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Vol. 90. Núm. 5.
Páginas 486-492 (setembro - outubro 2014)
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Vol. 90. Núm. 5.
Páginas 486-492 (setembro - outubro 2014)
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Prevalence and factors associated with vitamin A deficiency in children and adolescents
Prevalência e fatores associados à deficiência de vitamina A em crianças e adolescentes
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4033
Rita de Cássia Ribeiro‐Silva
Autor para correspondência
rcrsilva@ufba.br

Autor para correspondência.
, Itaciara L. Nunes, Ana Marlúcia Oliveira Assis
Escola de Nutrição, Programa de Pós‐Graduação em Alimentação e Nutrição, Departamento Ciência da Nutrição, Universidade Federal da Bahia (UFBA), Salvador, BA, Brasil
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Estatísticas
Figuras (1)
Tabelas (3)
Tabela 1. Características da população estudada. Salvador/BA, 2009
Tabela 2. OR bruto e respectivos intervalos de confiança 95% (IC 95%) da associação entre deficiência de vitamina A (DVA) e variáveis selecionadas em crianças e adolescentes da rede pública de ensino do município de Salvador, BA, 2009
Tabela 3. OR ajustado e respectivos intervalos de confiança 95% (IC 95%) da associação entre deficiência de vitamina A (DVA) e variáveis selecionadas em crianças e adolescentes da rede pública de ensino do município de Salvador, BA, 2009
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Abstract
Objective

To identify the prevalence and factors associated with vitamin A deficiency (VAD) in children and adolescents.

Methods

This was a cross‐sectional study involving 546 schoolchildren, aged between 7 and 14 years, of both genders, enrolled in public elementary schools. Blood was collected for measurement of serum retinol. The retinol concentration in the samples was determined by high performance liquid chromatography (HPLC). Data were collected on anthropometrics, dietary, demographic, and socioeconomic factors. Polytomous logistic regression was used to evaluate the associations of interest.

Results

Approximately 27.5% of the students had retinol values<30μg/dL. The multivariate analysis showed, after the appropriate adjustments, a positive and statistically significant association of moderate/severe VAD (OR=2.19; 95% CI 1.17 to 4.10) and marginal VAD (OR=2.34; 95% CI 1.47 to 3.73) with age<10 years. There was also association of VAD moderate/severe (OR=2.01; 95% CI 1.01 to 5.05) and borderline VAD (OR=2.14; 95% CI: 1.08 to 4.21) with the anthropometric status of underweight. Lower intake of retinol was detected among those with severe VAD.

Conclusion

VAD is a health concern among children and adolescents. Lower weight and younger schoolchildren had greater vulnerability to VAD.

Keywords:
Vitamin A deficiency
Risk factors
Children
Adolescents
Resumo
Objetivo

Identificar prevalência e fatores associados à deficiência de vitamina A (DVA) entre crianças e adolescentes.

Métodos

Estudo transversal envolvendo 546 escolares, com idade entre 7 e 14 anos, de ambos os sexos, matriculadas na rede pública do ensino fundamental. O sangue foi coletado para dosagem dos níveis séricos de retinol. A concentração de retinol das amostras foi determinada pelo método da cromatografia líquida de alta eficiência (CLAE). Coletaram‐se dados antropométricos, alimentares, demográficos e socioeconômicos. Utilizou‐se da regressão logística politômica para avaliar as associações de interesse.

Resultados

Aproximadamente 27,5% dos estudantes apresentaram valores de retinol<30μg/dL. Em análise multivariada, verificou‐se, após devidos ajustes, associação positiva e estatisticamente significante da DVA moderada/grave (OR=2,19; IC 95%: 1,17‐4,10) e da DVA marginal (OR=2,34; IC 95%: 1,47‐3,73) com a idade<10 anos. Verificou‐se, igualmente, associação da DVA moderada/grave (OR=2,01; IC 95%: 1,01‐5,05) e DVA marginal (OR=2,14; IC 95%: 1,08‐4,21) com o estado antropométrico magreza. Menor consumo de retinol foi detectado entre aqueles com DVA grave.

Conclusão

A deficiência de vitamina A configura‐se como um problema de saúde preocupante entre os escolares e adolescentes. Constatou‐se maior vulnerabilidade dos escolares de baixo peso e mais jovens à DVA.

Palavras‐chave:
Deficiência de vitamina A
Fatores de risco
Crianças
Adolescentes
Texto Completo
Introdução

A deficiência de vitamina A (DVA) é uma carência nutricional de elevada magnitude, que pode ser causada pela ingestão insuficiente de alimentos que são fontes de vitamina A ou por problemas em sua absorção, transporte ou utilização.1 A importância do adequado estado nutricional de vitamina A é incontestável, uma vez que ela possui papel fisiológico muito diversificado, atuando no funcionamento do processo visual, na integridade do tecido epitelial, no sistema imunológico e em outras funções metabólicas.1

A DVA acomete especialmente os grupos populacionais submetidos a precárias condições de vida, além de outros fatores ligados à condição de morbidade que contribuem, também, para a depleção dos níveis de retinol sérico. Entre eles, destacam‐se as infecções, que aumentam o requerimento ou estimulam a perda endógena desse micronutriente, e a desnutrição energética proteica, que afeta a síntese da proteína de enlace de retinol (Retinol Binding Protein – RBP), diminuindo assim a disponibilidade de retinol.2

As crianças em idade pré‐escolar, mulheres grávidas e nutrizes são consideradas como o grupo clássico de risco. Contudo, estudos apontam outros possíveis grupos de risco para a carência, dentre eles, os escolares e adolescentes. Por estar envolvida no crescimento e desenvolvimento físico, a vitamina A torna‐se essencial também nesse ciclo de vida.1,3 Os resultados dos poucos estudos disponíveis na literatura nacional indicam, de modo geral, que a prevalência DVA varia de 6,8% a 34,0% nesta população.3

Por não serem considerados classicamente como de risco, não se dispõe de muitos estudos sobre o estado nutricional de vitamina A entre os escolares (incluindo os adolescentes), o que tem impedido uma avaliação adequada da real magnitude da DVA nesse segmento, no Brasil. Assim, pretende‐se com o presente estudo estimar a prevalência de DVA e os fatores associados em crianças e adolescentes matriculadas na rede pública de ensino na cidade de Salvador‐BA.

Métodos

Trata‐se de um estudo transversal em que participaram estudantes, de ambos os sexos, de 7 a 14 anos de idade. Os participantes foram identificados a partir de uma investigação mais ampla, que teve por objetivo identificar os fatores associados à anemia ferropriva em crianças e adolescentes matriculados na rede pública de ensino da cidade de Salvador‐BA.4 O processo de amostragem no estudo original envolveu desenho complexo, valendo‐se da estratificação das escolas em dois níveis (estadual e municipal), seguido pelo procedimento de amostragem por conglomerado em três estágios, conforme descrito a seguir: o primeiro estágio representado pelos distritos sanitários; o segundo, pelas escolas; o terceiro, pelos alunos. Em virtude de questões logísticas de campo, as informações dos estudantes selecionados foram extraídas de seis dos 12 distritos existentes em Salvador, cidade em que se observaram 117 escolas estaduais e 173 municipais. As escolas estaduais comportavam 58.059 alunos; as municipais, 56.555. Para atender ao número amostral previamente definido, verificou‐se a necessidade de selecionar dez alunos de cada uma das 58 escolas municipais e 23 alunos de cada uma das 27 escolas estaduais, contabilizando 1.200 estudantes.

Para o presente estudo, foram selecionados aleatoriamente 600 estudantes, correspondendo a 50% da amostra original. Considerando que esta amostra não foi estimada para investigar o objeto adotado neste estudo, optou‐se por calcular o erro amostral a posteriori. Nessas circunstâncias e com base na prevalência de DVA inadequada identificada neste estudo (27,5%), o número amostral previamente adotado permitiu determinar os fatores associados ao desfecho estudado com erro de até 2,75%, considerando o nível de confiança de 95%.

Variável respostaDosagem de retinol sérico

Amostras de sangue (5mL) foram colhidas no início da manhã, com a criança em jejum, e obtidas por punção venosa periférica, utilizando‐se agulha e seringa descartáveis. As amostras foram armazenadas em tubos secos, transparentes, envolvidos em papel‐alumínio, para amenizar perdas em decorrência da exposição à luz. Após retração do coágulo e separação por centrifugação (1.500rpm por 10 minutos), as amostras de soro foram acondicionadas e enviadas para o Laboratório da Escola de Nutrição da UFBA, para determinação dos níveis de retinol sérico. Os procedimentos foram padronizados com referências nacionais e internacionais. Adotou se a rotina de controle de qualidade conforme recomendado pelo International Vitamin A Consultative Group (IVACG).5 Toda a manipulação do sangue, desde a coleta até a dosagem laboratorial, foi realizada em ambiente com pouca luminosidade.

A extração do retinol no soro foi realizada segundo proposto pelo IVACG.5 A concentração de retinol das amostras foi determinada pelo método da cromatografia líquida de alta eficiência (CLAE). Foi utilizado um sistema de fase reversa, seguido por detecção em PDA em 325nm. Empregou‐se um cromatógrafo Waters Modelo Alliance 2695 (Waters Technologies do Brasil, SP), acoplado ao detector de arranjo de photodi‐iodo (PDA), modelo 2998 marca Waters (Waters Technologies do Brasil, São Paulo). A análise foi desenvolvida usando coluna X‐Terra MS C 18 ((Waters Technologies do Brasil, São Paulo) e poros de 5μm (150mm x 3,9mm), protegida por uma coluna de guarda C 18. O cromatógrafo evoluiu em eluição isocrática com fase móvel 100% metanol (1mL/min). O tempo de retenção do retinol foi 2,4min. A identificação e quantificação do retinol nas amostras de soro foram estabelecidas por comparação com o tempo de retenção e a área do respectivo padrão, em comprimento de onda de 325nm. A exatidão do método foi avaliada por meio do teste de recuperação da extração, obtendo‐se 95% de recuperação do retinol acetato (padrão interno) adicionado às amostras. A precisão foi avaliada pelo teste de reprodutibilidade, em que triplicatas de uma mesma amostra foram aferidas para retinol durante três dias alternados. Os valores encontrados apresentaram variação inferior a um desvio‐padrão. A curva‐padrão foi realizada com padrão referência retinol todo trans (Sigma) em diferentes concentrações. Os limites de detecção e quantificação foram baseados na linearidade da curva‐padrão, obtendo‐se valores de 0,82μg/dL e 2,74μg/dL, respectivamente.

Os valores de retinol sérico foram categorizados em três níveis: deficiente grave/moderado (<20μg/dl), marginal (≥20μg/dl e <30μg/dl) e adequado (≥ 30μg/dl) (categoria de referência).6

Estado antropométrico

Os dados antropométricos foram coletados no ambiente escolar por antropometristas e entrevistadoras qualificadas e previamente treinadas para a coleta dos dados. O peso foi obtido com o auxílio de balança microeletrônica, marca Marte (Marte Balanças e Aparelhos de Precisão Ltda., São Paulo), modelo PP 200‐50, com capacidade para 199,95kg e precisão de 50 gramas. Para a obtenção da estatura, utilizou‐se estadiômetro marca Leicester (Height Measure, Londres, Inglaterra), graduado em décimos de centímetros. Todas as medições foram realizadas seguindo os procedimentos preconizados pelo Anthropometric standartization reference manual.7

Para avaliar o estado antropométrico, foram utilizadas como padrão de referência as tabelas da WHO,8 baseadas em valores percentílicos do índice de massa corporal [IMC = peso (kg)/estatura(m)2] para sexo e idade. E para classificação, utilizou‐se a proposta da WHO:9 magreza ou baixo peso (< percentil 3), peso normal (≥ percentil 3 e < percentil 85), sobrepeso (≥ percentil 85 e < percentil 97) e obesidade (percentil ≥ 97).

A idade do aluno foi originária da base de dados das Secretarias Estadual e Municipal de Educação e confirmada pela data de nascimento presente no registro de nascimento ou na carteira de identidade.

Consumo alimentar

O método recordatório de 24 horas foi utilizado para avaliar o consumo alimentar. O cálculo da composição centesimal da dieta foi efetuado utilizando‐se o Programa do Virtual Nutri, versão 1.0, desenvolvido pelo Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (São Paulo).10 O consumo de retinol foi estratificado segundo tercis: o 1° tercil foi categorizado por consumo mais baixo, e os demais por consumo mais elevado (categoria de referência).

Variáveis demográficas e socioeconômicas

As variáveis demográficas foram: sexo [masculino(categoria de referência), feminino]: e faixa etária [< 10 anos e > 10 anos (categoria de referência)].

As características das condições ambientais e de moradia, socioeconômicas e maternas foram coletadas mediante questionários aplicados aos responsáveis pelos estudantes por entrevistadores treinados e qualificados. Os responsáveis foram convidados a comparecer na escola para as entrevistas. Foram obtidos dados acerca das características do domicílio (condições de posse do domicílio, tipo de construção, material predominante de piso, material predominante na cobertura e parte do domicílio, número de habitantes por dormitórios etc.) e de saneamento básico (abastecimento de água, coleta de lixo, esgotamento sanitário) para a construção de um índice adaptado do modelo proposto por Issler & Giugliani.11 A cada situação, foi atribuída pontuação; a mais favorável recebeu o valor 0; a mais desfavorável, a pontuação 1. O somatório desses valores caracterizou o indicador das condições ambientais e de moradia. O índice foi classificado em dois estratos, tendo como ponto de corte a mediana: adequado (escore ≤ 4 – categoria de referência) e inadequado (escore > 4).

Foram coletados, ainda, dados de escolaridade materna. Foram considerados dois níveis, conforme a série escolar cursada: I < 5a série e II > 5a série (categoria de referência).

Análise estatística

Para o processamento e construção do banco de dados, foi utilizado o Epi Info versão 6.04 (Centers for Disease Control and Prevention, Atlanta, Estados Unidos), adotando‐se a digitação dupla dos dados após a revisão dos questionários e a correção dos erros decorrentes da codificação realizada inicialmente em campo.

As características da população foram identificadas por meio da análise descritiva, utilizando‐se a prevalência para os dados categorizados e a média e o respectivo desvio‐padrão para variáveis contínuas.

Os valores de retinol sérico categorizados em três níveis foram adotados como o desfecho: nível de retinol deficiente grave/moderado (< 20μg/dL), marginal (≥ 20μg/dl e <30μg/dL) e adequado (≥ 30μg/dL) (categoria de comparação). Empregou‐se a técnica de regressão logística politômica para avaliar os fatores associados à DVA. A força das associações foi expressa em odds ratio (OR) e os respectivos intervalos de confiança (IC95%).

Iniciou‐se o processamento das análises realizando a regressão logística politômica univariada para investigar a associação de cada uma das covariáveis na ocorrência dos desfechos. As variáveis associadas com DVA de 20% foram selecionadas para inclusão na análise multivariada. Para a seleção das variáveis no modelo final, adotou‐se o procedimento de eliminação progressiva (backward). Permaneceram no modelo ajustado apenas aquelas com valor de p < 0,05.

As análises estatísticas foram corrigidas pelo delineamento complexo da amostra, por meio da utilização do conjunto de comandos svy do Stata, versão 9.0 (Stata Corp, College Station, Estados Unidos).

Questões éticas

O protocolo de estudo foi submetido ao Comitê de Ética do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia, que avaliou e emitiu parecer favorável à sua realização.

Resultados

Do número total de alunos selecionados inicialmente (600), 54 não participaram do estudo (devido à recusa, mudança familiar para outra cidade ou à transferência do aluno para outra escola), resultando 546 estudantes na faixa etária de 7 a 14 anos, havendo percentual discretamente mais elevado de indivíduos do sexo feminino (50,2%). As demais características estão dispostas na tabela 1. Embora a população deste estudo seja originária de outra investigação, não foi observada diferença estatisticamente significante entre as características sociodemográficas da amostra original e as da subamostra utilizada neste trabalho (dados não apresentados).

Tabela 1.

Características da população estudada. Salvador/BA, 2009

Variáveis 
Idade
< 10 anos  148  27,1 
≥ 10 anos  398  72,9 
Sexo
Masculino  272  49,8 
Feminino  274  50,2 
Escolaridade maternaa
I < 5a série  185  34,8 
II > 5a série  347  65,2 
Indicador das condições de moradiaa
Inadequadas  213  39,0 
Adequadas  333  61,0 
Estado nutricional
Magreza  51  9,3 
Eutrófico  430  78,8 
Excesso de peso (sobrepeso/obesidade)  65  11,9 
Dosagem sérica de Vitamina A
I < 10μg/dL  22  4,0 
II 10‐20μg/dL  27  4,9 
III 20‐30μg/dL  103  18,9 
IV ≥ 30μg/dL  394  72,2 
Retinol (μg)b
Percentil 25 (175,79)  136  24,9 
Mediana (333,03)  137  25,1 
Percentil 75 (671,90)  273  50,0 

DP, desvio‐padrão.

a

Dados faltantes.

b

Média de retinol (μg) (±DP) = 960,06 (±2418,89).

A distribuição das frequências dos valores médios de retinol sérico apresentou algum grau de assimetria; o desvio foi mais pronunciado para a esquerda, sugerindo um percentual elevado de crianças e adolescentes com valores médios baixos de retinol sérico (média = 39,6±19,25μg/dL). Observou‐se prevalência de 27,8% da deficiência de vitamina A (<30μg/dL) entre os estudantes e, desta, 4,0% foi caracterizada por deficiência grave (<10μg/dL), e 4,9% por moderada (≥10μg/dL e <20μg/dL).

Foi evidenciada, por meio de análise univariada, associação positiva e estatisticamente significante da DVA moderada/grave com a idade <10anos (OR = 2,20; IC95%: 1,18‐4,10) e estado antropométrico magreza (OR = 2,09; IC95%: 1,02‐5,08). Também a DVA marginal esteve associada com a idade <10anos (OR=2,29; IC95%: 1,45‐3,64) e estado antropométrico magreza (OR = 2,14; IC95%: 1,10‐4,17). Em relação às demais variáveis, não foi observada distribuição diferenciada segundo os níveis séricos de retinol (tabela 2).

Tabela 2.

OR bruto e respectivos intervalos de confiança 95% (IC 95%) da associação entre deficiência de vitamina A (DVA) e variáveis selecionadas em crianças e adolescentes da rede pública de ensino do município de Salvador, BA, 2009

Variáveis  Modelo univariado (DVA moderada/grave)aModelo univariado (DVA marginal)a
  OR  IC 95%  OR  IC 95% 
Idade
< 10 anos  2,20  1,18‐4,10  2,29  1,45‐3,64 
≥ 10 anos  Referência    Referência   
Sexo
Masculino  0,93  0,54‐1,68  0,91  0,59‐1,41 
Feminino  Referência    Referência   
Escolaridade materna
< 5a Série  0,91  0,48‐1,73  1,09  0,69‐1,72 
≥ 5a Série  Referência    Referência   
Indicador das condições de moradia
Inadequadas  1,14  0,79‐1,65  1,07  0,81‐1,40 
Adequadas  Referência    Referência   
Estado nutricional
Magreza  2,09  1,02‐5,08  2,14  1,10‐4,17 
Eutrófico + excesso de peso  Referência    Referência   
Retinol A (μg)
< 1o tercil de consumo (231,94)  0,97  0,35‐1,33  0,89  0,56‐1,41 
≥ 1o tercil de consumo  Referência    Referência   

OR, odds ratio.

a

Níveis adequados de vitamina A = níveis de retinol ≥ 30μg/dL (grupo de comparação).

Em análise multivariada, confirmou‐se, após devidos ajustes, associação positiva e estatisticamente significante da DVA moderada/grave (OR = 2,19; IC95%: 1,17‐4,10) e da DVA marginal (OR = 2,34; IC95%: 1,47‐3,73) com a idade < 10 anos. Verificou‐se, igualmente, associação da DVA moderada/grave (OR = 2,01; IC95%: 1,01‐5,05) e DVA marginal (OR = 2,14; IC95%: 1,08‐4,21) com o estado antropométrico magreza (tabela 3).

Tabela 3.

OR ajustado e respectivos intervalos de confiança 95% (IC 95%) da associação entre deficiência de vitamina A (DVA) e variáveis selecionadas em crianças e adolescentes da rede pública de ensino do município de Salvador, BA, 2009

Variáveis  Modelo multivariado (DVA moderada/grave)aModelo multivariado (DVA marginal)a
  OR ajustado  IC 95%  OR ajustado  IC 95% 
Idade
< 10 anos  2,19  1,17‐4,10  2,34  1,47‐3,73 
≥ 10 anos     
Estado nutricional
Magreza  2,01  1,01‐5,05  2,14  1,08‐4,21 
Eutrófico + excesso de peso     

OR, odds ratio.

a

Níveis adequados de Vitamina A = níveis de retinol ≥ 30μg/dL (grupo de comparação).

Menor valor de consumo de retinol foi detectado entre aqueles com DVA grave (nível de retinol sérico < 10μg/dL) (fig. 1).

Fig. 1.

Valores médios de consumo de retinol segundo níveis séricos de retinol em crianças e adolescentes da rede pública de ensino do município de Salvador, BA, 2009.

IC 95% Retinol, intervalo de confiança para o nível médio de retinol.

(0.07MB).
Discussão

A prevalência de níveis baixos de retinol sérico (< 20μg/dL) foi aproximadamente de 9,0% (IC 95%, 6,5‐11,3), caracterizando a DVA como problema de saúde pública do tipo leve, segundo critérios da Organização Mundial de Saúde.1 Esse resultado é compatível com aquele encontrado por Gonçalves‐Carvalho et al.12 (10,7%) em Capinas, SP; e menor do que aquele identificado por Graebner et al.13 (33.55%) em Brasília, DF. Por outro lado, 18,5% (IC 95% 15,23‐21,19) das crianças e adolescentes apresentaram níveis marginais (20‐30μg/dL) de retinol sérico. Assim, 27,5% dos escolares matriculados na rede pública de ensino de Salvador, estado da Bahia, apareceram com níveis inadequados de retinol (<30μg/dL), percentual acima do encontrado por de Souza Valente da Silva et al.14 (10,0%) em estudo realizado no Rio de Janeiro, RJ. Esse é um ponto de corte (<30μg/dL) utilizado com frequência crescente para definir a deficiência da vitamina A em escolares, incluindo adolescentes.3,6 Ressalta‐se que esse ponto de corte já foi intervalidado com o teste terapêutico (+S30DR) e com o RDR,15 além de apresentar associação com alterações funcionais da visão.16

O presente estudo foi realizado para investigar os fatores associados à ocorrência de DVA. Verificou‐se que a magreza imprimiu chance 2,01 (IC95%: 1,01‐5,05) vezes maior de os escolares apresentarem DVA moderada/grave e 2,14 (IC95%: 1,08‐4,21) vezes de eles apresentarem DVA marginal. Esses resultados corroboram aqueles descritos em outros estudos,13,17,18 e essa relação se justifica, dado que a desnutrição torna o indivíduo vulnerável a múltiplas deficiências nutricionais. Há que considerar que, embora a prevalência da desnutrição na infância tenha declinado globalmente ao longo das últimas décadas, essa redução tem ocorrido de forma desigual. Em alguns países, inclusive, o problema tem persistido.19 Estima‐se que no Brasil, entre aqueles em idade escolar, as prevalências descritas de desnutrição, avaliadas pelo indicador altura/idade, oscilam em torno de 6,8%, e entre os adolescentes, avaliados pelo índice de massa corporal (IMC) para a idade, em torno de 3,4%, variando de acordo com o estrato de renda.20

Igualmente, observou‐se que a idade abaixo de 10 anos imprimiu uma chance 2,19 vezes maior de os escolares apresentarem DVA moderada/grave (IC95%: 1,17‐ 4,10) e 2,34 (IC95%: 1,47‐ 3,73) vezes de eles apresentarem DVA marginal. Esses resultados estão de acordo com aqueles observados em outras investigações,21,22 sugerindo uma maior vulnerabilidade dos escolares mais jovens. É possível que esta tendência decorra do crescimento físico, efeito adverso de infecções por vírus e bactérias e das infestações parasitárias comuns nessa faixa etária, ou ainda de uma maior diversificação do padrão dietético observado em crianças mais velhas. Concordando com Ramalho et al.,22 ainda que a frequência de baixos níveis séricos de retinol tenda a cair com a idade, como visto no presente estudo, ela ainda é alta o suficiente para justificar atenção a esse segmento populacional.

Embora o baixo consumo de alimentos fontes de vitamina A não tenha sido um dado complementar no modelo explicativo da DVA, verificou‐se baixo consumo de retinol entre os portadores de DVA grave, quando o consumo foi comparado aos demais níveis de deficiência. A percepção da influência do consumo de vitamina A sobre os níveis de retinol sérico tem sido compartilhada por alguns estudos.17,23 Os hábitos alimentares inadequados podem exercer grande influência no aparecimento das carências nutricionais,24 sobretudo nas crianças e adolescentes. Assim, em tempos em que emerge uma epidemia de sobrepeso/obesidade, persistem ainda carências nutricionais endêmicas, a exemplo da hipovitaminose A e da anemia, em vários espaços do território nacional.25 Esse quadro é explicado, em parte, pela adoção de padrões alimentares pouco saudáveis, especialmente entre os jovens, o que denota a necessidade de se aplicar estratégias públicas, a fim de deter o avanço dos distúrbios nutricionais e suas complicações nesse ciclo de vida.

É importante salientar que a principal limitação desta investigação está no fato de se tratar de um estudo transversal, o que afeta a interpretação dos resultados. O desenho adotado permite apenas observar associações entre os eventos estudados, não sendo possível demonstrar uma relação de causa e efeito entre tais eventos. Este estudo, embora coerente com seu objetivo e tendo utilizado amostra probabilística com tamanho adequado e técnicas de laboratório internacionalmente recomendadas, apresenta como limitação a falta de informações referentes às infecções gastrointestinais e respiratórias, que reduzem a absorção e elevam consideravelmente a utilização biológica e a excreção desse micronutriente, independentemente da reserva hepática.1 Também não foram obtidos dados de sinais clínicos de DVA.26 Ademais, o método recordatório de 24 horas, utilizado neste estudo para investigar o consumo alimentar, também apresenta algumas limitações. O inquérito de consumo alimentar, além de se limitar apenas a dados do consumo de vitamina A, sem informações sobre absorção e utilização biológica, tem recebido pesadas críticas em virtude da extrema variabilidade da determinação do teor de vitamina A dos alimentos fontes, bem como da multiplicidade de tabelas, muitas vezes sem uma adequada informação do conteúdo dos alimentos regionais consumidos pela população‐alvo. No entanto, esse método fornece informações da estimativa do consumo médio das populações, inclusive quando aplicado uma única vez, quando os pressupostos metodológicos são observados e os recursos analíticos adequados.27 Assim, os estudos de consumo alimentar podem fornecer, precocemente, importantes informações sobre os riscos de deficiência nutricional, antes que a forma clínica se instale.

A deficiência de vitamina A configura‐se como um problema de saúde preocupante entre os escolares e adolescentes. Verificou‐se maior vulnerabilidade dos escolares de baixo peso e mais jovens à DVA. A escola tem um papel importante na prevenção da deficiência da vitamina A, promovendo educação nutricional dirigida especialmente a grupos de risco.

Financiamento

Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (Fapesb) [processo n. 1431040053551] e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) [processo n. 402462/2005‐0].

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

Referências
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Como citar este artigo: de Cássia Ribeiro‐Silva R, Nunes IL, Assis AM. Prevalence and factors associated with vitamin A deficiency in children and adolescents. J Pediatr (Rio J). 2014;90:486–92.

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