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Vol. 95. Núm. S1.
Páginas 42-48 (março - abril 2019)
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Vol. 95. Núm. S1.
Páginas 42-48 (março - abril 2019)
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Preterm newborn's postnatal growth patterns: how to evaluate them
Padrões de crescimento pós‐natal do recém‐nascido prematuro: como avaliar
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Rita C. Silveiraa,b,
Autor para correspondência
drarita.c.s@gmail.com

Autor para correspondência.
, Renato Soibelmann Procianoya,b
a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Departamento de Pediatria, Porto Alegre, RS, Brasil
b Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), Serviço de Neonatologia, Porto Alegre, RS, Brasil
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Abstract
Objectives

There are several factors that influence the postnatal growth of preterm infants. It is crucial to define how to evaluate the growth rate of each preterm child and its individual trajectory, the type of growth curve, either with parameters of prescriptive curves for healthy preterm infants with no morbidities or, in the case of preterm infants and their “bundle of vulnerabilities”, growth curves that may represent how they are actually growing, with the aim of directing appropriate nutritional care to each gestational age range.

Data sources

The main studies with growth curves for growth monitoring and the appropriate nutritional adjustments that prioritized the individual trajectory of postnatal growth rate were reviewed. PubMed and Google Scholar were searched.

Data synthesis

The use of longitudinal neonatal data with different gestational ages and considering high and medium‐risk pregnancies will probably be essential to evaluate the optimal growth pattern.

Conclusions

Prioritizing and knowing the individual growth trajectory of each preterm child is an alternative for preterm infants with less than 33 weeks of gestational age. For larger preterm infants born at gestational age >33 weeks, the Intergrowth 21st curves are adequate.

Keywords:
Prematurity
Growth
Anthropometric charters
Newborn
Resumo
Objetivos

Inúmeros são os fatores que influenciam o crescimento pós‐natal de prematuros. É fundamental a definição de como avaliar velocidade de crescimento de cada criança nascida prematura e sua trajetória individual, o tipo de curva de crescimento, seja com parâmetros de curvas prescritivas para prematuros saudáveis e sem morbidades ou no caso de um prematuro e seu “pacote de vulnerabilidades”, curvas de crescimento que possam representar como eles realmente crescem, com a finalidade de direcionar o cuidado nutricional apropriado a cada faixa de idade gestacional.

Fonte de dados

Foram revisados os principais estudos com curvas de crescimento na monitoração do crescimento e nos ajustes nutricionais apropriados que priorizaram a trajetória individual da velocidade de crescimento pós‐natal. Foram consultados PubMed e Google Scholar.

Síntese dos dados

O uso de dados neonatais longitudinais com diferentes idades gestacionais e considerando gestações de alto e médio risco provavelmente será fundamental para avaliar o padrão ótimo de crescimento.

Conclusões

Priorizar e conhecer a trajetória individual de crescimento de cada criança nascida prematura é opção para prematuros com menos de 33 semanas. Para prematuros maiores, nascidos com idade gestacional acima de 33 semanas, as curvas Intergrowth 21 st são adequadas.

Palavras‐chave:
Prematuridade
Crescimento
Curvas antropométricas
Recém‐nascido
Texto Completo
Introdução

Os dados disponíveis na literatura para avaliação dos padrões de crescimento de prematuros são extremamente variados, refletem a evolução do cuidado neonatal e a maior sobrevida de recém‐nascidos com menores idades gestacionais. Diferentes curvas de crescimento, parâmetros de avaliação e populações avaliadas impactam na definição de um padrão ideal de crescimento. Além disso, os dados têm sido obtidos ao longo dos anos, desde o período in útero e na grande maioria dos casos restritos ao período neonatal, com o uso de diferentes metodologias, amplas faixas de idades gestacionais, as quais variam com a viabilidade de cada centro e o tempo de seguimento.1–5

O crescimento fetal, neonatal e infantil não é constante em qualquer dessas três fases da vida: durante a gestação, o período neonatal e a primeira infância. Alguns parâmetros que envolvem velocidade de crescimento, como 15g/kg/dia, 10‐30 gramas/dia e 1cm/semana são citados com frequência, mas são adequados como referência apenas por períodos de tempo limitados e posteriormente esses parâmetros perdem parte do seu referencial para a assistência neonatal. Da mesma forma, taxas de 15‐20g/dia estimadas a partir de métodos estatísticos exponenciais ou da média obtida de crescimento para crianças de 23 semanas a 36 semanas apresentam validade limitada na assistência.6

São inúmeros os fatores que influenciam o crescimento pós‐natal de crianças nascidas prematuras, dentre os quais podemos citar: grau de prematuridade, estado nutricional ao nascimento (adequado/pequeno para idade gestacional e crescimento intrauterino restrito), evolução clínica durante a internação neonatal e práticas nutricionais pós‐natais. Nesta revisão buscamos responder o entendimento do que é mais importante: avaliar velocidade de crescimento e o crescimento com parâmetros de curvas prescritivas, ou seja, que determinem o padrão ideal de crescimento de uma criança em aleitamento materno exclusivo e sem comorbidades. Ou, no caso de um prematuro e seu “pacote de vulnerabilidades”, definir como eles realmente crescem, com a finalidade de direcionar o cuidado nutricional apropriado a cada faixa de idade gestacional e reconhecer o quão diversa é a repercussão do nascimento com 25, 26 ou 27 semanas comparado com um nascimento com idade gestacional de 35,36 ou 37 semanas.

Curvas de crescimento

Desde o seu surgimento no século XVIII, o uso do gráfico de crescimento permite descrever um padrão de crescimento de grupos de crianças e indivíduos, tornou‐se uma ferramenta importante na triagem de saúde infantil e no acompanhamento clínico pediátrico.1 Existem dois tipos de gráficos: gráficos‐padrão e gráficos de referência. Os gráficos‐padrão são prescritivos, definem como uma população deve crescer em condições ideais ambientais e de saúde, baseados em gestações de baixo risco; já os gráficos de referência são descritivos, incluem gestações de baixo e alto risco, indicam crescimento longitudinal de uma determinada população de referência.1–3 Os dados antropométricos de um prematuro, ao ser plotados em curvas de crescimento desde o nascimento e ao longo da internação neonatal, assim como após a alta hospitalar no acompanhamento ambulatorial, permitem uma avaliação da quantidade e qualidade de crescimento em comparação com um padrão de referência que nós usamos chamar de “normal”, por meio de percentis ou escores‐z de normalidade para peso, comprimento, perímetro cefálico e IMC. Esse gráficos são usados como apoio para informações nutricionais e monitoram o padrão de crescimento.1–3,7

Considerações de como as curvas foram criadas, suavizadas e/ou validadas são fundamentais para entender o grande desafio do adequado padrão de referência do crescimento pós‐natal do prematuro. Enquanto os valores‐padrão de determinadas curvas de crescimento pretendem representar o crescimento ideal para um prematuro supostamente saudável em aleitamento materno exclusivo, os valores de referência descrevem como os prematuros efetivamente crescem diante de todo pacote de morbidades aos quais com frequência estão sujeitos.8 De tal forma que a seguir serão abordadas as curvas de crescimento pós‐natal de prematuros mais usadas e descritas na literatura.

Curvas de Ehrenkranz: As curvas de referência de Ehrenkranz et al. foram construídas com base na prática assistencial de 12 unidades neonatais americanas com 1.660 recém‐nascidos com peso ao nascer entre 501g e 1.500g, sem anomalias congênitas, nascidos em 1994 e 1995 e sobreviventes por tempo superior a sete dias de vida, com monitoração do crescimento principalmente das primeiras 2‐3 semanas pós‐natais. Essas curvas contemplam a perda fisiológica de peso que ocorre após o nascimento, são estratificadas em intervalos de 100 gramas, permitem, assim, monitorar o peso, o comprimento, o perímetro cefálico e o perímetro braquial do nascimento à alta, ou seja, aproximadamente até as 14 semanas pós‐natais ou até ser atingido o peso de 2.000 gramas. Como nessa fase não há diferença significativa entre os gêneros, são comuns para ambos os sexos.5 Um problema do uso dessas curvas atualmente é o fato de terem sido construídas com base no crescimento que foi reflexo da assistência nutricional anterior à prática da nutrição agressiva parenteral e incentivo ao início da nutrição enteral precoce que começaram a ser preconizadas nas UTINs no início da década de 2000; portanto, o padrão do crescimento avaliado por meio dessas curvas, na grande maioria das situações, está desatualizado.9 O crescimento de prematuros pode ser duplicado quando não há limitação de nutrientes, embora existam evidências de que os prematuros, enquanto grupo, ainda experimentam um crescimento oscilante, caem um ou dois pontos percentuais entre o nascimento e a alta. Estudos recentes demonstraram que é possível que os recém‐nascidos prematuros cresçam muito próximo do seu percentil de nascimento, particularmente se as necessidades nutricionais recomendadas forem satisfeitas e por essa razão uma curva com dados de mais de dez anos deve ser avaliada com cautela.10–12

Curvas de Fenton e Kim ou Curvas de Fenton 2013: Foram obtidas da combinação de uma metanálise dos registros das medidas ao nascer e coortes longitudinais de recém‐nascidos prematuros; posteriormente suavizadas para interagir com curva longitudinal de crescimento de recém‐nascidos de termo saudáveis seguidos desde o nascimento.13 Os estudos feitos entre 1990 e 2007 de seis países desenvolvidos (Alemanha, Austrália, Canadá, Escócia, EUA e Itália) foram incluídos, o que resultou na maior amostra de recém‐nascidos prematuros avaliada na atualidade.13,14 As curvas de Fenton 2013 possibilitam avaliar desde o estado de nutrição intrauterino ao crescimento pós‐natal, ou seja, de 24 semanas de gestação até 50 semanas de idade pós‐menstrual de um prematuro (até 10 semanas após termo), na sequência são suavizadas para a curva da Organização Mundial da Saúde (OMS) de 2006. São específicas para cada gênero (meninas e meninos), estratificadas em percentis (3 a 97), quantificam desvios acima ou abaixo do esperado e definem um padrão ideal a partir do cálculo do escore‐z.13 Apesar dessas qualidades, entre os estudos que foram selecionados na confecção da curva, apenas o de Voigt et al.15 usou idade gestacional em semanas e dias. Os demais que participaram da construção das curvas e do estabelecimento de percentis usaram as semanas completas, os dias de vida foram extrapolados a partir de dados matemáticos, o que é uma limitação considerável da construção das Curvas de Fenton.13

Curvas de Cole et al.: São curvas construídas a partir de uma base de dados longitudinais, compreendem o crescimento pós‐natal de uma população de prematuros com menos de 32 semanas de idade gestacional nascidos na Inglaterra de 2006 a 2011. Os prematuros nascidos com 29 semanas ou mais de gestação recuperaram a perda de peso inicial duas semanas após nascimento e os mais imaturos demoraram um tempo ainda maior, três semanas ou mais, de acordo com o grau de imaturidade. Dessa forma, a proposta dos autores é considerar o percentil de crescimento esperado após a perda de peso inicial, e não a partir do peso de nascimento.4

Curvas de Boghossian et al.: Com os dados de 852 UTINs dos Estados Unidos (> 156.000 sujeitos) afiliadas à rede Vermont Oxford foram obtidos gráficos para perímetro cefálico e peso após nascimento de prematuros com diversidade étnica e específicos para meninos e meninas sem malformações congênitas com idade gestacional entre 22 semanas e 29 semanas e seis dias, excluídos os óbitos antes da alta hospitalar.3 Boghossian et al. usaram um modelo de regressão quantílica para prever peso e percentis de perímetro cefálico ao nascimento para etnias branca, asiática e negra, mas infelizmente não avaliaram dados de comprimento, o que é uma limitação.3 A proposta foi a construção de curvas de referência pós‐natal, o que difere das curvas de crescimento intrauterinas que estimam peso e idade gestacional pelas medidas na utrassonografia fetal. Neonatos prematuros são menores do que fetos, uma vez que condições adversas são causa de nascimento prematuro. Dessa forma, qualquer curva de referência, inclusive a descrita por Boghossian et al., poderá subestimar o número de nascimentos com restrição de crescimento intrauterino e/ou pequenos para idade gestacional. Por outro lado, a determinação do peso estimado do feto durante a gestação é limitada pela capacidade de obter com precisão as medições.16

O National Institute of Child Health and Human Development (NICHD) avaliou o crescimento fetal de gestações de baixo risco de diferentes etnias; definiu curvas de crescimento fetal étnicas específicas, com diferenças significativas entre brancos não hispânicos, pretos não hispânicos, hispânicos e asiáticos em situações de baixo risco.17 Essas diferenças étnicas foram avaliadas na grande amostra de nascimentos prematuros da Rede Vermont Oxford.3

Curvas Intergrowth‐21st: São curvas com padrões prescritivos de crescimento, isto é, descrevem como crescem os recém‐nascidos sem anormalidades, sem malformações congênitas em condições nutricionais ideais, pois os dados foram coletados longitudinalmente de populações selecionadas, com sexo especifico e múltiplas etnias; de oito coortes populacionais urbanas geograficamente definidas e semelhantes o suficiente para permitir o agrupamento analítico e estatístico em termos de condições de saúde e de necessidades de nutricionais das mães e cuidados pré‐natais adequados.18–20 Assim, foram recrutadas somente gestantes de baixo risco para construir um padrão de crescimento fetal único a partir de medidas ultrassonográficas, presumiu‐se que não há diferenças entre as populações.19 Os dados foram extrapolados para obtenção do tamanho do recém‐nascido. O Intergrowth‐21st Consortium também publicou padrões de crescimento para peso de nascimento e gênero de neonatos na faixa de idade gestacional de 33 a 42 semanas de gestação, mas não para prematuros abaixo de 33 semanas, uma vez que muito poucos nascimentos ocorreram antes de 33 semanas, dado o grupo de gestantes selecionadas. Portanto, as curvas prescritivas do Intergrowth‐21st são adequadas para prematuros com idade gestacional acima de 33 semanas.20

Trajetórias individuais de crescimento

Independentemente do gráfico empregado, para monitorar o crescimento pós‐natal, tanto na UTIN quanto no acompanhamento ambulatorial do prematuro, deve haver o entendimento da velocidade ideal de crescimento pós‐natal e de como considerar, por exemplo, uma perda de peso como fisiológica para um prematuro, aceitam‐se suas esperadas limitações no contexto de criança saudável ou não. Particularmente em prematuros extremos torna‐se um desafio maior do que com prematuros tardios a definição da melhor curva de crescimento, ou seja, aquela que agrega validade e aplicabilidade na prática clínica.1,8,21,22

Ao considerar curvas de crescimento de referência que descrevem como as crianças crescem e a aplicabilidade desse padrão de crescimento às outras crianças para estabelecer se suas medidas são ou não típicas do grupo de referência, devemos selecionar a amostra de referência pelo estado de saúde. É o caso de prematuros, com ou sem restrição de crescimento intrauterino, aspectos nutricionais, morbidades, grau de prematuridade e todo a gama de condições que repercutirão no crescimento. A representação de um padrão saudável de crescimento é daquele padrão que mostra como as crianças devem crescer, e não como elas efetivamente crescem. Especialmente em populações de prematuros extremos, os quais antes não sobreviviam e atualmente são parte do contexto de periviabilidade, o padrão saudável de crescimento ainda não está adequadamente descrito.4,8,23

Proporção considerável de prematuros saudáveis tem pesos abaixo do percentil 10 em gráficos de crescimento logo após nascimento em função da perda inicial e fisiológica de água extracelular. Por essa razão, considerar o peso menor do que o 10° percentil como restrição de crescimento extrauterino ou como uma falha de crescimento pós‐natal pode não ser apropriado. Alguns autores propõe avaliar peso, comprimento e perímetro cefálico na alta hospitalar e seus percentis em relação ao nadir de peso pós‐fisiológico em duas a três semanas de idade, em vez de comparar com a adequação do peso de nascimento a idade gestacional, como anteriormente era considerado.4,6,7,14

Há dois fatores potencias que desviam as trajetórias pós‐natais dos prematuros em relação ao crescimento intrauterino: 1. Na adaptação fisiológica pós‐natal à vida extrauterina ocorre uma redução do espaço de água extracelular durante os primeiros dias de vida, com subsequente perda de peso e tendência à compensação permanente das trajetórias de crescimento pós‐natal quando comparada com trajetórias intrauterinas.24–26 2. A interrupção abrupta da oferta placentária causa um déficit nutricional transitório não facilmente demonstrável por meio de curvas de crescimento pós‐natal. Suporte nutricional deficitário, o avanço alimentar enteral pós‐natal lento, uso prolongado de nutrição parenteral, episódios repetidos de intolerância alimentar e/ou fornecimento de nutrição sem a composição ideal e os nutrientes necessários para as necessidades de altas taxas de crescimento necessárias são fatores que agravam o déficit de crescimento. Nessas condições, o impacto no crescimento parece ser específico de cada centro, na medida em que as práticas assistenciais não são uniformes.9,10,27,28

Estudo internacional, multicêntrico, longitudinal, observacional em cinco unidades de terapia intensiva neonatal (UTINs) avaliou a trajetória de crescimento de um grupo de prematuros supostamente saudáveis com 25 semanas a 34 semanas de idade gestacional, obteve ajuste da taxa de crescimento extrauterina para ‐0,8 escore‐z abaixo do seu percentil após a adaptação pós‐natal, uma transição para trajetórias de crescimento paralelas aos percentis da curva de Fenton. Esse ajuste foi independente da prática nutricional de cada centro. A abordagem estatística foi semelhante à usada na construção das curvas de crescimento da OMS para lactentes nascidos a termo e amamentados em 2006. Foram estabelecidos dois grupos de distintos de idades gestacionais para definir trajetórias de crescimento: 25 a 29 semanas, nas quais a perda máxima de peso foi de 11% e a recuperação do peso de nascimento com 15 dias de vida em média; e idades gestacionais de 30 a 34 semanas, nas quais a perda máxima de peso foi de 7% e peso ao nascer foi recuperado com 13 dias de vida.29 Embora esse estudo possibilite uma estimativa substancial para trajetórias fisiológicas de crescimento de prematuros após uma adaptação pós‐natal não perturbada por morbidades graves, restaram lacunas para os casos de prematuros com múltiplas morbidades.

O conceito de trajetórias individuais de crescimento para populações com muitas dificuldades e com déficits potenciais de crescimento tem ganhado força no meio cientifico. Estudo recente propôs o uso de três diferentes abordagens para os prematuros obterem um crescimento similar aos neonatos saudáveis a termo de acordo com as curvas da Organização Mundial da Saúde. A proposta envolve o uso de trajetórias individualizadas para monitorar o crescimento de prematuros; uma abordagem que combina o conhecimento atual referente aos diferentes períodos de crescimento fetal e pós‐natal e fornece evidências para padrões de crescimento com dados de referência para prematuros após a conclusão da adaptação pós‐natal. Além disso, avalia padrões de crescimento pós‐natal e permite que os prematuros cresçam com desvios de escore‐z abaixo de suas trajetórias intrauterinas, com a expectativa de retorno ao seu percentual de peso ao nascer em torno de 42 semanas de idade pós‐concepcional. Assim, podem ser estabelecidas novas trajetórias individualizadas de crescimento que incorporam um intervalo dentro do qual o crescimento deve ocorrer. Essa nova abordagem ajuda a cumprir os dois critérios estabelecidos pela American Academy of Pediatrics: primeiro, visa ao crescimento em taxas semelhantes àquelas que ocorrem in utero e em segundo lugar visa a alcançar o crescimento com uma composição corporal saudável, define o tempo para se obter um percentil de nascimento em que o crescimento pós‐natal deve ocorrer.30

As medidas antropométricas repetidas obtidas prospectivamente para avaliar a saúde e o estado nutricional do prematuro em vários momentos após o nascimento parece ser mais informativa do que o padrão de crescimento intrauterino como referência para o crescimento pós‐natal, uma vez que são ambientes e entidades biológicas distintos. As curvas Intergrowth‐21st cumprem essa função para prematuros tardios (acima de 34 semanas de idade gestacional) a partir da primeira avaliação pós‐natal até os seis meses de idade.31 A grande dificuldade é que não dispomos de curvas prescritivas para prematuros com menores idades gestacionais com tamanho amostral suficientemente poderoso para estabelecer um padrão de crescimento populacional. A Intergrowth‐21st foi obtida a partir de gestações saudáveis, tanto que entre as mães a taxa de nascimentos prematuros foi de apenas 5% e por isso os padrões de crescimento produzidos não ofertaram amostra suficiente no nascimento. Os prematuros constituíram 0,1% de todos os nascimentos da coorte e apenas 2% eram nascidos vivos ≤ 30 semanas de gestação.31

Estudos de coorte longitudinais recentemente concluídos desenvolveram gráficos de crescimento fetal intrauterino: NICHD, Intergrowth‐21st e Organização Mundial da Saúde. Apesar de esses três grandes estudos incluírem gestações de baixo risco, os percentis para as dimensões fetais e para o peso fetal estimado variaram entre os estudos, resultaram em diferentes percentagens de grandes e pequenos para idade gestacional mesmo para uma única medida na avaliação do crescimento fetal.32 Esse dado é um alerta para as variabilidades possíveis de serem encontradas quando coortes de prematuros com morbidades variadas são comparadas. É necessária a identificação dos pontos de corte percentuais apropriados em relação à morbidade e mortalidade neonatal em populações locais, depende de qual gráfico de crescimento é usado. Por exemplo, foi observada uma distribuição dos percentis da curva Intergrowth 21st diferente da curva de referência canadense, o que alterou as frequências e as taxas de morbidade/mortalidade neonatal associadas a categorias de percentis específicas, com um número maior de pequeno para idade gestacional e menor de morbidade na curva referência canadense; o que pode ser explicado em função do desvio da curva Intergrowth 21st, na qual um número de neonatos pequeno para idade gestacional representa um maior percentual de restrição de crescimento intrauterino e, portanto, mais morbidade.33

O Grupo de trabalho PRE‐B é a primeira fase de um grande projeto de diretrizes práticas no cuidado nutricional e avaliação de como devem crescer os prematuros. Nessa fase ocorre a avaliação da evidência cientifica disponível para as práticas nutricionais estabelecidas no cuidado do prematuro. O grupo de trabalho que compõe o PRE‐B reforça a teoria de que restrição de crescimento extrauterino ou falha de crescimento no momento da alta hospitalar não é apropriada, recomenda usar o parâmetro da taxa de crescimento fetal, porém começa‐se a avaliação somente após a perda fisiológica de liquido extracelular, como meta de crescimento para os prematuros com menos de 34 semanas.12 Esses quatro grupos de trabalhos revisaram toda a literatura disponível acerca de cada um dos temas a seguir: 1) especificações nutricionais para neonatos prematuros, especialmente a nutrição parenteral; 2) questões práticas na alimentação enteral de prematuros; 3) questões que envolvem problemas cirúrgicos gastrintestinais (gastrosquise, enterocolite necrosante, atresia de esôfago); 4) padrões atuais da transição sonda‐alimentação oral. Muitas das recomendações são orientadas pela morbidade de cada prematuro; como presença de displasia broncopulmonar (DBP) ou retinopatia da prematuridade, nas quais as necessidades de vitaminas, calorias e energia são maiores para se obter uma trajetória de crescimento adequada.12,34,35

No caso da DBP, leite materno é protetor, especialmente em população de prematuro com menos de 1.500 gramas de peso ao nascer e menos de 32 semanas, nos quais a prevalência é maior. Estudo que avaliou aleitamento materno nas primeiras seis semanas de vida encontrou média de oferta de 10,8mL/kg/dia no grupo sem displasia e 2,3mL/kg/dia de leite materno naqueles com DBP. A quantidade de leite materno recebida foi inversamente proporcional ao diagnóstico de DBP e as taxas de neonatos alimentados com fórmula são muito maiores.36,37 Evidencia‐se, assim, um exemplo prático de uma trajetória especifica de crescimento orientada pela prática nutricional.

Além disso, as necessidades nutricionais devem ser individualizadas de acordo com necessidades fetais e o peso de nascimento. Assim, para extremos baixo peso as necessidades de ingesta enteral são de aproximadamente 105kcal/kg/dia e 4 gramas proteína/kg/dia, alcançam relação de 3,8g proteína/100kcal de energia. Já para prematuros com peso de nascimento de 1.500 a 1.800 gramas, as necessidades de ingesta enteral são maiores, aproximadamente 128 Kcal/kg/dia e 3,6 gramas proteína/Kg/dia e uma relação de proteína/energia menor, de 2,8g de proteína/100kcal de energia.38,39

De acordo com Cole et al., parece mais apropriado avaliar escores‐z/percentis para peso, comprimento e perímetro cefálico em relação ao nadir de peso pós‐fisiológico em duas a três semanas de idade, em vez do tamanho ao nascimento.4 Por outro lado, Senterre et al. consideram o terceiro dia de vida como ponto de partida por ser o momento pós‐natal no qual o nadir de peso é ideal; espera‐se que seja o período pós‐natal, no qual a nutrição está aprimorada.40 Percebe‐se com isso que a monitoração do crescimento do prematuro deve ser individualizada e o conhecimento do pacote de vulnerabilidades que encerra a condição do nascimento prematuro é parte significativa nessa estratégia.

No entanto, mais estudos são necessários, particularmente com prematuros extremos, desde que se empreguem métodos sofisticados de medir a adequação da alimentação enteral, como biomarcadores, painéis de nutrientes e medições mais precisas de crescimento de órgãos e de composição corporal. Evidências sugerem que um crescimento mais rápido, que promove catch up antes da alta hospitalar ou entre a alta hospitalar e o termo equivalente de 38 a 40 semanas de idade corrigida e posteriormente entre a o termo e 4‐12 meses de idade corrigida, é benéfico para o neurodesenvolvimento em longo prazo, com poucas evidências de risco metabólico.41 Embora níveis de insulina em jejum e de LDL séricos de prematuros estejam mais elevados naqueles com rápida recuperação do crescimento entre o termo e 12 semanas de idade corrigida, os padrões de crescimento mais tarde na infância e na adolescência parecem ser mais preditores de síndrome metabólica na adolescência do que o crescimento e a nutrição dentro da UTI Neonatal.42 A prevalência de uma condição chamada síndrome metabólica like é elevada entre prematuros de muito baixo peso do que entre os que apresentam sobrepeso/obesidade aos dois anos de idade corrigida, mesmo sem diferença na exposição precoce e agressiva ao aminoácidos na nutrição parenteral, o que reforça a importância da monitoração do crescimento em fases precoces da vida como um guia de orientação nutricional individualizado.43,44

Conclusão

É essencial compreender exatamente qual é o padrão ótimo de crescimento para neonatos prematuros, levar em consideração os resultados de longo prazo do desenvolvimento neurológico, cardiovascular e metabólico. O uso de dados neonatais longitudinais com diferentes idades gestacionais e considerando gestações de alto e médio risco provavelmente será fundamental para a construção desse entendimento. Enquanto esse conhecimento não está disponível, cabe aos pediatras e neonatologistas priorizar e conhecer a trajetória individual de crescimento de cada criança nascida prematura.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

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Como citar este artigo: Silveira RC, Procianoy RS. Preterm newborn's postnatal growth patterns: how to evaluate them. J Pediatr (Rio J). 2019;95:S42–S8.

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