. Fatores associados ao baixo consumo de frutas entre crianças de 2‐3 anos
Tabela 3. Fatores associados ao baixo consumo de verduras entre crianças de 2‐3 anos
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Abstract
Objective

To evaluate factors associated with low consumption of fruits and vegetables among preschoolers from families treated at basic health centers in Porto Alegre, RS, Brazil.

Methods

This was a cohort study nested in a randomized field trial. Data collection was performed through structured questionnaires to obtain demographic and dietary data, combined with two 24‐hour recalls in the age groups 12–16 months and again at 2–3 years of age. Data on the consumption of one daily serving of fruits (80g) and vegetables (60g) were evaluated, as well as consumption of non‐recommended foods such as candy, chocolate, and soft drinks. Statistical analyses were performed using Poisson regression with robust estimation.

Results

A total of 388 children aged 2‐3 years were evaluated; of these, 58% and 87.4% did not consume one daily serving of fruits and vegetables, respectively. The following factors were negatively associated with fruit consumption: family income higher than four minimum wages, (p=0.024), lower paternal educational level (p=0.03), and lower fruit consumption at 12–16 months (p=0.002). Factors negatively associated with the consumption of vegetables were low paternal educational level (p=0.033) and consumption of high‐sugar content beverages at 12–16 months (p=0.014).

Conclusion

This study demonstrated a high prevalence of children who consumed less than one daily serving of fruit and vegetables; early feeding practices, parental education, and family income were associated with this process.

Keywords:
Preschooler
Food consumption
Fruits
Vegetables
Resumo
Objetivo

Avaliar os fatores associados ao baixo consumo de frutas e verduras entre pré‐escolares de famílias usuárias da rede básica de saúde de Porto Alegre, RS, Brasil.

Métodos

Estudo de coorte aninhado a ensaio de campo randomizado. A coleta de dados foi feita por meio de questionários estruturados para obtenção de dados dietéticos e sociodemográficos, além de dois recordatórios de 24 horas nas faixas etárias de 12–16 meses e novamente aos 2‐3 anos de idade. Foram avaliados os dados de consumo de uma porção diária de frutas (80g) e verduras (60g), além de consumo de alimentos não recomendados, como balas, chocolates e refrigerantes. As análises estatísticas foram feitas por regressão de Poisson com estimativa robusta.

Resultados

Foram avaliadas 388 crianças de 2‐3 anos, destas 58% e 87,4% não consumiram uma porção de frutas e verduras, respectivamente. Os fatores que se mostraram negativamente associados ao consumo de frutas foram: renda familiar superior a 4 salários mínimos, (p=0,024), menor escolaridade paterna (p=0,03) e menor consumo de frutas aos 12–16 meses (p=0,002). Os fatores negativamente associados à ingestão de verduras foram a menor escolaridade paterna (p=0,033) e consumo de refrigerante aos 12–16 meses (p=0.014).

Conclusão

Os resultados deste estudo mostraram alta prevalência de crianças que consumiram menos de uma porção de frutas e verduras ao dia e sugerem que práticas alimentares precoces, escolaridade paterna e renda estão associadas a esse processo.

Palavras‐chave:
Pré‐escolar
Consumo de alimentos
Frutas
Verduras
Texto Completo
Introdução

A alimentação nos primeiros anos de vida exerce papel fundamental no crescimento e desenvolvimento infantil,1 e a introdução adequada de alimentos sólidos é extremamente importante, pois pode afetar a aceitação dos alimentos no futuro.2 Dentre as políticas de alimentação e nutrição, o incentivo ao consumo de frutas e verduras destaca‐se entre as diretrizes de promoção à alimentação saudável,3,4 pois o consumo insuficiente de frutas e verduras foi considerado um dos principais fatores responsáveis pela carga global de doenças dos indivíduos em todo o mundo.5

As crianças em idade pré‐escolar caracterizam‐se por apresentarem maiores necessidades de micronutrientes quando comparadas com as necessidades energéticas.6 Esse aspecto, somado às evidências que os pré‐escolares estão consumindo dietas ricas em gordura saturada e açúcar e pobre em fibra alimentar,6,7 torna esse grupo etário vulnerável ao desenvolvimento de obesidade e deficiência de micronutrientes.6 Além disso, foi demonstrado que as crianças preferem os alimentos de maior densidade energética, principalmente pelas consequências fisiológicas positivas que eles proporcionam relacionadas à saciedade e garantia do aporte de energia,8 podendo, assim, prejudicar o consumo de verduras e frutas.

Diante das evidências anteriormente comentadas, de que a qualidade da alimentação consumida por crianças é fundamental para a promoção de saúde e prevenção de doenças crônicas não transmissíveis, os objetivos do presente estudo foram avaliar o consumo de frutas e verduras de crianças de baixo nível socioeconômico e os fatores maternos e familiares envolvidos nesse processo.

Método

O estudo constituiu‐se de coorte aninhada a ensaio de campo randomizado, que ocorreu entre abril de 2008 e maio de 2012, com mães e crianças acompanhadas desde os seis meses aos 2‐3 anos de idade. A fase de recrutamento ocorreu durante o terceiro trimestre da gestação, em unidades de saúde das oito áreas distritais de Porto Alegre, Brasil. Em todas as fases, a equipe de coleta de dados foi composta por aproximadamente vinte membros, nutricionistas e acadêmicos de nutrição, previamente capacitados. As equipes foram distribuídas de acordo com a região distrital, sendo a coleta realizada sempre por, no mínimo, dois membros da equipe.

O tamanho amostral considerou o objetivo do ensaio de campo randomizado, de que uma intervenção realizada com profissionais da rede básica de saúde aumentaria as taxas de aleitamento materno. A intervenção consistiu em atualização sobre o guia alimentar “10 passos para uma alimentação saudável para crianças menores de 2 anos”3 para todos os profissionais que atuavam nas unidades de saúde selecionadas, além do fornecimento de materiais educativos baseados no guia, a serem entregues para todas as mães em fase de pré‐natal e puericultura. Considerou‐se, para cálculo amostral, poder de 90%, nível de confiança de 95% e coeficiente de correlação de cluster de 1,5, que determinou avaliação de 300 pares de mãe‐bebê em cada grupo. Considerando previsão de perdas de 20%, estimou‐se o recrutamento de 720 indivíduos para que o número amostral fosse atingido.

As gestantes foram identificadas, convidadas a participar do estudo e orientadas quanto aos procedimentos. Após a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, responderam ao questionário, informando dados de idade, escolaridade (anos de estudo), ocupação (remunerada ou não), paridade, situação conjugal e renda familiar (em número de salários mínimos, equivalente a R$477,40 no ano de 2008), data provável do parto, endereço e contato telefônico. Gestantes com HIV foram excluídas do estudo porque o aleitamento materno é contraindicado nessa situação.

As fases posteriores de coletas de dados foram realizadas por visitas domiciliares às crianças, quando com idades entre seis e nove meses, 12 e 16 meses e dois e três anos. Foram aplicados questionários estruturados e dois recordatórios de 24 horas em cada uma das etapas, com as mães ou o principal cuidador. Os recordatórios de 24 horas foram realizados para qualquer dia da semana ou final de semana, tendo sido padronizado que o mesmo não seria realizado em dias consecutivos para a mesma criança. Os cálculos nutricionais foram realizados no programa Dietwin Profissional® (Porto Alegre, Brasil), que tem como principal base a Tabela Brasileira de Composição de Alimentos,9 sendo utilizada média dos dois dias.

Os dados sociodemográficos foram obtidos no recrutamento e não foram repetidos nas outras etapas.

Coleta de dados: 6‐9 meses

Foram obtidos os dados referentes ao aleitamento materno exclusivo (tempo que a criança recebeu apenas leite materno, excluindo água, chá, líquidos ou qualquer outro alimento).

Coleta de dados: 12‐16 meses

Os consumos de frutas e verduras na faixa etária de 12‐16 meses foram avaliados por meio de questionário especifico, o qual continha perguntas referentes ao consumo de frutas e verduras na ultima semana.

As mães ou cuidadores responderam às perguntas “Quantas vezes na última semana seu filho consumiu frutas?” e “Quantas vezes na última semana seu filho consumiu verduras?”. Dessa forma, obtivemos a frequência de consumo de frutas e verduras aos 12‐16 meses de idade

Foi calculado o percentual energético proveniente de alimentos não recomendados, por meio dos recordatórios de 24 horas. Segundo orientação do Ministério da Saúde,3 os alimentos considerados não recomendados para consumo de crianças menores de dois anos foram: balas, pirulitos, chocolates, biscoitos recheados, gelatinas, queijos petit suisse, achocolatados, embutidos, salgadinhos, refrigerantes, sucos artificiais e açúcares adicionados.

Durante a aplicação do questionário, as mães também informaram aos pesquisadores se seus filhos haviam consumido os alimentos acima citados no mês anterior. Com essa informação, foi obtido o número de tipos diferentes de alimentos não recomendados que as crianças tinham consumido. Esse dado foi utilizado para agrupar as crianças conforme o consumo de alimentos não recomendados, classificando aquelas que haviam consumido menos de quatro alimentos e aquelas que haviam consumido quatro tipos ou mais. Não foi considerado, nesse grupo, o consumo de refrigerantes e sucos artificiais, pois essa informação gerou a criação de um grupo adicional referente ao consumo de bebidas açucaradas.

Coleta de dados: 2‐3 anos

Foi realizada a avaliação antropométrica da mãe, com aferição de peso e estatura para cálculo de índice de massa corporal (IMC). O estado nutricional materno foi considerado adequado quando IMC < 25kg/m2, e como excesso de peso quando ≥ 25kg/m2, segundo classificação da Organização Mundial de Saúde.5

As variáveis dietéticas referentes ao consumo de frutas e verduras aos 2‐3 anos foram calculadas por meio dos dados dos recordatórios de 24 horas. Foi verificada a quantidade (em gramas) de frutas e verduras ingeridas e, com esse dado, averiguou‐se se houve consumo de pelo menos uma porção de cada categoria de alimentos. Foi considerada a porção de frutas equivalente a 80g, e para a de verduras, de 60g.3 As recomendações para o consumo de frutas e verduras são de três porções diárias de cada grupo alimentar.3 Para o cálculo da ingestão de frutas, o consumo de sucos naturais não foi considerado, e para o consumo de verduras foi considerada a ingestão de legumes, hortaliças e conteúdo sólido de sopas. Batata não foi considerada como pertencente ao grupo de vegetais, pois a mesma é tradicionalmente alocada nos grupo de alimentos ricos em carboidratos, de acordo com os guias alimentares brasileiros.3,4

Análises estatísticas

Os dados foram submetidos à dupla digitação no programa SPSS, versão 16.0 (Chicago, USA) e validados no programa Epi‐Info® versão 6.4 (Atlanta, USA). As análises estatísticas foram realizadas no software SPSS 16.0. Análises de frequência foram realizadas para descrição das variáveis categóricas e média e desvio‐padrão para variáveis contínuas. As variáveis contínuas foram testadas quanto à normalidade da sua distribuição pelo teste de Kolmogorov‐Smirnov e, quando a distribuição não se mostrou normal, foram apresentadas por mediana e intervalo interquartil.

O efeito da associação entre variáveis e desfecho e ter consumido ou não pelo menos uma porção de cada categoria foi examinado em análise bivariada por meio de regressão de Poisson, com estimativa robusta para ajuste de variâncias. As variáveis que evidenciaram associação com nível de significância estatística inferior ou igual a 20% (p ≤ 0,20) foram incluídas nas análises multivariadas. A magnitude da associação entre os fatores investigados e a prática alimentar foi estimada por meio de razões de prevalência e intervalos de confiança (IC 95%) em regressão de Poisson robusta bivariada e multivariada.

O estudo foi aprovado por Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre e obteve aprovação do Comitê de Ética da Prefeitura Municipal de Porto Alegre. As crianças com situações clínicas desfavoráveis foram encaminhadas aos serviços de saúde.

Resultados

A figura 1 representa o fluxograma da coleta de dados referente ao presente estudo, detalhando as perdas, recusas e exclusões ocorridas em cada fase. Destaca‐se que 149 famílias (20,8%) não foram localizadas para dar seguimento ao estudo, considerando‐se todas as fases da coleta de dados. Além disso, 87 crianças (12%) necessitaram ser excluídas das análises por não terem recordatórios de 24h aos 12‐16 meses e/ou aos 3‐4 anos.

Figura 1.

Fluxograma das coletas de dados.

(0.19MB).

Dentre as crianças avaliadas, a distribuição entre os gêneros se deu de forma homogênea, sendo 51,8% (n = 201) das crianças do sexo masculino. A caracterização da amostra, quanto aos dados maternos e familiares, está descrita na tabela 1.

Tabela 1.

Descrição da amostra

  n (%) 
Idade materna
< 20 anos  81 (20,7%) 
≥ 20 anos  307 (79,2%) 
Escolaridade materna
< 8 anos  185 (47,6%) 
≥ 8 anos  203 (52,4%) 
Escolaridade paterna
< 8 anos  176 (45,7%) 
≥ 8 anos  212 (54,2%) 
Renda familiar
≤ 4 salários mínimos  309 (79,6%) 
> 4 salários mínimos  79 (20,3%) 
Ocupação materna
Remunerada  131 (44,7%) 
Não Remunerada  257 (66,2%) 
Ocupação paterna
Remunerada  351 (90,4%) 
Não Remunerada  37 (9,5%) 
Tempo de aleitamento materno exclusivo
< 4 meses  295 (75,9%) 
≥ 4 meses  93 (23,9%) 
Mãe com excesso de peso
Não  150 (38,7%) 
Sim  238 (61,2%) 
Número de filhos
Filho Único  174 (44,5%) 
Mais de 1  214 (55,4%) 

As prevalências de crianças com idade entre dois e três anos que não consumiram uma porção de frutas ou uma porção de verduras, considerando‐se o consumo médio obtido por dois recordatórios de 24 horas, foi de 58,0% (n = 225) e 87,4% (n = 340), respectivamente. A mediana de consumo de frutas e verduras ao dia entre as crianças foi de 55g (0‐130g) e 5g (0‐30g), respectivamente. Ao se avaliar quantas crianças consumiram as três porções de frutas e verduras recomendadas em pelo menos um dos inquéritos alimentares, observou‐se que somente 35 crianças (9%) alcançaram essa recomendação para frutas e uma (0,2%) para verduras.

As mães que, ao responderem ao questionário na coleta de 12‐16 meses, afirmaram oferecer frutas e verduras diariamente aos seus filhos representaram 50,4% e 42,4% da amostra, respectivamente.

O consumo energético dos alimentos não recomendados aos 12‐16 meses foi de, em média, 13,61% do valor energético total, sendo que para 9,2% das crianças esses alimentos representaram mais de 30% do consumo energético. As mães que relataram ter oferecido refrigerantes ou sucos artificiais e no mínimo três tipos diferentes de alimentos não recomendados no mês anterior à coleta de 12 ‐16 meses corresponderam a 83,3% e 68,3% da amostra, respectivamente.

Na tabela 2 são apresentadas as variáveis associadas ao consumo de frutas aos 2‐3 anos. Não houve associação significativa em relação a gênero, número de filhos, ocupação materna e paterna, tempo de aleitamento materno exclusivo, estado nutricional e escolaridade materna. Dentre as variáveis dietéticas, o consumo precoce de bebidas e alimentos açucarados, assim como o percentual energético provindo de alimentos não recomendados ingeridos aos 12‐16 meses, não se mostrou associado ao desfecho.

Tabela 2.

Fatores associados ao baixo consumo de frutas entre crianças de 2‐3 anos

  Razão de prevalência bruta (IC95%)a  Valor de p  Razão de prevalência ajustada (IC95%)b  Valor de p 
Grupo
Controle  1,078 (0,910‐1,276)  0,385  1,088 (0,955‐1,13)  0,443 
Intervenção     
Gênero
Feminino  1,085 (0,917‐1,284)  0,344  ‐  ‐ 
Masculino    ‐   
Número de filhos
Dois ou mais  1,101 (0,926‐1,309)  0,276  ‐  ‐ 
Um    ‐   
Ocupação materna
Não remunerada  1,011 (0,845‐1,210)  0,906  ‐  ‐ 
Remunerada    ‐   
Ocupação paterna
Não remunerada  1,047 (0,795‐1,397)  0,743  ‐  ‐ 
Remunerada    ‐   
Renda familiar
≤ 4 Salários mínimos  0,851 (0,705‐1,026)  0,090  0,803 (0,664‐0,971)  0,024 
> 4 Salários mínimos     
Anos de estudo materno  1,013 (0,981‐1,047)  0,431  ‐  ‐ 
Anos de estudo paterno  0,973 (0,994‐1,002)  0,065  0,961 (0,928‐0.997)  0,03 
Mãe com excesso de peso
Sim  1,031 (0,858‐1,239)  0,745  ‐  ‐ 
Não    ‐   
Tempo de aleitamento materno exclusivo
< 4 meses  1,021 (0,836‐1,247)  0,838  ‐  ‐ 
≥ 4 meses    ‐   
Consumo de bebidas açucaradas aos 12‐16 meses
Consumiu no mês anterior  1,094 (0,856‐1,399)  0,473  ‐  ‐ 
Não consumiu no mês anterior    ‐   
Consumo de alimentos ricos em açúcar aos 12‐16 meses (4 ou mais tipos)c
Não consumiu no mês anterior  1,082 (0,892‐1,312)  0,424  ‐  ‐ 
Consumiu no mês anterior    ‐   
Consumo semanal de frutas aos 12‐16 meses  0,941 (0,911‐0,972)  < 0,001  0,950 (0,919‐0,982)  0,002 
Percentual energético de alimentos não recomendados aos 12‐16 meses  1,001 (0,994‐1,009)  0,698  ‐  ‐ 

IC, intervalo de confiança.

a

Qui‐quadrado de Pearson.

b

Regressão de Poisson realizada com variáveis que apresentaram p ≤ 0,20 na análise bruta.

c

Alimentos avaliados: suco artificial, bolacha recheada, refrigerante, bala, salgadinho e gelatina.

Em relação à renda, as crianças cujas famílias possuíam renda superior a quatro salários mínimos apresentaram probabilidade 19% maior de não consumir uma porção de frutas ao dia. O maior nível de escolaridade paterna se mostrou associado ao consumo de frutas, sendo que, cada ano a mais de estudo influenciou em aproximadamente 4% a probabilidade de a criança consumir a porção de frutas. Além disso, a frequência semanal de consumo de frutas aos 12 meses mostrou associação positiva ao seu consumo aos 2‐3 anos, sendo que cada dia que a mãe ofereceu frutas a seu filho levou a um aumento de 5% na probabilidade de a criança consumi‐las em idade pré‐escolar.

A tabela 3 descreve as variáveis associadas ao consumo de verduras aos 2‐3 anos. Destaca‐se o nível de escolaridade paterno, em que cada ano de estudo repercutiu no aumento de quase 2% na probabilidade de consumir uma porção de verduras ou mais ao dia e o consumo de bebidas açucaradas aos 12‐16 meses, que aumentou em mais de 15% a probabilidade de a criança não consumir a porção de verduras.

Tabela 3.

Fatores associados ao baixo consumo de verduras entre crianças de 2‐3 anos

  Razão de prevalência bruta (IC95%)a  Valor de p  Razão de prevalência ajustada (IC95%)b  Valor de p 
Grupo
Controle  1,019 (0,945‐1,099)  0,621  1,035 (0,936‐1,087)  0,654 
Intervenção     
Gênero
Feminino  1,044 (0,968‐1,126)  0,267  ‐  ‐ 
Masculino    ‐   
Número de filhos
Dois ou mais  1,014 (0,939‐1,095)  0,725  ‐  ‐ 
Um    ‐   
Ocupação Materna
Não Remunerada  1,031 (0,949‐1,120)  0,467  ‐  ‐ 
Remunerada    ‐   
Ocupação Paterna
Não Remunerada  1,092 (0,998‐1,194)  0,055  1,042 (0,943‐1,151)  0,416 
Remunerada     
Renda familiar
≤ 4 Salários Mínimos  1,019 (0,924‐1,124)  0,708  ‐  ‐ 
> 4 Salários Mínimos    ‐   
Escolaridade materna (anos de estudo)  0,983 (0,969‐0,997)  0,020  1,001 (0,983‐1,019)  0,916 
Escolaridade paterna (anos de estudo)  0,979 (0,965‐0,992)  0,002  0,982 (0,965‐0,998)  0,033 
Mãe com excesso de peso
Sim  1,016 (0,932‐1,107)  0,716  ‐  ‐ 
Não    ‐   
Tempo de Aleitamento materno Exclusivo
< 4 meses  1,058 (0,958‐1,169)  0,262  ‐  ‐ 
≥ 4 meses    ‐   
Consumo de bebidas açucaradas aos 12‐16 meses
Consumiu no mês anterior  1,204 (1,038‐1,397)  0,014  1,155 (1,100‐1,333)  0,048 
Não Consumiu no Mês anterior     
Consumo de alimentos ricos em açúcar aos 12‐16 meses (4 ou mais tipos)c
Não Consumiu no Mês anterior  1,028 (0,941‐1,123)  0,538  ‐  ‐ 
Consumiu no mês anterior    ‐   
Consumo semanal de verduras aos 12‐16 meses  0,983 (0,969‐0,998)  0,023  0,990 (0,975‐1,005)  0,205 
Percentual energético de alimentos não recomendados aos 12‐16 meses  1,003 (0,965‐1,012)  0,244  ‐  ‐ 

IC, intervalo de confiança.

a

Qui‐quadrado de Pearson.

b

Regressão de Poisson realizada com variáveis que apresentaram p ≤ 0,20 na análise bruta.

c

Alimentos avaliados: suco artificial, bolacha recheada, refrigerante, bala, salgadinho e gelatina.

Discussão

Este estudo mostrou que 87% das crianças avaliadas consumiram menos de uma porção de verduras, e 58% não consumiram uma porção de frutas ao dia. Dados similares foram observados em estudo nacional realizado com crianças entre seis e 59 meses de idade, no qual foi observada baixa prevalência de consumo de frutas e verduras. Os autores observaram que menos de 50% das crianças consumiram frutas diariamente, e somente 12% consumiram verduras folhosas.10 Há evidências de que o padrão alimentar estabelecido nos primeiros anos irá permanecer ao longo da vida,11,12 pois a exposição precoce a determinados alimentos ou sabores atua fortemente em sua aceitação em curto e longo prazos.13 Os achados do presente estudo vão ao encontro dessas evidências, com a observação de que o consumo de frutas aos 12 meses de idade se mostrou associado ao consumo aos 2‐3 anos. Ressalta‐se que as recomendações para frutas e verduras são de três porções diárias, ou seja, 240g e 180g, respectivamente. O percentual de crianças que atingiu essas recomendações não foi suficiente para que as análises deste estudo fossem feitas com essa proposta.

Outro dado observado foi a associação entre ingestão de refrigerantes e de outras bebidas açucaradas no primeiro ano de vida e menor consumo de verduras aos 2‐3 anos. O consumo dessas bebidas, especialmente o de refrigerantes, tem aumentado de maneira ascendente entre as crianças,14 e alguns estudos associaram o consumo de bebidas ricas em açúcar ao aumento de peso e adiposidade15 e outras comorbidades, como o aumento da glicemia entre crianças e adultos.15,16 Beauchamp e Moran17 demonstraram que crianças apresentam preferências inatas ao sabor doce, e que a ingestão precoce de líquidos açucarados pode estimular ainda mais essa preferência. Somando‐se a isso, Skinner11 observou que, enquanto os alimentos doces estão entre os preferidos das crianças, os alimentos menos apreciados são os vegetais. Dessa forma, o estímulo das preferências inatas ao doce, com a oferta de refrigerantes e sucos artificiais, somado ao baixo consumo de vegetais nos primeiros anos de vida, pode afetar de forma negativa o desenvolvimento do comportamento alimentar.18

Fatores socioeconômicos e familiares estão diretamente relacionados ao desenvolvimento das práticas alimentares dos pré‐escolares.19 Apesar de a escolaridade materna ser a variável mais estudada e de forte influência nos desfechos de saúde e nutrição,20 no presente estudo, foi a baixa escolaridade paterna que se associou ao menor consumo de frutas e verduras. Há evidências de que a baixa escolaridade dos pais está relacionada ao menor entendimento das necessidades de saúde, menor cuidado com a saúde dos filhos,21 interferindo também no conhecimento e entendimento das recomendações e das necessidades nutricionais.19,22 Dessa forma, assim como neste estudo, outros pesquisadores observaram que pais com baixa escolaridade oferecem menos frutas e verduras a seus filhos.23,24

Os resultados deste estudo mostraram que crianças pertencentes às famílias de maior renda apresentaram menor probabilidade de consumir frutas. No entanto, é importante ressaltar que a nossa amostra foi composta somente por famílias de baixa condição socioeconômica, e que a comparação entre os diferentes extratos de renda se deu somente nesse universo. Dessa forma, uma hipótese para o resultado encontrado é que, neste grupo populacional, entre as famílias com melhor renda esteja ocorrendo substituição das frutas ofertadas às crianças por alimentos processados, com maior densidade energética, decorrente do maior poder de compra25 e da maior capacidade de aquisição desses alimentos.14 Pesquisa de alcance nacional observou que o aumento do consumo de alimentos com alta densidade energética pode estar associado à redução do consumo dos alimentos tradicionais na dieta dos brasileiros.14 Observou‐se, também, que padrões alimentares caracterizados por alta ingestão de doces, refrigerantes e lanches são mais frequentes em populações com maior poder de compra.14,26 Estudos realizados em outros países em desenvolvimento observaram resultados similares, relacionando padrões alimentares altamente energéticos a famílias de maior renda.27,28

Este estudo apresenta limitações a serem comentadas. O baixo nível socioeconômico da população estudada não permite extrapolar os resultados para outros grupos populacionais, os quais provavelmente teriam outros fatores determinantes dos desfechos aqui estudados. Entretanto, essa população usuária das unidades de saúde do Sistema Único de Saúde apresenta maior vulnerabilidade biológica e social, quando comparada com população de melhor condição socioeconômica, que requer vigilância e estratégias efetivas de promoção à saúde. Outra limitação a ser considerada é que as crianças avaliadas participaram de um ensaio de campo randomizado, e a intervenção realizada pode ter tido influência nos resultados. No entanto, minimizando os efeitos da intervenção, a variável grupo foi incluída na regressão com a finalidade de servir como controle para seu efeito e não se mostrou associada aos desfechos. Vale ressaltar, ainda, que não foi possível avaliar os fatores associados ao consumo insuficiente de verduras e frutas, pois mais de 90% das crianças não consumiram as três porções recomendadas.

Os resultados deste estudo permitem concluir que alta prevalência de crianças de 2‐3 anos atendidas em unidades de saúde e que ingerem menos de uma porção de frutas e verduras por dia sugere que a baixa escolaridade paterna e práticas alimentares no primeiro ano de vida estão envolvidas nesse processo. Assim, faz se urgente uma implementação efetiva, por profissionais de saúde, de práticas alimentares saudáveis no âmbito da puericultura, pois foi demonstrado, por meio de ensaio de campo randomizado,29,30 que mães de baixo poder aquisitivo melhoram a qualidade da alimentação oferecida a seus filhos por meio de aconselhamento dietético.

Financiamento

Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS).

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

Referências
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J.A. Mennella, J.C. Trabulsi.
Complementary foods and flavor experiences: setting the foundation.
Ann Nutr Metab, 60 (2012), pp. 40-50
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Como citar este artigo: Valmórbida JL, Vitolo MR. Factors associated with low consumption of fruits and vegetables by preschoolers of low socio‐economic level. J Pediatr (Rio J). 2014;90:464–71.

Estudo conduzido no Núcleo de Pesquisa em Nutrição (NUPEN) da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA).

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