To present current evidence on the etiology, risk factors, diagnosis, and management of early and late neonatal sepsis.
Source of dataNon‐systematic review of the Medline (PubMed), Scopus, Web of Science, Cochrane, and Google Scholar databases regarding the following terms: neonatal sepsis, early neonatal sepsis, late neonatal sepsis, empirical antibiotic therapy, sepsis calculator, vancomycin, newborn, preterm newborn.
Data synthesisNeonatal sepsis is a frequent cause of neonatal morbidity and mortality. Its diagnosis is difficult. Continuous observation of the patient is critical to diagnostic suspicion. When neonatal sepsis is suspected, bacteriological tests should be collected. Vancomycin should not be routinely using in the empirical antibiotic regimen in late neonatal sepsis, and the main protective mechanisms against neonatal sepsis are handwashing and the use of breast milk.
ConclusionsNewborns constitute a group that is more vulnerable to sepsis. Knowledge of risk factors and etiological agents allows a better approach to the newborn with sepsis.
Apresentar evidências atuais na etiologia, fatores de risco, diagnóstico e manejo da sepse neonatal precoce e tardia.
Fontes de dadosRevisão não sistemática feita nas bases de dados Medline (PubMed), Scopus, Web of Science, Cochrane, Google Scholar sobre os temas sepse neonatal, sepse neonatal precoce, sepse neonatal tardia, antibioticoterapia empírica, sepsis calculator, vancomicina, recém‐nascido, recém‐nascido pré‐termo.
Síntese de dadosA sepse neonatal é uma causa frequente de morbimortalidade neonatal. O seu diagnóstico é difícil. A observação contínua do paciente é fundamental para uma suspeição diagnóstica. Ao se suspeitar de sepse neonatal devem‐se coletar exames bacteriológicos. Não usar, rotineiramente, vancomicina no esquema empírico de antibiótico na sepse neonatal tardia. Os principais mecanismos protetores da sepse neonatal são a lavagem de mãos e o uso do leite materno.
ConclusõesOs recém‐nascidos constituem um grupo mais vulnerável à sepse. O conhecimento dos fatores de risco e dos agentes etiológicos permite uma melhor abordagem do recém‐nascido séptico.
A sepse neonatal é uma síndrome clínica com alterações hemodinâmicas e outras manifestações clínicas sistêmicas decorrentes da presença de germe patogênico (bactéria, vírus ou fungo) em fluido normalmente estéril, tais como sangue ou líquor, no primeiro mês de vida.1 A sepse neonatal é importante causa de sequelas neurocognitivas e de mortalidade neonatal.2,3
A sepse neonatal é classificada, quanto ao momento de aparecimento, em precoce ou tardia. De forma geral, considera‐se sepse neonatal precoce quando o quadro clínico aparece nas primeiras 72 horas de vida. A exceção dessa definição é a sepse neonatal causada pelo Streptococcus agalactiae, que, embora seja de etiologia perinatal, pode surgir nos primeiros sete dias de vida. A sepse neonatal tardia é a que se inicia após 72 horas de vida.1 Para fins deste artigo, consideraremos sepse neonatal precoce a que se inicia nas primeiras 72 horas de vida e sepse neonatal tardia a que se inicia após 72 horas de vida.
Os agentes etiológicos da sepse neonatal precoce e da sepse neonatal tardia são bem distintos.
A sepse neonatal precoce é adquirida no período periparto, antes ou durante o parto, portanto os germes costumam ser de origem do trato gênito‐urinário materno. Segundo dados da Rede Americana de Neonatologia, os germes gram positivos são os agentes etiológicos em 62% das sepses neonatais precoces. Em 43% do total, o germe encontrado é o Streptococcus agalactiae. Os germes gram negativos perfazem 37% dos agentes etiológicos da sepse neonatal precoce, 29% do total são a Escherichia coli.4
A sepse neonatal tardia ocorre mais frequentemente em recém‐nascidos que permanecem hospitalizados por longos períodos, tais como recém‐nascidos pré‐termos ou de termo que necessitem hospitalização prolongada e procedimentos invasivos, os germes mais frequentes são aqueles adquiridos no ambiente hospitalar. Segundo a Rede Americana de Neonatologia, em 79% das situações os germes encontrados são gram positivos, o estafilococo coagulase negativo ocorre em 57% do total e o Staphylococcus aureus em 12%. Os germes gram negativos perfazem 19% do total, a Escherichia coli é o germe mais frequente entre os gram negativos, 7% do total. Os fungos são encontrados em 6% dos casos de sepse neonatal tardia.5 Os dados publicados pela Rede Brasileira de Pesquisas Neonatais mostram resultados semelhantes aos americanos quanto aos agentes etiológicos da sepse neonatal tardia.6
Eventualmente, a sepse tardia pode se manifestar em recém‐nascidos no ambiente fora do hospital, os germes mais comuns são os de origem comunitária, tais como Staphylococcus aureus e Escherichia coli.
A sepse neonatal pode ter também uma etiologia viral, entretanto, neste artigo, nos ateremos a discutir a sepse neonatal bacteriana.
Sepse neonatal precoceA incidência de sepse precoce nos Estados Unidos é em torno de 0,77 casos por mil nascidos vivos e se considerarmos somente os recém‐nascidos acima de 34 semanas de idade gestacional é em torno de 0,5 casos por mil nascidos vivos.7,8 Desde que foi instituída a antibioticoterapia intraparto para as gestantes colonizadas com Streptococcus agalactiae, a incidência de sepse neonatal precoce caiu muito nos Estados Unidos e nos serviços que fazem rastreamento e prevenção de estreptococcia perinatal.
Os fatores de risco para sepse precoce que têm sido apontados são:
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Colonização por Streptococcus agalactiae: a gestante colonizada com Streptocococcus agalactiae que não tenha feito profilaxia intraparto tem 25 vezes mais probabilidade de que o seu recém‐nascido tenha sepse neonatal precoce do que um recém‐nascido de uma mãe não colonizada.9
- 2.
Ruptura de membranas amnióticas por mais de 18 horas: recém‐nascidos de mães com bolsa rota por mais de 18 horas têm quatro vezes mais risco de que o seu recém‐nascido tenha infecção do que no caso de mães que não tenham bolsa rota.10
- 3.
Corioamnionite: a presença de corioamnionite aumenta a possibilidade de infecção neonatal precoce.11
As manifestações clínicas são muito variadas e inespecíficas, o que torna o diagnóstico de sepse neonatal precoce difícil e predispõe ao uso excessivo de antibiótico.
Os sinais clínicos são de diferentes sistemas e podem ser agrupados da seguinte forma: a) apneia, dificuldade respiratória, cianose; b) taquicardia ou bradicardia, má perfusão ou choque; c) irritabilidade, letargia; hipotonia, convulsões; d) distensão abdominal, vômitos, intolerância alimentar, resíduo gástrico, hepatomegalia; e) icterícia inexplicável; f) instabilidade térmica; g) petéquias ou púrpura. Para se valorizarem os sinais clínicos, o ideal é que o recém‐nascido apresente manifestações de três sistemas distintos, ou dois sinais clínicos de sistemas distintos associado a um fator de risco materno.12
Preocupado com a solicitação excessiva de exames para afastar sepse neonatal e o uso excessivo de antibióticos por suspeita de sepse neonatal precoce, o grupo da Kaiser Permanent Northern California, que engloba 14 hospitais com atendimento obstétrico e neonatal, criou uma calculadora para recém‐nascidos com idade gestacional igual ou maior do que 34 semanas que levava em consideração a idade gestacional, o tempo de bolsa rota, a temperatura materna, a presença ou não de colonização por Streptococcus agalactiae e uso ou não de antibiótico no período imediatamente anterior ao parto para determinar a probabilidade de um recém‐nascido ter sepse neonatal precoce. Considerando a importância de alguns sinais clínicos, especialmente os de origem respiratória, a calculadora foi aprimorada, foram acrescentados os sinais clínicos do recém‐nascido nas primeiras 24 horas de vida.13,14 Essa calculadora está disponível gratuitamente (EOS Calculator, tanto para iPhone como para Android).
Estudos que usaram dados retrospectivos ou dados prospectivos foram feitos com o objetivo de aferir a utilidade e a acurácia da calculadora. Tem sido mostrado que o uso da calculadora diminui o uso de antibióticos em recém‐nascidos pré‐termos tardios ou de termo sob risco de sepse em torno de 40%, sem aumentar o risco de falsos negativos.8,15–17
Outra estratégia que tem sido usada na tentativa de diminuir o uso de antibióticos e a solicitação de exames laboratoriais complementares é a valorização da observação atenta e frequente dos sinais clínicos do recém‐nascido em risco de sepse neonatal precoce. Estudo europeu que observou atentamente os sinais clínicos mostrou que houve diminuição do uso de antibiótico e diminuição do tempo de internação.18 Em recente publicação, a Academia Americana de Pediatria sugere que a observação clínica atenta nas primeiras 48 horas possa ser mais eficaz do que a EOS Calculator em determinar o recém‐nascido pré‐termo tardio e de termo com sepse neonatal precoce.19
Para os recém‐nascidos com idade gestacional igual ou menor do que 34 semanas, o fator de risco mais importante é a presença de corioamnionite definida por hipertermia materna igual ou maior do que 39°C ou entre 38°C e 39°C acompanhada de pelo menos um dos seguintes sinais clínicos: leucocitose materna, secreção vaginal purulenta ou taquicardia fetal.
O risco de sepse precoce é elevado quando o nascimento do recém‐nascido pré‐termo ocorreu após trabalho de parto espontâneo, ruptura prolongada de membrana amniótica ou presença de corioamnionite. A conduta mais adequada nessas situações é coletar hemocultura, líquor, exames complementares e iniciar antibioticoterapia empírica. O risco de sepse precoce é baixo quando o parto for por cesariana, sem bolsa rota e sem trabalho de parto, por exemplo, nas pacientes com pré‐eclâmpsia que tiveram de ter a sua gestação interrompida por razões obstétricas.20
Exames de laboratórioNa suspeita de sepse neonatal precoce devem ser colhidos hemocultura e líquor. A coleta de urocultura não é indicada, uma vez que infecção urinária na sepse neonatal precoce é pouco frequente.
Hemograma e proteína C‐reativa sérica apresentam um melhor valor preditivo negativo do que um valor preditivo positivo. Os achados de hemograma que costumam ser valorizados são a relação neutrófilos imaturos por número total de neutrófilos>0,2, leucopenia (abaixo de 5.000) ou leucocitose (> 25.000). Níveis séricos baixos de proteína C‐reativa seriados (níveis séricos abaixo de 10mg/L) auxiliam em afastar o diagnóstico de sepse neonatal em um recém‐nascido com hemocultura negativa.1
AntibioticoterapiaO protocolo de tratamento antibiótico empírico no nosso serviço é ampicilina e gentamicina. Esse esquema antibiótico cobre os germes que mais comumente causam sepse neonatal precoce. O espectro da ampicilina é adequado para Streptococcus agalactiae e para listeria, que ocorre muito raramente em nosso meio. A gentamicina tem um espectro adequado para germes gram negativos e em especial para Escherichia coli. Ao se obter o resultado da hemocultura com o teste de antibiograma deve‐se direcionar o esquema antibiótico para a droga específica indicada.
Em caso de meningite, se o Streptococcus agalactiae for o agente etiológico, recomenda‐se o ajuste da ampicilina para a dose adequada indicada para tratamento de meningite. Se o germe for desconhecido ou um germe gram negativo, indica‐se a troca do esquema antibiótico para cefepime.
Prevenção da sepse neonatal precoce causada por Streptococcus agalactiaeSucintamente, o CDC recomenda na prevenção da sepse por Streptococcus agalactiae o seguinte21:
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Pesquisa universal (para todas as gestantes) da colonização do estreptococo entre 35 a 37 semanas de gestação.
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Durante o trabalho de parto ou no momento da rotura de membranas a quimioprofilaxia deve ser administrada para todas as gestantes colonizadas pelo estreptococo.
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Mulheres com estreptococo identificado em culturas de urina (em qualquer concentração) durante a gravidez devem receber a quimioprofilaxia intraparto.
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Mulheres que tiverem um filho anterior com infecção por estreptococo devem receber quimioprofilaxia.
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Se o resultado do rastreamento não é conhecido, a paciente deverá receber quimioprofilaxia nos seguintes casos: (1) Trabalho de parto em idade gestacional inferior a 37 semanas; (2) Tempo de rotura de membranas superior a 18 horas; (3) Apresentar febre durante o trabalho de parto (≥ 38°C).
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Para a profilaxia intraparto o seguinte regime antimicrobiano é recomendado: penicilina cristalina endovenosa 5 milhões de unidades como dose de ataque e 2,5 milhões a cada 4 horas até o parto. Como segunda linha pode ser usada a ampicilina 2g endovenosa de ataque e 1g de 4 em 4 horas até o parto.
A sepse neonatal tardia é aquela que ocorre após 72 horas de vida e é mais frequente em recém‐nascidos de muito baixo peso que permanecem internados um UTI neonatal por longo período ou em recém‐nascidos pré‐termos tardios ou de termo que necessitem internação prolongada. A incidência de pelo menos uma primeira hemocultura positiva após 72 horas de vida em recém‐nascidos pré‐termos de muito baixo peso (peso de nascimento ≤ 1.500 gramas) varia de 20% a 35%, depende do serviço analisado.5,6,22
Os germes que mais frequentemente se associam com sepse neonatal tardia são os gram positivos (79%), especialmente o estafilococo coagulase negativo. Também ocorrem infecções causadas pelos germes gram negativos e a incidência de sepse fúngica se torna importante em vários centros.
A ocorrência de infecções virais, em especial o vírus sincicial respiratório e o rinovírus, tem sido relatada com certa frequência em recém‐nascidos com quadro clínico semelhante à sepse neonatal bacteriana internados em UTI neonatais.23
Os fatores de risco mais importantes para sepse neonatal tardia são:
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Prematuridade: em comparação com recém‐nascidos de termo, os recém‐nascidos pré‐termos apresentam menor produção de citocinas pró‐inflamatórias, menor ativação das células NK, diminuição da imunidade mediada por células, diminuição da passagem placentária de imunoglobulinas e menores níveis de complemento sérico.24
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Quebra de barreiras naturais: lesões e lacerações de pele e mucosa propiciam invasão bacteriana.
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Uso de cateteres centrais por longo período é porta de entrada para bactérias.
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Procedimentos invasivos, por ex., intubação traqueal: o risco de sepse aumenta com o número de vezes que o recém‐nascido for entubado; extubações acidentais com necessidade de reintubações frequentes são causas importante de infecção.
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Uso de bloqueadores H2: a acidez gástrica serve de barreira para proliferação e invasão bacteriana; o uso de bloqueadores H2 diminui o mecanismo de defesa e aumenta o risco de invasão bacteriana.25
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Uso prolongado de antibioticoterapia empírica: o uso por mais de cinco dias de antibioticoterapia empírica para sepse neonatal precoce aumenta a incidência de sepse neonatal tardia, especialmente em unidades com escasso uso de leite materno e excesso de prescrição de cefalosporinas de terceira geração.26,27
É importante salientar que a sepse tardia também ocorre em recém‐nascidos de termo normais pós‐alta. Estudo feito nos Estados Unidos, que analisou 4.255 hemoculturas coletadas de 160.818 recém‐nascidos de termo normais que retornaram à emergência com idade entre uma semana e três meses, mostrou uma positividade de 0,57 por 1.000 nascidos, o germe mais encontrado foi a Escherichia coli. A fonte inicial da infecção nesses pacientes foi infecção urinária.28 A pesquisa de infecção urinária em sepse neonatal tardia deve ser sempre feita.
DiagnósticoAs manifestações clínicas, assim como na sepse neonatal precoce, são muito variadas e inespecíficas. Os sinais clínicos são de diferentes sistemas e podem ser agrupados da seguinte forma: a) apneia, dificuldade respiratória, cianose; b) taquicardia ou bradicardia, má perfusão ou choque; c) irritabilidade, letargia; hipotonia, convulsões; d) distensão abdominal, vômitos, intolerância alimentar, resíduo gástrico, hepatomegalia; e) icterícia inexplicável; f) instabilidade térmica; g) petéquias ou púrpura.12
Frente a um recém‐nascido pré‐termo internado por um longo período na UTI neonatal que apresente sinais clínicos suspeitos de sepse, recomenda‐se a coleta de hemocultura, líquor e urina coletada de forma estéril (punção suprapúbica ou sondagem estéril) para cultura.1
A hemocultura deve ser colhida em dois sítios, numa quantidade de 1mL O germe mais frequente na sepse neonatal tardia é o estafilococo coagulase negativo e a distinção entre ser contaminante ou não é a positividade das hemoculturas coletadas em dois sítios. A positividade de ambas as hemoculturas é indicativa de que o estafilococo coagulase negativo é o agente etiológico da sepse.
Os exames laboratoriais complementares como hemograma e proteína C‐reativa apresentam um melhor valor preditivo negativo do que valor preditivo positivo, da mesma forma que na sepse neonatal precoce. Entretanto, em determinadas ocasiões o resultado do nível sérico da proteína C‐reativa em combinação com o quadro clínico auxilia em direcionar o tratamento. O ponto de corte da proteína C‐reativa é 10mg/L.
O quadro clínico do recém‐nascido é fundamental para a suspeição de sepse neonatal e, depois do resultado da hemocultura, o principal dado a orientar a necessidade de tratamento. Um recém‐nascido em bom estado geral só terá indicação de antibioticoterapia se a hemocultura for positiva, independentemente do resultado do hemograma ou da proteína C‐reativa. Por outro lado, um recém‐nascido com sinais clínicos que demonstrem doença só não terá indicação de antibioticoterapia se a hemocultura for negativa e se tiver, pelo menos, dois níveis baixos de proteína C‐reativa sequenciais com intervalo de 24 horas. Nessa situação devemos considerar que os sinais de doença sejam de uma etiologia não infecciosa bacteriana.
AntibioticoterapiaA antibioticoterapia empírica deve levar em consideração os agentes etiológicos mais prováveis e as suas respostas à antibioticoterapia. Embora o germe mais frequente na sepse neonatal tardia seja o estafilococo coagulase negativo meticilino resistente, não significa que o esquema empírico inicial deva incluir a vancomicina. Vários estudos mostram que o não uso da vancomicina no esquema antibiótico empírico inicial não aumenta a mortalidade, a duração da bacteremia e as complicações atribuídas à sepse neonatal tardia.29–32
O uso indiscriminado e exagerado de vancomicina é um fator importante no aparecimento de flora multirresistente e no aumento da ocorrência de infecção fúngica invasiva.
Krediet et al. estudaram 66 recém‐nascidos com sepse causada por estafilococo coagulase negativo que receberam três esquemas terapêuticos distintos: 25 cefalotina, 15 vancomicina e 26 iniciaram com cefalotina e depois trocaram para vancomicina. Embora 22 dos 25 pacientes tratados com cefalotina apresentassem estafilococo coagulase negativo meticilino resistente, o tratamento com cefalotina foi mantido e os pacientes se recuperaram sem apresentar qualquer complicação ou recidiva.33
Atualmente, há esquemas de gerenciamento de uso de antibióticos em UTI neonatal que preveem o uso inicial de oxacilina no esquema empírico inicial para sepse neonatal tardia e a eventual troca para vancomicina somente quando não há melhoria do quadro clínico do paciente após 48 horas do uso de oxacilina.29,32 A sepse causada por estafilococo coagulase negativa em geral tem um curso mais brando e uma evolução subaguda, o que permite a observação do pacientes por 48 horas em uso de oxacilina e a eventual troca somente no caso de não haver uma resposta adequada ao uso de oxacilina.
O protocolo de antibioticoterapia empírica para sepse neonatal tardia em nosso serviço inclui oxacilina e amicacina. A amicacina tem a função de cobrir os germes gram negativos que podem ocorrer na sepse adquirida em ambiente hospitalar. Após a identificação do germe, devemos direcionar a antibioticoterapia orientados pelo teste de antibiograma, exceto no caso de estafilicoco coagulase negativo resistente à oxacilina, em que a mantemos na dependência da resposta, in vivo, à oxacilina,
Em caso de meningite, recomenda‐se o ajuste da antibioticoterapia de acordo com o germe identificado e o teste de antibiograma. Se o agente etiológico for desconhecido, indica‐se a troca do esquema antibiótico para cefepime.
Prevenção da sepse neonatal tardiaAlgumas medidas são indicadas na prevenção da sepse neonatal tardia:
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Lavagem de mãos ou uso de álcool gel: a lavagem de mãos e/ou uso de álcool gel é a medida mais eficaz para prevenir infecções. Os germes são transportados pelas mãos ao manusear um paciente. Os cinco momentos de higienização de mãos preconizados pela Organização Mundial da Saúde devem ser enfatizados: 1. antes do contato com o paciente; 2. antes do procedimento; 3. após risco de exposição a fluidos biológicos; 4. após contato com paciente; 5. após contato com áreas próximas ao paciente.
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Bundles apropriados e bem definidos de cuidados com cateteres intravasculares centrais e tubos endotraqueais que sejam rigorosamente seguidos com o objetivo de diminuir a contaminação.34
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Alimentação enteral trófica: o início precoce da alimentação trófica estimula o trato gastrointestinal e a maturidade intestinal, previne a atrofia das vilosidades e diminui também a translocação bacteriana e a invasão bacteriana através da mucosa intestinal.35
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Uso de leite materno: o leite materno contém concentrações significantes de IgA e oligossacárides que lhe conferem propriedades anti‐infecciosas. O uso exclusivo do leite materno determina uma microbiota intestinal com maior diversidade, o que propicia menor probabilidade de infecções.36,37
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Probióticos: embora existam metanálises que mostrem que o uso de probióticos pode ser útil na prevenção da sepse neonatal tardia, ainda existem muitos questionamentos quanto ao seu uso rotineiro. Os estudos foram feitos com diferentes tipos de probióticos, distintas dosagens e tempos de tratamento muito variáveis, o que torna muito difícil a generalização dos resultados.38,39
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Lactoferrina: há estudos conflitantes quanto ao papel da lactoferrina como fator protetor de sepse neonatal tardia. Ensaio clínico randomizado colaborativo italiano incluiu 472 recém‐nascidos de muito baixo peso: grupo lactoferrina com 153 pacientes, grupo com lactoferrina e probiótico com 151 pacientes e grupo placebo (glicose 5%) com 168 pacientes foram tratados desde o nascimento até 30 dias de vida. A sepse tardia foi significantemente menor nos grupos que receberam lactoferrina.40 Entretanto, recentemente, foi publicado um ensaio clínico randomizada colaborativo feito no Reino Unido com 2.203 recém‐nascidos de idade gestacional <32 semanas: 1.099 no grupo tratado com lactoferrina até 34 semanas de idade gestacional corrigida e 1.104 no grupo controle que recebeu sacarose até 34 semanas de idade corrigida. Não houve diferença significativa na incidência de sepse tardia.41 Neste momento, a indicação do uso de lactoferrina como medida preventiva de sepse neonatal tardia ainda está em avaliação.
O manejo da sepse neonatal é sempre um desafio. A sepse neonatal é uma causa frequente de morbimortalidade neonatal, principalmente em países em desenvolvimento. O seu diagnóstico é difícil, uma vez que os sinais clínicos são inespecíficos e os exames complementares têm baixa acurácia. A observação contínua do paciente, saber valorizar sinais clínicos e observar os fatores de risco são fundamentais para uma suspeição diagnóstica. Quando suspeitar de sepse neonatal, sempre coletar exames bacteriológicos antes do início do tratamento empírico. A decisão de iniciar a antibioticoterapia empírica e saber escolher qual o esquema mais apropriado é fundamental. Não usar, rotineiramente, vancomicina no esquema empírico de antibiótico na sepse neonatal tardia é importante para evitar resistência bacteriana e infecções fúngicas invasivas. Os principais mecanismos protetores da sepse neonatal são a lavagem de mão e o uso do leite materno.
Conflitos de interesseOs autores declaram não haver conflitos de interesse.
Como citar este artigo: Procianoy RS, Silveira RC. The challenges of neonatal sepsis management. J Pediatr (Rio J). 2020;96(S1):80–6.