The management of children with low birth weight is not the same in countries with different resources. The authors assessed the association of birth weight with blood pressure and nutritional status in a representative sample of adolescents from a Brazilian state, aiming to identify possible consequences of these differences.
MethodsA cross-sectional school-based study was conducted with adolescents (12-18 years) enrolled in public and private schools. Birth weight, office blood pressure, home blood pressure measurements, and nutritional status (body mass index, height z-score for the age, and waist circumference) were assessed. The association of birth weight with the outcomes (blood pressure, height, body mass index, and waist circumference) was studied through univariate and multivariable linear regression models.
ResultsA total of 829 adolescents with a mean age of 14.6 ± 1.62 years were included; 43.3% were male, and 37.0% from private schools. The prevalence of low birth weight was 8.7%. Mild low height prevalence was higher among those adolescents with low/insufficient birthweight when compared to those with normal/high birth weight (11.7 vs. 4.2%; p < 0.001). In the multiple linear regression analysis, for each increase of 100 g in birth weight, height increased by 0.28 cm (95% CI: 0.18-0.37; p < 0.01). Birth weight did not influence office blood pressure and home blood pressure, body mass index, or waist circumference of adolescents.
ConclusionsBirth weight was directly associated to height, but not associated to blood pressure, body mass index, and waist circumference in adolescents from an urban area of a developing country.
O manejo de crianças com baixo peso ao nascer não é o mesmo em países com diferentes recursos. Investigamos a associação do peso ao nascer com a pressão arterial e o estado nutricional em uma amostra representativa de adolescentes de uma capital brasileira com o objetivo de identificar possíveis consequências destas diferenças.
MétodosEstudo transversal de base escolar conduzido com adolescentes (12-18 anos) matriculados em escolas públicas e privadas. Investigou-se o peso ao nascer, a pressão arterial, e o estado nutricional, por meio do índice de massa corporal, do escore z de estatura para idade e da circunferência da cintura.
ResultadosUm total de 829 adolescentes com uma idade média 14.6 ± 1.62 anos foram incluídos, 43.3% do sexo feminino e 37.0% de escolas privadas. A prevalência de baixo peso ao nascer foi 8.7%. Baixa estatura leve foi mais prevalente nos adolescentes com peso ao nascer baixo/insuficiente (11.7 × 4.2% - p < 0.001). Na análise de regressão linear múltipla, para cada aumento de 100 g no peso ao nascer, a estatura aumentou em 0.28 cm (IC 95% = 0.18-0.37; p < 0.01). O peso ao nascer não influenciou a pressão arterial (casual e residencial), o índice de massa corporal e a circunferência da cintura dos adolescentes.
ConclusõesO peso ao nascer esteve diretamente associado à altura, mas não associado à pressão arterial, índice de massa corporal e circunferência da cintura em adolescentes de uma área urbana de um país em desenvolvimento.
A hipótese da origem fetal das doenças ou “programação” foi proposta pela primeira vez por Barker, em 1990.1 O principal conceito dessa hipótese é que o estresse causado por desnutrição fetal, para o qual o principal biomarcador é baixo peso ao nascer (BPN), não modificaria a fisiologia ou o metabolismo de um órgão, aumentaria a susceptibilidade a doenças na vida adulta.
Indubitavelmente, a vida uterina é um período essencial de desenvolvimento, devido ao rápido crescimento, à diferenciação celular e à maturação funcional dos órgãos. Esses processos bastante sensíveis seriam particularmente suscetíveis a alterações no meio nutricional.1
O peso ao nascer é um importante indicador de saúde que reflete as condições sociais e econômicas da mulher durante a gravidez. Juntamente com a prematuridade, o peso ao nascer é o principal fator associado a óbito neonatal no Brasil. Os bebês com BPN apresentam maior morbidez e mortalidade no primeiro ano de vida.2
As crianças com baixo peso ao nascer (PN < 2.500g) podem ser nascidos a termo ou pré‐termo e ter diferentes graus de risco social e médico. Como as crianças com BPN não são um grupo homogêneo, apresentam um amplo espectro de crescimento, saúde e resultados de desenvolvimento. Embora a grande maioria das crianças com BPN apresente resultados normais, como um grupo, elas, em geral, apresentam maiores taxas de crescimento subnormal, doenças e problemas de desenvolvimento neurológico.3
Estudos recentes mostraram que as pessoas com baixo peso ao nascer, consequência de desenvolvimento intrauterino inadequado, são propensas a desenvolver, entre outras doenças, hipertensão, obesidade e baixa estatura nos estágios finais da vida.4–6
Apesar de a associação do BPN a várias doenças ser mostrada em diferentes contextos,7–9 os mecanismos por trás dessas associações ainda não são completamente entendidos e precisam ser mais investigados.10 Além disso, poucas publicações em países de renda média focam nessa questão. Considerando que o manejo de crianças com BPN não é o mesmo em países com diferentes recursos, a pesquisa feita nesses países pode ajudar a identificar as consequências relacionadas aos resultados do BPN na adolescência e na vida adulta.
Devido à escassez de estudos sobre programação fetal das doenças em países de renda média, como o Brasil, considerando particularmente a população jovem, nosso objetivo foi avaliar a associação do peso ao nascer com a pressão arterial e o estado nutricional em uma amostra representativa de adolescentes de uma capital brasileira.
MétodosFoi feito um estudo transversal de base escolar com uma amostra representativa de adolescentes matriculados em escolas públicas e privadas de Goiânia, capital do Estado de Goiás na Região Centro‐Oeste do Brasil. A população estudada foi composta por adolescentes, entre 12 e 18 anos. As escolas foram selecionadas por amostragem probabilística conglomerada e a seleção dos alunos foi aleatória e estratificada por idade e sexo. Os critérios de exclusão foram doença crônica, uso de medicação que possa influenciar a pressão arterial (PA), deficiência física que não possibilitaria avaliação antropométrica, gravidez e ausência de informações sobre o peso ao nascer.
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética de nossa instituição (número de protocolo ETIC 017/2010). Os adolescentes elegíveis que concordaram em participar do estudo assinaram um formulário de consentimento informado, bem como seus responsáveis.
Foram convidados a participar do estudo 1.221 adolescentes que atenderam aos critérios de inclusão, 48 recusaram (3,8%), quatro (0,5%) não tiveram suas medidas antropométricas avaliadas e 340 (41%) foram excluídos, os pais ou responsáveis legais não forneceram informações sobre o peso ao nascer, resultou‐se em 829 adolescentes (67,9% do grupo original) na amostra final.
O tamanho da amostra nos possibilitou estimar a associação do peso ao nascer com as variáveis antropométricas e a PA em adolescentes, detectar uma diferença de 15% para meninos e meninas, separadamente, com α bicaudal de 0,05 e poder de teste de 80%.
O instrumento para coleta de dados foi um questionário padronizado, anteriormente testado em um estudo‐piloto,11 com perguntas relacionadas à identificação do indivíduo, inclusive sexo, idade, cor da pele (branca ou não branca), histórico familiar de hipertensão e obesidade, bem como a classificação socioeconômica do adolescente.
Medidas antropométricasO estado nutricional foi avaliado por meio do peso, da estatura e da circunferência da cintura, com os procedimentos padronizados.12 O peso foi verificado em uma balança eletrônica Kratos® (Kratos®, SP, Brasil) com capacidade de 150kg e variação de 50g, e a estatura foi avaliada com estadiômetro Secca® (Secca®, SP, Brasil), graduado para precisão de 0,1cm. Os adolescentes foram classificados com base no escore de z de estatura para a idade: baixa estatura leve (−1 < escore de z ≤ −2) e estatura normal (escore de z ≥ −1).13 O índice de massa corporal (IMC) foi calculado e classificado de acordo com a referência‐padrão específica para idade e sexo proposta pela Organização Mundial de Saúde (OMS).14 As medições da circunferência da cintura (CC) foram feitas com fita métrica inextensível Sanny® (Sanny®, SP, Brasil) 200cm com variação de 0,1cm e os pontos de corte foram os propostos por Taylor et al.15 e foram categorizados em CC normal e aumentada.
Peso ao nascerOs pais ou responsáveis tiveram de responder, na carta de apresentação do estudo, se o nascimento foi prematuro ou não e anotar o peso ao nascer, de acordo com os dados da certidão de nascimento da criança. O peso ao nascer foi classificado como baixo (PN < 2.500g), insuficiente (2.500g ≤ PN < 3.000g), normal (3.000g ≤ PN < 4.000g) ou alto (PN ≥ 4.000g).12 Nascimento prematuro foi usado para ajustar o peso ao nascer no modelo de regressão.
Medição da pressão arterial no consultórioConsultório As aferições foram feitas na escola, com o aparelho semiautomático HEM‐705CP OMRON® (HEM‐705CP OMRON®, CA, EUA) e foram usados três tamanhos de medidores, de acordo com a circunferência correta do braço. O equipamento foi previamente validado para adolescentes.16 Duas aferições de PA que seguem as técnicas17 adequadas foram feitas em dois encontros no intervalo de uma semana. Para a análise, foram considerados os valores médios das segundas aferições em cada ponto de tempo. PA alta aferida no consultório foi definida por valores ≥ do percentil de 95 para sexo, idade e estatura.17
Medição da pressão arterial em casaForam usados o mesmo equipamento e tamanhos de medidores que na medição da PA no consultório. O aparelho foi dado ao adolescente, que foi, também, adequadamente treinado sobre como usá‐lo. Deve‐se fazer duas aferições no braço direito, na posição sentada, após cinco minutos de descanso, de manhã (entre 6h e 10h) e à noite (entre 18h e 22h), por seis dias consecutivos (total de 24 leituras).18
As aferições em casa salvas na memória do equipamento foram impressas e comparadas com as relatadas no formulário de pressão arterial aferida em casa preenchido pelo adolescente. Quando houve discrepância entre as aferições (mais aferições da memória do equipamento do que do formulário da pressão arterial em casa) ou quando o adolescente relatou não ter sido a única pessoa a usar o equipamento, o exame foi excluído da análise. Os exames foram considerados válidos com no mínimo 12 aferições (50%) feitas de acordo com os protocolos padronizados.18 A aferição da pressão arterial em casa (APAC) foi classificada como alta quando a média da pressão sistólica e/ou diastólica dos seis dias foi ≥ percentil de 95 para a idade, o sexo e a estatura respectivos.19
Análise estatísticaOs dados foram tabulados em entrada dupla com o software Epi‐Info (Epi‐Info, versão 6.04, Division of Health Informatics & Surveillance, Centers of Disease Control and Prevention). A categorização variável e a análise estatística foram feitas com o software Stata (SPSS para Windows, Versão 13, Chicago, EUA). O teste de Kolmogorov‐Smirnov avaliou se as variáveis contínuas apresentaram distribuição normal. O teste qui‐quadrado de Pearson comparou as categorias de PA e estado nutricional entre os adolescentes com peso ao nascer baixo/insuficiente e normal/alto. A relação do peso ao nascer com os resultados (PA, estatura, IMC e CC) foi estudada por meio da análise de regressão linear univariada e multivariada. As variáveis que apresentaram valor de p < 0,20 na análise univariada e ausência de colinearidade entre as variáveis independentes (coeficiente de correlação de Pearson < 0,80) foram incluídas no modelo multivariado. As variáveis incluídas no modelo de ajuste foram selecionadas com base na plausibilidade científica.20 Foi considerado um nível de significância de 5%.
ResultadosForam incluídos na análise 829 adolescentes com média de 14,68 (± 1,62) anos, 43,3% eram meninos e 37% eram de escolas privadas. As aferições da PA no consultório não foram feitas em 53 (6,4%) indivíduos e a aferição da pressão arterial em casa (APAC) não foi feita de forma válida em 128 (15,4%) indivíduos. A média de peso ao nascer foi de 3.277,93 (± 597,33g) e 47,9% disseram ter cor de pele branca. As características gerais do grupo são mostradas na tabela 1.
Características gerais de uma amostra representativa de adolescentes de uma capital brasileira. Goiânia – Brasil
Variável | n | Valor |
---|---|---|
Sexo, (masculino), n (%) | 829 | 359 (43,3%) |
Tipo de escola (privada), n (%) | 829 | 307 (37,0%) |
Cor da pele (branca), n (%) | 829 | 397 (47,9%) |
Idade (anos), média (DP) | 829 | 14,68 (1,62) |
Peso ao nascer (g), média (DP) | 829 | 3277,93 (597,33) |
Peso (kg), média (DP) | 829 | 57,36 (13,52) |
Estatura (m), média (DP) | 829 | 1,66 (0,09) |
Índice de massa corporal (kg/m2), média (DP) | 829 | 20,79 (3,92) |
Circunferência da cintura (cm), média (DP) | 829 | 70,81 (9,09) |
PAS médiaa no consultório (mmHg), média (DP) | 777 | 112,15 (12,50) |
PAD médiab no consultório (mmHg), média (DP) | 777 | 66,61 (8,03) |
PAS médiac em casa (mmHg), média (DP) | 701 | 112,82 (10,21) |
PAD médiac em casa (mmHg), média (DP) | 701 | 66,59 (6,36) |
Nascimento prematuro, n (%) | 829 | 55 (6,7%) |
Histórico familiar de hipertensão, n (%) | 829 | 216 (26,1%) |
Histórico familiar de obesidade, n (%) | 829 | 80 (9,7%) |
A prevalência de baixo peso ao nascer foi de 8,7%. A distribuição entre as categorias de peso ao nascer foi homogênea entre meninos e meninas e a única diferença foi encontrada na categoria de alto peso ao nascer, na qual a proporção de meninos foi maior do que a de meninas, conforme mostrado na figura 1.
O estado nutricional caracterizado por IMC, estatura e distribuição da circunferência da cintura estratificada em peso ao nascer baixo/insuficiente e normal/alto é relatado na tabela 2. A prevalência geral de sobrepeso/obesidade foi de 22,9%. A prevalência de baixa estatura leve foi maior entre os adolescentes com peso ao nascer baixo/insuficiente em comparação com os com peso ao nascer normal/alto (11,7 x 4,2%; p < 0,001). A prevalência dos adolescentes com obesidade abdominal foi de 15,7%.
Distribuição dos níveis de estado nutricional e pressão arterial por categorias de peso ao nascer em adolescentes. Goiânia – Brasil
Variável | n | Amostra total n (%) | n | Peso ao nascer baixo/insuficiente n (%) | n | Peso ao nascer normal/alto n (%) | Valor de pa |
---|---|---|---|---|---|---|---|
IMC | 829 | 230 | 599 | 0,285 | |||
Baixo | 30 (3,6) | 13 (5,6) | 17 (2,8) | ||||
Peso normal | 609 (73,5) | 166 (72,2) | 443 (74,0) | ||||
Sobrepeso | 127 (15,3) | 34 (14,8) | 93 (15,5) | ||||
Obesidade | 63 (7,6) | 17 (7,4) | 46 (7,7) | ||||
Estatura | 829 | 230 | 599 | < 0,001 | |||
Normal | 777 (93,7) | 203 (88,3) | 574 (95,8) | ||||
Baixa leve | 52 (6,3) | 27 (11,7) | 25 (4,2) | ||||
CC | 829 | 230 | 599 | 0,386 | |||
Normal | 699 (84,3) | 198 (86,1) | 501 (83,6) | ||||
Aumentada | 130 (15,7) | 32 (13,9) | 98 (16,4) | ||||
PA no consultório | 776 | 214 | 562 | ||||
< Percentil de 95 | 710 (91,5) | 201 (93,9) | 509 (90,6) | 0,134 | |||
≥ Percentil de 95 | 66 (8,5) | 13 (6,1) | 53 (9,4) | ||||
APAC | 701 | 188 | 513 | ||||
< Percentil de 95 | 674 (96,1) | 179 (95,2) | 495 (96,5) | 0,436 | |||
≥ Percentil de 95 | 27 (3,8) | 9 (4,8) | 18 (3,5) | ||||
PA e APAC no consultório | 816 | 224 | 592 | ||||
< Percentil de 95 | 805 (98,6) | 220 (98,2) | 585 (98,8) | 0,505 | |||
≥ Percentil de 95 | 11 (1,4) | 4 (1,8) | 7 (1,2) | ||||
PA ou APAC no consultório | 816 | 224 | 592 | ||||
< Percentil de 95 | 734 (89,9) | 206 (92,0) | 528 (89,2) | 0,239 | |||
≥ Percentil de 95 | 82 (10,1) | 18 (8,0) | 64 (10,8) |
APAC, aferição da pressão arterial em casa; CC, circunferência da cintura; IMC, índice de massa corporal; PA, pressão arterial.
A prevalência de pressão arterial alta definida por aferições no consultório foi de 8,5%, ao passo que por APAC foi de 3,8%. A tabela 2 mostra a prevalência de hipertensão pela técnica de aferição e a comparação entre as categorias de peso ao nascer. Não foi encontrada diferença na prevalência de hipertensão entre as categorias de peso ao nascer.
O peso ao nascer não influenciou a PA no consultório e PA em casa nos adolescentes estudados. Uma influência positiva foi detectada inicialmente no IMC e na CC; contudo, ela não foi mantida após a análise ajustada (p = 0,274 e 0,835, respectivamente). Por outro lado, para cada aumento de 100g no peso ao nascer, a estatura aumentou 0,33cm (IC de 95% = 0,23‐0,43; p < 0,01) e, após a análise multivariada, o aumento caiu para 0,28cm (IC de 95% = 0,18‐0,37; p < 0,01). Os resultados de peso ao nascer foram ajustados para prematuridade. As variáveis independentes usadas no modelo explicaram 37,6% da variação na estatura (tabela 3).
Associação do peso ao nascer com pressão arterial e estado nutricional em adolescentes. Goiânia/GO/Brasil, 2010‐2011 (n = 829)
Variáveisa | β simples (IC de 95%) | Valor de pb | β ajustado (IC de 95%) | R2 | Valor de pc |
---|---|---|---|---|---|
PA no consultório (mmHg)d | |||||
Sistólica | –0,01 (–0,16 – 0,14) | 0,872 | ‐ | ‐ | ‐ |
Diastólica | 0,03 (–0,06 – 0,13) | 0,466 | ‐ | ‐ | ‐ |
APAC (mmHg)e | |||||
Sistólica | 0,08 (–0,05 – 0,20) | 0,240 | ‐ | ‐ | ‐ |
Diastólica | –0,01 (–0,08 – 0,07) | 0,881 | ‐ | ‐ | ‐ |
IMC (kg/m2) | 0,05 (0,01 – 0,09) | 0,023 | 0,03 (–0,02 – 0,07)f | 0,095 | 0,274 |
CC (cm) | 0,13 (0,03 – 0,23) | 0,013 | –0,01 (–0,09 – 0,11)f | 0,174 | 0,835 |
Estatura (cm) | 0,33 (0,23 – 0,43) | < 0,001 | 0,28 (0,18 – 0,37)g | 0,376 | < 0,001 |
β, coeficiente de regressão não padronizado; APAC, aferição da pressão arterial em casa; CC, circunferência da cintura; IC, intervalo de confiança; IMC, índice de massa corporal; PA, pressão arterial; R2, coeficiente de determinação.
Neste estudo avaliamos uma amostra representativa de mais de 800 alunos do ensino médio de uma capital brasileira na Região Centro‐Oeste do país e focamos no BPN e em sua associação com pressão arterial e estado nutricional. O peso ao nascer foi uma variável preditora de estatura, porém não de IMC e PA, em adolescentes de uma área urbana de um país de renda média.
A taxa de BPN da amostra (8,7%) foi maior do que a taxa de 6,1% de outra amostra brasileira21 e a taxa de 6,9% encontrada em um estudo publicado anteriormente em Goiânia.22 Esse achado tem um impacto negativo sobre a saúde e a sobrevida do recém‐nascido. Contudo, uma maior prevalência de BPN pode ser observada em regiões mais desenvolvidas do Brasil e esse fenômeno pode ser explicado pela melhoria na assistência à saúde de mulheres grávidas e neonatos, possibilita que os bebês com baixo peso sobrevivam.23
A alta prevalência de peso ao nascer (9%) também foi superior ao número relatado anteriormente de 6,5% para recém‐nascidos em Goiânia.24 Como a macrossomia fetal está relacionada a um maior risco de óbito e prematuridade, bem como complicações como trauma obstétrico, distocia e hipoglicemia neonatal,25 são necessárias investigações adicionais para esclarecer se esse achado representa uma tendência e os possíveis fatores por trás desse crescimento.
Um aspecto considerável deste estudo foi que as crianças com BPN se tornaram adolescentes mais baixos. Esse resultado está de acordo com uma redução de 5,9cm na estatura, no fim da adolescência, de crianças com baixo peso ao nascer no condado de Hordaland (Noruega),4 bem como com a maior ocorrência de baixa estatura (10,3%) em um grupo de adultos que nasceram pequenos para a idade gestacional (PIG) em comparação com o grupo de controle.26
A maior parte das crianças PIG recupera sua estatura nos dois primeiros anos de vida; contudo, estima‐se que entre 10% e 15% manterão um déficit de estatura (escore de z ‐2) durante toda a vida. Para essas crianças, a terapia com hormônio do crescimento humano recombinante foi recentemente aprovada nos EUA e na Europa.20
Contudo, não está claro se a relação do peso ao nascer com a estatura resulta de mecanismos genéticos, influência uterina, estilo de vida, condição social ou uma combinação desses fatores. Um mecanismo de programação de baixa estatura provavelmente está relacionado a alterações no hormônio da tireoide, por meio da redução de fenilalanina e tirosina. Isso causaria uma redução no consumo de oxigênio e um retardamento no crescimento.7 Outra explicação seria uma predisposição para maturação sexual e óssea precoce, que resultaria em um déficit de crescimento linear.1 Apesar de não ser o foco deste estudo, a descoberta de loci (HMGA2 e LCORL) que associa geneticamente o crescimento intrauterino à estatura pós‐natal é outro aspecto a ser mencionado.27
A última recomendação da OMS28 modificou a classificação anterior de baixa estatura leve para normal, devido, provavelmente, à queda mundial na prevalência de déficit de estatura entre indivíduos jovens na população. Contudo, a tendência de aumento na estatura em todas as gerações exige a necessidade de reavaliação das curvas de referência e revisão da definição de baixa estatura, para não subestimar os distúrbios nutricionais na população, principalmente em recém‐nascidos com baixo peso.26
O peso ao nascer foi diretamente associado a aumento no IMC e CC em adolescentes; contudo, essa relação não foi mantida após uma análise ajustada. As alterações dessas variáveis antropométricas podem ser total ou parcialmente explicadas por fatores no período pós‐natal, muito mais do que a biologia fetal.8 Esses resultados corroboraram os estudos4,29,30 que não encontraram risco significativo de baixo peso ou obesidade, associados a peso ao nascer, durante e no fim da adolescência.
Ainda há controvérsias sobre essa relação. Um estudo chileno concluiu que aproximadamente um terço dos casos de obesidade em indivíduos do ensino médio poderia ter sido evitado com intervenções precoces em recém‐nascidos com macrossomia.6 Um estudo de coorte brasileiro com recém‐nascidos da região mais economicamente desenvolvida do país mostrou aumento de 1,2kg/m2 (IC de 95% = 0,0‐2,4) no IMC aos 18 anos em indivíduos com peso ao nascer ≥ 4kg.31
Sobrepeso foi observado em mais de um quinto dessa população, ultrapassou em seis vezes a frequência de déficit no peso. Esses resultados confirmam a transição nutricional observada em países de renda média, caracterizada pela redução progressiva da desnutrição e do aumento contínuo na prevalência de obesidade. Foi relatada prevalência do déficit no peso entre brasileiros entre 10‐19 anos em 3,4%, ao passo que sobrepeso/obesidade foi de 20,5%.32
Não houve associação entre peso ao nascer e PA (consultório e casa) na adolescência, contradisseram‐se os autores que propuseram que o BPN, consequência de desenvolvimento uterino inadequado, estaria associado ao maior risco de desenvolvimento de hipertensão em jovens.5,8
Contudo, a investigação do impacto do peso ao nascer sobre a PA é controversa. Outro estudo brasileiro, que usou monitoramento ambulatorial da pressão arterial (MAPA), revelou maior PAS à noite e menores padrões dipper de PAS em alunos com BPN; contudo, o estudo não encontrou correlação com PAS durante o dia.9
Uma limitação de nosso estudo foi a ausência de informações sobre a idade gestacional. Sem isso não foi possível definir se a condição de PIG ocorreu em virtude de restrição do crescimento intrauterino (RCIU). Contudo, o termo PIG apresenta limitações em um ponto de vista epidemiológico, pois ele desconsidera fatores como variabilidade biológica, sexo, multiplicidade, etnia e paridade, infere que todos os bebês pequenos resultam de uma restrição patológica no crescimento. Nesse sentido, não há um método padrão para determinar a RCIU com precisão, o que dificulta estudo na programação fetal. Ademais, o peso ao nascer é o único indicador de saúde perinatal amplamente coletado no Brasil, devido à sua praticidade e forte associação com mortalidade de neonatos.33
Outras limitações referem‐se à condição socioeconômica, que não necessariamente corresponde ao contexto em que a criança nasceu; a coleta de variáveis de parto, que foi feita exclusivamente pelos pais ou responsáveis dos adolescentes; e à ausência de dados sobre maturação sexual, estatura dos pais e tabagismo durante a gestação. Considerando que 67,9% dos adolescentes inscritos para participar foram incluídos na análise transversal, é importante considerar também o possível viés de seleção como uma limitação.
Outro fator que pode ter influenciado nossos resultados foi o uso do método oscilométrico para aferir a pressão arterial, em vez de auscultador, bem como o uso de apenas duas aferições da pressão arterial. Essa metodologia foi escolhida devido ao fato de as recomendações disponíveis para aferição da pressão arterial em adolescentes terem como base as opiniões de especialistas, em vez de estudos experimentais bem feitos.34
O peso ao nascer é uma variável complexa influenciada por muitos fatores de genótipo fetal e materno. As perspectivas do curso de vida contemporâneo também reconhecem as complexas interações dos fatores biológicos com o ambiente. Esses são os desafios para promover o entendimento da origem fetal das doenças, considerando a complexidade dos fatores ambientais.33
O BPN foi uma variável preditora de déficit de crescimento na adolescência. Não houve associação entre o peso ao nascer e PA (consultório e casa), CC e IMC nessa faixa etária. A alta prevalência de recém‐nascidos com baixo e alto peso ao nascer na população estudada demonstra a necessidade de melhores cuidados pré‐natais e atenção nutricional à mulher grávida, a fim de promover saúde materna, evitar mortalidade neonatal e garantir crescimento/desenvolvimento normais da criança.
FinanciamentoConselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg).
Conflitos de interesseOs autores declaram não haver conflitos de interesse.
Agradecemos a participação dos adolescentes, bem como de seus parentes ou responsáveis, no estudo e o apoio oferecido pela Liga de Hipertensão da Universidade Federal de Goiás.
Como citar este artigo: Ferreira VR, Jardim TV, Póvoa TR, Mendonça KL, Nascente FN, Carneiro CS, et al. Birth weight and its association with blood pressure and nutritional status in adolescents. J Pediatr (Rio J). 2018;94:184–191.
Estudo feito na Universidade Federal de Goiás (UFG), Liga de Hipertensão Arterial, Goiânia, GO, Brasil.