Compartilhar
Informação da revista
Vol. 94. Núm. 4.
Páginas 440-445 (Julho - Agosto 2018)
Compartilhar
Compartilhar
Baixar PDF
Mais opções do artigo
Visitas
2391
Vol. 94. Núm. 4.
Páginas 440-445 (Julho - Agosto 2018)
Artigo Original
Open Access
Who cares for adolescents and young adults with cancer in Brazil?
Onde são tratados os adolescentes e jovens adultos com câncer no Brasil?
Visitas
2391
Helena T.G. Martinsa,b, Nathalie V. Balmanta,b, Neimar de Paula Silvaa,b, Marceli de O. Santosc, Rejane de S. Reisd, Beatriz de Camargob,
Autor para correspondência
bdecamar@terra.com.br

Autor para correspondência.
a Instituto Nacional de Câncer, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
b Instituto Nacional de Câncer, Centro de Pesquisa, Programa de Hematologia Pediátrica e Oncologia, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
c Instituto Nacional do Câncer, Divisão de Vigilância e Análise de Situação Coordenação de Prevenção e Vigilância, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
d Fundação do Câncer, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
Este item recebeu

Under a Creative Commons license
Informação do artigo
Resume
Texto Completo
Bibliografia
Baixar PDF
Estatísticas
Figuras (1)
Tabelas (2)
Tabela 1. Dados sobre as características sociodemográficas e dos tumores de pacientes AAJ nos registros hospitalares de câncer no Brasil (2007‐2011)
Tabela 2. Estimativa de risco para tratamento em uma enfermaria de oncologia médica em termos de características sociodemográficas e de tumores (dados coletados dos registros hospitalares de câncer no Brasil de 2007 a 2011)
Mostrar maisMostrar menos
Abstract
Objective

Approximately 6% of all cancers arise in adolescents and young adults. Currently, the ward type best placed to treat this patient group remains controversial. The aim of this study was to evaluate exactly where adolescents and young adults with cancer are treated in Brazil.

Methods

Data were extracted from 271 Brazilian hospital‐based cancer registries (2007–2011), including all five national regions (North, Northeast, Midwest, South, and Southeast). Variables included gender, age, ethnicity, National Code of Health Establishment, hospital unit state, and region. Tumors were classified according to the World Health Organization classification for adolescents and young adults with cancer. Odds ratios with 95% confidence intervals were computed by unconditional logistic regression.

Results

Most patients were managed on medical oncology wards, followed by pediatric oncology and then by non‐specialist wards. Of patients aged 15–19 years, 49% were managed on pediatric wards; most of the older patients (96%; aged 20–24) were managed on adult wards. Patients were more likely to be seen in medical oncology wards as their age increased (OR=2.03 [1.98–2.09]), or if they were based in the South (OR=1.50 [1.29–1.73]). Conversely, bone tumors were less likely to be treated (decreased OR) on medical oncology wards, regardless of age, gender, and region.

Conclusion

An elevated risk of treatment on medical oncology wards was observed for older patients and those treated in the South. Bone tumors were generally treated in pediatric oncology wards, while skin cancers were treated in medical oncology wards, regardless of age, gender, and region.

Keywords:
Adolescents and young adults
Cancer
Site of care
Resumo
Objetivo

Aproximadamente 6% de todos os cânceres surgem em adolescentes e adultos jovens. Atualmente, o melhor tipo de enfermaria para tratar esse grupo de pacientes continua sendo controverso. O objetivo deste estudo foi avaliar exatamente onde os adolescentes e adultos jovens com câncer são tratados no Brasil.

Métodos

Foram coletados dados de 271 registros de câncer de base hospitalar (2007‐2011), inclusive de todas as cinco regiões nacionais (Norte, Nordeste, Centro‐Oeste, Sul e Sudeste). As variáveis incluíram sexo, idade, etnia, o Código Nacional de Estabelecimento de Saúde e o estado e a região da unidade hospitalar. Os tumores foram classificados de acordo com a classificação da Organização Mundial de Saúde para adolescentes e adultos jovens com câncer. As razões de chance com intervalos de confiança de 95% foram calculadas por regressão logística incondicional.

Resultados

A maioria dos pacientes foi tratada em enfermaria de oncologia médica, seguido da enfermaria de oncologia pediátrica e, então, a enfermaria sem especialidade. 49% dos pacientes entre 15‐19 anos foram tratados em enfermarias pediátricas; os pacientes mais velhos (96%, entre 20‐24) foram tratados em enfermarias de adultos. Os pacientes apresentaram maior propensão a serem vistos em enfermarias de oncologia conforme mais velhos (RC=2,03 [1,98‐2,09]) ou caso morassem na região Sul (RC=1,50 [1,29‐1,73]). Por outro lado, os tumores ósseos mostraram menor propensão a tratamento (redução da RC) em enfermarias de oncologia, independentemente da idade, sexo e região.

Conclusão

Foi visto um risco elevado de tratamento, em enfermarias de oncologia, de pacientes mais velhos e os tratados na Região Sul. Os tumores ósseos foram, em geral, tratados em enfermarias de oncologia pediátrica, ao passo que os cânceres de pele foram tratados em enfermarias de oncologia médica, independentemente de idade, sexo e região.

Palavras‐chave:
Adolescentes e adultos jovens
Câncer
Local de atendimento
Texto Completo
Introdução

Atualmente, não há, na literatura, definição clara da idade do grupo de pacientes que abrange os adolescentes e adultos jovens (AAJ). A Organização Mundial de Saúde (OMS) define adolescência como a faixa de 10 a 19 anos, ao passo que as Nações Unidas (ONU) usam de 15 a 24 anos e o termo “adulto jovem” é usado para fazer referência aos acima de 20 anos.1 O Estatuto da Criança e do Adolescente define adolescência como entre 12 e 18 anos.2

A incidência de câncer no grupo de AAJ aumentou em comparação com outras faixas etárias. Aproximadamente 6% de todos os cânceres atualmente surgem em pacientes AAJ (entre 15‐29 anos) e essa incidência é 2,7 vezes maior em pacientes mais jovens (idade < 15 anos).3 No Brasil, a incidência mediana de câncer na população é de 218 por milhão para pacientes do sexo masculino e 232 casos por milhão para pacientes do sexo feminino, a maioria dos casos é diagnosticada como carcinomas, linfomas e leucemias.4

A faixa etária de AAJ fica entre a oncologia pediátrica e médica e manifesta características biológicas e clínicas únicas. Os tumores pediátricos são, na maior parte, embrionários, ao passo que os tumores em idosos tendem a se originar do tecido epitelial. Portanto, o espectro do tipo de câncer difere ao comparar crianças mais novas e adultos e isso reflete os diferentes mecanismos patológicos envolvidos, bem como a tolerância e a resposta à terapia. Consequentemente, há uma conscientização cada vez maior da necessidade de unidades de tratamento de adolescentes especializadas nas enfermarias pediátricas.

Um dos desafios consideráveis com relação ao tratamento do câncer na população de AAJ é determinar onde é o melhor local para tratar esses pacientes, considerando a heterogeneidade no comportamento biológico/clínico ao comparar a oncologia pediátrica e médica. São necessárias unidades exclusivas especializadas no tratamento de pacientes AAJ, principalmente considerando a falta de qualquer melhoria na sobrevida para esse grupo, em comparação com crianças ou adultos com mais de 29 anos.5 Essa falha decepcionante em melhorar a terapia para o grupo de pacientes AAJ pode refletir um baixo reconhecimento e a falta de atenção do especialista à patobiologia única apresentada por esses pacientes, juntamente com apoio inadequado às suas necessidades psicossociais.6–9

O local de tratamento ideal para pacientes AAJ continua controverso.10–13 O encaminhamento para enfermarias pediátricas parece estar associado à idade, ao tipo de câncer e à distância dos centros de oncologia pediátrica.14–16 De preferência, seria usada uma unidade especializada em câncer em adolescentes. No Brasil, atualmente não temos dados com relação a onde os pacientes AAJ são tratados. Essa lacuna dificulta nossa melhoria da prática institucional e o desenvolvimento de protocolos de tratamento específicos.13

O objetivo deste estudo foi determinar onde é feito o tratamento oncológico de pacientes AAJ no Brasil.

Material e métodosFontes de dados

Os dados foram extraídos de 13.417 casos de câncer em pacientes AAJ entre 15 e 25 anos de 271 registros de câncer de base hospitalar no Brasil (RCBH) em todas as cinco regiões do Brasil (Norte, Nordeste, Sudeste, Sul e Centro‐Oeste); dados extraídos do Sistema Integrador (SI) (http://www.inca.gov.br). As informações dos pacientes de cada registro incluíram: sexo, idade, o Código Nacional de Estabelecimento de Saúde (CNES), tipo de unidade hospitalar e sua região geográfica. Os tumores foram classificados de acordo com a classificação de câncer em AAJ da OMS.17 A coleta de dados foi feita por telefone com cada unidade hospitalar para determinar a presença (ou ausência) de uma enfermaria de oncologia pediátrica, bem como a faixa etária internada.

Análises estatísticas

Todas as variáveis estiveram sujeitas a análises descritivas. As razões de chance (RC) brutas e ajustadas com intervalos de confiança (IC) de 95% foram obtidas por análises de regressão logística e sexo, região e classificação dos AAJ foram incluídos como variáveis categóricas. A idade dos pacientes foi incluída como variável contínua (por ano de aumento de idade). As categorias de referência das variáveis foram sexo feminino, Região Sudeste e leucemia. Todas as análises foram feitas com o programa SPSS (IBM SPSS Statistics para Windows, versão 20.0. NY, EUA).

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (Inca).

Resultados

As características sociodemográficas e tumorais de nossa coorte de pacientes são apresentadas na tabela 1. A maioria dos pacientes foi diagnosticada com carcinomas, linfomas e leucemias. A maioria dos pacientes foi tratada em enfermaria de oncologia (n = 9.399), seguida de enfermaria de oncologia pediátrica (n=2907) e, então, as enfermarias sem especialidade (n=146). A Região Sudeste apresentou o maior número de unidades hospitalares com enfermarias de oncologia pediátrica (n=37/28%), mais especificamente em São Paulo. As regiões Norte e Nordeste apresentaram a proporção mais alta de enfermarias de oncologia pediátrica, com 50% de suas unidades hospitalares (fig. 1). Em 81 das 94 enfermarias de oncologia pediátrica, a idade dos pacientes foi até 18 anos (n=37/81; 45,7%). Para pacientes entre 15 e 19 anos, 49,6% dos casos foram tratados em enfermarias pediátricas, ao passo que para os entre 20 e 24 a maioria (96,1%) foi encaminhada para enfermarias de adultos. Para os pacientes entre 15 e 19 anos, os tumores ósseos (61%), os tumores no sistema nervoso central (55,8%) e leucemias (53%) foram tratados principalmente em enfermarias pediátricas. Em contrapartida, aproximadamente 56% dos carcinomas foram tratados em enfermarias de oncologia.

Tabela 1.

Dados sobre as características sociodemográficas e dos tumores de pacientes AAJ nos registros hospitalares de câncer no Brasil (2007‐2011)

 
Sexo
Feminino  6.556  48,9 
Masculino  6.860  51,1 
Sem informações   
Etnia
Branca  4.314  49,2 
Não branca  4.457  50,8 
Sem informações  4.646   
Faixa etária
15‐19  5.961  44,4 
20‐24  7.456  55,6 
Região geográfica da unidade hospitalar
Norte  747  5,6 
Nordeste  3.547  26,4 
Sudeste  6.019  44,9 
Sul  2.660  19,8 
Centro‐Oeste  444  3,3 
Classificação dos AAJ
Leucemia  1.275  13,4 
Linfoma  1.841  19,3 
SNC  524  5,5 
Tumor ósseo  710  7,4 
Sarcoma  566  5,9 
Tumor de células germinativas  1.002  10,5 
Tumor de pele  255  2,7 
Carcinoma  3.024  31,7 
Diversos  156  1,6 
Não específico  197  2,1 

SNC, tumores no sistema nervoso central.

Figura 1.

Distribuição de enfermarias especializadas de acordo com as regiões brasileiras, 2007‐2011.

(0,24MB).

A tabela 2 mostra as RCs brutas e ajustadas com ICs de 95% para o local de tratamento de pacientes em termos de sexo, idade, região e tipo de tumor. A idade, usada como variável contínua mostrou (por aumento de ano) uma associação independente com a enfermaria de oncologia (RC=2,02 [IC: 95%, 1,97‐2,07]). Os tumores ósseos revelaram uma redução na chance de tratamento em uma enfermaria de oncologia médica independentemente do sexo, idade e região (RC=0,72 [IC: 95%, 0,59‐0,88]). Entre os pacientes da região Sul do Brasil, houve um aumento no risco de serem tratados em uma enfermaria de oncologia (RC=1,50 [IC: 95%, 1,29‐1,73]), ao passo que os pacientes da Região Norte (RC=0,66 [IC: 95%, 0,52‐0,85]) mostraram maior propensão a serem tratados em uma enfermaria de oncologia pediátrica, independentemente do tipo de tumor, da idade ou do sexo.

Tabela 2.

Estimativa de risco para tratamento em uma enfermaria de oncologia médica em termos de características sociodemográficas e de tumores (dados coletados dos registros hospitalares de câncer no Brasil de 2007 a 2011)

  Oncologia pediátrica  Oncologia médica  RC bruta (IC de 95%)  RC ajustadaa (IC de 95%) 
Sexo
Feminino  1.228 (20,3)  4.808 (79,7) 
Masculino  1.679 (26,8)  4.590 (73,2)  0,70 (0,64‐0,76)  0,83 (0,74‐0,93) 
Idade
(Contínuab‐  ‐  2,02 (1,97‐2,07)  2,03 (1,98‐2,09) 
Região geográfica da unidade hospitalar
Norte  186 (30,2)  429 (69,8)  0,70 (0,58‐0,84)  0,66 (0,52‐0,85) 
Nordeste  747 (24,3)  2.332 (75,7)  0,95 (0,85‐1,05)  0,96 (0,84‐1,10) 
Sudeste  1.292 (23,3)  4.262 (76,7) 
Sul  489 (18,4)  2.171 (81,6)  1,35 (1,20‐1,51)  1,50 (1,29‐1,73) 
Centro‐Oeste  193 (48,5)  205 (51,5)  0,32 (0,26‐0,40)  0,16 (0,12‐0,21) 
Classificação dos AAJ
Leucemia  547 (31,8)  1.175 (68,2) 
Linfoma  663 (24,3)  2.065 (75,7)  1,45 (1,27‐1,66)  1,04 (0,87‐1,24) 
SNC  208 (31,6)  450 (68,4)  1,01 (0,83‐1,22)  0,80 (0,62‐1,04) 
Ósseo  468 (42,5)  634 (57,5)  0,63 (0,54‐0,74)  0,72 (0,59‐0,88) 
Sarcoma  205 (27,4)  543 (72,6)  1,23 (1,02‐1,49)  0,96 (0,75‐1,23) 
Células germinativas  192 (16,4)  979 (83,6)  2,37 (1,97‐2,86)  1,25 (0,99‐1,58) 
Pele  61 (11,7)  461 (88,3)  3,52 (2,64‐4,68)  1,69 (1,19‐2,40) 
Carcinoma  440 (14,3)  2.639 (85,7)  2,79 (2,42‐3,22)  1,05 (0,87‐1,27) 
Diversos  69 (26,8)  188 (73,2)  1,27 (0,95‐1,70)  0,96 (0,66‐1,40) 
Não específico  54 (17,2)  260 (82,8)  2,24 (1,64‐3,06)  1,37 (0,93‐2,02) 

SNC, tumores no sistema nervoso central.

a

Ajustado para idade, sexo, classificação dos AAJ e região.

b

Para cada aumento de anos (de idade) há um risco elevado equivalente ao valor da RC.

Discussão

A incidência de câncer no grupo de pacientes AAJ é maior para crianças abaixo de 15 anos3 e carcinomas, linfomas e leucemias são os tipos de tumores mais frequentes no Brasil.4 Como e onde esses pacientes são tratados continua um problema controverso, ainda mais confuso pela falta de clareza na definição dessa população de pacientes. Ao considerar esses problemas, buscamos coletar dados sobre como esse grupo de paciente é diagnosticado e tratado no Brasil.

Os tumores mais frequentemente registrados nos RCBHs foram semelhantes aos descritos nos registros de câncer de base populacional e consistiram em carcinomas, linfomas e leucemias. Os carcinomas de tiroide e cervical são mais frequentes na faixa etária de AAJ, o último é o tipo de tumor mais predominante em mulheres brasileiras jovens. A taxa de incidência mediana de carcinoma cervical no grupo de pacientes AAJ, de acordo com os dados brasileiros de base populacional, foi 2,11 casos por 100.000 mulheres entre 20‐24 anos.18 Os tumores da tiroide, que ocorrem com mais frequência em pacientes do sexo feminino, mostraram uma taxa de incidência mediana de 13,7 casos por milhão.4

Nossos dados revelaram que a maioria dos AAJ entre 15 e 24 anos foi tratada em enfermarias de oncologia médica e o avanço da idade mostrou ser um fator de risco significativo para tratamento nesse tipo de enfermaria. A confusão gerada pela variação nas definições de idade para o grupo de pacientes AAJ é refletida por uma falta de padronização entre as diferentes unidades hospitalares. Uma limitação deste estudo é que não conseguimos ter certeza se o paciente internado em uma enfermaria de adultos sempre é acompanhado por um oncologista (de adultos), principalmente em unidades hospitalares que têm os dois serviços (oncologia pediátrica e de adultos). Assim, alguns autores relatam que a maior parte dos AAJ com diagnóstico de câncer é tratada por oncologistas não pediátricos.13,19

As necessidades médicas, físicas, psicológicas e emocionais variam entre os diferentes grupos de pacientes, o que significa um desafio distinto ao decidir onde os pacientes AAJ devem ser tratados. Consequentemente, é obrigatória uma equipe multidisciplinar e deve ser envolvido um oncologista com experiência médica e psicossocial relacionada a essa faixa etária. Padronizar o local e o tipo de tratamento disponível para os pacientes AAJ com diagnóstico de câncer pode ajudar a melhorar os resultados para esse grupo de pacientes, considerando o que espectro de cânceres para AAJ e pacientes pediátricos difere. Além disso, sabe‐se que os cânceres pediátricos e em adultos são mais bem tratados com protocolos e centros exclusivos para esses grupos de pacientes. Em nossa população, os tipos de tumores pediátricos, como ósseo e leucemia, foram mais propensos a ser tratados em uma enfermaria pediátrica, ao passo que os carcinomas e linfomas foram tratados em enfermarias de adultos.

As características biológicas dos tumores diagnosticados em pacientes na categoria de AAJ manifestam respostas heterogêneas a diferentes protocolos, com a sugestão de que a adesão ao tratamento apresenta melhoria quando os pacientes são tratados em enfermarias pediátricas. Contudo, a falta de participação e exposição dos pacientes AAJ a ensaios clínicos e protocolos20–22 pode explicar, em parte, as opções de tratamento limitado disponíveis a essa faixa etária, pois a melhoria nos protocolos e terapias geralmente exige a participação em ensaios e o desenvolvimento posterior de protocolos multidisciplinares bem estabelecidos.16,19

A maioria dos relatos menciona melhoria nos resultados quando o tratamento é feito em uma enfermaria de oncologia pediátrica em comparação com uma enfermaria de adultos.23 Uma metanálise feita em 2012 com uma avaliação de 11 publicações revelou que os AAJ tratados com protocolos pediátricos atingiram resultados superiores aos tratados com protocolos de adultos.10 Estudos anteriores feitos em diferentes países (EUA, Inglaterra e Países Baixos) demonstraram que, na configuração de pacientes AAJ com leucemia linfoide aguda (LLA), o tratamento de acordo com os protocolos pediátricos mostrou um resultado superior em comparação com os protocolos de adultos.10,24–26 Com relação ao tratamento de outros tumores, como sarcoma de Ewing, também foi demonstrado que os adolescentes com mais de 15 anos tratados em enfermarias pediátricas apresentaram melhor sobrevida em comparação com os adolescentes tratados em enfermarias não pediátricas, apesar de receberem o mesmo protocolo de tratamento.27 Os motivos inerentes a esses resultados diferentes continuam incertos. Contudo, foi demonstrada uma associação definitiva entre a especialidade médica e o resultado em adolescentes com câncer, apesar de este estudo não ter avaliado as respostas a tratamentos ou protocolos específicos.

Confusamente, alguns estudos não mostraram diferença na taxa de sobrevida para enfermarias especializadas, bem como melhoria nas taxas de sobrevida para pacientes AAJ tratados em enfermarias de oncologia de adultos.19,28 Acreditamos que essas diferenças podem estar relacionadas ao tipo histológico do tumor. Por exemplo, os carcinomas e tumores de pele são mais específicos de adultos e são mais bem tratados em enfermarias de oncologia. Por outro lado, os tumores ósseos, como um tipo de tumor, também mostraram ter um fator protetor em termos de encaminhamento para enfermarias de oncologia. De acordo com Globocan (Projeto da Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer), esse grupo histológico de tumores abrange 5% de todas as neoplasias na população até 19 anos. Em outras palavras, os tumores ósseos estão fortemente associados a pacientes mais jovens e, portanto, tendem a ser tratados em enfermarias pediátricas, conforme mostrado em nossos dados.

Um menor risco de manejo em enfermarias médicas foi encontrado na Região Nordeste, que tem uma alta proporção de hospitais com enfermarias de oncologia pediátrica. Esses dados podem implicar fator de proteção “geográfica” em termos de manejo em enfermarias médicas.

Apesar de a literatura continuar controversa, a maior parte dos achados internacionais demonstra a importância de um oncologista pediátrico no prognóstico e tratamento de tumores em pacientes AAJ. As enfermarias de oncologia pediátrica no Brasil tratam crianças e adolescentes até 18 anos, conforme orientado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, que define adolescência como a faixa entre 12 e 18 anos. Contudo, atualmente, no Brasil, não temos dados sobre a eficácia de tratamentos ou protocolos específicos para casos de AAJ.

Programas clínicos com profissionais do setor de saúde adequadamente treinados, bem como comunicação e colaboração aprimorados entre oncologistas de adultos e pediátricos, são vitais para aprimorar a prestação de cuidados para pacientes AAJ com câncer. Vários estudos, como na Inglaterra, EUA, Austrália e Alemanha, estabeleceram programas de tratamento colaborativos, apesar de o desenvolvimento de um programa de oncologia para AAJ comparável no Brasil ainda ser um desafio.29,30

É necessário trabalho adicional em termos de avaliar os resultados dos tratamentos na faixa etária de pacientes AAJ no Brasil. Com isso em mente, focaremos em avaliar a resposta ao tratamento, os protocolos e os resultados de acordo com o tipo de tumor e o local de tratamento.

Financiamento

HTGM e NVB receberam bolsas de estudo do programa de pós‐graduação do Instituto Nacional de Câncer e BDC tem uma bolsa de estudos do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) (Brasília) (#306291/2014‐2) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) (#212989‐2016).

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

Agradecimentos

A todos os coordenadores dos RCBH no Brasil, que contribuíram com os conjuntos de dados para tornar este trabalho possível.

Referências
[1]
World Health Organization (WHO).
Report of a WHO Study Group on Young People and Health for All.
WHO, (1986),
[2]
E. Eisenstein.
Adolescência: definições, conceitos e critérios.
Adolesc Saúde, 2 (2005), pp. 6-7
[3]
A. Bleyer, M. O’Leary, R. Barr, L.A. Ries.
Cancer epidemiology in older adolescents and young adults 15 to 29 years of age, including SEER incidence and survival: 1975–2000 [monograph].
National Cancer Institute (NIH), (2006),
[4]
N.V. Balmant, R. de Souza Reis, J.F. Pinto Oliveira, S. Ferman, M. de Oliveira Santos, B. de Camargo.
Cancer incidence among adolescents and young adults (15 to 29 years) in Brazil.
J Pediatr Hematol Oncol, 38 (2016), pp. 88-96
[5]
A. Bleyer.
Young adult oncology: the patients and their survival challenges.
CA Cancer J Clin, 57 (2007), pp. 242-255
[6]
E. Desandes, S. Bonnay, C. Berger, L. Brugieres, F. Demeocq, V. Laurence, et al.
Pathways of care for adolescent patients with cancer in France from 2006 to 2007.
Pediatr Blood Cancer, 58 (2012), pp. 924-929
[7]
B. Zebrack, A. Bleyer, K. Albritton, S. Medearis, J. Tang.
Assessing the health care needs of adolescents and young adults cancer patients and survival.
Cancer, 107 (2006), pp. 2915-2923
[8]
B.H. Pollock, J.M. Birch.
Registration and classification of adolescent and young adult cancer cases.
Pediatr Blood Cancer, 50 (2008), pp. 1090-1093
[9]
A. Bleyer, R. Barr.
Cancer in young adults 20 to 39 years of age: overview.
Semin Oncol, 36 (2009), pp. 194-206
[10]
W. Stock, M. La, B. Sanford, C.D. Bloomfield, J.W. Vardiman, P. Gaynon, et al.
What determines the outcomes for adolescents and young adults with acute lymphoblastic leukemia treated on cooperative group protocols? A comparison of Children's Cancer Group and Cancer and Leukemia Group B studies.
Blood, 112 (2008), pp. 1646-1654
[11]
R. Ram, O. Wolach, L. Vidal, A. Gafter-Gvili, O. Shpilberg, P. Raanani.
Adolescents and young adults with a acute lymphoblastic leukemia have a better outcome when treated with pediatric‐inspired regimens: systematic review and meta‐analysis.
Am J Hematol, 87 (2012), pp. 472-478
[12]
J.D. Pole, S.M. Alibhai, M.C. Ethier, O. Teuffel, C. Portwine, S. Zelcer, et al.
Adolescents with acute lymphoblastic leukemia treated at pediatric versus adult hospitals.
Ann Oncol, 24 (2013), pp. 801-806
[13]
H.M. Parsons, L.C. Harlan, S. Schmidt, T.H. Keegan, C.F. Lynch, E.E. Kent, et al.
Who treats adolescents and young adults with cancer? A report from the AYA HOPE Study.
J Adolesc Young Adult Oncol, 4 (2015), pp. 141-150
[14]
K.H. Albritton, C.H. Wiggins, H.E. Nelson, J.C. Weeks.
Site of oncologic specialty care for older adolescents in Utah.
J Clin Oncol, 25 (2007), pp. 4616-4621
[15]
A. Bleyer.
The quid pro quo of pediatric versus adult services for older adolescent cancer patients.
Pediatr Blood Cancer, 54 (2010), pp. 238-241
[16]
S. Downs-Canner, P.H. Shaw.
A comparison of clinical trial enrollment between adolescent and young adult (AYA) oncology patients treated at affiliated adult and pediatric oncology centers.
J Pediatr Hematol Oncol, 31 (2009), pp. 927-929
[17]
R.D. Barr, E.J. Holowaty, J.M. Birch.
Classification scheme for tumors diagnosed in adolescents and young adults.
Cancer, 106 (2006), pp. 1425-1430
[18]
L.S. Viana.
Incidence and mortality trends in cervix cancer in adolescents and young adults in Brazil, 2015 [monograph].
National Institute of Cancer (INCA), (2015),
[19]
T. Cash, M. Qayed, K.C. Ward, A.C. Mertens, L. Rapkin.
Comparison of survival at adult versus pediatric treatment centers for rare pediatric tumors in an adolescent and young adult (AYA) population in the state of Georgia.
Pediatr Blood Cancer, 62 (2015), pp. 456-462
[20]
A. Bleyer, A. Viny, R. Barr.
Cancer in 15‐ to 29‐year‐olds by primary site.
Oncologist, 11 (2006), pp. 590-601
[21]
L. Fern, S. Davies, T. Eden, R. Feltbower, R. Grant, M. Hawkins, et al.
Rates of inclusion of teenagers and young adults in England into National Cancer Research Network clinical trials: report from the National Cancer Research Institute (NCRI) Teenage and Young Adult Clinical Studies Development Group.
Br J Cancer, 99 (2008), pp. 1967-1974
[22]
A. McTiernan.
Issues surrounding the participation of adolescents with cancer in clinical trials in the UK.
Eur J Cancer Care, 12 (2003), pp. 233-239
[23]
W.A. Wood, S.J. Lee.
Malignant hematologic diseases in adolescents and young adults.
Blood, 117 (2011), pp. 5803-5815
[24]
N. Boissel, M.F. Auclerc, V. Lhéritier, Y. Perel, X. Thomas, T. Leblanc, et al.
Should adolescents with acute lymphoblastic leukemia be treated as old children or young adults? Comparison of the French FRALLE‐93 and LALA‐94 trials.
J Clin Oncol, 21 (2003), pp. 774-780
[25]
J.M. De Bont, B.v. Holt, A.W. Dekker, A. van der Does-van den Berg, P. Sonneveld, R. Pieters, et al.
Significant difference in outcome for adolescents with acute lymphoblastic leukemia treated on pediatric vs. adult protocols in the Netherlands.
Leukemia, 18 (2004), pp. 2032-2053
[26]
R. Ramanujachar, S. Richards, I. Hann, A. Goldstone, C. Mitchell, A. Vora, et al.
Adolescents with acute lymphoblastic leukemia: outcome on UK National Paediatric (ALL 97) and Adult (UKALLXII/E2993) trials.
Pediatr Blood Cancer, 48 (2007), pp. 254-261
[27]
M. Paulussen, S. Ahrens, H.F. Juergens.
Cure rates in Ewing tumor patients aged over 15 years are better in pediatric oncology units. Results of the GPOH CESS/EICESS studies.
Proc Am Soc Clin Oncol, 22 (2003), pp. 3279
[28]
D.L. Howell, K.C. Ward, H.D. Austin.
Access to pediatric cancer care by age, race, and diagnosis, and outcomes of cancer treatment in pediatric and adolescent patients in the state of Georgia.
J Clin Oncol, 25 (2007), pp. 4610-4615
[29]
P.C. Rogers, S. De Pauw, B. Schacter, R.D. Barr.
A process for change in the care of adolescents and young adults with cancer in Canada.
J Adolesc Young Adult Oncol, 2 (2013), pp. 72-76
[30]
R. Ramphal, S. Aubin, P. Czaykowski, S. De Pauw, A. Johnson, S. McKillop, et al.
Adolescent and young adult cancer: principles of care.
Curr Oncol, 23 (2016), pp. 204-209

Como citar este artigo: Martins HT, Balmant NV, Silva NP, Santos MO, Reis RS, Camargo B. Who cares for adolescents and young adults with cancer in Brazil? Pediatr (Rio J). 2018;84:440–5.

Copyright © 2017. Sociedade Brasileira de Pediatria
Idiomas
Jornal de Pediatria
Opções de artigo
Ferramentas
en pt
Taxa de publicaçao Publication fee
Os artigos submetidos a partir de 1º de setembro de 2018, que forem aceitos para publicação no Jornal de Pediatria, estarão sujeitos a uma taxa para que tenham sua publicação garantida. O artigo aceito somente será publicado após a comprovação do pagamento da taxa de publicação. Ao submeterem o manuscrito a este jornal, os autores concordam com esses termos. A submissão dos manuscritos continua gratuita. Para mais informações, contate assessoria@jped.com.br. Articles submitted as of September 1, 2018, which are accepted for publication in the Jornal de Pediatria, will be subject to a fee to have their publication guaranteed. The accepted article will only be published after proof of the publication fee payment. By submitting the manuscript to this journal, the authors agree to these terms. Manuscript submission remains free of charge. For more information, contact assessoria@jped.com.br.
Cookies policy Política de cookies
To improve our services and products, we use "cookies" (own or third parties authorized) to show advertising related to client preferences through the analyses of navigation customer behavior. Continuing navigation will be considered as acceptance of this use. You can change the settings or obtain more information by clicking here. Utilizamos cookies próprios e de terceiros para melhorar nossos serviços e mostrar publicidade relacionada às suas preferências, analisando seus hábitos de navegação. Se continuar a navegar, consideramos que aceita o seu uso. Você pode alterar a configuração ou obter mais informações aqui.