To compare the changes in cardiorespiratory fitness in evaluations performed every ten years since 1978/1980, according to the nutritional status and gender of students in the city of Ilhabela, Brazil.
MethodsThe study is part of the Mixed Longitudinal Project on Growth, Development and Physical Fitness of Ilhabela. The study included 1,291 students of both genders, aged 10 to 11 years old. The study periods were: 1978/1980, 1988/1990, 1998/2000, and 2008/2010. The variables analyzed were: body weight, height, and cardiorespiratory fitness (VO2max - L.min−1 and mL.kg−1.min−1) performed using a submaximal progressive protocol on a cycle ergometer. Individuals were classified as normal weight and overweight according to curves proposed by the World Health Organization of body mass index for age and gender. Analysis of variance (ANOVA) with three factors followed by the Bonferroni method were used to compare the periods.
ResultsThe number of normal weight individuals (61%) was higher than that of overweight. There was a significant decrease in cardiorespiratory fitness in both genders. Among the schoolchildren with normal weight, there was a decrease of 22% in males and 26% in females. In overweight schoolchildren, males showed a decrease of 12.7% and females, of 18%.
ConclusionDuring a 30-year analysis with reviews every ten years from 1978/1980, there was a significant decrease in cardiorespiratory fitness in schoolchildren of both genders, which cannot be explained by the nutritional status. The decline in cardiorespiratory fitness was greater in individuals with normal weight than in overweight individuals.
Comparar as mudanças da aptidão cardiorrespiratória em avaliações a cada 10 anos a partir de 1978/1980, de acordo com o estado nutricional e o sexo de escolares do município de Ilhabela, Brasil.
MétodosO estudo faz parte do Projeto Misto-Longitudinal de Crescimento, Desenvolvimento e Aptidão Física de Ilhabela. Participaram do estudo 1.291 escolares de ambos os sexos, de 10 e 11 anos de idade. Os períodos analisados foram 1978/1980, 1988/1990, 1998/2000 e 2008/2010. As variáveis analisadas foram peso corporal, estatura e aptidão cardiorrespiratória (VO2máx - L.min−1 e mL.kg−1.min−1) realizada por um protocolo progressivo submáximo em um ciclo ergômetro. Os indivíduos foram classificados em eutróficos e excesso de peso mediante as curvas propostas pela Organização Mundial da Saúde de índice de massa corporal para idade e sexo. Para comparar os períodos, foi utilizado a ANOVA com três fatores, seguida pelo método Bonferroni.
ResultadosA quantidade de eutróficos (61%) foi maior do que a de excesso de peso. Houve diminuição significativa da aptidão cardiorrespiratória em ambos os sexos. Entre os escolares meninos e as meninas eutróficas houve diminuição de 22% e 26%, respectivamente. Nos escolares com excesso de peso, os meninos diminuíram em 12,7%, e as meninas, em 18%.
ConclusãoEm uma análise de 30 anos, com avaliações a cada 10 anos a partir de 1978/1980, houve uma diminuição significante da aptidão cardiorrespiratória em escolares de ambos os sexos, que não pode ser explicada pelo estado nutricional. A queda da aptidão cardiorrespiratória foi maior nos escolares eutróficos do que nos obesos.
Os níveis de aptidão física em jovens têm diminuído nos últimos anos, podendo contribuir para o desenvolvimento de diabetes, hipertensão e síndrome metabólica, e para o aumento do risco de doenças metabólicas e cardiovasculares na idade adulta.1 Cerca de 80% dos adolescentes do mundo não atingem a recomendação de 60 minutos de atividade física moderada a vigorosa por dia,2 que, aliado às enormes mudanças socioeconômicas nos últimos anos, teve como consequência o aumento do excesso de peso e obesidade.3
As baixas aptidões e atividades físicas4 estão associadas ao excesso de peso5 e, com a crescente prevalência de obesidade e a proporção de crianças com estilo de vida sedentário, sugerem que os níveis de aptidão cardiorrespiratória podem ter diminuído por distribuição aleatória em escolares de diferentes tamanhos.6
A aptidão cardiorrespiratória (VO2máx), a medida de forma absoluta (L.min−1) e a relativa à massa corporal total (mL. kg−1.min−1) têm sido adotadas, objetivando uma real comparação do condicionamento físico entre escolares de diferentes estaturas.1,5 Os valores relativos são mais utilizados para comparações entre indivíduos que diferem na massa corporal total e na massa magra, pois a musculatura envolvida na atividade física influencia nessas variáveis.7
Ao longo dos anos, diversas pesquisas têm associado as modificações da aptidão cardiorrespiratória a comportamentos sedentários, estado nutricional e variáveis antropométricas, principalmente em países desenvolvidos.8,9 Entretanto, a realidade em países em desenvolvimento é distinta, e a quantidade de estudos nessas regiões ainda é pequena.10–12
Para uma melhor compreensão do comportamento das variáveis de aptidão física de acordo com o estado nutricional de uma determinada população ao longo do tempo, estudos longitudinais parecem explicar o fenômeno de forma mais adequada. Em se tratando do Brasil, é escassa a quantidade de estudos que analisaram a aptidão cardiorrespiratória de acordo com o estado nutricional ao longo dos anos, sendo que muitos deles foram realizados como parte do Projeto Misto-Longitudinal de Ilhabela.10,13
Como a aptidão cardiorrespiratória é um importante componente da síndrome metabólica e um forte preditor de morte prematura, identificar mudanças nos níveis de atividade física durante a epidemia da obesidade pode indicar a necessidade de intervenções para melhorar o condicionamento físico de escolares.4 Neste estudo, a hipótese é de que a diminuição da atividade física, analisada em um período de 30 anos, esteja ocorrendo tanto em escolares utróficos quanto nos escolares com excesso de peso. Com isso, o objetivo do presente estudo foi comparar as mudanças da aptidão cardiorrespiratória com avaliações a cada 10 anos a partir de 1978/1980, de acordo com o estado nutricional e o sexo de escolares do município de Ilhabela, no estado de São Paulo.
2Material e métodosO presente estudo faz parte do Projeto Misto-Longitudinal de Crescimento, Desenvolvimento e Aptidão Física de Ilhabela, desenvolvido pelo CELAFISCS desde 1978, de forma ininterrupta, com uma avaliação semestral sempre nos meses de abril e outubro. Em 32 anos, houve 68 avaliações, sendo o mais extenso e detalhado estudo realizado em países em desenvolvimento nesta área do conhecimento, cuja principal característica reside no uso de equipamentos não sofisticados e técnicas não complexas, proporcionando facilidade e simplicidade de aplicação de testes em grandes grupos. Todas as avaliações foram realizadas por profissionais da área de saúde previamente treinados, realizadas em três dias consecutivos, com o objetivo de coletar dados referentes à aptidão física (antropométricos, neuromotores e metabólicos), nível de atividade física e alimentar, de crianças a partir dos sete anos de idade, por meio de testes e medidas padronizadas.14
A cidade de Ilhabela localiza-se ao litoral norte do estado de São Paulo (Brasil), tendo uma área territorial de 348km2. Consideraram-se os levantamentos feitos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística de 1980, 1991, 2000 e 2010 com a faixa etária de 10 e 11 anos. A população do município em 1980 era de 7.800 habitantes, sendo 394 escolares. Já em 1991, possuía 13.538 habitantes, sendo 641 escolares. No ano de 2000, era constituída de 20.836 habitantes, sendo 803 de 10 e 11 anos. Em 2010, a população do município era constituída de 28.176 habitantes e 1.036 escolares com 10 e 11 anos.15 A amostra participante da pesquisa (10 e 11 anos) representa 47% da população do município em 1978/1980, 1988/1990 e 1998/2000, e 52% em 2008/2010, respectivamente. No período do estudo observou-se aumento da população (3,6 vezes), diminuição proporcional dos escolares em relação ao total da população e mudança da atividade econômica, que passou a ser predominantemente de serviços.
Para compor a amostra deste estudo, foi analisado um banco de dados composto por mais de 16.000 avaliações e 3.200 escolares de ambos os sexos, de sete a 18 anos de idade, e que participaram das avaliações entre 1978 e 2011, sendo que 1.291 escolares (fig. 1: 726 meninos, 565 meninas) entre 10 e 11 anos atendiam os seguintes critérios de inclusão: (a) ter uma avaliação completa em um dos seguintes anos – 1978/1980, 1988/1990, 1998/2000 e 2008/2010; (b) ter entre 10 e 11 anos de idade; (c) estar regularmente matriculado na rede de ensino de Ilhabela; (d) não ter limitações clínicas nem funcionais para realizar teste de esforço; (e) os responsáveis deveriam assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido conforme a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Federal de São Paulo sob o protocolo 0056/10.
Os 1.291 escolares que participaram da pesquisa foram analisados em quatro avaliações, intercaladas a cada 10 anos, realizadas em um período de 30 anos: 1978/1980, 1988/1990, 1998/2000 e 2008/2010.
Em todas as avaliações foram realizadas medidas de peso corporal (kg) e estatura (cm). O peso corporal foi obtido com o escolar em posição ortostática de costas para a escala da balança (Filizola® modelo Personal Life), com afastamento lateral dos pés. Em seguida, era colocado no centro da plataforma, ereto, com o olhar num ponto fixo à frente.14 A estatura foi obtida por estadiômetro com base fixa e cursor móvel, com o escolar na posição ortostática, pés descalços e unidos, procurando pôr em contato com o instrumento de medida as superfícies posteriores do calcanhar, cintura pélvica, cintura escapular e região occipital. A medida foi feita com o indivíduo em apneia inspiratória, de modo a minimizar possíveis variações sobre esta variável antropométrica. A cabeça deveria estar no plano de Frankfurt, paralela ao solo. A medida foi feita com o cursor no ângulo de 90 graus em relação à escala.14 Foram feitas três medidas consecutivas, considerando a média aritmética como o valor final.
Foi feito o cálculo do índice de massa corporal (IMC) através das duas medidas citadas anteriormente. Para a classificação do estado nutricional, os escolares foram classificados em eutróficos com z-score entre -1 e 1 e excesso de peso com z-score maior que 1, de acordo com as curvas propostas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) de IMC para idade e sexo.16 Pelo fato de os escolares classificados com z-score menor que -1 terem sidos excluídos da pesquisa, o presente estudo se caracteriza por comparar dois grupos, um com eutróficos e outro com excesso de peso. Essa classificação tem sido utilizada para identificar o risco ou a condição efetiva de obesidade em populações.9
Para avaliar a aptidão cardiorrespiratória, foi estimada a potência aeróbica (VO2max) mediante um protocolo progressivo submáximo em bicicleta ergométrica mecânica (Monark® modelo Ergomedic 828E) com duração de oito minutos, com uma carga de aquecimento (quatro minutos) e outra carga de trabalho calculada a partir do peso corporal (quatro minutos). Os valores de pressão arterial, frequência cardíaca e percepção subjetiva de esforço foram medidos no repouso e a cada minuto do teste. Os escolares foram orientados a pedalar em uma rotação de 50 RPM e as bicicletas foram previamente calibradas antes das avaliações. Nos quatro períodos, foram utilizadas sempre as mesmas bicicletas ergométricas. O VO2max era apresentado em valores absolutos (L.min−1) e relativos à massa corporal (mL.kg−1.min−1), permitindo, assim, uma comparação mais precisa entre escolares com diferentes tamanhos. Para calcular o VO2max absoluto e relativo utilizou-se o nomograma de Åstrand,17 considerando a frequência cardíaca do último minuto da carga de esforço. Em todos os períodos analisados, todas as medidas e testes seguiram a mesma padronização.14 Como critério de qualidade interna de todas as medidas e testes, foram calculadas a objetividade e a reprodutibilidade das medidas obtidas em uma subamostra de 30 escolares selecionados aleatoriamente em cada avaliação. Foram encontradas variações da objetividade e da reprodutibilidade nos quatro períodos analisados, sendo: peso corporal 0,96 e 0,99, estatura 0,97 e 0,99 e potência aeróbica 0,58 e 0,88, respectivamente.
3Análise estatísticaFoi utilizada estatística descritiva, média, desvio-padrão, frequência e porcentagem. A variação entre 2008/2010 e 1978/1988 foi avaliada mediante o delta percentual (Δ%). A distribuição dos dados foi verificada pelo teste de Kolmogorov-Smirnov.18 A comparação entre as quatro ava- liações da aptidão cardiorrespiratória foi feita pela Análise de Variância com três fatores (sexo, década e estado nutricional), seguida pelo método de comparações múltiplas de Bonferroni.18 Os cálculos foram realizados pelo software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 18.0, e o nível de significância adotado foi de p<0,01.18
4ResultadosA partir de um banco de dados com mais de 16.000 avaliações realizadas desde 1978 até 2011, 1.291 escolares atenderam os critérios de inclusão. Em ambos os sexos, nas quatro avaliações realizadas no período de 30 anos com intervalos de 10 anos, a quantidade de eutróficos (n=789; 61%) foi maior do que excesso de peso (n=502). No sexo masculino, o número de escolares eutróficos foi maior do que excesso de peso em todas as avaliações. Nas meninas, o mesmo ocorre nas avaliações de 1998/2000 e 2008/2010 (fig. 1).
Na tabela 1, a análise de variância mostrou que, após três décadas, as médias dos valores dos dados antropométricos não foram estatisticamente diferentes nas quatro avaliações realizadas no período de 30 anos com intervalos de 10 anos, tanto nos eutróficos quanto nos escolares com excesso de peso.
Proporção de escolares eutróficos e excesso de peso e comparação das variáveis antropométricas entre os sexos e estado nutricional em escolares de Ilhabela.
1978/1980 | 1988/1990 | 1998/2000 | 2008/2010 | pa | Δ%b | |
---|---|---|---|---|---|---|
Eutroficos | ||||||
f (%) | ||||||
Meninos | 51(27,2) | 110(35,8) | 156(41,6) | 184(43,8) | ||
Meninas | 43(22,8) | 62(20,2) | 92(24,6) | 91(21,6) | ||
Total | 94(50,0) | 172(56,0) | 248(66,2) | 275(65,4) | ||
Peso corporal | ||||||
Meninos | 31,53(6,23) | 31,41(4,45) | 31,94(4,70) | 31,76(4,76) | 1,00 | 0,7 |
Meninas | 35,42(9,52) | 34,36(7,25) | 34,91(7,61) | 35,70(7,23)c | 1,00 | 0,7 |
Total | 32,41(0,87) | 32,48(0,54) | 33,08 (0,44) | 33,03 (0,42) | 1,00 | 1,9 |
Estatura | ||||||
Meninos | 138,80(5,88) | 138,83(7,46) | 140,06(6,82) | 139,82(7,43) | 1,00 | 0,7 |
Meninas | 141,31(6,46) | 139,62(7,80) | 141,68(6,58) | 143,42(8,11) | 0,87 | 1,4 |
Total | 139,37(0,94) | 139,11(0,58) | 140,68(0,48) | 140,98(0,45) | 0,64 | 1,1 |
Excesso de peso | ||||||
f (%) | ||||||
Meninos | 42(22,3) | 63(20,5) | 56(14,9) | 64(15,2) | ||
Meninas | 52 (27,7) | 72(23,5) | 71(18,9) | 82(19,4) | ||
Total | 94(50,0) | 135(44,0) | 127(33,8) | 146(34,6) | ||
Peso corporal | ||||||
Meninos | 46,02(9,90)d | 41,22(7,74)d | 46,70(45,20)d | 45,20(7,06)d | 1,00 | -1,7 |
Meninas | 38,60(7,84) | 39,57(9,54)d | 37,85(8,38)c | 38,73(8,39)c | 1,00 | 0,3 |
Total | 40,32(0,96)d | 40,09(0,69)d | 41,75 (0,63)d | 41,21(0,66)d | 1,00 | 2,2 |
Estatura | ||||||
Meninos | 145,60(9,21) | 141,60(10,65) | 146,76(8,12)d | 145,51(5,40)d | 1,00 | 0 |
Meninas | 147,18(7,96) | 145,77(8,51)d | 146,50(9,14)d | 148,40(7,63)d | 0,93 | 0,8 |
Total | 146,83(1,04)d | 144,46(0,74)d | 146,62(0,67)d | 147,30(0,71)d | 1,00 | 0,32 |
Quando comparado o estado nutricional, a tabela 1 exibe que as médias dos valores da estatura foram estatisticamente superiores em todas as avaliações nos escolares com excesso de peso quando comparada com os eutróficos. Quando comparado o estado nutricional dos meninos, é possível verificar que houve diferença significativa nas avaliações de 1998/2000 e 2008/2010. Já nas meninas, houve diferença significativa em 1988/1990, 1998/2000 e 2008/2010 (p ≤ 0,001).
Tanto a aptidão cardiorrespiratória absoluta e a relativa dos escolares eutróficos e com excesso de peso diminuíram significativamente ao se comparar a avaliação de 2008/2010 com todas as outras. No VO2máx absoluto e relativo, a diminuição foi maior nos escolares eutróficos (23,5% e 25,8%) do que naqueles com excesso de peso (15,2% e 16,2% respectivamente). Entre todos os períodos analisados, os resultados da avaliação de 2008/2010 foram inferiores estatisticamente aos das outras avaliações (tabela 2).
Comparação da aptidão cardiorrespiratória entre os sexos e estado nutricional em escolares de Ilhabela.
1978/1980 | 1988/1990 | 1998/2000 | 2008/2010 | pa | Δ%b | |
---|---|---|---|---|---|---|
Eutroficos | ||||||
VO2max (L.min−1) | ||||||
Meninos | 1,57(0,30)c | 1,43(0,32)c | 1,50(0,30)c | 1,26(0,33) | < 0,001 | -19,7 |
Meninas | 1,36(0,41) | 1,36(0,10)c | 1,35(0,20)c | 1,10(0,15)d | < 0,001 | -19,1 |
Total | 1,53 (0,45)c | 1,40(0,26)c | 1,44(0,21)c | 1,17 (0,23) | < 0,001 | -23,5 |
VO2max (mL.kg−1.min−1) | ||||||
Meninos | 50,06(5,95)c | 46,01(9,81)c | 47,22(9,38)c | 38,98(4,78) | < 0,001 | -22,1 |
Meninas | 36,64(5,97)d | 39,81(4,18)c,d | 39,51(5,83)c,d | 27,15(4,61)d | < 0,001 | -25,9 |
Total | 47,90(1,37)c | 43,88 (0,79)c | 44,32(0,65)c | 35,5(3,24) | < 0,001 | -25,8 |
Excesso de peso | ||||||
VO2max (L.min−1) | ||||||
Meninos | 1,67(0,27) | 1,63(0,36) | 1,63(0,33) | 1,47(0,34) | 0,08 | -12 |
Meninas | 1,46(0,35)c | 1,44(0,25)c | 1,46(0,19)c | 1,17(0,20)d | < 0,001 | -20 |
Total | 1,51(0,51)c | 1,49(0,33)c | 1,53(0,30)c,e | 1,28(0,35) | < 0,001 | -15,2 |
VO2max (mL.kg−1.min−1) | ||||||
Meninos | 36,50(6,10)e | 40,53(6,59) | 35,63(5,36)e | 31,84(6,37)e | 0,07 | -12,7 |
Meninas | 37,15(3,69) | 36,15(4,93)c | 39,63(4,42)c | 30,42(3,68) | < 0,001 | -18 |
Total | 36,98(1,56)c,e | 38,23(1,01)c,e | 37,84(0,91)c,e | 30,96(4,74)e | < 0,001 | -16,2 |
Ainda comparando a avaliação de 2008/2010 com todas as outras, foi encontrada uma diminuição significante nos valores da aptidão cardiorrespiratória absoluta e relativa nos escolares eutróficos em ambos os sexos e nas meninas com excesso de peso (tabela 2).
Quando comparado o estado nutricional, no que se refere à aptidão cardiorrespiratória absoluta, os escolares com excesso de peso tiveram valores estatisticamente diferentes e maiores somente na avaliação de 1998/2000. Já no caso da aptidão cardiorrespiratória relativa, os escolares com excesso de peso tiveram valores estatisticamente menores nas quatro avaliações (tabela 2).
No que se refere à potência aeróbica (L.min−1), é possível verificar que não houve diferença significativa de acordo com o estado nutricional em todas as avaliações realizadas, com exceção na avaliação de 1998/2000 (tabela 2).
Na potência aeróbica em termos relativos (mL.kg−1.min−1), os meninos eutróficos obtiveram valores estatisticamente maiores do que os com excesso de peso na avaliação de 1978/1980 (p=0,003), 1998/2000 (p=0,001) e 2008/2010 (p ≤ 0,001). Nas meninas, é possível verificar que não foi encontrada diferença estatística entre o estado nutricional e no VO2máx relativo (tabela 2).
Comparando os sexos dos escolares eutróficos, os meninos obtiveram valores superiores aos das meninas no VO2máx absoluto, na avaliação de 2008/2010, e em todas as avaliações no VO2máx relativo. Já nos escolares com excesso de peso, os meninos tiveram valores estatisticamente superiores aos das meninas, somente em 2008/2010, no VO2máx absoluto.
5DiscussãoNo estudo atual, foi possível encontrar uma diminuição significante da aptidão cardiorrespiratória em ambos os sexos em quatro avaliações realizadas no período de 30 anos, com intervalos de 10 anos, que não pode ser explicada pelo estado nutricional. Essa queda foi maior nos escolares eutróficos do que nos obesos de Ilhabela.
Uma revisão de literatura mostrou que, em 33 anos (1970-2003), a aptidão cardiorrespiratória (VO2máx) diminuiu -0,46% por ano em escolares de 27 países do mundo, valores inferiores aos do presente estudo (0,51%)19. Os achados do presente estudo corroboram com outras pesquisas realizadas em que maiores declínios em atividade física são encontrados nas meninas do que nos meninos.20 Já Tomkinson et al.21 verificaram uma queda de 0,46% ao ano nos meninos e 0,41% nas meninas.
Embora diversos estudos10,22 sejam apresentados na literatura em relação à tendência secular de crescimento, é de suma importância ressaltar a importância da discussão baseada em estudos desenvolvidos no mesmo projeto, com uma população que vive no mesmo lugar, utilizando a mesma metodologia e padronização de medidas.10,13 Rejman e Matsudo13 realizaram uma pesquisa com escolares do Projeto de Ilhabela e verificaram que, em 10 anos, os meninos apresentaram altura significativamente maior (3,2cm). Nas meninas, não foi encontrada diferença no período analisado, porém verificou-se um aumento de 1,4cm. Utilizando o mesmo método do presente estudo para controlar o estado nutricional, Ferrari et al.10 encontraram modificações da adiposidade em 20 anos (1990-2010), sendo que, em ambos os sexos, o aumento foi maior nos escolares com excesso de peso do que nos eutróficos.
As enormes mudanças socioeconômicas no Brasil nas últimas três décadas tiveram como consequência o aumento da obesidade e da estatura, que estão se aproximando dos países desenvolvidos.3 O número de crianças brasileiras acima do peso mais que triplicou (1975-2009), passando de 9,8% para 33,4%.23 No presente estudo, verificou-se estabilidade no peso corporal no período de 30 anos.
A obesidade e a aptidão cardiorrespiratória em jovens possuem alta relação com fatores de risco cardiovasculares. 19 Desconsiderando o estado nutricional, alguns autores24,25 verificaram uma diminuição da aptidão cardiorrespiratória ao longo dos anos, principalmente nos meninos.24
Apoiando os nossos achados, a redução da aptidão cardiorrespiratória foi observada não somente em escolares ingleses obesos, mas também em eutróficos.4 Em oposição aos resultados encontrados da aptidão cardiorrespiratória (L.min−1), escolares obesos, quando realizaram avaliação do VO2máx em testes de corrida, tiveram resultados piores de aptidão física do que os eutróficos.26,27 Isso ocorre principalmente quando escolares obesos se exercitam em eventos onde existe a sustentação do peso corporal, como na corrida. 7 Alguns autores4,26,27 verificaram uma relação inversa entre antropometria e aptidão física, não sendo possível estabelecer uma relação causa-efeito.
Desfavorável composição corporal e atividade física possui alta relação com fatores de risco para doença cardiovascular, podendo ser prejudicial à saúde pública, indicando um risco aumentado de morte prematura.27
Considerando o transporte ativo para a escola como atividade física de intensidade leve ou moderada, Smpokos et al.28 verificaram uma queda da mesma (1992/93-2006/07) em escolares da Grécia. Com a experiência de mais de três décadas na realização do Projeto de Ilhabela, os achados no presente estudo mostraram considerável diminuição nos valores do VO2máx, tanto em escolares eutróficos quanto em obesos. Estes resultados sugerem que a diminuição da aptidão cardiorrespiratória e da atividade física possa, estar relacionadas ao comportamento sedentário. Assim, é sugerida a hipótese de que a diminuição da prática de atividade física e da utilização do transporte ativo para a escola (caminhada ou bicicleta)2 poderiam explicar os presentes achados, uma vez que o transporte ativo para escola pode contribuir em cinco vezes mais chances para um bom nível de aptidão cardiorrespiratória.29
Apoiando os nossos achados, meninas têm menores taxas na prática da atividade física praticada dentro ou fora da escola quando comparadas com os meninos, além de quantidades elevadas de inatividade física.2,11 Portanto, a determinação da prevalência de inatividade física e a identificação de grupos de risco são importantes no sentido de direcionar estratégias de intervenção.
Apesar da riqueza de um estudo envolvendo três décadas que aconteceu em uma ilha em um país em desenvolvimento, minimizando assim a taxa de migração, contribuindo para diminuição da influência de fatores externos, os autores consideram que a atual pesquisa possui algumas limitações. Utilizou-se a aptidão cardiorrespiratória submáxima no presente estudo. No entanto, testes submáximos são adequados em ambientes não hospitalares em função da menor possibilidade de complicações cardiorrespiratórias; 30 os valores médios da qualidade dos dados em todas as décadas variaram de moderado a alto na aptidão cardiorrespiratória; não foi avaliado se a diminuição da aptidão cardiorrespiratória está associada ao aumento do nível de sedentarismo dos escolares. Estratégias de intervenção devem ser dirigidas não só às crianças obesas, mas também àquelas que possuem baixa aptidão física e elevado tempo de comportamento sedentário.
Em uma análise de 30 anos, com avaliações a cada 10 anos a partir de 1978/1980, houve uma diminuição significante da aptidão cardiorrespiratória em escolares de 10 e 11 anos de idade, de ambos os sexos, que não pode ser explicada pelo estado nutricional. A queda da aptidão cardiorrespiratória foi maior nos escolares eutróficos do que nos obesos.
Futuras pesquisas são necessárias a fim de identificar os fatores determinantes na redução da aptidão cardiorrespiratória, a fim de relacionar o estilo de vida, como a atividade física habitual, com a aptidão cardiorrespiratória de escolares de ambos os sexos. Estratégias de intervenção devem ser dirigidas não só às crianças obesas, mas também àquelas eutróficas e/ou com baixa aptidão física e elevado tempo de comportamento sedentário.
FinanciamentoFundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP - 2010/20749-8), Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq – 47.807/2011-8).
Conflitos de interesseOs autores declaram não haver conflitos de interesse.
À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP - 2010/20749-8), à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq – 47.807/2011-8); aos participantes, pais e responsáveis; aos professores e à coordenação da Escola Municipal José Antônio Verzegnassi e da Escola Municipal Eva Esperança; e à Prefeitura Municipal de Ilhabela.
Como citar este artigo: Ferrari GL, Bracco MM, Matsudo VK, Fisberg M. Cardiorespiratory fitness and nutritional status of schoolchildren: 30-year evolution. J Pediatr (Rio J). 2013;89:366-73.