Compartilhar
Informação da revista
Vol. 96. Núm. 4.
Páginas 456-463 (Julho - Agosto 2020)
Compartilhar
Compartilhar
Baixar PDF
Mais opções do artigo
Visitas
2801
Vol. 96. Núm. 4.
Páginas 456-463 (Julho - Agosto 2020)
Artigo Original
Open Access
Cross‐cultural adaptation and validation of the universal Portuguese‐version of the Pediatric Functional Assessment of Chronic Illness Therapy – Fatigue (pedsFACIT‐F)
Adaptação transcultural e validação da versão portuguesa universal da Escala Avaliação Funcional Pediátrica de Terapia de Doença Crônica – Fadiga (pedsFACIT‐F)
Visitas
2801
Karla P. Fernandesa,
Autor para correspondência
fernandeskp@uol.com.br

Autor para correspondência.
, Bruno S. Teixeiraa, Benjamin J. Arnoldb, Tânia M. da S. Mendonçaa, Sthela M. Oliveiraa, Carlos Henrique M. da Silvaa,c,d
a Universidade Federal de Uberlândia, Faculdade de Medicina, Programa de Pós‐graduação em Ciências da Saúde, Uberlândia, MG, Brasil
b FACITtrans, Elmhurst, Estados Unidos
c Universidade de São Paulo (USP), Faculdade de Medicina, São Paulo, SP, Brasil
d Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Grupo de Pesquisa em Qualidade de Vida Relacionada à Saúde, Uberlândia, MG, Brasil
Este item recebeu

Under a Creative Commons license
Informação do artigo
Resume
Texto Completo
Bibliografia
Baixar PDF
Estatísticas
Figuras (2)
Tabelas (2)
Tabela 1. Características sociodemográficas dos participantes
Tabela 2. Parâmetros dos itens da TRI para escala pedsFACIT‐F
Mostrar maisMostrar menos
Abstract
Objective

To cross‐culturally adapt and validate the universal Portuguese version of the Pediatric Functional Assessment of Chronic Illness Therapy – Fatigue (pedsFACIT‐F).

Method

The universal Portuguese version of the pedsFACIT‐F was cross‐culturally adapted and validated in 323 children and adolescents aged 8–18 years, 173 healthy individuals, and 150 with chronic diseases (cancer, juvenile idiopathic arthritis, and diabetes). Reliability (internal consistency and test–retest reliability) was assessed. Item response theory model assumptions were evaluated using confirmatory and exploratory factor analyses. Items were calibrated using a graded response model. Differential item functioning was assessed regarding age, gender, and clinical condition (healthy vs. chronic diseases).

Results

No major cultural adaptations were needed. Internal consistency (Cronbach's alpha=0.84) and test–retest reliability (intraclass correlation coefficient=0.92) were good. CFA (CFI=0.92, TLI=0.90, RMSEA=0.097) and CFE analysis confirmed sufficient unidimensionality. The data also fit the GRM and demonstrated good coverage of the fatigue construct (threshold parameters range: −1.42 to 4.56). No items demonstrated significant differential item functioning.

Conclusion

The universal Portuguese version of the pedsFACIT‐F provides a reliable, precise, and valid measure after being assessed by robust psychometric properties. Stability of the measurement properties of the pedsFACIT‐F scale allows its use to assess fatigue in clinical research in Portuguese‐speaking children and adolescents.

Keywords:
Fatigue
Children
Cross cultural translation
Validation
Calibration
Item response theory
Resumo
Objetivo

Adaptar transculturalmente e validar a versão portuguesa universal da escala Avaliação Funcional Pediátrica de Terapia de Doença Crônica – Fadiga (pedsFACIT‐F).

Método

A versão traduzida para o português universal e adaptada transculturalmente da escala pedsFACIT‐F foi validada em 323 crianças (entre 8 e 18 anos), 173 saudáveis e 150 com doenças crônicas (câncer, artrite idiopática juvenil e diabetes). A confiabilidade foi avaliada pela consistência interna e confiabilidade teste‐reteste. Os pressupostos do modelo da teoria da resposta ao item foram avaliados por meio da análise fatorial confirmatória e exploratória. Os itens foram calibrados segundo modelo de resposta gradual. O funcionamento diferencial do item foi examinado com respeito à idade, ao gênero e à condição de saúde (saudáveis versus doenças crônicas).

Resultados

A adaptação cultural não apresentou dificuldades substantivas. A confiabilidade da consistência interna (alfa‐Cronbach=0,84) e do teste‐reteste (correlação intraclasse=0,92) foram adequadas. As análises da AFC (CFI=0,92, TLI=0,90, RMSEA=0,097) e AFE confirmaram suficiente unidimensionalidade. O estudo de calibração demostrou bom ajuste do MRG e boa cobertura do construto fadiga (variação dos limiares das categorias de resposta: −1,42 a 4,56). Não foi verificada presença de funcionamento diferencial do item significante.

Conclusão

A versão portuguesa universal da escala pedsFACIT‐F é uma medida confiável, precisa e válida, verificada após análises de propriedades psicométricas robustas. A estabilidade das propriedades de medida da escala permite seu uso para avaliação de fadiga em estudos clínicos com crianças e adolescentes em países lusófonos.

Palavras‐chave:
Fadiga
Crianças
Tradução transcultural
Validação
Calibração
Teoria de resposta ao item
Texto Completo
Introdução

Fadiga é um sintoma constituído por componentes físicos, mentais e emocionais caracterizados por falta de energia, diminuição da capacidade de fazer atividades diárias e sensação de cansaço.1 É um construto subjetivo multidimensional de caráter agudo, episódico ou crônico e um importante componente da qualidade de vida relacionada à saúde, pois se correlaciona com estado de saúde, dor, função cognitiva e papel familiar ou social desempenhado.2 É um sintoma frequente em adolescentes “saudáveis” (30% a 40%) sobretudo do sexo feminino3 e em crianças e adolescentes com doenças crônicas como câncer, diabetes, doença inflamatória intestinal e artrite idiopática juvenil.1

Medidas de fadiga em crianças e adolescentes são importantes, pois permitem identificar o impacto desse sintoma, distinguir sujeitos com maior vulnerabilidade e avaliar e comparar resultados de ensaios clínicos.3 Algumas escalas foram desenvolvidas para aferir fadiga na faixa etária pediátrica: Fatigue Scale Child (FS‐C)4 e Fatigue Scale Adolescent (FS‐A)5; Promis – Pediatric Fatigue6; PedsQL Multidimensional Fatigue Scale (PedsQL‐MFS)7 e Avaliação Funcional Pediátrica de Terapia de Doença Crônica – Fadiga (pedsFACIT‐F).8 Dessas, apenas a PedsQL‐MFS foi traduzida para o português do Brasil e usada para se avaliar fadiga em crianças com artrite idiopática juvenil.9

A pedsFACIT‐F foi desenvolvida para ser respondida por crianças e adolescentes entre oito e 18 anos e suas propriedades psicométricas foram consideradas adequadas por meio de testes clássicos e modernos.8 A pedsFACIT‐F tem‐se revelado uma escala importante para clínicos e pesquisadores que desejam avaliar a presença de fadiga em crianças e adolescentes saudáveis e com doenças crônicas.1 A coleta de informações diretamente das crianças e dos adolescentes por meio de um instrumento válido e confiável é essencial para melhor conhecer as percepções de fadiga nessa faixa etária. A oferta dessa escala para uso universal em países lusófonos contribuirá para o atendimento integral à saúde desse grupo de crianças e permitirá estratégias de prevenção e tratamento desse sintoma. O objetivo do presente trabalho é fazer a adaptação transcultural e avaliar as propriedades psicométricas da versão portuguesa universal da pedsFACIT‐F.

MétodoDesenho do estudo e participantes

Estudo observacional metodológico, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisas com Seres Humanos da Universidade Federal de Uberlândia (CAAE:13446913.2.0000.5152). Foi obtida permissão formal, por e‐mail, do representante do FACIT.org para o uso da versão original da pedsFACIT‐F.

Entre setembro de 2014 e setembro de 2016, por meio de uma amostra de conveniência de 323 crianças e adolescentes, entre oito e 18 anos, 173 saudáveis, provenientes de escolas públicas locais, e 150 com doenças crônicas atendidas no Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia, foram convidados a responder a escala pedsFACIT–F. A escala foi aplicada após assinatura de termo de consentimento pelos pais e de assentimento, pelas crianças acima de 12 anos e mediante comprovação de literácia para leitura e interpretação de dois itens do instrumento. Determinamos que seriam excluídos do estudo os participantes que não respondessem a mais de dois itens. Um questionário com dados sociodemográficos foi respondido pelos pais. Com relação ao tamanho da amostra, para avaliação da equivalência semântica e conceitual em relação aos itens originais, testamos a versão pré‐teste em 10 participantes conforme recomendado por DeWalt et al.10 Para avaliar a equivalência das medidas psicométricas seguimos as orientações de Hair et al.11 de uso de uma amostra que contemple um mínimo de cinco a 10 participantes por cada item da escala.

A escala pedsFACIT‐F

A peds FACIT‐F é uma escala constituída por 13 itens do tipo Likert com cinco opções de respostas (“nunca” – escore = 0 a “sempre” – escore = 4), que medem a sensação de fadiga nos últimos sete dias, derivados de um banco de itens do peds‐FIB (Pediatric Fatigue Item‐Bank) composto por 51 itens calibrados por meio da metodologia da Teoria da Resposta ao Item. O pedsFACIT‐ F avalia fadiga como um conceito unidimensional e apresenta propriedades psicométricas satisfatórias conforme análises de teoria clássica e moderna.8

Tradução e adaptação cultural

A escala pedsFACIT–F foi traduzida para língua portuguesa de acordo com os critérios da metodologia de tradução FACIT um método iterativo amplamente validado que consiste das etapas de tradução, retrotradução, revisão da retrotradução por revisores independentes e harmonização. Na fase de tradução para língua portuguesa a escala foi avaliada por cinco tradutores e um revisor representante da empresa FACIT (FACIT.org). Após responder os itens, as crianças foram convidadas, por um meio de entrevista retrospectiva e cognitiva, a comentar sobre o entendimento de cada item e sua relevância para elas, tanto pessoal como cultural, e puderam fazer sugestões sobre itens ou termos considerados de difícil compreensão, ofensivos, redundantes ou inadequados. Após a aplicação do pré‐teste, as respostas foram enviadas aos autores da escala original para reformulação dos termos caso necessário.12

Estatística e testes psicométricos

A análise estatística descritiva foi usada para dados sociodemográficos dos participantes. Para as análises dos itens, os escores obtidos dos itens reversos foram revertidos de modo que escores mais altos passaram a representar maior percepção de fadiga no respondente.

Confiabilidade

A confiabilidade da escala foi avaliada através da consistência interna por meio do coeficiente de alfa‐Cronbach. Coeficientes acima de 0,7 foram considerados aceitáveis.13

Para verificar a reprodutibilidade, a escala foi reaplicada em 30 participantes após 14 dias e calculado o coeficiente de correlação intraclasse. As correlações foram consideradas adequadas quando acima de 0,90.14

Validade

Para confirmar o modelo original da escala pedsFACIT foi avaliada a validade de construto por meio da análise fatorial confirmatória (AFC).15 Além disso, os pressupostos epistemológicos para a Teoria de Resposta ao Item avaliados foram a unidimensionalidade, independência local e monotonicidade.16

A unidimensionalidade do construto foi verificada pela análise fatorial confirmatória (AFC), que usou matrizes de correlação policórica interitem e o algoritmo estimador de mínimos quadrados ponderados robustos ajustados pela média e variância (Mean and Variance – Adjusted Weighted Least Squares [WLSMV]) do programa MPlus (versão 6.12).17 Para avaliar os índices de ajuste do modelo proposto foram usados os coeficientes Índice de Ajuste Comparativo (Comparative Fit Index – CFI), Tucker‐Lewis Index (TLI) e raiz do erro quadrático médio de aproximação (Root Mean Square Error of Approximation [RMSEA]). Os itens foram considerados unidimensionais se CFI e TLI superiores a 0,90 e RMSEA inferior a 0,06.11 No caso de violação de um desses critérios, a suficiência da unidimensionalidade será confirmada se na Análise Fatorial Exploratória (AFE) (software SPSS 18.0) o primeiro fator extraído explica mais do que 20% da variância total no modelo e se a razão entre o percentual de explicação do primeiro fator é quatro vezes maior do que o percentual de explicação do segundo fator.15

A independência local foi investigada por meio da correlação da matriz de resíduos obtida na AFC com um fator geral. Correlações residuais maiores do que 0,25 são indicativas de possível dependência local. O impacto negativo da dependência local foi avaliado por meio da observação da mudança nos parâmetros dos itens após a retirada individual dos itens suspeitos de não atenderem a esse pressuposto.16

A monotonicidade foi aferida durante a calibração dos itens, através do programa IRTPRO 4.2. Foi executado o Modelo de Resposta Gradual (MRG)18 nesse programa, que considera um valor positivo para o parâmetro (a) (discriminação), resulta em uma monotonicidade crescente. Itens bem ajustados são indícios de que esse pressuposto foi devidamente atendido.19

Calibração

Os itens do pedsFACIT–F foram calibrados conforme MRG proposto por Samejima,18 que estima o grau de discriminação, parâmetro (a), e o grau de dificuldade, parâmetro (b), a partir das respostas dos itens.18 O parâmetro (a) representa a capacidade de respostas do item de discriminar respondentes com magnitudes de variável latente próximas. Valores do parâmetro (a) entre 0,01 e 0,34 são considerados muito baixos; de 0,35 a 0,64, baixos; de 0,65 a 1,34, moderados; de 1,35 a 1,69, altos; e acima de 1,70, muito altos.20 O parâmetro (b) refere‐se à dificuldade do item, ou seja, à sua localização ao longo do continuum da variável latente (fadiga) conforme limiar das categorias de respostas, por meio do método de máxima verossimilhança marginal. Itens idealmente perfeitos devem ter abrangência suficiente para conter os graus de dificuldade do construto medido.21 O índice SS‐X2 foi usado para avaliar o ajuste do modelo, itens com valores significativos (< 0,01) foram considerados como não ajustados. Essas análises foram feitas com o programa IRTPRO 4.02.18,22

Funcionamento Diferencial do Item (DIF)

O Funcionamento Diferencial do Item (DIF) refere‐se à possibilidade de dois indivíduos com o mesmo nível de traço latente (fadiga) responderem de forma distinta em razão de alguma característica particular. No presente estudo foram considerados grupos distintos segundo idade (oito a 12 anos versus 13 a 18 anos), gênero (masculino versus feminino) e estado de saúde (doenças crônicas versus saudáveis).

A magnitude e o impacto do DIF em itens de fadiga foram avaliados por meio de modelos de análise de regressão logística ordinal, com a interface do programa de computador R package Lordif (version 0.2‐2).23

A magnitude do DIF foi avaliada por meio do teste do qui‐quadrado (nível de significância de 0,01) e teste de Mc Fadden “Pseudo R2” (com mudança de 2% nos valores críticos). O impacto do DIF foi avaliado com base coeficiente de determinação (R2). Coeficientes R2 abaixo de 0,13 foram considerados insignificantes, entre 0,13 e 0,26, significância moderada e acima de 0,26, de DIF de impacto importante.23

ResultadosTradução e adaptação cultural

O processo de tradução, retrotradução e revisão da retrotradução não apresentou dificuldades. Para a fase do pré‐teste, a escala foi aplicada em dez crianças, cinco saudáveis e cinco com doenças crônicas. Em geral, os participantes relataram boa compreensão e facilidade de responder os itens. Os revisores consideraram os itens relevantes para a cultura portuguesa universal e não sugeriram modificações na escala. O tempo médio de preenchimento da escala variou de cinco a 10 minutos.

Participantes

Responderam a escala 323 crianças e adolescentes, 150 com doença crônica e 173 escolares. Os dados sociodemográficos estão listados na tabela 1. A média de idade foi de 138 meses (DP = 26,4) e a maioria do sexo feminino, tanto entre os pacientes (51,3%) quanto nos escolares (57,2%). Acima de 80% frequentavam o ensino fundamental.

Tabela 1.

Características sociodemográficas dos participantes

Características  Doenças crônicas(n = 150)  Saudáveis(n = 173) 
Idade média; meses (DP)  138,0 (28,0)  138,2 (26,8) 
Faixa etária (%)
8 a 12 anos  106 (70,6)  114 (65,9) 
13 a 18 anos  44 (29,3)  59 (34,1) 
Sexo (%)
77 (51,3)  99 (57,2) 
73 (48,7)  74 (42,8) 
Escolaridade (%)
Fundamental 1  38 (25,3)  47 (27,2) 
Fundamental 2  98 (65,3)  121 (69,9) 
Ensino médio  14 (9,3)  5 (2,9) 
Doenças crônicas (%)
Artrite juvenil  42 (28,0) 
Câncer  46 (30,6) 
Diabetes  62 (41,3) 

DP, desvio padrão.

Confiabilidade

A confiabilidade da consistência interna e a reprodutibilidade foram consideradas adequadas. O coeficiente alfa‐Cronbach da escala obtido foi de 0,84 e o de correlação intraclasse de 0,92 (intervalo de confiança entre 0,87‐0,95).

Validade

As análises da AFC mostraram um bom ajuste do modelo com índices TLI = 0,90, CFI = 0,92 e RMSEA = 0,097 (IC 90% entre 0,08 e 0,11). Como houve violação da unidimensionalidade (RMSEA > 0,06), foi feita a AFE, na qual o primeiro fator extraído explicou 38,0% da variância total dos itens e o segundo fator 8,2%, o que indica a suficiência da unidimensionalidade (fig. 1). Apenas um par de itens (pF11e pF1) apresentou correlação residual acima de 0,25, o que sugere possível violação da independência local. Após a retirada individual desses itens não foram observadas diferenças nos parâmetros estimados pela TRI. Portanto, foi confirmada a independência local dos itens.

Figura 1.

Gráfico de Declividade (Scree Plot) extraído da Análise Fatorial Exploratória da escala pedsFACIT‐F.

(0,06MB).
Calibração

O ajuste das categorias (parâmetros dos itens) no Modelo de Resposta Gradual é apresentado na tabela 2.

Tabela 2.

Parâmetros dos itens da TRI para escala pedsFACIT‐F

    Limiares das categorias de resposta 
Itens  b1  b2  b3  b4  SS‐X2 
Sinto‐me cansado/apF1  1,61  ‐1,42  ‐0,22  1,40  2,22  0,39 
Tenho energia (ou força)pF2  1,07  0,01  1,75  3,20  4,56  0,03 
Consegui fazer minhas coisasnormais em casapF3  0,84  0,45  1,83  3,05  4,37  0,24 
Tive dificuldade de começar coisas porque estava cansado/a demaispF4  2,10  ‐0,39  0,46  1,43  2,15  f0,11 
Tive dificuldade de acabar coisasporque estava cansado/a demaispF5  1,62  ‐0,34  0,64  1,75  2,69  0,17 
Precisei dormir durante o diapF6  0,95  ‐0,51  0,67  1,86  2,46  0,06 
Fiquei irritado por estar cansado/ademais para fazer as coisas que queriapF7  2,28  ‐0,09  0,48  1,04  1,57  0,10 
Tive dificuldade de brincar ou sair com os meus amigos tanto quanto gostaria porque estava cansado(a)pF8  1,76  0,54  1,15  1,77  2,27  0,01 
Precisei de ajuda para fazer minhas coisas normais em casapF9  0,96  ‐0,07  1,11  2,35  2,96  0,02 
Sinto‐me fraco(a)pF10  1,52  0,05  0,98  2,05  2,93  0,20 
Eu ficava cansado demais para comerpF11  1,19  1,26  2,05  2,92  4,42  0,00 
Estar cansado fez‐me ficar tristepF12  1,56  0,52  1,31  1,82  2,41  0,37 
Estar cansado fez me ficar zangadopF13  1,68  0,08  0,78  1,32  1,81  0,22 

a, parâmetro (a) de discriminação do item; b1‐4, categorias das respostas do parâmetro (b) de dificuldade do item.

Os valores do parâmetro (a) de discriminação variaram de 0,84 (pF3) a 2,28 (pF7). Cinco itens (pF2, pF3, pF6, pF9 e pF11) apresentaram valores do parâmetro (a) de discriminação considerados moderados, cinco (pF1, pF5, pF10, pF12 e pF13), alto poder de discriminação e três (pF4, pF7 e pF8), muito alto. Os valores do parâmetro (b) de dificuldade variaram de ‐1,42 a 4,56, o que demonstra uma cobertura adequada da variação do traço latente.

A Curva de Informação do Teste da versão portuguesa universal da escala peds‐FACIT‐F que relaciona a informação do teste com o erro de medida observado está representada na fig. 2.

Figura 2.

Curva de Informação do Teste da versão portuguesa universal da escala pedsFACIT‐F.

(0,1MB).
Funcionamento Diferencial do Item (DIF)

Não se verificou DIF entre grupos de participantes com doença crônica e saudáveis. Com relação à idade, houve presença de DIF uniforme nos pF9 e pF11 e com relação ao gênero, apenas o item pF11 mostrou DIF uniforme. O impacto do DIF foi considerado insignificante, pois os valores do pseudo‐R2 obtidos foram abaixo de 0,13.

Discussão

A versão final traduzida para o português universal da escala pedsFACIT‐F foi obtida após criteriosa metodologia que garantiu equivalência semântica, conceitual e cultural. O processo de validação contou, além das medidas psicométricas clássicas, com os princípios da TRI que oferecem vantagens na avaliação dos resultados relatadas por pacientes (Patient‐reported‐outcomes‐PROs), pois permitem a elaboração de testes adaptativos computadorizados ou de escalas individualizadas com poucos itens (short forms), uma vez que estimam os parâmetros de dificuldade e de discriminação do item de forma isolada.24 A versão portuguesa universal da escala pedsFACIT‐F apresentou confiabilidade e unidimensionalidade aceitáveis. A calibração dos itens mostrou ajustes do modelo satisfatórios e propriedades de medida consistentes quanto a idade e gênero avaliados pela DIF.

Observamos que, durante a fase de tradução e adaptação cultural, a escala foi respondida de forma rápida e não houve sugestões de alterações dos itens ou termos considerados inadequados ou desnecessários, o que demonstra boa compreensão e aceitação dos itens pelos respondentes. Das escalas disponíveis para avaliação do sintoma fadiga em crianças e adolescentes, apenas a PedsQL‐MFS foi traduzida e adaptada culturalmente para língua portuguesa do Brasil.9 Interessante notar que o termo fadiga não é referido nos itens da versão portuguesa universal da escala pedsFACIT‐F, mas o construto é garantido por meio das expressões de fácil entendimento como “falta de energia”, “cansaço” e “necessidade de repouso”. De fato, o termo fadiga nem sempre é de fácil compreensão, especialmente na faixa etária pediátrica. Portanto, é desejável que seja oferecida uma escala para a avaliação desse sintoma que traduza a complexidade e a multidimensionalidade do construto.25,26 A versão portuguesa universal da escala pedsFACIT‐F delineia‐se como uma ferramenta importante para prestadores de serviços de saúde e pesquisadores de países lusófonos que tratam principalmente de crianças e adolescentes com doenças crônicas. A validação de um instrumento para o contexto no qual será usado garante a fidedignidade dos dados coletados e sua aplicação em estudos multicêntricos.12 A confiabilidade da consistência interna e a reprodutibilidade da versão portuguesa universal da escala pedsFACIT‐F foram consideradas adequadas.

A escala peds‐FACIT‐F foi originalmente validada para crianças e adolescentes com câncer. Como no presente estudo, a unidimensionalidade do construto fadiga também foi confirmada por AFC. No entanto, ainda não está claramente estabelecido se fadiga deveria ser medida por meio de abordagem unidimensional ou multidimensional.8 No processo de avaliação das propriedades psicométricas do Banco de Itens Fadiga do Promis Pediátrico, foram identificadas duas dimensões (“cansaço” e “falta de energia”).6 Neste estudo, apenas 23% dos participantes tinham doenças crônicas. Embora fadiga ocorra tanto em crianças saudáveis como doentes, esse sintoma tem sido estudado predominantemente em crianças com câncer26 e está relacionado tanto com “cansaço” como “falta de energia”, mas no contexto de crianças saudáveis apenas a dimensão “cansaço” tem sido usada.3 Portanto, talvez a unidimensionalidade ou multidimensionalidade do conceito dependa da população estudada, se de indivíduos saudáveis ou com condições clínicas crônicas.

Como identificado na validação da escala original, nenhum item foi sinalizado com DIF de magnitude significante, no presente estudo, com respeito a idade, gênero ou condição de saúde. Isso significa que os itens da versão portuguesa universal da escala pedsFACIT‐F foram igualmente compreendidos independentemente de idade, gênero ou presença de doenças crônicas. Lai et al.,6 no entanto, identificaram DIF em mais de 50% dos itens do Banco de Itens Fadiga do Promis Pediátrico ao analisar uma coorte de 3.048 crianças e adolescentes entre oito e 17 anos. Segundo esses autores, a compreensão do conceito “cansado” pode variar conforme a idade. A aplicação da escala pedsFACIT‐F em futuros estudos com maior número de participantes deve ser feita para confirmar se a compreensão do conceito de fadiga permanece estável em toda faixa etária pediátrica.

Dependência local foi verificada apenas em um par de itens pF1: “Sinto‐me cansado” e pF11: “Estava cansado demais para comer”. Dependência local significa que a resposta dada a um item facilita ou interfere nas respostas aos demais itens. Entretanto, após a exclusão individual desses itens não foram observadas diferenças nos parâmetros estimados pela TRI. Acreditamos, portanto, que não se deve, por ora, retirar um item do par de itens com dependência local, até que seja comprovada essa tendência em estudos com crianças e adolescentes saudáveis e com doenças crônicas.

As análises de calibração indicam que os itens da escala pedsFACIT‐F apresentam um bom ajuste no modelo da TRI. A maioria dos itens mostraram bons parâmetros de discriminação e boa cobertura do construto, pois a variação dos limiares de respostas dos itens foi abrangente.

Vale notar que, como na validação da escala original para crianças com câncer, a escala peds‐FACIT‐F‐ mostrou‐se ideal para mensurar fadiga em crianças e adolescentes saudáveis e com doenças crônicas com maiores valores de traço latente (teta entre ‐1,4 e 3), ou seja, com intensidade moderada ou grave do sintoma. Esses resultados sinalizam para a necessidade de inclusão de itens que possam avaliar indivíduos com menor intensidade de fadiga.

Algumas limitações do estudo podem ser verificadas, relativas à composição e ao tamanho da amostra para as análises psicométricas. Foram recrutados para o estudo crianças e adolescentes de uma cidade brasileira. Dada a extensão territorial e diversidade cultural brasileira, bem como a possível variação no entendimento do conceito “fadiga”, será importante verificar se a versão para língua portuguesa da escala peds‐FACIT‐F mantém propriedades psicométricas adequadas nas outras regiões do país ou de outros países lusófonos. A participação de crianças e adolescentes saudáveis e com doenças crônicas (câncer, artrite idiopática juvenil e diabetes) possibilitou validar a escala nas principais condições clínicas associadas com o sintoma fadiga. No entanto, será necessário verificar se a ausência de DIF para idade, gênero e diagnóstico permanece em estudos com número maior de participantes.

Concluindo, a versão portuguesa universal da escala peds‐FACIT‐F apresenta adequadas propriedades psicométricas avaliadas tanto pela teoria clássica quanto pela TRI. Essa escala, composta de poucos itens, é precisa, confiável e válida e, dada a estabilidade das suas propriedades de medida quanto a idade, gênero e estado de saúde, poderá ser usada para a avaliação de fadiga em estudos clínicos que envolvem crianças e adolescentes saudáveis e com doenças crônicas.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

Referências
[1]
A. Crichton, S. Knight, E. Oakley, F.E. Babl, V. Anderson.
Fatigue in child health conditions: a systematic review of assessment instruments.
Pediatrics, 135 (2015), pp. e1015-e1031
[2]
C. O’Connell, E.K. Stokes.
Fatigue: concepts for physiotherapy management and measurement.
Phys Ther Rev, 12 (2007), pp. 314-323
[3]
M. Ter Wolbeek, L.J. van Doornen, A. Kavelaars, C.J. Heijnen.
Predictors of persistent and new‐onset fatigue in adolescent girls.
Pediatrics, 21 (2008), pp. e449-e457
[4]
M.J. Hockenberry, P.S. Hinds, P. Barrera, R. Bryant, J. Adams-McNeill, C. Hooke, et al.
Three instruments to assess fatigue in children with cancer.
J Pain Symptom Manag, 25 (2003), pp. 319-328
[5]
P.S. Hinds, M. Hockenberry, X. Tong, S.N. Rai, J.S. Gattuso, K. McCarthy, et al.
Validity and reliability of a new instrument to measure cancer‐related fatigue in adolescents.
J Pain Symptom Manag, 34 (2007), pp. 607-618
[6]
J.S. Lai, B.D. Stucky, D. Thissen, J.W. Varni, E.M. DeWitt, D.E. Irwin, et al.
Development and psychometric properties of the PROMIS(®) pediatric fatigue item banks.
Qual Life Res, 22 (2013), pp. 2417-2427
[7]
J.W. Varni, T.M. Burwinkle, E.R. Katz, K. Meeske, P. Dickinson.
The PedsQL in pediatric cancer reliability and validity of the pediatric quality of life inventory™ generic core scales, multidimensional fatigue scale, and cancer module.
Cancer, 94 (2002), pp. 2090-2106
[8]
J.S. Lai, D. Cella, M.J. Kupst, S. Holm, M.E. Kelly, R.K. Bode, et al.
Measuring fatigue for children with cancer: development and validation of the Pediatric Functional Assessment of Chronic Illness Therapy‐Fatigue (pedsFACIT‐F).
J Pediatr Hematol Oncol, 29 (2007), pp. 471-479
[9]
L.T. Paulo, C.A. Len, M.O. Hilario, A.S. Pedroso, M.S. Vitalle, M.T. Terreri.
Fatigue in children with juvenile idiopathic arthritis: reliability of the “Pediatric Quality of Life Inventory‐Multidimensional Fatigue Scale”.
Rheumatol Int, 35 (2015), pp. 133-139
[10]
D.A. DeWalt, N. Rothrock, S. Yount, A.A. Stone.
Evalutation of item candidates. The PROMIS qualitative item review.
[11]
J.F. Hair, W.C. Black, B.J. Babin, R.E. Anderson.
Multivariate data analysis.
6th ed., Prentice Hall, (2006),
[12]
S.L. Eremenco, D. Cella, B.J. Arnold.
A comprehensive method for the translation and cross‐cultural validation of health status questionnaire.
Eval Health Prof, 28 (2005), pp. 212-232
[13]
J.C. Nunally, I.H. Bernstein.
Psychometric theory.
3rd ed., McGraw‐Hill, (1994),
[14]
P.M. Fayers, D. Machin.
Quality of life.
2nd ed., John Wiley & Sons, (2007),
[15]
J.H. Kahn.
Factor analysis in counseling psychology research, training and practice: principles, advances and applications.
Couns Psychol, 34 (2006), pp. 684-718
[16]
M.O. Edelen, B.B. Reeve.
Applying item response theory (IRT) modeling to questionnaire development, evaluation, and refinement.
Qual Life Res, 16 (2007), pp. 5-18
[17]
L.K. Muthen, B.O. Muthen.
Mplus: statistical analysis with latent variables.
Muthen and Muthen, (2004),
[18]
F. Samejima.
Estimation of latent ability using a response pattern of graded scores.
Psychometrika Society, (1969),
[19]
D.C.L. Thissen, S.H.C. du Toit.
IRTPRO for windows.
Scientific Software International, (2017),
[20]
F.B. Baker.
The basics of item response theory.
2nd ed., Eric Clearinghouse on Assessment and Evaluation, (2001),
[21]
S.L. Bortolotti, R. Tezza, D.F. Andrade, A.C. Bornia.
Relevance and advantages of using the item response theory.
Qual Quant, 47 (2013), pp. 2341-2360
[22]
M. Orlando, D. Thissen.
Further examination of the performance of S‐X2, an item fit index for dichotomous item response theory models.
Appl Psychol Meas, 27 (2003), pp. 289-298
[23]
S.W. Choi, L.E. Gibbons, P.K. Crane.
An R package for detecting differential item functioning using iterative hybrid ordinal logistic regression/item response theory and Monte Carlo simulations.
J Stat Softw, 39 (2011), pp. 1-30
[24]
R.F. Devellis.
Classical test theory.
Med Care, 44 (2006), pp. S50-S59
[25]
D. Tomlinson, S. Zupanec, H. Jones, C. O'Sullivan, T. Hesser, L. Sung.
The lived experience of fatigue in children and adolescents with cancer: a systematic review.
Support Care Cancer, 24 (2016), pp. 3623-3631
[26]
M. McCabe.
Fatigue in children with long‐term conditions: an evolutionary concept analysis.
J Adv Nurs, 65 (2009), pp. 1735-1745

Como citar este artigo: Fernandes KP, Teixeira BS, Arnold BJ, Mendonça TM, Oliveira SM, Silva CH. Cross‐cultural adaptation and validation of the universal Portuguese‐version of the Pediatric Functional Assessment of Chronic Illness Therapy – Fatigue (pedsFACIT‐F). J Pediatr (Rio J). 2020;96:456–63.

Copyright © 2019. Sociedade Brasileira de Pediatria
Idiomas
Jornal de Pediatria
Opções de artigo
Ferramentas
en pt
Taxa de publicaçao Publication fee
Os artigos submetidos a partir de 1º de setembro de 2018, que forem aceitos para publicação no Jornal de Pediatria, estarão sujeitos a uma taxa para que tenham sua publicação garantida. O artigo aceito somente será publicado após a comprovação do pagamento da taxa de publicação. Ao submeterem o manuscrito a este jornal, os autores concordam com esses termos. A submissão dos manuscritos continua gratuita. Para mais informações, contate assessoria@jped.com.br. Articles submitted as of September 1, 2018, which are accepted for publication in the Jornal de Pediatria, will be subject to a fee to have their publication guaranteed. The accepted article will only be published after proof of the publication fee payment. By submitting the manuscript to this journal, the authors agree to these terms. Manuscript submission remains free of charge. For more information, contact assessoria@jped.com.br.
Cookies policy Política de cookies
To improve our services and products, we use "cookies" (own or third parties authorized) to show advertising related to client preferences through the analyses of navigation customer behavior. Continuing navigation will be considered as acceptance of this use. You can change the settings or obtain more information by clicking here. Utilizamos cookies próprios e de terceiros para melhorar nossos serviços e mostrar publicidade relacionada às suas preferências, analisando seus hábitos de navegação. Se continuar a navegar, consideramos que aceita o seu uso. Você pode alterar a configuração ou obter mais informações aqui.